A lendária diretora alemã Margarethe von Trotta está de volta e trazendo Barbara Sukowa a tiracolo. Caramba! Tive o privilégio de ver dois filmes com Sukowa em menos de uma semana no ano passado (o outro filme foi “Stefan Zweig, Adeus Europa”)! Dado também que a lendária atriz alemã (ela era uma das estrelas de Rainer Werner Fassbinder) não aparece muito pelas telas daqui, esse evento de vê-la duas vezes em menos de uma semana é motivo para comemoração, assim como ver um filme escrito e dirigido por Trotta. Mas, será que desta vez a história correspondeu?
Bom, vemos aqui a trajetória de Sophie (interpretada por Katja Riemann), uma cantora de bar que não é muito bem sucedida. Para complementar a sua renda, a mulher também organiza festas de casamento. Um belo dia, seu pai Paul (intepretado por Matthias Habich) a chama à sua casa. Ele mostra uma notícia de um jornal americano sobre uma famosa cantora, que é a cara da mãe de Sophie e se chama Caterina Fabiani (interpretada por Sukowa). Obcecado por tal cantora, já que sua esposa havia falecido um ano antes, Paul manda a filha ir para os Estados Unidos à procura de Caterina para buscar entender o que está acontecendo, pois a cantora se parecia muito com a esposa de Paul. Esse vai ser somente o começo de uma série de situações inusitadas e revelações perturbadoras que vão permear toda a película.
Cá para nós, esse filme tem um enredo que muito se assemelha aos das novelas mexicanas que são exibidas à tarde no SBT. Só que, em vez do laquê e dos olhares perdidos no infinito, vemos aqui atores alemães, muitas vezes nas suas interpretações quadradonas e nada sutis para os nossos padrões culturais.
O maior ícone disso foi justamente Sukowa, pois a partir do momento em que sua personagem Caterina foi perseguida por Sophie, ela se tornou extremamente rude por não querer que estranhos interferisem em sua vida pessoal. E tome coices do naipe de um rinoceronte entrando à toda numa loja de cristais. Já Katja Riemann, a atriz que interpreta Sophie, a protagonista, fez uma atuação muito mais suave e cativante, algo que surpreendeu bastante. A personagem também agiu de forma muito centrada à cada revelação que a história trazia, o que foi outro trunfo para o filme. Aliás, essa característica “mexicana” do filme foi interessante: nós, espectadores, não sabíamos mais da história em si do que a protagonista e íamos descobrindo junto com ela todas as mutretas e picaretagens dos demais personagens lá num passado distante e, também, no presente. Esse artifício ajudou a prender a nossa atenção na trama, principalmente depois que ela ficou com uma certa cara de dramalhão.
Assim, “O Mundo Fora do Lugar” tem uma história que justifica bem o título, pois suas revelações inusitadas à la novela mexicana dão o tom da coisa. Se num primeiro momento a gente torce o nariz para o dramalhão, num segundo momento a gente se concentra nas atuações dos atores que, apesar de ser um filme alemão e a gente esperar uma padronização nas atuações pela forte diferença cultural entre nós e eles, são bastante diferentes. Se Sukowa é muito mais rígida e teutônica, Riemann foi muito mais amável e suave, nos cativando muito. E o fato de que não sabíamos mais do que a protagonista sobre a história e compartilhávamos simultaneamente com ela todas as inusitadas revelações fez com que tivéssemos um relacionamento muito mais intimista com a personagem. Por esses motivos, vale a pena dar uma conferida nesse filme. E cultuar Sukowa, obviamente.