Uma co-produção França/Marrocos/Bélgica passou em nossas telonas. “Primavera em Casablanca” (“Razzia”), dirigido por Nabil Ayouch, é mais um daqueles filmes que abordam a questão do Oriente Médio e da intolerância. O terreno de atuação da película será a cidade de Casablanca, no Marrocos, onde veremos cinco histórias cujos personagens se encontram ao longo da narrativa. Vamos ver aqui o professor de ciências que não pode dar aula no idioma de seu povoado e sim em árabe, além de ficar sujeito às regras educacionais do Estado Teocrático, a mulher escultural que engravida e aborta o feto, pois tem um marido possessivo, o dono de restaurante judeu que é obrigado a conviver com os árabes, o rapaz que quer ser cantor e tem Freddie Mercury como ídolo e a menina de classe média alta que nutre um amor homossexual.
Todas essas pessoas terão que conviver numa sociedade muçulmana que parece implodir com a crise econômica, em meio a muitas manifestações de estudantes que não conseguem se encaixar no mercado de trabalho. Ou seja, como se não bastasse a turbulência pela qual passam, esses protagonistas também vão ter que encarar a turbulência do próprio país, embora elas não pareçam ligar muito para isso, já que seus problemas pessoais são bem mais imperativos.
As histórias não são contadas de forma estanque e elas acabam se mesclando no tempo e no espaço. A história do professor, por exemplo, se passa em 1982, e a da mulher que aborta, assim como as demais se passa em 2015. A narrativa acaba por intercalar essas histórias, se bem que a da mocinha de classe média aparece mais na segunda metade do filme, enquanto que as demais se intercalam ao longo de toda a película.
É curioso perceber que, mesmo com histórias tão diferenciadas, o ritmo do filme consegue ser um tanto lento, pois se parece que, com esse ritmo, o diretor busca mergulhar toda a narrativa numa vibe mais reflexiva, onde se faz a crítica do conservadorismo do Estado Teocrático de forma bem presente. Esse também é um filme onde devemos prestar bastante atenção nos nomes dos personagens, pois um personagem mais secundário de uma história pode aparecer em outra num papel de um pouco mais de destaque.
O filme deixa outra mensagem: a de que a intolerância e a violência podem contaminar até as mentes mais livres e tolerantes. Isso fica muito marcante mais ao final do filme, mas os spoilers me impedem de entrar em mais detalhes.
Assim, “Primavera em Casablanca” é mais uma película que lida com a questão da intolerância e convida o leitor a uma boa reflexão. As cinco histórias, por seu caráter altamente diferenciado, dão exemplos bem desafiadores a um Estado Teocrático mais tradicional, o que torna o filme em si muito interessante e iconoclasta por natureza. Vale a pena assistir a essa película que também tem um certo quê poético, seja nas músicas do Queen, seja nas referências ao filme “Casablanca”.