Batata Movies – Imagens do Estado Novo 1937-1945. O Passado Materializado.

Cartaz do Filme

O diretor Eduardo Escorel traz par nós um documentário realizado no já longínquo ano de 2016. “Imagens do Estado Novo 1937-1945” é um importante documento e fonte histórica de nosso país, pois traz, na materialidade de suas imagens, muito do que aconteceu no período de nossa História que ficou conhecido como “Ditadura do Estado Novo”. Vindo desde a Revolução de 1930 e chegando até ao suicídio de Vargas, o documentário não deixou de ser fiel ao seu recorte, enfatizando mais o período 1937-1945. Além de muito material oficial do governo e do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), temos imagens também de particulares e de filmes como “O Descobrimento do Brasil”, de Humberto Mauro. Todas essas imagens são cimentadas e significadas por uma narração que tem a sua visão e interpretação dos fatos, que nem sempre pode agradar a gregos e troianos. De qualquer forma, sabemos que a História possui múltiplas interpretações do passado e que todas essas interpretações têm um local de fala, ou seja, não são neutras ideologicamente, como nada o é (até a suposta postura de ser neutro ideologicamente é uma postura ideológica). Como professor de História, consegui identificar vários elementos factuais que são trabalhados em sala de aula como, por exemplo, o Plano Cohen, que foi um complô orquestrado pelo governo ao denunciar uma suposta tentativa comunista de golpe, totalmente falsa, para justificar um golpe de estado dado pelo próprio Vargas para se perpetuar no poder.

Um presidente cuidando de sua imagem…

Vimos, também, a campanha queremista, onde era pedida uma Assembleia Constituinte e a permanência de Vargas no poder. Ou então as pressões militares para que Vargas saísse do governo após a Segunda Guerra Mundial. Mas o grande trunfo é que os filmes também mostram o cotidiano daqueles fatos, que eram cimentados por muitos eventos de curta duração praticamente despercebidos hoje, como um acidente de carro que manteve Vargas no hospital por alguns meses, fazendo com que sua ausência deteriorasse sua posição política num momento decisivo. Ou as visitas de Roosevelt ao Brasil nas tentativas de dissuadir o Estado Novo a continuar namorando com o Eixo.

Documentário fala de um cotidiano já esquecido…

Ou ainda, imagens (coloridas) dos eventos cívicos dos quais Vargas participava no Estádio de São Januário. Imagens de pessoas influentes do governo como Osvaldo Aranha ou Gustavo Capanema, também se faziam presentes. Toda essa materialidade de imagens trazem aqueles distantes dias até nós de uma forma muito vívida e ajudam a gente a compreender melhor todo o contexto daquela época, mesmo que sejam imagens lidas por uma versão ideologizada.

Pessoas próximas a Vargas são destacadas…

Aliás, essa é a grande questão colocada ao início da película: será que é possível fazer uma reconstrução histórica do período com um acervo de imagens? Nesse caso foi possível, mesmo que essa seja apenas uma das leituras possíveis de passado que podemos assumir. As imagens têm um peso tão determinante nesse documentário que ele tem a duração de 227 minutos, ou seja, quase quatro horas de duração, sendo o filme dividido em duas partes com um intervalinho de dez minutos. Até a exibição do filme se processa como antigamente.

Os integralistas…

Assim, “Imagens do Estado Novo 1937-1945” é uma grande relíquia de nosso cinema e uma espécie de material obrigatório para historiadores. Acima de um filme, esse documentário pode ser considerado uma verdadeira fonte histórica, pela força de suas imagens e pela leitura delas. Programa imperdível, sendo aquele tipo de filmes que já falamos aqui um monte de vezes, ou seja, aquele filme para ver, ter e guardar.

Batata Movies – Indiana Jones E O Templo Da Perdição. Novas Ideias, Antigos Ideais.

