Batata Movies – Batman, A Piada Mortal. Psicose E Perdão.

Cartaz da Animação

Esse ano, houve um rebuliço entre os chamados DCnautas (ou fãs de quadrinhos da DC, para ser mais específico). É que foi feita uma exibição em sessão única da animação “Batman, A Piada Mortal” (“Batman, The Killing Joke”). As expectativas eram ótimas: a voz do Coringa seria feita por Mark Hamill, essa seria uma das animações mais  violentas e doentias de que se tinha notícia, etc. Confesso que não assisti a animação quando de sua exibição única no cinema. Algum tempo depois, fiquei sabendo que ela já estava disponível em DVD. E, nas minhas andanças pelas mega stores da vida, me deparei com “Batman, A Piada Mortal”. Decidi então comprar o DVD para ver se a animação era realmente tão boa assim. Para poder falar um pouco sobre ela, vou ter que lançar mão de “spoilers”, me desculpem.

Surtadaço!!!!

No que consiste a história? Ela é dividida basicamente em duas partes, a princípio muito distintas. Ao seu início, Batman e Batgirl caçam o perigoso sobrinho de um gângster muito importante de Gotham City. Batman quer Batgirl fora dessa caçada, pois o malfadado sobrinho sente uma forte atração sexual por ela e usa isso para enervar a heroína. Não pensando de forma racional, Batgirl pode facilmente cair nas armadilhas do bandido. Com um instinto protetor, Batman tenta dissuadir Batgirl do caso, mas as coisas acabam numa forte noite de amor. O tal bandido é preso, não sem antes Batgirl dar-lhe uma surra e quase matá-lo. Aí estava outro motivo para Batman querer Batgirl fora do caso, pois ele temia que ela perdesse as estribeiras e fizesse justiça com as próprias mãos, matando o bandido, sendo esse um abismo sem volta. Cansada de toda essa pressão psicológica, Batgirl aposenta a capa e volta a ser apenas Barbara Gordon.

Já a segunda história é bem mais barra pesada. Coringa escapa da prisão e quer provar a todo mundo uma teoria: basta um dia ruim em sua vida para você surtar e enlouquecer. Para isso, ele dá um tiro em Barbara, aleijando-a permanentemente, além de estuprá-la. Ainda, sequestra o comissário Gordon e o submete a toda uma série de torturas físicas e psicológicas, onde o policial é inclusive obrigado a ver a imagem de sua filha ferida e nua. Depois de ouvir do palhaço do crime que Batman também age fora das regras da lei, o comissário Gordon, ao ser resgatado das mãos de Coringa e dos seus criminosos por Batman, fala ao Homem Morcego que faz questão de que o vilão seja preso de acordo com as leis. Esse é o sinal de que a tese de Coringa está furada e a sanidade mental pode ser mantida. Há o duelo final entre o herói e o vilão e, então, ao se ver derrotado, Batman se nega a matar Coringa e age dentro das leis, dizendo que não quer matá-lo e sim ajudá-lo, chegando a estender a mão para o vilão, que declina do convite, pois alega que “já é muito tarde para aceitar isso”. A animação termina com o Homem Morcego e Coringa rindo de uma piada um tanto sem graça, que eu já até vi contada de uma forma diferente na Turma da Mônica.

Bom, o que podemos falar da animação? Ela tem um ponto positivo e um ponto negativo. Vamos começar pelo negativo, para que a antipatia dos fãs da DC à minha pessoa passe logo. A promessa de uma grande violência no filme para mim não foi muito cumprida. Sei lá, eu acho que o Rio de Janeiro real é muito mais violento que uma Gotham City fictícia. Aqui, o Coringa já teria tomado um teco de fuzil na cara, dado pela polícia, há muito tempo. E que se lasque se as leis não fossem cumpridas. O Coringa, por sua vez, não teria deixado Barbara Gordon viva e paralítica. Ele teria estuprado e matado a moça mesmo (isso se ainda não desossasse a finada e desse a carne para os cachorros comerem, como dizem por aí que aconteceu com a Eliza Samudio). Ou seja, o Rio de Janeiro é muito mais violento e desrespeita as leis há bem mais tempo. Eu acho que a DC podia pagar uma estadia para seus roteiristas para passarem umas duas semanas por aqui. Eles voltariam cheios de ideias para um Coringa bem mais cruel. E nem quero imaginar o que fariam com o Batman.

