E temos “Creed II”. A tão esperada continuação da saga do filho de Apolo, o Doutrinador, treinado por Rocky Balboa, busca dar sequência, cerca de trinta anos depois, aos eventos de “Rocky IV”, quando Ivan Drago matou Apolo e Rocky o venceu na então União Soviética. Agora, Ivan Drago busca a revanche com Creed tendo como instrumento seu filho, Viktor Drago (interpretado por Florian Munteanu).
Os dois filmes “Creed” podem ser entendidos como uma sequência séria e respeitosa de “Rocky”. Mesmo que “Rocky” tenha sido um grande sucesso de bilheteria, é impossível não perceber que havia um tom de galhofa e exagero mais em alguns filmes e menos em outros. O próprio “Rocky IV” às vezes tinha um tom de vergonha alheia. Nos dois “Creed” não vemos nada disso e os filmes funcionam muito bem, o que acaba sendo um deleite para os olhos.
Como é o plot? Preparem-se que vai haver spoilers. O filme começa com Ivan Drago e seu filho Viktor indo para uma luta onde saem vencedores. Enquanto isso, Creed consegue conquistar o título de campeão mundial dos pesados. Mas, com a ajuda de um empresário americano, a família Drago desafia Creed. Mesmo sob os insistentes pedidos de Rocky para não aceitar o que considera uma provocação, Creed aceita o desafio sem a ajuda de Balboa. É claro que ele vai entrar na porrada, mas não perde o título, pois Drago é desclassificado porque atingiu Creed enquanto ele estava no chão. Depois de ruminar muita raiva na sua recuperação, Creed esquece um pouco do boxe, pois sua filha nasce. Mas Viktor Drago seguidamente o desafia e Creed pode perder o título caso protele demais a defesa do mesmo. Aí, vai ter uma segunda luta, agora na Rússia e com Rocky treinando o pugilista.
Por que “Creed II” foi tão bom? Em primeiro lugar, e até mais do que a questão das cenas de lutas de boxe, esse é um filme de núcleos familiares muito bem explorados. Temos a questão de Rocky, que não conhece o neto pois não fala com o filho, temos a família de Creed, que vive sob a sombra das ameaças de feridas do passado abertas, onde Creed se vê na obrigação de lutar por ter tido seu pai assassinado no ringue, mas que depois descobre que ele precisa lutar não por seu pai, mas por si mesmo, e temos a questão da família Drago (a melhor a meu ver) onde o pai exigia demais do filho por ter sido abandonado por tudo e por todos depois da derrota com Rocky, só que (alerta de spoiler) ele reconhece na última hora que, ao tentar recuperar a honra da família, ele dava atenção demais a pessoas que só queriam se aproveitar da fama de pai e filho ao invés de se preocupar com o próprio filho (dentre essas pessoas está a própria personagem interpretada por Brigitte Nielsen, que era a esposa de Ivan em “Rocky IV” e que o abandonou depois da derrota). Ou seja, há uma grande preocupação com a construção dos personagens nesse filme, ao contrário do que víamos, por exemplo, no núcleo soviético de “Rocky IV” em Ivan Drago, por exemplo, que mais parecia um robô do que qualquer outra coisa. Mais do que o Boxe em si, “Creed II” é uma boa história de personagens muito bem pensados.
Obviamente, o Boxe é a outra vedete. E aí, “Creed II” também acerta, sobretudo nas referências a “Rocky IV”. Tivemos a derrota nos Estados Unidos e a revanche na Rússia, a música antológica dos filmes antigos na luta final, passando pelo treinamento de Creed num ambiente e condições totalmente rústicas (no meio de um deserto bem quente), lembrando muito o treinamento de Rocky no interior da Rússia em “Rocky IV”, também em condições adversas, só que no meio da neve. As cenas das lutas de Boxe, apesar de um pouco exageradas, eram mais realistas do que víamos no “Rocky” original e havia algumas referências, como os socos na cara que Creed e Apolo, o Doutrinador, recebiam com a câmara em slow motion. Mas as esquivas de Creed eram bem mais palatáveis do que as que víamos em “Rocky III”, por exemplo. E a esposa de Creed cantando na entrada do marido na luta na Rússia era uma alusão direta a James Brown em “Rocky IV”. Tudo isso tornava o filme saboroso, pois nos ligava de forma positiva ao “Rocky IV” do passado.
Assim, “Creed II” é um grande prêmio para os fãs de “Rocky”, pois faz muitas referências a “Rocky IV” e respeita demais os filmes antigos, mais até do que eles mesmos. Ainda, e principalmente, é um filme sobre personagens muito bem construídos e núcleos familiares que resolvem suas diferenças ao longo do tempo, não sendo uma película totalmente maniqueísta na questão de “mocinhos e bandidos”. A gente também torce para que a família Drago supere suas frustrações, mesmo tomados por tanto ódio. Quando o filme atinge esse tipo de sentimento, temos uma história nobre que atinge nossos corações e mentes de uma forma avassaladora. Filme obrigatório para ver, ter e guardar.