Cartaz do Filme

A Rede Cinemark realiza, toda última terça-feira do mês, uma sessão Clássicos Cinemark em algumas de suas salas, onde são exibidos consagrados filmes do passado. Neste mês de março de 2018, tivemos a exibição de “Indiana Jones e o Templo da Perdição”. Esse foi um filme que, curiosamente, não assisti quando passou no cinema e somente o fiz quando passou na TV. Como era uma oportunidade ímpar de ver esse agora clássico na telona, me despenquei para o Cinemark do Botafogo Praia Shopping para assisti-lo. Vamos dar algumas palavrinhas sobre um filme que já assistimos muito, mas que sempre tem pano para a manga numa boa conversa e análise.

Um herói mais hilário

Temos aqui a continuação das aventuras do renomado arqueólogo Dr. Henry Jones Jr., conhecido como Indiana Jones e um ladrão de tumbas segundo o seu intérprete Harrison Ford. Caçador de relíquias, ele as negocia com gângsters sempre pensando em compensações financeiras (acho que Ford estava certo em sua avaliação do personagem). Depois de tomar uma carreira de um desses gângsters, ele foge com a cantora Willie Scott (interpretada por Kate Capshaw) e com seu fiel escudeiro, o chinesinho Short Round (interpretado por Jonathan Ke Quan, que também trabalhou no filme “Os Goonies”, uma das pérolas da Sessão da Tarde) de avião, que pertencia à companhia do gângster em questão. Seus capangas abandonam o avião com para-quedas e nosso destemido arqueólogo se lança com seus amigos num bote (!) e chega ileso a um rio, depois de duas quedas abissais. Eles, então, encontram uma comunidade indiana que perdeu todas as suas crianças depois que uma pedra sagrada desapareceu. Caberá a Indiana pegar a tal pedra e salvar as crianças, embora ele inicialmente pensasse na fama e glória da conquista de mais um artefato arqueológico. Só que, miraculosamente, ele fica “bonzinho” com o tempo e pensa mais nas crianças da tribo. É claro que a coisa se dará com toda aquela pompa de aventura muito fora da realidade que marcam esses filmes. Mas quem está preocupado com isso?

Momentos de humor

A gente pode falar de outras coisinhas aqui. Em primeiro lugar, a ideia de se criar Indiana Jones partiu de George Lucas. Ele seria uma espécie de reedição dos antigos personagens de fitas em série do cinema, quando antes do filme principal, as crianças, lá das décadas de 30, 40, assistiam aos seriados (lembremos que a TV, onde hoje vemos seriados, ainda não existia). Lucas tentava fazer com esse estilo de personagem a mesma coisa que ele tinha feito com “Guerra nas Estrelas”, tomando Flash Gordon como inspiração. Já Spielberg pensava num personagem com uma pegada mais, digamos, James Bond. Lucas convenceu Spielberg a abraçar a ideia de Indiana e saíram os filmes. E, como o filme foi inspirado em heróis e séries antigas, a primeira coisa que chama a atenção é a floresta de estereótipos que a película contém. O herói americano, com um quê meio canalha, tanto nos hábitos quanto no trato com outras civilizações, que são vistas de forma totalmente supersticiosa e inferior, dentro de um ponto de vista muito maniqueísta e de uma ideologia imperialista.

Um casal à moda antiga…

Só devo alertar que esse ponto de vista extremamente ostensivo sobre outras culturas talvez não deva ser levado tão à sério assim, pois é nítida a intenção de se mostrar essa reedição das antigas fitas em série de uma forma um tanto galhofeira, onde se carrega muito nas tintas para se ter essa impressão. Como um exemplo disso, o herói, mais imaculado nas fitas antigas (vejam Flash Gordon, com Buster Crabbe, por exemplo), é aqui ridicularizado em algumas passagens do filme. Cansamos de rir vendo Indiana passando pelas situações mais escabrosas, onde até o seu medo de cobras é explorado. Aliás, poucas vezes pudemos presenciar como a combinação de filme de aventura com comédia foi tão bem sucedida. A sequência dos carrinhos nas minas, onde o inusitado é o condutor dos veículos naqueles trilhos com cara de montanha russa, é simplesmente deliciosa. As populares “mentiras” dos filmes desfilam apoteoticamente nos fotogramas e, pelo menos da minha parte, eu via os filmes de Indiana para me deliciar com suas coleções de absurdos. Esse, talvez seja o ingrediente que mais atrai nesses filmes.