Até onde eles se aproximam e se distanciam????

Mas isso não quer dizer que a animação tenha apenas problemas. Contar a história pregressa do Coringa foi algo simplesmente sensacional. A gente realmente fica com pena do homem, que sofreu várias pressões, e teve vários dias ruins, ao invés de um só. Talvez a tese do palhaço do crime tenha mais coerência aí. E de como Batman foi determinante para o seu mergulho total na insanidade. Provavelmente foi por isso que Batman, ao final, oferece ajuda ao bandido para tentar recuperá-lo, ao invés de lhe desferir um golpe fatal. O relacionamento entre herói e vilão, mostrando até onde eles se assemelham e onde se diferenciam, é o grande lance dessa história, algo que poderia até ser examinado por especialistas em psicologia ou psicanálise, o que, definitivamente, não é o meu caso.

E qual é a relação entre as histórias da Batgirl e do Coringa? Ambas defendem a premissa de que somente se combate o crime se você age dentro da lei. Ou seja, aquela velha ideia de John Locke de que o respeito às leis é necessário, pois quando as pessoas vivem em sociedade, ninguém pode fazer o que bem entender, pois o ato de uma pessoa pode prejudicar outra. Daí a importância de se cumprir as leis, que devem representar a vontade da maioria das pessoas e ainda garantir os direitos e a vida dos cidadãos. Criminosos devem ser punidos por desrespeitar as leis. Mas os heróis também não devem desrespeitar as leis para punir os criminosos, algo que se torna muito notório quando se trata de Batman, que tem atrelada às suas costas a fama de justiceiro que nem está aí para o que as leis dizem.

Barbara passará por um sufoco…

Assim, “Batman, A Piada Mortal”, se não parece ser excessivamente violento como se apregoava, ainda tem a virtude de se analisar não somente a psique do vilão, mas indiretamente a do próprio Homem Morcego. A discussão do respeito às leis também tem forte destaque. Para o DCnauta, é obrigatório ter. Mas é altamente recomendável para quem gosta de uma boa história. Veja o trailer abaixo…

https://youtu.be/Gc5z3JFrJ7k

Carrie Fisher. Uma Homenagem.

A eterna Princesa de Alderaan.

Todo dia 26 de dezembro (meu dia de aniversário), vou ao Cemitério São João Batista para fazer uma pequena homenagem a algumas pessoas. Visito as sepulturas de Luís Carlos Prestes (considerado “O Cavaleiro da Esperança” por uns, um bandido comunista para outros), Tom Jobim (um músico que foi importante demais para nosso país e nem temos a ideia disso), Santos Dumont (que dispensa apresentações), o casal Vicente Celestino e Gilda de Abreu (um grande cantor antigo e uma grande atriz e diretora de cinema). Mas, principalmente, visito minhas duas Carmens, a Miranda e a Santos, que tentaram elevar o nome de nosso país e de nosso cinema. Carmen Miranda ainda teve um reconhecimento do público, embora tenha sido criticada pela imprensa brasileira por se “vender” aos Estados Unidos. Carmen Santos, essa ninguém fala mais, apesar de todos os sacrifícios feitos por ela para realizar bons filmes no Brasil, numa época em que nosso país ainda era assolado pelo complexo de vira-latas. Minhas visitas anuais ao cemitério são para diminuir um pouco o impacto da injustiça provocada pela falta de reconhecimento. Colocar rosas vermelhas em seus túmulos ajudam a minimizar um pouquinho tais dores. 

