Mais um tesouro da Batata
Autor: Carlos Lohse
Batata Movies – A Cidade Onde Envelheço. Buscando Seu Porto Seguro.
Uma co-produção Brasil-Portugal passou em nossas telonas. “A Cidade Onde Envelheço” fala de dúvidas e incertezas. Fala do medo dos caminhos que você toma na vida. Para onde devo ir? Será que o rumo que dou ao meu futuro é o melhor? Devo seguir em frente ou voltar atrás e buscar o antigo caminho? Ou tentar uma terceira solução? Dúvidas, dúvidas e dúvidas.
O filme fala de duas amigas portuguesas, Francisca e Tereza (interpretadas, respectivamente por Elisabete Francisca e Francisca Manuel), que vieram tentar a vida no Brasil, mais especificamente na cidade de Belo Horizonte. Francisca já está há algum tempo no Brasil e Tereza é uma recém-chegada que irá dividir o apartamento da amiga. Francisca tem seu círculo de amizades, com pessoas frequentando seu apartamento, mas não consegue se adaptar ao Brasil, sendo um pouco mais mal-humorada. Já Tereza é bem mais alegre e extrovertida. Mesmo que as duas amigas se entendam bem, Francisca já deixou claro que prefere morar sozinha. Mas as duas amigas portuguesas são bem unidas e enfrentam o dia-a-dia de se estar num país com hábitos e comportamentos diferentes.
O filme tem um ritmo relativamente lento e é um tanto enfadonho, mas aborda uma interessante questão: como um estrangeiro convive num novo país e consegue ou não se adaptar? No caso de nossas amigas portuguesas, a gente via que elas, de alguma forma, conseguiram se adaptar e formar um círculo de amigos, entretanto não dava para dizer que aquelas eram amizades profundas, a ponto de se fincar raízes por aqui. Isso ficou bem claro num choro de Tereza que, aparentemente, não tinha qualquer motivo, mas sentíamos nas entrelinhas que a moça (lindíssima por sinal) estava com saudades da “terrinha”. Ainda assim, fica no ar a dúvida para nossas protagonistas: é melhor tentar a sorte no Brasil ou voltar para seu país natal? O próprio turbilhão de incertezas quando da permanência no Brasil (Vai se ter um emprego? Haverá dinheiro para o aluguel? E se precisar de alguém para dividir as despesas?) tornam as decisões ainda mais difíceis.
Assim, “A Cidade Onde Envelheço” é um filme que inaugura uma série de co-produções Brasil-Portugal esse ano e dá a nós o olhar do imigrante português perante o Brasil. Um filme com duas atrizes eficientes que nos dá um leve sopro de como é difícil se fincar raízes em terras estrangeiras, pelo menos para as novas gerações, e que, acima de tudo, mostra como é enorme a incerteza de quais rumos podemos dar a nossas vidas. Vale a pena dar uma conferida.
Batata Literária – O Medo (Série Obscura)
Batata Movies – Marguerite E Julien. Um Amor Incestuoso.
Um filme curioso e polêmico que passou somente lá no Cine Joia, de Copacabana. “Marguerite e Julien”, da diretora Valérie Donzelli, trata de uma história real que já aconteceu há muito tempo (na virada do século XVI para o XVII), mas que desperta uma polêmica e tanto até os dias atuais: o amor incestuoso entre dois irmãos. Um filme que é feito com muita delicadeza para justamente não ser tão agressivo aos moralistas mais sensíveis.
Vemos aqui a história dos dois irmãos, Marguerite (interpretada por Anaïs Demoustier) e Julien (interpretado por Jérémie Elkaïm). Desde cedo, os dois irmãozinhos eram muito ligados. A coisa na infância era altamente idílica, com brincadeiras infantis e trocas de carinhos, sem muitas maldades. Mas, ao entrar na escola, o casalzinho de irmãos foi notado pelo professor (e padre), alertando o pai de que os irmãos deveriam ser separados, o que de fato aconteceu, com Julian sendo mandado para outra escola, ficando vários anos longe dos pais e da irmã. Mas Julian retornaria, já rapaz feito e reencontraria Marguerite já moça e prometida. Não é preciso nem dizer o que acontece daí para a frente, com os dois querendo engatar um namoro e desafiando todas as rígidas convenções sociais da época, que consideravam o incesto um crime passível de ser punido com a morte.
O grande barato desse filme é que, apesar de ser uma história que já se passou há séculos, vemos toda uma estética propositalmente anacrônica. Assim, uma hora parece que os irmãozinhos estão no século XIX, outra hora no século XX, quando Marguerite é presa e levada por um helicóptero, e assim vai. Nós nunca sabemos em que época exata a real história aconteceu a não ser no fim do filme, quando um intertítulo nos diz como foi o desfecho do verdadeiro casal. O filme também tem uma curiosidade interessante. Em dois momentos, é preparada toda uma cena em que os protagonistas ficam totalmente estáticos e a câmara passa por eles em “travelling”, tal como se fizéssemos um passeio em 3D numa pintura ou algo do tipo. Depois dessa pequena “viagem”, os personagens ganham vida e se movimentam, dando sequência à narrativa.
