Batata Movies – Metrópolis. Um Futuro Que Espelha O Presente.

Metropolis (1927 film) - Wikipedia
Cartaz do Filme…

Dentre as nossas análises de filmes da fase alemã de Fritz Lang, falemos hoje de “Metrópolis” (“Metropolis”, 1927), talvez o mais famoso filmes de Fritz Lang. Essa foi uma grande superprodução da UFA que, infelizmente, não teve o retorno esperado. O filme foi muito mutilado para a sua exibição nos Estados Unidos, em virtude de sua longa duração e de alguma censura, o que fez com que a versão completa se perdesse para sempre, ficando muito desconexa e de difícil compreensão. Mesmo assim, a grande plasticidade de suas imagens transformou “Metrópolis” numa lenda. Em 2008, foi divulgada ao mundo a descoberta de uma cópia praticamente completa em Buenos Aires e hoje podemos ver “Metrópolis” muito próximo do que foi sua exibição de estreia em Berlim, a 10 de janeiro de 1927. Para podermos falar desse filme, vamos liberar os spoilers de noventa e três anos.

Cinema e Arquitetura: “Metrópolis” | ArchDaily Brasil
Uma grande metrópole futurista…

O plot é o seguinte. No ano de 2026, há uma grande cidade futurista chamada Metrópolis, com uma população de sessenta milhões de habitantes. A enorme cidade é controlada por máquinas que ficam abaixo da terra, onde operários têm uma jornada desumana de trabalho de dez horas diárias. Eles vivem numa cidade operária abaixo das máquinas. Os filhos da elite de Metrópolis se divertem nos jardins eternos, por serem artificiais, e têm uma vida privilegiada, regada à muito prazer. Um deles é Freder (interpretado por Gustsv Fröhlich), filho do grande patrão da cidade, Joh Fredersen (interpretado por Alfred Abel). Um dia, enquanto Freder se diverte com uma das moças à disposição do varão, surge uma linnda moça humilde chamada Maria (interpretada por Brigitte Helm), com muitas crianças maltrapilhas, que são as filhas dos operários. Maria diz às crianças que aquela elite estarrecida são seus irmãos. Freder imediatamente se apaixona pela moça e vai atrás dela, mas descobre a realidade insana das máquinas e da exploração sobre os operários. Ele vai conversar sobre isso com seu pai, que não demonstra a menor compaixão. Com a ajuda de Josaphat (interpretado por Theodore Loos), Freder vai procurar Maria e seus irmãos, enquanto que o pai ordena ao sinistro mordomo (interpretado por Fritz Rasp) que vigie o filho. Há, também, um cientista, Rotwang (interpretado por Rudolf Klein-Rogge) que disputou, no passado, com Joh Fredersen o amor de uma mulher chamada Hel, e ele perdeu. Mas Hel morreu ao dar à luz Freder. Inconformado, Rotwang cria para ele uma mulher mecânica (também interpretada por Brigitte Helm), mas Fredersen pede que Rptwang dê ao robô a forma de Maria para manipular os operários. Esse plano se mostrará trágico, com conseqüências muito destrutivas.

Metrópolis (1927) - Cultura Projetada
Maria. Mais um vez, a questão dos duplos…

Esse filme, eivado de uma estética expressionista, é considerado por alguns especialistas do cinema alemão como já fora da fase expressionista. Lang se dizia realista ao invés de expressionista. Mas muitos elementos do expressionismo estão lá: o claro/escuro, a interpretação antinatural dos atores, a arquitetura muito ornamentada da grande metrópole, as sombras atuando como personagens, a indignação com a exploração capitalista. Freder é um personagem-chave aqui. Ele surge como o novo homem expressionista que vai ao contato de seus irmãos mais pobres para libertá-los da tirania. Entretanto, Freder será influenciado e guiado pela doce e angelical Maria, que, ao invés de propor uma ruptura entre capital e trabalho, propõe a (impossível) união pacífica entre esses dois pólos. A frase que manifesta essa união no filme é “Entre a mente que planeja e as mãos que constroem, tem que haver um mediador, e esse deve ser o coração”. Assim, Freder, eivado de uma conotação até messiânica, promove essa união entre capital e trabalho com um relutante aperto de mão entre Joh Fredersen e o capataz dos operários. O próprio Fritz Lang dizia que não gostava de “Matrópolis” por seu final “falso”. Muitos outros historiadores e estudiosos do cinema condenavam o filme, às vezes até com adjetivos depreciativos. Freder parece fazer uma jornada no filme. No início, ele busca um novo homem expressionista, com uma nova visão de mundo e ansioso pela justiça social. Mas, ao ser manipulado por Maria, ele chega ao novo homem nazista, onde os operários voltam a ter uma postura passiva frente ao patrão por inteira responsabilidade de seu filho e, muito mais de Maria, que acalmava as massas com a profecia da vinda do mediador. Thea von Harbou, que assina o roteiro, teria simpatia com os nazistas, e estes, sobretudo Goebbels, diriam que é necessário conquistar o coração do povo e mantê-lo. Assim, o filme se constitui de duas camadas: a Expressionista-Social e a da Nova Objetividade passiva e conformista que flerta com o nazismo, estilo artístico surgido posteriormente ao Expressionismo. Se Lang não atingiu sua maturidade política nesse filme, as condições turbulentas da República de Weimar não tardariam em acelerar esse processo de maturação e nosso diretor seria muito mais competente nas entrelinhas em “M, O Vampiro de Dusseldorf”, de 1931.