Postura desafiadora com os inimigos

Carmen Miranda faleceu em 1955, e Carmen Santos, em 1952. Essas mortes doem até tempos presentes. E o que não falar de uma morte que aconteceu hoje? Carrie Fisher, a eterna Princesa Leia, nos deixou. Filha da atriz americana Debbie Reynolds e do cantor e apresentador Ed Fisher, Carrie Fisher viveu desde cedo próxima ao showbiz. Em 1977 ela encantou o mundo, ao estrelar “Guerra nas Estrelas” como a Princesa Leia, com apenas 19 anos. Fez noventa filmes e era escritora. Ela nunca teve medo de expor sua vida pessoal na mídia e divulgou que sofria de transtorno bipolar. Outras fontes diziam que ela tinha problemas com drogas. Mas nenhuma dessas informações abalavam a adoração que os fãs de “Guerra nas Estrelas” tinham por Leia e por Fisher. A atriz e a personagem às vezes pareciam ser uma coisa só. Da mulher forte que peitava o grão moff Tarkin com tiradas cínicas e atrevidas, passando pelo tom debochado com os subalternos do Império (“Você não é pequeno demais para ser um stormtrooper?”, dizia para um Luke disfarçado), trocando rusgas com o “canalha” Han Solo, mostrando que não era mulher de entrar em qualquer conversa e que para ter seu coração, era preciso conquistá-la, chegando até a sua carinhosa afeição por Luke, uma afeição a princípio inexplicável por ela não saber que se tratava de seu irmão. A atriz Carrie Fisher deu essa natureza multifacetada à Princesa Leia de forma extremamente convincente. Se em Jornada nas Estrelas, havia a tríade Spock – Kirk – McCoy com o vulcano representando a razão, o médico representando a emoção e o capitão representando a conciliação entre pólos aparentemente tão antagônicos, em “Guerra nas Estrelas” também havia outra tríade. Han Solo é a impetuosidade masculina em pessoa, o aventureiro que age pelo impulso. Luke Skywalker é o jovem e ingênuo aprendiz que inicia timidamente seus passos no ofício da batalha. E no centro, cimentando e alicerçando esses dois pólos, estava Leia, com o espírito libertário feminino, que luta contra milênios de opressão machista (isso nessa galáxia aqui mesmo), botando o machismo do contrabandista em seu devido lugar e, ao mesmo tempo, tratando com extremo carinho o órfão padawan tardio, manifestando um amor que mais se aproxima dos ancestrais instintos maternos que ajudaram a preservar nossa espécie.

Leia e Han Solo. Um amor surgido depois de muitos conflitos

Um símbolo da mulher pós década de 60, que é dura ao lutar por seus direitos frente a uma cultura que a oprime, mas que não perde a ternura ao mostrar seu lado mãe. Mas uma mulher também que atua como a verdadeira fêmea fatal, ao reagir violentamente contra as investidas do pérfido Hutt, que queria transformá-la num objeto sexual e periodicamente a enforcava com uma coleira presa a uma corrente. Ao melhor estilo “olho por olho”, ela ceifa a vida do gângster estrangulando-o com a própria corrente que estava presa em seu pescoço. Ainda, uma mulher que consegue pensar racionalmente, mesmo em situações de extrema tensão, quando o contrabandista e o jovem agricultor tentam libertá-la da prisão, mas não têm um plano de fuga, e a herdeira do trono da destruída Alderaan toma as armas e improvisa um caminho para a calha de lixo, arrancando até uma admiração do machão Solo.

