Uma bela produção Áustria/Luxemburgo de 2016 passou somente de forma recente. “Egon Schiele, A Morte e a Donzela” pode ser encarado como uma cinebiografia do famoso pintor, que teve uma vida muito breve, diga-se de passagem. O filme fez um recorte falando dos oito últimos anos de vida do artista, onde parte deles se passaram durante a Primeira Guerra Mundial. Um filme que mostra o espírito livre e transgressor de Schiele, considerado por muitos um pedófilo e um depravado. Para podermos analisar o filme, vamos precisar lançar mão de alguns spoilers.
A película começa com um Schiele (interpretado por Noah Saavedra) já doente em 1918, vítima da gripe espanhola. O filme, então, faz um flashback e nos joga para 1910, onde o artista faz seus esboços de mulheres nuas em seu ateliê, usando como primeiro modelo sua irmã Gerti (interpretada por Maresi Riegner), que é menor de idade. O artista segue sua rotina de pintar mulheres nuas e vai colecionando modelos ao longo de sua curta vida, tendo vários relacionamentos um tanto efêmeros e metendo os pés pelas mãos quando lida com as mulheres. Ele ainda recebeu uma acusação de sequestro de menores e de mostrar pornografia para menores de idade, o que quase o levou à prisão por vários anos. Sem dinheiro a maior parte da vida, precisava vender seus quadros e esboços para sobreviver.
O filme consegue dar um bom apanhado dos últimos anos do pintor e não pensa duas vezes em apontar incoerências de Schiele. Se ele se dizia um artista que devia ter liberdade para divulgar sua arte e ter um estilo de vida que era baseado num amor livre, por outro lado, ele teve uma postura deveras conservadora com sua irmã, pois como tutor da menina ele não permitiu que ela casasse sendo menor de idade e mesmo grávida. Ainda, ele não tinha uma postura considerada correta com as mulheres que o cercavam, destruindo corações e forjando casamentos em função de seus interesses pessoais. Ou seja, o filme reconhece o talento do pintor enquanto artista, mas também lembra que ele é uma figura humana que tem seus defeitos como todo mundo. Aliás, esses defeitos são responsáveis pelo título do quadro (“A Morte e a Donzela”) que está também no título do filme. Mas não darei o spoiler disso.
Pelo fato de Schiele pintar mulheres nuas, esse é um filme onde podemos ver muitas cenas de nudez, mas pouca ou quase nenhuma cena de sexo, ficando a impressão do interesse puramente artístico em cima da nudez, embora o artista se relacionasse com algumas de suas modelos.
Noah Saavedra interpretou de forma bem satisfatória o artista, exibindo todas as suas contradições. Mas devo confessar que gostei mais de Maresi Reigner. A atriz esteve muito bem como a irmã do pintor, mostrando traços bem infantis ao início da película, mas mudando a sua atuação para mostrar o amadurecimento de sua personagem com o passar do tempo. Tal mudança, por exemplo, não é vista em Schiele, cujo tempo parece não passar.
Assim, “Egon Schiele, a Morte e a Donzela” é uma boa cinebiografia sobre um artista consagrado, cujas obras de arte hoje valem milhões de dólares. Mesmo sendo um gênio na sua área, o filme teve a coragem de expor seus defeitos. Um filme sobre um artista que esteve à frente de seu tempo.