Metrópolis | O precursor do Sci-Fi completa 90 anos
Lang e alguns dos seus mais de trinta e sete mil figurantes…

Dessa forma, se “Metrópolis” imortalizou Lang pela grandeza da produção, por outro lado, esse é um filme de estética Expressionista que tem uma narrativa que se adéqua mais à Nova Objetividade. Um produto cultural nas fronteiras de duas tendências artísticas. Não deixe de ver o filme na íntegra legendado em português abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=Vnp_TAb52AI

Batata Movies – A Mulher Na Lua. Uma Ficção Científica Séria.

Woman in the Moon - Wikipedia
Cartaz do Filme

Dentre as nossas análises de filmes de Fritz Lang em sua fase alemã, vamos falar de “A Mulher Na Lua” (“Frau Im Mond”, 1929). Esse é um filmaço de Fritz Lang. Além da sua longa duração (cerca de duas horas e quarenta e nove minutos), “A Mulher Na Lua” é uma ficção científica surpreendente, pois foi um filme que buscou fazer uma ficção científica o mais coerente possível, mas também com alguns devaneios. Para se ter uma ideia, o filme teve consultoria científica e tocou, em paralelo, o desenvolvimento de um projeto onde um foguete de verdade (não tripulado, obviamente, e de dimensões bem mais reduzidas que os de hoje) seria lançado no dia de lançamento do filme. O filme teve como consultor científico o pioneiro da astronáutica Hermann Oberth, que tinha como ajudante um jovem de nome Werhner Von Braun, que mais tarde seria responsável pelo Saturno V, o foguete que realmente levaria o ser humano à Lua. Infelizmente, o foguete não foi lançado no dia da estreia do filme, mas “A Mulher Na Lua” estimularia muito a pesquisa e desenvolvimento de foguetes. Para podermos falar desse filme, vamos liberar os spoilers de noventa e um anos.

Blu-ray Review: Frau im Mond | The Least Picture Show
Um casal com um amor reprimido…

