Carrie Fisher. Uma Homenagem.

A eterna Princesa de Alderaan.

Todo dia 26 de dezembro (meu dia de aniversário), vou ao Cemitério São João Batista para fazer uma pequena homenagem a algumas pessoas. Visito as sepulturas de Luís Carlos Prestes (considerado “O Cavaleiro da Esperança” por uns, um bandido comunista para outros), Tom Jobim (um músico que foi importante demais para nosso país e nem temos a ideia disso), Santos Dumont (que dispensa apresentações), o casal Vicente Celestino e Gilda de Abreu (um grande cantor antigo e uma grande atriz e diretora de cinema). Mas, principalmente, visito minhas duas Carmens, a Miranda e a Santos, que tentaram elevar o nome de nosso país e de nosso cinema. Carmen Miranda ainda teve um reconhecimento do público, embora tenha sido criticada pela imprensa brasileira por se “vender” aos Estados Unidos. Carmen Santos, essa ninguém fala mais, apesar de todos os sacrifícios feitos por ela para realizar bons filmes no Brasil, numa época em que nosso país ainda era assolado pelo complexo de vira-latas. Minhas visitas anuais ao cemitério são para diminuir um pouco o impacto da injustiça provocada pela falta de reconhecimento. Colocar rosas vermelhas em seus túmulos ajudam a minimizar um pouquinho tais dores. 

Postura desafiadora com os inimigos

Carmen Miranda faleceu em 1955, e Carmen Santos, em 1952. Essas mortes doem até tempos presentes. E o que não falar de uma morte que aconteceu hoje? Carrie Fisher, a eterna Princesa Leia, nos deixou. Filha da atriz americana Debbie Reynolds e do cantor e apresentador Ed Fisher, Carrie Fisher viveu desde cedo próxima ao showbiz. Em 1977 ela encantou o mundo, ao estrelar “Guerra nas Estrelas” como a Princesa Leia, com apenas 19 anos. Fez noventa filmes e era escritora. Ela nunca teve medo de expor sua vida pessoal na mídia e divulgou que sofria de transtorno bipolar. Outras fontes diziam que ela tinha problemas com drogas. Mas nenhuma dessas informações abalavam a adoração que os fãs de “Guerra nas Estrelas” tinham por Leia e por Fisher. A atriz e a personagem às vezes pareciam ser uma coisa só. Da mulher forte que peitava o grão moff Tarkin com tiradas cínicas e atrevidas, passando pelo tom debochado com os subalternos do Império (“Você não é pequeno demais para ser um stormtrooper?”, dizia para um Luke disfarçado), trocando rusgas com o “canalha” Han Solo, mostrando que não era mulher de entrar em qualquer conversa e que para ter seu coração, era preciso conquistá-la, chegando até a sua carinhosa afeição por Luke, uma afeição a princípio inexplicável por ela não saber que se tratava de seu irmão. A atriz Carrie Fisher deu essa natureza multifacetada à Princesa Leia de forma extremamente convincente. Se em Jornada nas Estrelas, havia a tríade Spock – Kirk – McCoy com o vulcano representando a razão, o médico representando a emoção e o capitão representando a conciliação entre pólos aparentemente tão antagônicos, em “Guerra nas Estrelas” também havia outra tríade. Han Solo é a impetuosidade masculina em pessoa, o aventureiro que age pelo impulso. Luke Skywalker é o jovem e ingênuo aprendiz que inicia timidamente seus passos no ofício da batalha. E no centro, cimentando e alicerçando esses dois pólos, estava Leia, com o espírito libertário feminino, que luta contra milênios de opressão machista (isso nessa galáxia aqui mesmo), botando o machismo do contrabandista em seu devido lugar e, ao mesmo tempo, tratando com extremo carinho o órfão padawan tardio, manifestando um amor que mais se aproxima dos ancestrais instintos maternos que ajudaram a preservar nossa espécie.

Leia e Han Solo. Um amor surgido depois de muitos conflitos

Um símbolo da mulher pós década de 60, que é dura ao lutar por seus direitos frente a uma cultura que a oprime, mas que não perde a ternura ao mostrar seu lado mãe. Mas uma mulher também que atua como a verdadeira fêmea fatal, ao reagir violentamente contra as investidas do pérfido Hutt, que queria transformá-la num objeto sexual e periodicamente a enforcava com uma coleira presa a uma corrente. Ao melhor estilo “olho por olho”, ela ceifa a vida do gângster estrangulando-o com a própria corrente que estava presa em seu pescoço. Ainda, uma mulher que consegue pensar racionalmente, mesmo em situações de extrema tensão, quando o contrabandista e o jovem agricultor tentam libertá-la da prisão, mas não têm um plano de fuga, e a herdeira do trono da destruída Alderaan toma as armas e improvisa um caminho para a calha de lixo, arrancando até uma admiração do machão Solo.

Leia e Luke. Relacionamento pautado na afeição

Essa é Carrie Fisher. Essa é a Princesa Leia. Essa jamais irá embora de nossas memórias. Mesmo que eu não possa visitar seu jazigo, como faço todos os anos com minhas Carmens, ela estará sempre presente em nossos pensamentos. Dizem que uma pessoa morre mais de uma vez. E a última vez em que uma pessoa morre é quando param de falar o nome dela. Se depender dos fãs, Carrie Fisher e Leia jamais terão essa morte derradeira. Mais do que uma princesa que luta contra um fictício Império Galáctico do Mal, Leia se tornou um símbolo das mulheres que lutam aqui em nosso planeta por mais direitos e igualdades. Luta que não necessariamente faz a mulher bruta e a afasta de suas doces características femininas. Leia, portanto, se tornou também um símbolo da afeição feminina, sabendo ser carinhosa e materna nos momentos certos. Agressiva, sem perder o racionalismo. Racional, sem perder a emoção. Agora ela realmente é a Força. Agora, ela nos envolve. E jamais ficaremos distantes dela. 

E, para uma pequena homenagem, fiquem com o inesquecível final do Episódio IV, que jamais sairá de nossos corações…

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