Batata Movies – A Mulher Na Lua. Uma Ficção Científica Séria.

Woman in the Moon - Wikipedia
Cartaz do Filme

Dentre as nossas análises de filmes de Fritz Lang em sua fase alemã, vamos falar de “A Mulher Na Lua” (“Frau Im Mond”, 1929). Esse é um filmaço de Fritz Lang. Além da sua longa duração (cerca de duas horas e quarenta e nove minutos), “A Mulher Na Lua” é uma ficção científica surpreendente, pois foi um filme que buscou fazer uma ficção científica o mais coerente possível, mas também com alguns devaneios. Para se ter uma ideia, o filme teve consultoria científica e tocou, em paralelo, o desenvolvimento de um projeto onde um foguete de verdade (não tripulado, obviamente, e de dimensões bem mais reduzidas que os de hoje) seria lançado no dia de lançamento do filme. O filme teve como consultor científico o pioneiro da astronáutica Hermann Oberth, que tinha como ajudante um jovem de nome Werhner Von Braun, que mais tarde seria responsável pelo Saturno V, o foguete que realmente levaria o ser humano à Lua. Infelizmente, o foguete não foi lançado no dia da estreia do filme, mas “A Mulher Na Lua” estimularia muito a pesquisa e desenvolvimento de foguetes. Para podermos falar desse filme, vamos liberar os spoilers de noventa e um anos.

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Um casal com um amor reprimido…

O plot é o seguinte. O cientista Wolf Helius (interpretado por Willy Fritsch) visita seu antigo professor, Georg Manfeldt (interpretado por Klaus Pohl), que vivia num humilde apartamento e na miséria depois de ter sido ridicularizado pela comunidade científica por defender que havia ouro na Lua e que uma viagem até nosso satélite natural seria possível. Ele desenvolveu toda uma teoria a respeito, que agora estava sendo cobiçada por uma grande instituição financeira. Essa teoria ficaria sob a guarda de Helius, que a colocaria em seu cofre em casa. Mas essa instituição financeira conseguiu roubar a teoria escrita pelo cientista e obrigou Helius a fazer a viagem conjuntamente com um de seus representantes, o sinistro Walter Turner (interpretado por Fritz Rasp). Também tomariam parte na viagem o professor Manfeldt e o casal de cientistas amigo de Helius, Hans Windegger (interpretado por Gustav von Wangenheim) e Friede Velten (interpretada por Gerda Maurus). Completa a tripulação o garoto “clandestino” Gustav (interpretado por Gustl Gstettsenbaur). Depois de uma grande cerimônia para o lançamento, o foguete parte para a Lua, soltando seus estágios e tudo, viajando por trinta e seis horas até pousar em nosso satélite artificial. Uma vez chegado lá, o professor Manfeldt sai do foguete primeiro, pisando na superfície lunar com um escafandro, mas descobre que há atmosfera no satélite. Ele anda até uma caverna e encontra ouro, mas cai num buraco e morre. Turner o segue e consegue encontrar outro pedaço de ouro, tentando voltar para a Terra sozinho no foguete, deixando os demais tripulantes na superfície. Mas seus planos são descobertos e, depois de uma luta corporal e uma troca de tiros. Turner morre. Entretanto, um dos tiros atingiu os cilindros de oxigênio do foguete, o que significava que um dos tripulantes teria que ficar na Lua. Helius e Windegger (que estava meio surtado da vida) tiraram a sorte no palitinho e Helius venceu. Gustav armou um acampamento para Windegger ficar. Mas Helius decidiu ficar no lugar do amigo e deu-lhe uma bebida com tranqüilizante para ele dormir. Helius deu as instruções para Gustav pilotar o foguete e desceu para a superfície da Lua. Depois que o foguete partiu para a Terra, Helius foi para o acampamento e encontrou Friede que, apesar de noiva de Windegger, sempre esteve apaixonada por Helius. Fim do filme.

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Um filme que inspira o futuro…

O que podemos dizer de “A Mulher Na Lua”? Em primeiro lugar, a ficção científica impressiona, e muito. As cenas da Lua (que precisaram de quarenta caminhões de areia das praias do Mar Báltico para simularem o deserto lunar) lembram muito as imagens reais da superfície da Lua, à despeito da atmosfera, do ouro e das poças ferventes que vemos no filme. Mas muito mais impressionante e realístico foi o lançamento do foguete na Terra. O deslocamento do foguete do hangar para a plataforma de lançamento lembra demais os lançamentos reais, à despeito do foguete ser colocado numa piscina para aguentar o seu peso com o deslocamento da água. Chamou muito a atenção a contagem regressiva, a separação dos estágios durante o lançamento do foguete e os nossos astronautas tendo que suportar a pressão da força G e a necessidade do foguete atingir a velocidade de escape da gravidade da Terra, que realmente é de onze quilômetros por segundo. A situação de gravidade zero durante o voo também é lembrada, onde os personagens tinham que encaixar os pés em alças durante o voo. Gustav chega a “flutuar” num momento do filme. Nessas horas, a gente se pergunta: até onde “A Mulher Na Lua” influenciou nos lançamentos reais de foguetes? Devemos nos lembrar que esse é um filme de 1929, feito décadas antes dos lançamentos reais de foguetes, e vimos a contagem regressiva nele. Vendo esse filme, me lembro demais da discussão de como Jornada nas Estrelas influenciou o futuro antecipando, por exemplo, o uso de celulares e tablets. Parece que todo o cerimonial, estética e antevisão de um lançamento de foguete em estágios, sujeição do corpo humano à aceleração e à ausência de gravidade foram exibidos nesse filme, com os cientistas de décadas posteriores influenciados pelo que vimos na película de Lang lá do final dos anos vinte.

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Uma paisagem lunar muito realista…

E a “Mulher Na Lua” em si? Apesar dela estar no título do filme, a sua posição na missão é altamente periférica. Parece que o empoderamento feminino aqui só chegava ao máximo a isso. O simples ato de Friede já estar numa missão perigosíssima, como o próprio Helius dizia (como ele era apaixonado por Friede, não queria de jeito nenhum que a mesma se submetesse a uma missão tão perigosa) parecia ser suficiente para um ato feminino pioneiro e de vanguarda. Um empoderamento feminino que se manifestava no vestuário. Se no início do filme, a moça, em seu noivado, vestia um delicado vestido branco, na missão, sua vestimenta era deveras masculinizada, com direito a uma gravata e a uma calça bem larga, que escondia suas formas femininas. Seria como se a moça, ao tomar para si uma tarefa atribuída aos varões, precisasse se vestir como tal. Pelo menos, ela filmou a superfície da Lua em toda a sua riqueza de detalhes (impossível não se lembrar de Leni Riefensthal), já que Friede era uma renomada cientista.

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A mulher que filma a Lua…

Dessa forma, se “A Mulher Na Lua” mostrou um empoderamento feminino com as limitações culturais da época, por outro lado, vimos uma ficção cientifica que, apesar dos devaneios como a presença de atmosfera na Lua, teve uma consultoria científica que alguns diriam que anteviu o futuro, e outros diriam que deu as bases para a construção do próprio futuro. Ver uma contagem regressiva de um lançamento de um foguete décadas antes do primeiro foguete ser realmente lançado é algo, no mínimo, perturbador. E veja o filme na íntegra abaixo, legendado em português.

https://www.youtube.com/watch?v=lZiU9Gc-kWk