Um filme extremamente perturbador. “Utoya, 22 de Julho” tenta reproduzir o horror dos ataques terroristas de 22 de julho de 2011 na Noruega, quando houve um atentado a bomba à sede do governo norueguês e um acampamento de férias de adolescentes na Ilha de Utoya foi alvejado por uma série de tiros por 72 minutos, provocando muitas mortes, ferimentos graves e sérios traumas psicológicos. Os ataques foram empreendidos por um grupo de ultradireita com conotações religiosas. E o autor dos atentados nunca se arrependeu de ter matado as pessoas que alvejou. Esse evento chocou o mundo, pois aconteceu num país que sempre teve a fama de ser muito correto e justo em virtude da política do “Welfare State”.
Como é o plot do filme? Inicialmente, vemos cenas reais de circuito de tv da explosão na sede do governo. Posteriormente, o filme foca no acampamento de Utoya em si e em torno da personagem fictícia Kaja (interpretada por Andrea Berntzen). No momento em que começam os tiros, Kaja se esconde numa casa com outros jovens e perde contato com sua irmã, que estava na barraca das duas. A partir daí, o filme é uma longa e angustiante jornada pelas barracas, pela floresta e pela beira do mar, onde sempre fica a questão: o que é mais seguro? Se esconder na floresta? Correr para o mar e fugir nadando? Ficar escondido nas escarpas à beira mar? Em qualquer dessas alternativas, o atirador pode te achar e te matar. Qual é a menos arriscada?
O filme é montado como se fosse um único plano-sequência (muito provalmente emendado aqui e ali), onde a câmara atua como uma personagem que sempre está próxima de Kaja. Como a moça se aproxima e se afasta dos grupos, estando sozinha em alguns momentos, em virtude de sua busca pela sua irmã, é como se estivéssemos junto da personagem o tempo todo, o que cria uma espécie de empatia (talvez até cumplicidade) com a personagem. Não vemos o atirador (exceto em esporádicos e rápidos vultos), apenas escutando os tiros (que ficam mais altos e mais baixos, indício de que o atirador pode estar mais perto ou mais longe) e pessoas correndo pela floresta, que é o terreno onde a película passa sua maior parte. Essa opção da câmara em plano-sequência como personagem é profundamente angustiante e deixa o espectador totalmente inserido na história.
O filme também cumpre a função social de denúncia do cinema, alertando para os perigos dos movimentos de extrema-direita e seu crescimento no mundo atual, constituindo-se numa verdadeira ameaça. Dessa forma, o filme usa a tragédia de Utoya como uma espécie de prelúdio para um futuro altamente apocalíptico. Depois não digam que não foram avisados.
Assim, “Utoya, 22 de Julho” é um filme essencial, que denuncia o perigo do radicalismo dos grupos extremistas, fazendo isso de uma forma muito perturbadora, pesada e angustiante. Um filme que deve ser mais e mais exibido por aí, não ficando apenas restrito a um único horário numa única e pequena sala. Imperdível. Para ver, ter e guardar.