Dentre as nossas análises de filmes que concorrem ao Oscar nesse ano de 2021, falemos hoje de “Wolfwalkers”, que concorreu à estatueta de Melhor Animação. Para podermos falar desse filme, uma co-produção Irlanda/Luxemburgo, vamos precisar dos spoilers de sempre.
O filme fala da história de Robyn, uma menininha inglesa que gosta de caçar lobos e vive com seu pai numa cidadezinha irlandesa dominada pelos ingleses. O povo irlandês é hostil aos invasores ingleses. Estamos no ano de 1650. O pai de Robyn, Bill, quer que a menina fique em casa em virtude da hostilidade dos irlandeses para com os ingleses e ele não quer que a menina o acompanhe na sua tarefa de caçar lobos numa floresta próxima. O temido Lorde Protetor da cidade quer destruir a floresta em que os lobos vivem para afugentá-los, já que os lobos atacam as criações de ovelhas. Quando Robyn segue o pai às escondidas, ela acaba descobrindo todo um mundo novo dentro da floresta, onde conhece Mebh, uma menininha que vive lá e é uma Wolfwalker, ou seja, uma espécie de menina lobo que, quando adormece, se transforma num lobo. Aliás, Robyn vai conhecê-la quando ela está transformada em lobo, mordendo acidentalmente o braço de Roobyn, que também a transforma numa wolfwalker. A mãe de Mebh, sabendo dos perigos do ser humano com relação à floresta, saiu para procurar um novo lugar para os lobos, mas nunca mais voltou, pois ela foi aprisionada pelo Lorde Protetor. Caberá à Robyn e a Mebh salvar os lobos da destruição da floresta, assim como tirar a mãe de Mebh do cativeiro.
Essa animação é surpreendente em vários aspectos. Em primeiro lugar, por ser algo de época, se passando numa época em que os ingleses subjugavam os irlandeses, com toda essa animosidade ficando bem clara na animação. Em segundo lugar, vemos aqui uma lenda que lembra demais as histórias de lobisomem, mas não com o wolfwalker sendo uma criatura monstruosa (ele até o era para os citadinos que eram vistos pelo Lorde Protetor como supersticiosos por causa disso), mas sim como um ser da floresta que deve ser preservada juntamente com sua fauna. Os lobos, vistos no início do filme como criaturas selvagens e perigosas, se tornam cachorrinhos muito fofinhos e amáveis quando entramos no mundo da floresta e conhecemos Mebh e sua mãe. E aí, os seres humanos, principalmente os ingleses, são vistos como os grandes vilões da história. É interessante perceber que, tanto dentro dos ingleses quanto dentro dos irlandeses, vemos pouquíssimas pessoas virtuosas. Além de Robyn, temos o seu pai Bill e um citadino que foi “para o tronco” por ordem do Lorde Protetor, que era alimentado às escondidas por Robyn. Os demais ingleses eram vistos como os opressores do povo irlandês, e estes últimos eram retratados de uma forma rústica e caricata.
Essa também é uma animação que fala de liberdade. O pai de Robyn era subordinado a um Lorde Protetor que exigia obediência de seus subordinados, não dando a eles qualquer liberdade. A vida da floresta, em contrapartida, era o espaço da liberdade por excelência, onde o contato prosaico com a natureza era a sua maior manifestação, contra as rígidas regras das convenções sociais, além da liberdade de todo um povo (no caso, o irlandês) tolhida pela dominação inglesa.
Dessa forma, “Wolfwalkers” é uma animação que concorre ao Oscar que tem um sabor um pouco diferente das demais animações que concorrem à estatueta. Apesar de se assemelhar às demais animações quanto a algo de mágico e fantasioso, “Wolfwalkers” se diferencia pelo seu conteúdo histórico e pela mensagem ecológica de preservação do meio ambiente, onde os humanos são os verdadeiros vilões da história e figuras mitológicas como lobisomens são esvaziados de seus conteúdos aterrorizantes e se tornam criaturas virtuosas que defendem a floresta em que vivem, sendo a sua casa. Vale muito a pena dar uma conferida.