Apesar de ser um drama e falar de um tema muito polêmico, o ritmo do filme flui muito bem, pois a impressão que nos dava era a de que víamos um grande filme de romance e aventura, onde o herói apaixonado salva a mocinha das garras de homens maus que querem desposá-la. Ainda, deve ser mencionado que esse roteiro foi originalmente escrito para François Truffaut rodá-lo lá na década de 70. Coube à diretora Valérie Donzelli e ao ator Jérémie Elkaïm adaptá-lo para os dias atuais, colocando os já citados elementos anacrônicos. Em tempo: Truffaut não o filmou já que ele estava envolvido em muitos projetos.
Assim, “Marguerite e Julien” é um daqueles filmes que trata de um tema altamente polêmico, mas consegue colocar um frescor de aventura de capa e espada para dar uma aliviada na barra. A colocação de uma estética fora de época e o uso de tomadas onde os atores apareciam totalmente estáticos trazem um elemento de novidade, apesar desses estratagemas já terem sido utilizados no passado. Como não vemos essas coisas todos os dias por aí, a revisitação é válida. Pena que só passou no Joia e não esteve disponível em outras salas, o que mostra a carência de salas em nossa cidade.
Batata Movies – Silêncio. A Fé Move Montanhas Mas Não Transforma Ilhas.
Martin Scorsese tinha um projeto antigo: o de fazer um filme sobre a perseguição aos cristãos no Japão do século XVII. Por anos a fio, ele buscou concretizar seu filme, mas não conseguia. Até que, finalmente, Scorsese realizou “Silêncio”, e agora o temos em mãos. E o que podemos dizer desse filme? Nada menos do que uma obra-prima. Essa é uma daquelas películas que entrarão para o rol das melhores feitas por Scorsese. Também pudera. Como ele teve muitas dificuldades em fazer esse filme, assim que teve a oportunidade, o ítalo-americano a aproveitou com muito amor. E, quando você faz as coisas com amor, você faz muito bem.
No que consiste a história? Dois jesuítas portugueses, Padre Rodrigues (interpretado pelo “Homem Aranha” Andrew Garfield) e Padre Garupe (interpretado pelo “Kylo Ren” Adam Driver) estão muito angustiados com o sumiço do Padre Ferreira (interpretado por Liam Neeson) em missão no Japão, um país conhecido por rechaçar com muita violência qualquer tentativa de implementação do cristianismo, pois já tinha estabelecida a religião budista (importada da Índia) e a xintoísta. Considerando que o cristianismo era uma influência estrangeira e uma ameaça à cultura local, as autoridades japonesas simplesmente executavam todos os camponeses que se convertiam. É para esse país que os dois jovens jesuítas viajarão à procura pelo Padre Ferreira que, segundo as últimas informações, tinha renunciado à Deus e vivia como um japonês. Ao chegarem ao Japão, os padres foram acolhidos por uma pequena comunidade camponesa cristã que vivia bem escondida, temerosa da perseguição de um tal “inquisidor”. Os dois padres inicialmente vivem escondidos por lá, mas ficam no dilema de que precisam procurar o Padre Ferreira, e necessitam se arriscar mais. Até que, um dia, os representantes do governo japonês chegam à caça dos cristãos. É o momento em que a película se tornará extremamente tensa e pararemos com os “spoilers”.
Vamos lá. Por que esse filme foi tão bem? Em primeiro lugar, o diretor e o roteirista Jay Cocks (Scorsese também assina o roteiro e a história é baseada no romance de Shusaku Endo) tiveram o cuidado de trabalhar muito bem o embate entre as duas culturas, ou seja, a lógica do Antigo Regime e do catolicismo, com a sua arrogância em levar a sua verdade para outros povos, em contraposição à da cultura japonesa vigente do xogunato, que precisava manter a sua estabilidade política num histórico de muitos períodos de caos e disputas entre senhores feudais japoneses durante os séculos a fio de xogunato. Se num primeiro momento, os japoneses são vistos dentro de um estereótipo plano de violência, num segundo momento vemos um debate entre as visões de mundo do catolicismo de Rodrigues e do budismo do Inquisidor. Ambos discutiam onde suas religiões se aproximavam e se afastavam e até onde o catolicismo era viável ou não no Japão. Tais debates foram o grande fator motivador do filme e não o choque violento provocado pelas atrocidades japonesas em si. Em segundo lugar, as atuações dos atores. Andrew Garfield rouba as ações. Esse é mais um filme onde a gente se esquece de que ele é o Homem Aranha. Sua interpretação de um padre atormentado pelo silêncio de Deus perante à matança de fiéis foi simplesmente soberba e convenceu bastante. Pena que o filme não tenha dado tanto espaço a Adam Driver. Depois de tantos comentários até um pouco maldosos sobre sua atuação em “O Despertar da Força”, seria legal vê-lo tendo uma oportunidade em algo diferente. E aí chegou a oportunidade dele com Scorsese, um diretor consagrado. Só que, comparada a Garfield, sua atuação caiu mais para a de coadjuvante, o que foi uma pena. Liam Neeson, nos poucos momentos em que apareceu, também esteve muito bem. Mas quero fazer aqui um destaque todo especial aos atores japoneses que participaram da película. Yosuke Kubozuka interpretou Kichijiro, uma espécie de “Judas recorrente” para o padre Rodrigues. Tadanobu Asano fez o intérprete de Rodrigues e conseguiu ser muito intenso nos momentos de cortesia e nos momentos de tortura psicológica. Agora, quem realmente deu um show foi o ator Issei Ogata, no papel de Inquisidor. Ele conseguia ser delicado, cortês e muito sábio, mas simultaneamente conseguia ser extremamente ameaçador, despertando o respeito de Rodrigues. Uma grande atuação que ajudou o filme a afastar os estereótipos para com os japoneses. Foi um verdadeiro deleite ver esses atores ocidentais e orientais trabalhando juntos.