Leia e Luke. Relacionamento pautado na afeição

Essa é Carrie Fisher. Essa é a Princesa Leia. Essa jamais irá embora de nossas memórias. Mesmo que eu não possa visitar seu jazigo, como faço todos os anos com minhas Carmens, ela estará sempre presente em nossos pensamentos. Dizem que uma pessoa morre mais de uma vez. E a última vez em que uma pessoa morre é quando param de falar o nome dela. Se depender dos fãs, Carrie Fisher e Leia jamais terão essa morte derradeira. Mais do que uma princesa que luta contra um fictício Império Galáctico do Mal, Leia se tornou um símbolo das mulheres que lutam aqui em nosso planeta por mais direitos e igualdades. Luta que não necessariamente faz a mulher bruta e a afasta de suas doces características femininas. Leia, portanto, se tornou também um símbolo da afeição feminina, sabendo ser carinhosa e materna nos momentos certos. Agressiva, sem perder o racionalismo. Racional, sem perder a emoção. Agora ela realmente é a Força. Agora, ela nos envolve. E jamais ficaremos distantes dela. 

E, para uma pequena homenagem, fiquem com o inesquecível final do Episódio IV, que jamais sairá de nossos corações…

https://youtu.be/iH6a1iYQ0GA

Batata Literária – A Rainha de Gales (à Bonnie Tyler)

Eu estava em Swansea.
Eram onze e meia da noite.
Entrei no pub
muito ordinário para um night club.
No bar, um rosário de venenos cobiçados
que iam desde a cerveja até o absinto
tornando os bêbados irados
e, nos mais comedidos, acirrando o instinto.
Mas eu estava lá por outro propósito.
Esperava por minha rainha naquele ambiente inóspito.
Nascida Gaynor, Bonnie imortalizada,
toda semana cantava aqui minha amada.
Seu show começava à meia noite
num pequeno palco lá no fundo.
Eu sempre sentia um impacto, como num açoite,
quando ela surgia para todo o mundo!
Finalmente, ela aparece na ribalta.
Seus cabelos louros e olhos azuis, tudo isso me exalta!
Ela traja um negro vestido de veludo.
Sua boca vermelha e seus brilhantes me deixam mudo.
Mas a plateia bate palmas morna.
É uma turba idiota que insensível se torna
aos talentos infinitos de minha deusa
artista notória de origem galesa.
Ela começa a cantar.
Escolhe “He’s the King” como a primeira música a interpretar.
Olha para a plateia de jeito formoso.
Volta e meia, me joga um sorriso gostoso.
Às vezes, parece que ela me conhece há mil anos.
Há a impressão de que nos amamos.
Mas eu sei que sou apenas um súdito inglês
dessa eterna rainha do povo galês.

Batata Antiqualhas – Anakin Skywalker. Vilão Ou Vítima? (Parte 2)

Um jovem Anakin, ainda sem as marcas da crueza da vida…

Qual seria o grande mérito de “Guerra nas Estrelas”? O maniqueísmo clássico bem X mal protagoniza um conflito violento justamente dentro do personagem mais maligno da saga. Anakin Skywalker, como todo mundo sabe, teve uma infância difícil, sendo escravo num povoado paupérrimo de um planeta desértico com dois sóis (quantos Anakins encontramos nos morros cobertos de barracos à nossa volta?).

Rejeitado pelos Jedis, Anakin encontrou amparo em Qui-gon Jim

Ao ser amparado por dois cavaleiros jedis, foi visto com repúdio pelo Conselho dos nobres cavaleiros, como se ele tivesse uma essência ruim congênita. Mas, como diria o iluminista Rousseau, o homem é bom por natureza, é a sociedade que o corrompe. Ou, trocando em miúdos, o homem é produto do meio em que vive. Qui-gon Jim e Obi-Wan Kenobi investiram no jovem Anakin, mesmo a contragosto dos jedis. Logo, a visão iluminista se concretizaria. A infância difícil em Tatooine tornou Anakin um rapaz altamente impetuoso e destemido, que nem sempre Obi-Wan conseguia segurar. Logo ele descobriria o amor ao conhecer Padmé.

E Obi Wan Kenobi.

E com ela Anakin teve o único momento idílico em sua vida, sempre permeada por muito treinamento, disciplina e batalhas violentas. Houve um grande trauma, que foi a morte da mãe e a reação violentíssima contra os algozes, numa fúria impetuosa. Depois, o arrependimento nos braços da amada ao lembrar que massacrou crianças e inocentes. Definitivamente, não foi uma juventude fácil.