O inusitado a todo instante…

Dessa forma, foi uma experiência muito legal poder ver na telona um filme que chama tanto a atenção por tantos fatores. E também uma viagem no tempo, pois pudemos presenciar um Harrison Ford jovial em toda a plenitude de sua atuação, recheada de carisma e cinismo (podemos dizer que Indiana é uma espécie de Han Solo light). Se você tiver um tempinho, volte a assistir essa película tão saborosa.

Batata Antiqualhas – Spock e Leonard. Dualidade que se Completa (Parte 20)

Nimoy em “Unification”. Spock na Nova Geração!!!

Apesar de Nimoy achar que sua participação como Spock em “Jornada nas Estrelas” havia terminado, o mundo dá voltas e, ainda durante as filmagens do sexto filme, Mancuso liga para Nimoy e lhe pergunta se ele não estaria disposto a fazer uma participação como Spock em um episódio da “Nova Geração”. Esse convite levou Nimoy a uma recordação. O ano era 1986, na época da pós-produção de “A Volta Para Casa”, quando Mancuso o convidou para uma reunião, onde ele foi convidado para ser o produtor-executivo de uma nova série de “Jornada nas Estrelas” com uma nova tripulação, muitos anos depois da época em que se passava a série clássica (século 23). Nimoy agradeceu mas negou o convite, pois ele disse que não funcionaria, já que a série clássica funcionou devido  a vários fatores: os temas, os personagens, a química entre os atores, as perspectivas de futuro da década de 1960, e que tudo isso não se repetiria novamente. O projeto foi adiante sem Nimoy e “Nova Geração” se tornou um sucesso estrondoso. E aí, voltando ao convite para a participação especial como Spock na “Nova Geração” no episódio “Unificação”, Nimoy prontamente aceitou. Vulcanos vivem mais que humanos e, no século 24, época em que se passam os episódios da “Nova Geração”, Spock estaria na meia-idade. E essa seria mais uma oportunidade para criar pontes entre a série clássica e a nova geração. De Forest Kelley fez um Dr. McCoy com 180 anos no piloto da “Nova Geração”, “Encontro em Fairpoint”. Mark Lenard trabalhara no episódio “Sarek”. E até James Doohan voltou ao Sr. Scott em outro episódio. O roteiro de “Unificação” foi escrito após uma reunião de Nimoy com os produtores de “Nova Geração”, Rick Berman e Michael Piller, e tratava de um trabalho secreto de Spock dentro do Império Romulano para aproximar vulcanos e romulanos, os últimos parentes distantes dos primeiros, que preferiram viver sua vida agressiva e predadora, ao invés dos vulcanos, que usaram a lógica para conter seus instintos agressivos ancestrais. Há um elo mental entre Nimoy e o Capitão Picard ao fim do episódio que também simboliza a “unificação” entre a série clássica e a Nova Geração. Nimoy aceitou um salário modesto e se encontrou com a equipe de “Nova Geração”, que ele já conhecia, pois ele havia dado uma festa em sua casa para comemorar o fim da produção de “Jornada nas Estrelas 6”. A única coisa que o incomodava, mas que ele também achava uma certa graça, era que o elenco de “Nova Geração” o tratava com muita reverência.