O filme, por sua vez, também tem seus probleminhas. Em primeiro lugar, o xintoísmo foi praticamente esquecido ao longo de todo o filme (só em um pequeno momento, o Padre Ferreira o cita muito levemente), sendo dado um foco maior no budismo, o que foi uma pena. Ainda, o filme pareceu demasiado longo (cerca de duas horas e quarenta minutos) e com um ritmo um tanto lento. Talvez ele pudesse ser um pouco mais enxugado e com mais debates entre Rodrigues e o Inquisidor. Se isso acontecesse, talvez a película passasse mais rápido aos olhos do espectador, que se apavorou com as atrocidades japonesas. Mas, apesar disso, não podemos deixar de dar uma certa razão aos japoneses. É só a gente se lembrar do que aconteceu com os índios por todo o continente americano durante a colonização, onde o genocídio e o etnocídio foram a tônica.
Assim, “Silêncio” é um filmaço de Scorsese, feito com muito amor e carinho, e que levanta questões muito pertinentes sobre embates culturais do Oriente e do Ocidente. Imperdível! Daqueles que a gente compra o DVD para ver, ter e guardar.
Batata Movies – Quatro Vidas De Um Cachorro. Cão Espírita.
Passou em nossas telonas o controverso “Quatro Vidas de um Cachorro”. Por que esse filme despertou tanta polêmica? É que circulou nas redes sociais que houve maus tratos a um pastor alemão durante as gravações do filme (ele teria sido obrigado a pular numa piscina com ondas e lutou muito contra isso; para piorar a situação, o cachorro afundou na piscina e quase se afogou). Por causa desse fato, rolou uma campanha para se boicotar o filme. Mas minha curiosidade era tanta desde que vi o livro da história desse filme na livraria, que me despenquei para o São Luiz 4 para dar uma conferida na película.
Vemos aqui a história de um cãozinho que, na verdade, não vive quatro, mas cinco vezes. Isso mesmo que você entendeu, caro leitor. O bichinho morria e reencarnava no corpo de outro cachorro, com o agravante de que o cachorro se lembrava de tudo o que tinha acontecido em sua vida anterior (nem precisava fazer regressão). O filme era narrado em primeira pessoa canina e assim podíamos atestar como era a visão de mundo do cachorro, sendo um texto bem escrito e engraçado. O mais legal das histórias era como o cachorro encarava seus donos e de todo o carinho e cumplicidade envolvidos entre o bichinho e os “chefes da matilha” que era como o cachorro se referia aos seus donos. Uma coisa que ficou um pouco ruim foi o fato de que as histórias não tinham a mesma duração ou tratamento adequados. Algumas histórias eram mais detalhadas e longas em detrimento de outras. Na verdade, o filme gira mais em torno de duas histórias principais que estão interligadas, enquanto que as demais histórias têm uma importância menor atribuída, parecendo apenas encher linguiça para o filme, o que configurou um problema no roteiro, o que foi uma pena. No mais, tivemos um elenco de atores desconhecidos, salvo a grata surpresa de podermos rever Dennis Quaid em ação novamente, um ator que muito apareceu na década de 80, mas que anda meio sumido, o que é uma pena, pois é um talentoso ator cheio de presença e deveria estar aparecendo mais por aí nos filmes.
Assim, se “Quatro Vidas de Cachorro” despertou muita polêmica em virtude da denúncia de maus tratos contra os animais, por outro lado é um filme que vê os cachorrinhos com a maior simpatia do mundo e enfatiza tudo aquilo que a sabemos que um animal de estimação desses dá para a gente: muito amor sincero e bastante carinho. Só é pena o que aconteceu nas gravações.
Batata Jukebox – Take On Me (A-Ha)
Um grande sucesso dos anos 80!!!
Batata Arts – Tesouros da Batata (14)
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