Mais uma curiosa história real retratada no cinema. “A Espiã Vermelha” nos lança uma questão perturbadora. A película insinua (alerta de spoiler) que a Guerra Fria que manteve União Soviética e Estados Unidos num campo de igualdade no contexto nuclear durante décadas foi forjada por uma cientista inglesa que compartilhou com a União Soviética informações nucleares para gerar o equilíbrio entre as potências e frear a guerra.
Vemos aqui a trajetória de Joan Stanley (interpretada por Judi Dench na velhice e por Sophie Cookson na juventude), uma senhora que recebe a visita da polícia que a intima a um interrogatório por ser acusada de traição contra a Inglaterra. Durante o interrogatório, temos um flash-back que explica o que aconteceu. Joan era estudante universitária de Física na juventude, se envolvendo com estudantes de esquerda que depois se revelam espiões da União Soviética no Ocidente.
Ao mesmo tempo, Joan passa, sem perceber, a fazer parte do Programa Nuclear da Inglaterra, que busca a construção da bomba atômica. Leo (interpretado por Tom Hughes), um dos amigos comunistas de Joan, e que se envolveu com ela amorosamente, tenta convencê-la de compartilhar os segredos nucleares dos ingleses com os russos, mas Joan rechaça tal atitude com muita veemência, pois ela tem plena consciência de que participa de um projeto altamente confidencial.
Entretanto, Joan irá mudar de ideia quando os Estados Unidos conseguem explodir a sua primeira bomba e, mais tarde, destroem as cidades de Hiroshima e Nagazaqui. A partir daí, ela compartilha os segredos nucleares com os espiões russos, pois acredita num equilíbrio entre as futuras superpotências como um expediente para evitar mais uma guerra.
Essa é uma história surpreendente, ainda mais porque a gente tem uma espécie de “mãe” da Guerra Fria aqui. Vista como uma traidora por seu país, Joan se via como uma espécie de salvadora da própria humanidade ao buscar uma forma de evitar mais guerras, ainda mais numa época em que guerras mundiais em sequência massacraram demais gerações inteiras. Assim, o filme tem a coragem de relativizar o papel de uma personagem real acusada de traição.
Quando temos uma atriz do naipe de Judi Dench, a gente sempre espera que ela tenha o maior tempo de tela possível. Infelizmente, isso não ocorre aqui. Já que temos uma história em flash-back, Sophie Cookson teve uma presença maior e não foi mal, com uma atuação bem convincente. Dench, como não podia deixar de ser, rouba a cena nos momentos em que aparece. Mas tivemos também uma boa atuação de Stephen Campbell Moore, no papel do cientista Max Davis, chefe de Joan no Projeto Nuclear, mas também seu amante muito apaixonado, que passou por momentos de altos e baixos emotivos, além de fazer no início um austero chefe.
Assim, “A Espiã Vermelha” é um filme que merece muito a atenção do público, pois chama a atenção para o importante fato histórico de que Joan Stanley, uma ilustre desconhecida, teve um papel marcante na gênese da Guerra Fria. Ainda, é uma história bem instigante com boas atuações de Judi Dench, Sophie Cookson e Stephen Campbell Moore. Vale a pena dar uma conferida.