Clint Eastwood está de volta em seu novo filme “15h:17 Trem Para Paris”. Temos aqui mais uma película inspirada numa história real. Mais um filme de qualidade dirigido por Eastwood. Só que temos uma história principal meio que morninha, apesar de heroica. Toda a vez que a gente pensa em algo heroico (o trailer dizia que o filme era inspirado numa história real com heróis reais), a gente acha que algo de muito espetacular vai passar nas telonas. Mas nem sempre a vida imita a arte.
Bom, temos aqui a história de três amigos de infância, Anthony Sadler, Alek Skarlatos e Spencer Stone (interpretados por eles mesmos, os tais “heróis reais”), cujas trajetórias foram um tanto tortuosas, sobretudo na infância. Crianças problema e mimados pelas mães, os garotos não conseguiam se adaptar a nada, mas pelo menos dois deles alçavam a carreira militar e enveredaram por esse caminho. O filme mostra a trajetória de nossos protagonistas até o momento em que eles decidem viajar pela Europa juntos e, no tal trem para Paris, testemunham uma tentativa de atentado terrorista. E aí, não posso dar mais detalhes para evitar os spoilers.
Devo dizer que o filme é dividido em algumas partes: a infância dos protagonistas, a vida adulta deles e a viagem em si. E, de todas essas partes, a mais instigante é justamente a da infância, onde os meninos não se enquadravam. O filme dá a entender que houve uma educação meio frouxa das mães e de que a escola foi negligente com os meninos, no sentido de que apenas praticavam punições com qualquer indiferença com relação aos alunos. E, se dessem um problema mais sério, recomendavam às mães coisas desde medicações até a expulsão sumária. E as mães sempre discordavam da fala da escola, deixando os meninos meio largados.
Sei não, mas essa pareceu mais uma versão dos protagonistas, pois a coisa pareceu plana e simplória demais, tanto da parte das mães como da parte da escola. Como vimos a trajetória dos alunos em mais de uma escola, fica um pouco difícil avaliar que o comportamento das duas tenha sido tão uniforme assim. De qualquer maneira, é interessante ver em que ambiente os meninos se formavam, onde o militarismo e a paixão às armas era algo considerado supernormal, e o coleguinha podia manusear rifles, fuzis e pistolas livremente na casa do amigo. Do jeito que isso foi mostrado, pareceu que evocou um tom de crítica a essa visão bélica daquela sociedade americana. Mas, ainda assim, o filme levou essa história num tom muito normal, até porque depois tal belicismo infanto-juvenil não foi mais recordado, mesmo que a carreira militar tenha sido mais enfocada. Nosso senso comum diz que tal cultura bélica americana é um celeiro de psicopatas que dizimam pessoas em shoppings, supermercados, escolas e universidades. Mas depois da infância, todos levaram uma vida normal, sem qualquer paranoia adicional. Ou seja, brinca-se com armas o tempo todo nos Estados Unidos, mas psicopatas somente são uma exceção. Dá para acreditar nisso? Difícil de dizer.
Pelo menos, essa foi uma história de redenção de um de nossos protagonistas. Spencer Stone, o personagem no qual o filme foi focado, era tido como o garoto problema por excelência e tomou um tremendo puxão de orelha da mãe numa de suas estripulias. Arrependido, o menino reza à beira da cama a Oração a São Francisco (como todo bom cristão católico) implorando a Deus para ser um instrumento da paz divina. E. alguns anos depois, o menino teve a sua chance. O mais engraçado é que tal oração ficou famosa aqui no Brasil como exemplo de clientelismo e corrupção há alguns anos (sobretudo a parte do “… é dando que se recebe…”).
No mais, o filme teve uma pegada pouco estimulante, talvez pelo fato da história ser focada mesmo no episódio do trem. O problema é que a gente compara esse filme com outras películas dirigidas por Eastwood, que muitas vezes se inspiraram em histórias reais muito fantásticas ou que tiveram roteiros muito bem escritos. E aí a gente acha esse filme um pouco menos interessante e até enfadonho em alguns momentos.
De qualquer forma, sempre vale a pena ver o trabalho desse diretor que se revelou um diretor de mão cheia com os anos, fazendo algo um pouco mais convencional e menos espetacular. Vá, mas não espere o padrão dos filmes anteriores.