Picard havia feito um elo mental com Sarek…

Nimoy gostou muito de fazer o episódio e destaca o elo mental entre Spock e Picard, onde o vulcano pôde ter contato com parte da mente de Sarek presente na mente de Picard (no episódio “Sarek”, o pai de Spock e Picard também fizeram um elo mental). Para Nimoy, esse foi um momento “extremamente tocante e dramático”. Como nunca Spock e Sarek fizeram o elo mental, Nimoy decidiu aumentar a dramaticidade da coisa colocando uma expressão de dor. A maioria das cenas de Nimoy foram com Patrick Stewart (Picard) e Brent Spinner (Data), atores muito admirados por Nimoy. Ele achava Stewart muito parecido com Picard, ou seja, charmoso e com autoridade no jeito de ser e de falar. Já Spinner ele achou mais exótico e escorregadio. Nimoy trabalharia com Spinner e Armim Shimerman (o ferengue Quark de “Deep Space Nine”) na produção de “Guerra dos Mundos” para a Rádio Nacional Pública, com direção de John De Lancie (o onipotente alienígena “Q” da “Nova Geração”). Uma das razões de Nimoy aceitar esse trabalho foi o grande número de pessoas de “Jornada nas Estrelas” envolvido no projeto.

Mas voltemos a “Unificação”. Há uma cena muito curiosa no episódio, que foi dividido em duas partes, onde Spock trabalha nos computadores enquanto Data o observa curioso. Spock pergunta sobre sua curiosidade e Data diz que não consegue entender por que o vulcano renega sua parte humana enquanto que Data justamente procura isso, sendo um diálogo genial!

Spock e Data. Delicioso diálogo…

Nimoy era frequentemente interpelado nas convenções de “Jornada nas Estrelas” quando ele faria uma participação em “Nova Geração”. O dia em que ele comunicou a participação em “Unificação”, a reação do público foi mais calorosa do que ele esperava, emocionando-o muito. Nimoy sempre estava acostumado com as ovações nas convenções, mas, naquele dia, ele foi pego de surpresa. E havia reparado que tinha tocado “num assunto de família”, em suas próprias palavras. Até então havia dois grupos de fãs: os da série clássica e os da nova geração, que não se uniam muito. Com “Unificação”, esse mal-estar acabou e até os fãs foram “unificados”. Não é à toa que Spock, no idioma vulcano significa “o unificador”. E também não é à toa que o episódio duplo “Unificação” registrou a maior audiência entre todos os episódios de “Nova Geração”.

No próximo artigo, vamos terminar essa grande jornada de Leonard Nimoy e do vulcano Spock. Até lá!

Elo mental entre Spock e Picard. O vulcano reencontra seu pai…

Batata Literária – Ficando Com Sono

Estou cansado

Estou com sono

Estou porrado

Estou a cara da Yoko Ono

Quero dormir

Mas não posso sucumbir

Tenho que estudar

Para uma boa nota tirar

 

Vou tomar o café

Argh! Está frio!

Assim não dá pé!

Isso não é vida nem de gentio!

As fórmulas pululam à minha frente

E, lá fora, o tiroteio inclemente

Meu estômago revira para dentro e além

Já vi que essa noite não vai acabar bem

 

Chega a manhã!

Antes não tivesse chegado!

Para a prova, não tenho qualquer afã

E agora estou esculhambado

Saio à rua, vejo o rabecão

Carregando os frutos da overdose de munição

Que assolou meu estudo da madrugada

E lá vou eu para a minha prova, de alma condenada

 

É, meus amigos, não deu outra

Realmente não me safei

E, na minha prova, eu me ferrei

Assim como a pobre mulher moura

Não adianta passar a noite em claro

Senão você fica em retalho

É melhor ser mais sensato, meu caro!

Estudando todo o dia, você divide o trabalho!

Batata Mangá – Who Fighter E O Coração Das Trevas. A Segunda Guerra Mundial Em Mangá.