O plot é o seguinte. O cientista Wolf Helius (interpretado por Willy Fritsch) visita seu antigo professor, Georg Manfeldt (interpretado por Klaus Pohl), que vivia num humilde apartamento e na miséria depois de ter sido ridicularizado pela comunidade científica por defender que havia ouro na Lua e que uma viagem até nosso satélite natural seria possível. Ele desenvolveu toda uma teoria a respeito, que agora estava sendo cobiçada por uma grande instituição financeira. Essa teoria ficaria sob a guarda de Helius, que a colocaria em seu cofre em casa. Mas essa instituição financeira conseguiu roubar a teoria escrita pelo cientista e obrigou Helius a fazer a viagem conjuntamente com um de seus representantes, o sinistro Walter Turner (interpretado por Fritz Rasp). Também tomariam parte na viagem o professor Manfeldt e o casal de cientistas amigo de Helius, Hans Windegger (interpretado por Gustav von Wangenheim) e Friede Velten (interpretada por Gerda Maurus). Completa a tripulação o garoto “clandestino” Gustav (interpretado por Gustl Gstettsenbaur). Depois de uma grande cerimônia para o lançamento, o foguete parte para a Lua, soltando seus estágios e tudo, viajando por trinta e seis horas até pousar em nosso satélite artificial. Uma vez chegado lá, o professor Manfeldt sai do foguete primeiro, pisando na superfície lunar com um escafandro, mas descobre que há atmosfera no satélite. Ele anda até uma caverna e encontra ouro, mas cai num buraco e morre. Turner o segue e consegue encontrar outro pedaço de ouro, tentando voltar para a Terra sozinho no foguete, deixando os demais tripulantes na superfície. Mas seus planos são descobertos e, depois de uma luta corporal e uma troca de tiros. Turner morre. Entretanto, um dos tiros atingiu os cilindros de oxigênio do foguete, o que significava que um dos tripulantes teria que ficar na Lua. Helius e Windegger (que estava meio surtado da vida) tiraram a sorte no palitinho e Helius venceu. Gustav armou um acampamento para Windegger ficar. Mas Helius decidiu ficar no lugar do amigo e deu-lhe uma bebida com tranqüilizante para ele dormir. Helius deu as instruções para Gustav pilotar o foguete e desceu para a superfície da Lua. Depois que o foguete partiu para a Terra, Helius foi para o acampamento e encontrou Friede que, apesar de noiva de Windegger, sempre esteve apaixonada por Helius. Fim do filme.

Frau Im Mond [Woman in the Moon] | Eureka
Um filme que inspira o futuro…

O que podemos dizer de “A Mulher Na Lua”? Em primeiro lugar, a ficção científica impressiona, e muito. As cenas da Lua (que precisaram de quarenta caminhões de areia das praias do Mar Báltico para simularem o deserto lunar) lembram muito as imagens reais da superfície da Lua, à despeito da atmosfera, do ouro e das poças ferventes que vemos no filme. Mas muito mais impressionante e realístico foi o lançamento do foguete na Terra. O deslocamento do foguete do hangar para a plataforma de lançamento lembra demais os lançamentos reais, à despeito do foguete ser colocado numa piscina para aguentar o seu peso com o deslocamento da água. Chamou muito a atenção a contagem regressiva, a separação dos estágios durante o lançamento do foguete e os nossos astronautas tendo que suportar a pressão da força G e a necessidade do foguete atingir a velocidade de escape da gravidade da Terra, que realmente é de onze quilômetros por segundo. A situação de gravidade zero durante o voo também é lembrada, onde os personagens tinham que encaixar os pés em alças durante o voo. Gustav chega a “flutuar” num momento do filme. Nessas horas, a gente se pergunta: até onde “A Mulher Na Lua” influenciou nos lançamentos reais de foguetes? Devemos nos lembrar que esse é um filme de 1929, feito décadas antes dos lançamentos reais de foguetes, e vimos a contagem regressiva nele. Vendo esse filme, me lembro demais da discussão de como Jornada nas Estrelas influenciou o futuro antecipando, por exemplo, o uso de celulares e tablets. Parece que todo o cerimonial, estética e antevisão de um lançamento de foguete em estágios, sujeição do corpo humano à aceleração e à ausência de gravidade foram exibidos nesse filme, com os cientistas de décadas posteriores influenciados pelo que vimos na película de Lang lá do final dos anos vinte.

Frau im Mond | Electric Sheep – reviews
Uma paisagem lunar muito realista…

E a “Mulher Na Lua” em si? Apesar dela estar no título do filme, a sua posição na missão é altamente periférica. Parece que o empoderamento feminino aqui só chegava ao máximo a isso. O simples ato de Friede já estar numa missão perigosíssima, como o próprio Helius dizia (como ele era apaixonado por Friede, não queria de jeito nenhum que a mesma se submetesse a uma missão tão perigosa) parecia ser suficiente para um ato feminino pioneiro e de vanguarda. Um empoderamento feminino que se manifestava no vestuário. Se no início do filme, a moça, em seu noivado, vestia um delicado vestido branco, na missão, sua vestimenta era deveras masculinizada, com direito a uma gravata e a uma calça bem larga, que escondia suas formas femininas. Seria como se a moça, ao tomar para si uma tarefa atribuída aos varões, precisasse se vestir como tal. Pelo menos, ela filmou a superfície da Lua em toda a sua riqueza de detalhes (impossível não se lembrar de Leni Riefensthal), já que Friede era uma renomada cientista.

