Um grande e instigante filme. “O Primeiro Homem”, dirigido por Damien Chazelle (o mesmo de “Whiplash” e “La La Land”), e com produção executiva de, ninguém mais, ninguém menos que Steven Spielberg, fala sobre a saga da exploração espacial americana tomando como foco a trajetória de Neil Armstrong, o primeiro homem a pisar na Lua em 20 de julho de 1969. Para o papel de Armstrong, Ryan Gosling foi escalado. Confesso que sempre gostei desse ator, embora ele já tenha ficado estigmatizado como tendo o talento de uma porta para atuar. Sua carreira decolava quando ele resolveu dirigir um filme e o projeto foi um fracasso total. Veio a redenção com “La La Land” e, então o vemos novamente protagonizando um bom projeto. E aí, Gosling interpreta Armstrong, uma figura que parece transpirar muita serenidade e tranquilidade (se me permitirem o trocadilho infame). Mas, apesar de Gosling ter sido demasiadamente sereno e tranquilo novamente, tivemos um momento em que houve uma explosão de choro onde a coisa foi muito sincera (não vou entrar no porquê do choro de Armstrong para evitar um spoiler que deixa a história interessante e ajuda na construção dramática do personagem).
Em relação à película em si, o recorte temporal escolhido está no Programa Espacial Americano realizado durante toda a década de 60, quando os Estados Unidos perdiam de lavada para a União Soviética na Corrida Espacial. Nesse contexto, a chegada de uma viagem tripulada à Lua era praticamente uma obrigação, ainda mais depois do antológico discurso de Kennedy que estabelecia essa viagem como uma meta futura. Assim, o filme nos permite testemunhar, além de detalhes pessoais da vida de Armstrong, como foi todo o processo de preparação da viagem espacial à Lua, onde cada missão buscava avançar em mais uma etapa da futura missão Apolo 11, que era a culminância de todo o processo. O filme, também, aborda a situação de angústia e perda das esposas dos astronautas (muitos astronautas morreram no Programa Espacial Americano), manifestas, sobretudo, na personagem Janet (interpretada por Claire Foy), a esposa de Armstrong, que realmente foi a melhor atuação de todo o filme. Essa é uma película que também mostrou todo um questionamento feito ao Programa Espacial Americano na época, com muito desperdício de dinheiro e de vidas, quando problemas sociais mais graves aguardavam por soluções. Tudo isso implicava numa pressão extra para os astronautas, que já tinham, aliás, que passar por situações muito perigosas e escabrosas. E aqui reside o grande trunfo do filme.
Ele permite ao espectador vivenciar in loco toda a sensação de desconforto que um astronauta passa quando é arremessado ao espaço espremido numa cápsula espacial. Definitivamente, esse não é um filme para claustrofóbicos. Essa película nos dá a exata sensação de que uma viagem ao espaço nada tem de romântica ou glamorosa, pelo contrário, é extremamente perigosa. Sentimos isso quando escutamos o barulho de ferro rangendo dentro da cápsula espacial em pleno lançamento, onde mais parece que estamos numa lata velha de um ônibus antigo do que num foguete.
Aqui, cai como uma luva as palavras de Janet aos varões do controle da missão, quando o seu marido passava por um sufoco no espaço. Quando eles disseram que estava tudo sob controle, ela retrucou: “Não há nada sob controle! Vocês são um bando de meninos brincando com modelos de madeira! Não têm nada sob controle!”. Frases mais precisas, impossível. Mas a experiência de colocar o espectador ao lado do astronauta é altamente compensadora no momento do pouso lunar e das caminhadas em nosso satélite, com momentos de grande beleza nas imagens.
Não se pode deixar de dizer, para concluir, que o filme também teve uma preocupação em reconstruir de forma muito fidedigna, imagens de filmagens originais da missão, seja no pouso na Lua, seja em testes que Armstrong fez na Terra de pouso do módulo lunar, onde inclusive houve um fracasso, com o módulo se espatifando no chão enquanto o astronauta descia de paraquedas depois de ejetar.
Assim, “O Primeiro Homem” é um programa obrigatório por tratar da trajetória de Armstrong, por falar das etapas do Programa Espacial Americano, por testemunhar a difícil vida das esposas dos astronautas, e, principalmente, por dar ao espectador a noção de quão perigosa podia ser uma viagem ao espaço nos primórdios da Corrida Espacial. Não deixe de ver.