                                 Capa do Mangá

Vamos falar hoje de um lançamento em mangá já bem antigo (mais especificamente de julho de 2010). A HQM Editora trouxe, naquela longínqua data, um volume único com três histórias que se remetiam à Segunda Guerra Mundial. A primeira, Who Fighter, era mais centrada em aviação e OVNIs. Tanto a aviação americana quanto a japonesa detectam um objeto não identificado nos céus do Japão. O tenente Kitayama, que fez contato visual com a estranha luz, é chamado para depor. A partir daí, nosso personagem protagonista se envolverá numa trama regada à espionagem, mistério, suspense e estranhos alienígenas. A história não fica somente nesses gêneros, abraçando também um pouco do terror. Podemos ver soldados morrendo com seus cérebros espatifados, ou poças de sangue aqui e ali. Há, também, menções a sinais deixados pelos alienígenas em descampados e que também apareciam misteriosamente impressos em corpos de pessoas que haviam tido contatos imediatos de terceiro grau (ou seja, quando se deparavam frente à frente com os alienígenas). Uma coisa que incomodou na história foi o seu fim um tanto abrupto e o fato de que o OVNI e a espécie alienígena permaneceram um mistério, com o último quadrinho tomado pela enigmática frase: “Os céus são maiores do que você pensa”. Ou seja, o leitor fica o tempo todo esperando para ver quem são os alienígenas e suas intenções, mas no final, nada fica explicado. Parece aqui que o alienígena foi somente um argumento, um pretexto para que se fizesse o exercício do mistério, do suspense e do terror ao longo da história.

                                                                             Who Fighter

A segunda história do mangá, “O Coração das Trevas”, tem uma notável curiosidade. Ela é baseada na obra de Joseph Conrad, que inspirou também o filme “Apocalipse Now”. De Francis Ford Coppola. Assim, a coisa nos soa muito familiar. Essa trama também é ambientada na Segunda Guerra Mundial, tendo como personagens oficiais do exército japonês. Nosso protagonista é o primeiro-tenente Maruo, uma especialista em combate estratégico que foi convocado para uma missão muito inusitada: localizar, nas selvas da Birmânia (atual Mianmar), o coronel Kurutsu, um herói da guerra sino-japonesa que, aparentemente, enlouqueceu e desertou, levando consigo todo um regimento preparado para um combate na linha de frente. O coronel deixou uma carta onde disse que desistia do combate da guerra na Birmânia e havia decidido fundar uma sociedade utópica nas florestas. Aí, vemos uma livre adaptação em relação a que vimos em “Apocalise Now” (infelizmente não li Conrad) com algumas diferenças introduzidas, onde as intenções de nosso coronel não eram tão idealistas assim (Marlon Brando era muito mais idealista e muito mais psicótico também) e o desfecho teve uma cara totalmente diferente do filme de Coppola. Assim, foi muito instigante testemunharmos uma história que faz parte de um clássico do cinema ser recontada de forma criativa num outro veículo que é o mangá.

                                                                        Encontrando um OVNI…

A terceira história é muito curta, intitulada “Tanques”, onde presenciamos batalhas de tanques nas Duas Guerras Mundiais, que nada mais eram do que o sonho de um militar que operava um tanque numa guerra do futuro.

O autor dessas três histórias, Seiho Takizawa, ainda nos brinda com um posfácio, onde ele nos revela detalhes de seu processo criativo, assim como algumas dificuldades criativas que ele enfrentou, além de confessar que gosta muito de trabalhar histórias onde se tem o medo (daí a pegada de terror da primeira história). O autor também falou de como desenvolve seu processo criativo em histórias originais e histórias adaptadas, exatamente os casos desse mangá específico.

          O coração Das Trevas

Assim, “Who Fighter” e “O Coração Das Trevas” são histórias de um mangá bem interessante e curioso, sobre a presença japonesa na Segunda Guerra Mundial. Seja carregando nas tintas do mistério, suspense e terror na primeira história, seja relendo um clássico do cinema na segunda história, dando-lhe novas perspectivas. Só é pena que esse mangá já seja demasiadamente antigo (eu o consegui num stand de livros a dez reais na Feira da Providência de 2017), mas pode ser que seja possível obtê-lo em lojas e bancas especializadas de quadrinhos. Vale a pena procurar por aí.

    O livro de Joseph Conrad…

Batata Movies – Silêncio No Estúdio. A Trajetória De Uma Comunicadora.