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A mulher que filma a Lua…

Dessa forma, se “A Mulher Na Lua” mostrou um empoderamento feminino com as limitações culturais da época, por outro lado, vimos uma ficção cientifica que, apesar dos devaneios como a presença de atmosfera na Lua, teve uma consultoria científica que alguns diriam que anteviu o futuro, e outros diriam que deu as bases para a construção do próprio futuro. Ver uma contagem regressiva de um lançamento de um foguete décadas antes do primeiro foguete ser realmente lançado é algo, no mínimo, perturbador. E veja o filme na íntegra abaixo, legendado em português.

https://www.youtube.com/watch?v=lZiU9Gc-kWk

Batata Movies – O Homem Que Quis Matar Hitler. Caçada Insana.

Man Hunt – Wikipédia, a enciclopédia livre
Cartaz do Filme

Voltando a falar um pouco da fase americana de Fritz Lang, temos “O Homem Que Quis Matar Hitler” (“Man Hunt”, 1941). Esse é um filme de suspense que aborda o infinito tema da Segunda Guerra Mundial no cinema. Para que possamos falar sobre o filme, vamos liberar os spoilers de setenta e nove anos.

O Desporto da Caça, com Hitler na Mira | À pala de Walsh
Capitão Thorndike. Atrás de uma grande caça…

O plot é o seguinte. O capitão inglês Thorndike (interpretado por Walter Pidgeon) tenta matar Hitler um pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, mas é capturado pelos nazistas. Ele vai ser interrogado por Quive-Smith (interpretado por George Sanders) e diz que não pretendia matar o Führer, somente simular a caçada perfeita. Quive-Smith não acredita muito nisso e liberta Thorndike caso ele assine um documento onde admite tentar matar Hitler a mando do governo inglês. Mas Thorndike se nega terminantemente a fazer isso. Os nazistas então o torturam e o jogam de uma ribanceira, simulando um suicídio. Mas Thorndike sobrevive e foge, sob o cerco cerrado dos nazistas, que descobrem que ele sobreviveu. A perseguição se estende até a Inglaterra, onde Thorndike conhece Jerry (interpretada por Joan Bennett), uma moça que se apaixona por ele, Mas Thorndike é perseguido por nazistas e ele precisa se separar da moça, que lamenta muito isso. Quando isso finalmente acontece, Jerry é capturada pelos nazistas é assassinada. Os nazistas finalmente cercam Thorndike, que consegue alvejar Quive-Smith com um presente que nosso protagonista tinha dado à moça (um adorno em formato de flecha), mas Quive-Smith também acerta Thorndike com um tiro. Este consegue sobreviver mais uma vez. O episódio termina com Thorndike descendo em território alemão em plena guerra, com um rifle, com o objetivo de matar Hitler novamente.

Man Hunt (1941) Fritz Lang | Journeys in Darkness and Light
Capturado, Thorndike tem Quive-Smith como antagonista…

Esse é um filme de muito suspense, com cenas de perseguição quase o tempo todo, mas também um filme que mostra o terno relacionamento entre Thorndike e Jerry. O mais curioso disso é que a personagem de Jerry seria originalmente uma prostituta, mas a glamourização de uma prostituta por parte do filme era considerado moralmente impossível. Assim, se colocou uma máquina de costura na casa de Jerry para ela ser tomada como costureira. Mesmo assim, Lang conseguiu colocar a cena do encontro final entre Jerry e Thorndike com a primeira fingindo ser uma prostituta para despistar o policial que estava na rua e não reconhecesse Thorndike, que era procurado. Outra curiosidade no filme foi testemunharmos a participação de um Roddy McDowall muito jovem, menino ainda, já destilando muito talento, e ajudando Thorndike a fugir da perseguição dos nazistas.

Man Hunt Blu-ray Review
Com Jerry, que vai se apaixonar loucamente por ele…

Dessa forma, “O Homem Que Quis Matar Hitler” é um filme de suspense que tem a perseguição como um personagem à parte, bons diálogos entre Throndike e Quive-Smith, uma história de amor um tanto terna entre Thorndike e Jerry (com uma Joan Bennett ainda com cara de menina, já que o filme é de 1941) e uma grata surpresa de um pré-adolescente Roddy McDowell, já mostrando um baita de talento desde muito cedo. O filme vale mais por suas curiosidades em si. E veja o filme na íntegra abaixo, legendado em português.

https://www.youtube.com/watch?v=4je_JZnBOiw&t=1s