Um curioso filme brasileiro. “Greta”, de Armando Praça, é um filme de várias vidas paralelas que acabam, num momento ou noutro, se cruzando. Explorando um mundo um tanto “underground”, o filme pode chocar mentes mais sensíveis e conservadoras. Mas não tem pudores em expressar detalhes concretos da vida, sem diminuir nem aumentar as coisas. Para entendermos melhor o filme, faremos uso de spoilers.
O plot gira em torno de Pedro (interpretado por Marco Nanini), um enfermeiro de um hospital público de Fortaleza. Ele tem uma amiga, Daniela (interpretada por Denise Weinberg), uma artista trans de uma boate gay que tem sérios problemas renais e vai se internar no hospital onde Pedro trabalha. Mas há falta de vagas no hospital e Daniela não quer ficar em outro hospital longe do amigo. Ao mesmo tempo, chegam dois feridos ao hospital depois de uma briga. Um dos homens morre, tendo sido morto pelo outro, que se chama Jean (interpretado por Démick Lopes). Com medo de ser morto, Jean pede a Pedro para ser retirado do hospital. Pedro abriga Jean em sua casa, até para surgir uma vaga para Daniela. Logo, Pedro e Jean vão se envolver afetivamente, mas Pedro está sendo investigado pela suspeita de ter acobertado a fuga de Jean, ao mesmo tempo que precisa lidar com o problema de Daniela, que foi diagnosticada como paciente terminal.
A história desse filme é um livre adaptação da peça “Greta Garbo, Quem Diria, Acabou no Irajá”, de Fernando Mello, pois o personagem de Pedro pedia a Jean para que o chamasse de Greta Garbo nas noites de amor dos dois. Temos aqui uma história que aborda o Universo homossexual de uma forma muito aberta e sem hipocrisias, com várias cenas de sexo, sendo esse um filme que desafia abertamente o comportamento conservador de nossa sociedade. Palmas para Marco Nanini e seu personagem Pedro, em quem o filme orbita. Apesar das boas atuações de Denise Weinberg (muito carismática e impressionante) e Démick Lopes (que, apesar de interpretar um assassino que despertava a suspeita de explodir em violência à qualquer momento, deu uma atuação ponderada, delicada e contida para Jean), o filme, obviamente, é de Nanini, que fez um homem que recebia pressões de todos os lados, seja da amiga Daniela, seja da direção do hospital, que sabia de seu envolvimento no desaparecimento de Jean, seja no próprio Jean, que vivia dentro de sua casa e constantemente lhe pedia ajuda. Esse é um filme também de várias vidas, seja em Pedro, um austero enfermeiro que convive com a situação imposta por suas preferências sexuais, seja no relacionamento de Pedro com Daniela, uma amizade consolidada de longa data, seja no relacionamento de Pedro com Jean, que traz ao enfermeiro a novidade de uma nova aventura sexual e traz a Jean a única amizade sincera que teve.
Esse é um filme que caminhava para um desfecho melancólico, até porque a relação de Pedro e Jean tem um ponto de ruptura que parecia impossível de reatar. Mas optou-se por uma espécie de direção ao happy end, onde fica todo o indício de que Pedro e Jean voltarão, com um relacionamento repaginado.
Assim, “Greta” é um filme que se pauta, sobretudo, na boa atuação dos atores, sendo que a grande e inquestionável cereja do bolo é Marco Nanini que, volta e meia, nos brinda com seu talento fora do ambiente televisivo, lançando mão do teatro e do cinema, onde sempre parece que ele tem mais espaço para abusar de sua competência. Típico filme que a gente vai ver pelo ator. Vale a pena dar uma conferida.