Cartaz do Filme

Em meus tempos de infância, havia um programa de TV à tarde na Rede Bandeirantes cujo cenário reproduzia uma sala de uma casa muito elegante, onde uma senhora muito bem vestida falava com você de forma muito simples e direta, sempre abordando uma temática qualquer do cotidiano. Lembro-me que, a primeira vez que ela me chamou a atenção de verdade foi quando falou sobre o assunto das pessoas que perdiam os seus bichinhos de estimação e ofereciam uma pequena recompensa em dinheiro para quem os achassem. A elegante senhora ficava indignada com aqueles que, ao encontrarem os bichinhos perdidos e entregarem aos seus donos faziam questão da tal recompensa e não o faziam com a pura intenção de devolver um ente querido à família que sofria pela sua ausência, aliviando a sua dor. Esse pensamento, que pode parecer altamente simplório nos dias de hoje, era apenas um dos temas de um programa vespertino de TV, cujo principal público da época era o das donas de casa (algo que também não parece ser mais uma constante nos dias de hoje). E quem era a tal senhora bem vestida que conduzia esse programa? Seu nome era Edna Savaget.

Edna Savaget, uma mulher à frente de seu tempo…

E agora, para homenageá-la e para que as novas gerações a conheçam, foi lançado há alguns meses o bom documentário “Silêncio no Estúdio”, de Emilia Silveira, onde pudemos ver a trajetória de Savaget numa riqueza de detalhes. Mesclando imagens de arquivo de seus programas, filmagens, pessoais, muitas fotos e entrevistas de figuras como Artur Xexéo e o Boni, da Rede Globo, “Silêncio no Estúdio” consegue mostrar Savaget de uma forma que, a princípio, não notamos em toda a sua plenitude, pois sempre nos fica o estereótipo de que o programa feito para a tarde e para um público de donas de casa enfocado em variedades parece ser uma coisa menor, uma espécie de tapa-buraco na programação. Entretanto, Savaget não se encaixava de forma nenhuma nesse estereótipo, pois sua mente era de uma erudição inigualável, sempre lendo e, principalmente, escrevendo muito, desde romances, passando por poesias e chegando até a colunas de jornal. O jeito com que ela se dirigia ao público, comentando todo o tipo de coisa, de forma muito corajosa e direta, lhe trouxe alguns problemas, por exemplo, com a censura da ditadura militar.

Fernanda Montenegro foi uma das entrevistadas

É notável perceber que seu programa era um convite para a reflexão, justamente num veículo de comunicação – a TV – que foi concebido aqui no Brasil inteiramente para a função de entretenimento, com o objetivo de alienar e manipular as massas. Ela era uma apresentadora, por exemplo, que entrevistava escritores que falavam de seus lançamentos literários, levando pela primeira vez na TV a menção de nomes da literatura latino-americana como Gabriel Garcia Marquez e Jose Luis Borges. Savaget também abordava termas espinhosos para os mais conservadores, como uma nova ideia para a relação homem-mulher no casamento, que não se ancorasse em parâmetros determinados pela tradição, discutindo com muita coragem o papel da mulher nas décadas de 60, 70 e 80. Desafiando todas as convenções da época, ela apresentava em seu programa ao vivo sua maquiadora, uma transex, em dias de repressão latentes. Sincera, quando era demitida de uma emissora de TV ou se demitia, ela anunciava isso no ar e ao vivo, para a perplexidade geral. Mas, apesar de toda a sua vivacidade, Savaget também era muito sensível e, volta e meia, tinha crises de depressão. Todos esses elementos são contados com muita simplicidade nesse filme que faz a gente se apaixonar por Savaget por ela mesma, pelo que simplesmente ela é. O único problema que incomodou um pouco no filme foi no que se refere às entrevistas do documentário, pois optou-se por fazer um cenário muito escuro, com muitas molduras entulhadas num canto. A gente até entende a proposta estética da coisa, mas um primeiro olhar mais despreocupado dá a impressão de que as entrevistas foram feitas num depósito de coisas velhas, indo totalmente contra a grande vivacidade da homenageada pelo documentário. Mas isso não diminui a qualidade do resgate de Savaget e de sua trajetória pelo filme.

A diretora Emilia Silveira

Assim, “Silêncio no Estúdio” (onde o título desse filme é o mesmo de um dos livros escritos por Savaget) é um grande documentário que fala da trajetória de uma mulher notável que deu qualidade intelectual a um meio de comunicação visto por alguns como extremamente alienante, que é a televisão. A personalidade dessa senhora nos cativa instantaneamente e fica a vontade de ter aproveitado melhor aquele cotidiano longínquo de seus programas que a minha infância não os fez desfrutar direito. Uma pena.

Batata Movies – Em Pedaços. A Vingança Basta?

Cartaz do Filme

Um excelente filme que é co-produção Alemanha/França está em nossas telonas. “Em Pedaços” fala de dor, de vingança e de se tal vingança é capaz de aplacar uma dor muito grande. Esse também é um filme de denúncia, mostrando que a barbárie humana pode vir de qualquer lugar e não apenas de grupos que são vistos de forma marginalizada por aí. Também não podemos nos esquecer de que esse filme ganhou o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro.

Katja e o marido. Início de uma vida feliz.

Temos aqui a história de Katja Sekerci (interpretada por Diane Kruger), uma mulher alemã que casou com um imigrante de origem turca. Ele havia sido preso por tráfico de drogas, cumpriu a pena e voltou ressocializado para a liberdade e para os braços de sua esposa. Eles tiveram um filho e tocavam um negócio. Mas tudo veio por água abaixo, quando um atentado terrorista à bomba destruiu o escritório do casal, matando pai e filho. Katja mergulha, então, num redemoinho sem fundo e já havia cortado os pulsos quando seu advogado lhe liga e diz que um casal neonazista foi acusado de praticar o atentado. Assim, Katja reúne forças para ir ao julgamento e colocar os assassinos de sua família atrás das grades. Só que essa história ainda vai reservar muitas surpresas.

Logo, uma bela família é formada…

Esse é um filme sobre atentados terroristas que envolve muçulmanos. Mas, ao contrário do que o senso comum (e o preconceito) diria, o muçulmano é que é a vítima ao invés de algoz. O filme tem o grande mérito de denunciar o assassinato de muçulmanos na Alemanha por grupos neonazistas, algo que não é muito lembrado por aí. E o cinema cumpre sua função social de denúncia.

Descobrindo que sua família foi destruída…

Mas a película não é apenas isso, pois testemunhamos toda a via-crucis de Katja em todo o seu sofrimento, sendo algo muito dolorido, e dando a impressão de que nada, nem a condenação dos réus, poderá aplacar a sua dor. Não é à toa que esse filme também foi premiado em Cannes para melhor atriz. Diane Kruger conseguiu uma atuação bem convincente, em todo o seu esplendor e intensidade. Chorávamos com ela, sofríamos com ela, odiávamos com ela. Mas também ficou o alerta de que esses grupos neonazistas são muito bem articulados em toda a Europa, constituindo-se num perigo que os atentados terroristas de grupos islâmicos radicais encobrem devido à sua forte exposição na mídia. Às vezes, é melhor você se preocupar com os problemas que vêm de fora, enquanto que sua própria sujeira é varrida para debaixo do tapete.

Sofrimento no julgamento…

Esse é também um filme de julgamento, gênero que a gente não vê muito por aí hoje e que quando volta agrada, pois todo julgamento é um forte exercício de argumentação e retórica que, se bem construído, vale a pena ser assistido e acompanhado, o que é o caso aqui. Mas essa é apenas uma parte do filme que vai ter outros lances curiosos, mas não posso contar aqui em virtude dos spoilers.

Diana Kruger fez jus ao prêmio em Cannes

Assim, “Em Pedaços” é mais um bom filme que temos da Europa, que trabalha um tema atual – o terrorismo – mas que não fala do islâmico como vilão e sim como vítima. Nesse caso, o terrorista não vem de fora e está dentro de casa. Mais um filme de denúncia e de reflexão.

Batata Movies – Tomb Raider, A Origem. Uma Lara Croft Sem Glamour.

Cartaz do Filme

E estreou “Tomb Raider, A Origem” em nossas telonas. E, antes que algum fã já estranhe o título do texto, quero dizer que essa falta de glamour mencionada aí em cima é vista como algo extremamente positivo. Toda vez que a gente fala dessa famosa personagem dos games, nos lembramos imediatamente da atuação de Angelina Jolie. Só que, pelo menos no primeiro filme, me pareceu que vimos uma personagem altamente glamourizada. Não tive a oportunidade de vê-la nos joguinhos eletrônicos, mas a Croft de Jolie parecia um tanto marrenta e muito segura de si, vícios que já vimos em inúmeros heróis masculinos por aí, não sendo isso algo positivo nem para um gênero, nem para outro, além de Jolie esbanjar muita sensualidade para a personagem. Assim, aquela Croft de tempos pretéritos parecia um tanto plana e sem graça, ainda mais quando falava com seus antigos amigos de longa data, dando ao espectador a impressão um tanto desagradável de estar caindo de para-quedas na história.

Uma heroína mais humana…

Pois bem. Com todas essas referências um tanto negativas sobre Lara Croft no cinema, vamos nós para assistir a “Tomb Raider” de 2018, agora com a Alicia Wikander, premiada com o Oscar. As comparações serão inevitáveis. E o que pode ser dito desse novo Tomb Raider, que busca a origem de nossa heroína? Este foi um filme que deixou impressões muito positivas. Li em algum lugar, nessa floresta selvagem que é a internet, gente sentando o malho em Wikander, dizendo que ela não era boazuda como Jolie, parecia masculinizada, etc. Pura maldade. Mesmo que Wikander não tenha os atributos físicos de Jolie, sua Lara Croft teve muito mais essência. Creio que, por se tratar de um filme de “origem”, Wikander acabou tendo alguma vantagem nisso, pois sua Croft foi muito mais bem construída.

Mistérios arqueológicos. Saudades desse gênero…

E a face angelical da atriz contribuiu de forma positiva para a sua desglamourização. Ela não era uma heroína perfeita, acima do bem e do mal, totalmente artificial como a Croft de Jolie. Ela era muito mais humana, com suas virtudes, coragens, medos, traumas e mágoas. Uma menina levemente atrevida, mas também destemida e um pouco frágil. E Wikander consegue amarrar todas essas características muito bem, fazendo a gente comprar a personagem.

Procurando um pai desaparecido…

A história é relativamente simples. A moça, que sempre fora muito ligada ao pai desde cedo (interpretado por Dominic West) sofre com o sumiço dele depois que ele parte para uma ilha do Japão onde uma antiga rainha maligna foi sepultada. Com espírito arqueólogo, Richard Croft vai em busca do corpo dessa rainha. E desaparece. A moça, que precisa assinar uns papéis reconhecendo a morte do pai para assumir os negócios das empresas da família, se recusa a fazê-lo e começa a seguir uma série de pistas que Richard deixou. Ela consegue chegar à ilha depois de muitas saias justas. E aí…

Vilão canastrão…

Esse é um daqueles filmes de ação cheios de referências. Há muita porrada, bomba e tiro, há os mistérios arqueológicos a la Indiana Jones, há a cumplicidade entre pai e filha, há o vilão canastrão. Nada de muito novo e fora do convencional. Somente a presença de Wikander, que não temos o hábito de ver em produções desse tipo e a grande curiosidade de como ela encararia tal papel. De qualquer forma, é legal a gente ver um filme de aventura, pelas armadilhas das tumbas, pelos enigmas de antigas inscrições, pelo embate entre fé e razão.

Só um pouquinho de marra…

Dessa forma, “Tomb Raider, A Origem” é um filme que vale a pena ser visto, pois ele desmistifica o glamour montado em cima da personagem dos games quando da película feita por Angelina Jolie. Vikander nos dá uma Croft muito mais humana, sem perder o pique da ação. E é, também, um filme divertido, apesar de não apresentar nada de muito novo. Não deixe de assistir.