Perda da mãe…

Mas o divisor de águas na vida de Anakin viria no episódio três. E aí entra a grande questão. O que o impeliu a escolher o caminho do mal? O medo, um sentimento que todos nós temos e escondemos em nosso íntimo. Todo mundo tem medo de alguma coisa. Quem fala que não tem medo de nada está mentindo. E qual foi o grande medo de Anakin? De perder seu ente mais querido, Padmé.

Um violento trauma

Mestre Yoda lhe dizia que o medo traz raiva e ódio, que ele, Anakin, devia se despir do medo, como se houvesse um outro mundo onde sua querida Padmé poderia estar caso ela morresse. Entretanto, como um jovem que havia passado tantas dificuldades na vida e sofrido um trauma tão violento como a morte da mãe poderia se resignar com a perda da única pessoa que o amava? A severa disciplina jedi não foi tão eficiente em lidar com os problemas psicológicos tão profundos de Anakin e ele acabou se tornando totalmente manipulável nas mãos do senador Palpatine (esse sim, um personagem clássico do mal) para a sua conversão para o lado sombrio.

O medo de perder Padmé…

Filmes de mocinhos totalmente bons e bandidos totalmente maus com o tempo se tornaram cansativos e incoerentes, embora até hoje a fórmula se repita na indústria cinematográfica americana. Por isso, quando o personagem se torna complexo, com o mal e o bem em fusão e conflito, há uma atração maior por parte do público, pois é apresentado algo diferente dessa dicotomia bem X mal tão bem definida e clássica.

… o empurrou para as mãos do senador Palpatine.

Exemplos disso não faltam. Lembro-me do Rick, interpretado por Humphrey Bogart, em “Casablanca”, um mocinho com atraente canalhice e cinismo, e os personagens HQ Batman e Venom, que são classificados por alguns fãs de vigilantes, ou seja, justiceiros violentos que espreitam os malfeitores pelas ruas. Darth Vader seria um exemplo desse personagem complexo onde bem e mal estão em conflito.

Momento mais dramático do episódio 3. Anakin chora após optar pelo mal e sujar suas mãos com sangue. Conflito evidente.

Ou seja, Anakin Skywalker é, acima de tudo, um personagem humano, com virtudes e defeitos, amores e fraquezas, coragens e medos. Um personagem que, na segunda trilogia (episódios um, dois e três), se aproxima mais de seus espectadores, humanos como ele, com seus sonhos, com suas virtudes, com seus defeitos, com seus temores. Nunca me esqueço das palavras de meu irmão Cláudio, sobre o episódio três: “quando a gente fica sabendo da história de Anakin dá até pena, né?”. Pena definitivamente não é um sentimento bom. É um sinal do fracasso do indivíduo. Mas também uma comoção e solidariedade com o sofrimento alheio.

Libertação somente com a morte.

Vocês podem até me criticar e dizer que, mesmo com todos os problemas, Anakin ainda poderia ter escolhido o lado de luz da força, pois pessoas que tiveram uma vida de sofrimento conseguiram dar a volta por cima. Mas também quanta gente por aí não enveredou também para o “dark side” por ser mal amada, por ser tripudiada, por ser desrespeitada? Essas pessoas são as únicas culpadas por seus atos? Na minha modesta  opinião, não… Charlie Chaplin já dizia em seu discurso de “O Grande Ditador”: “Só quem não é amado que tem a capacidade de odiar”.

Ectoplásmico Anakin com Yoda e Obi-Wan envelhecidos. Redenção.

Pelo menos no mundo da fantasia de “Guerra nas Estrelas”, Anakin teve um fim reconfortante. A cópia de “Retorno de Jedi” restaurada, com a imagem ectoplásmica de Anakin jovem ao lado de um Yoda e um Obi-Wan envelhecidos pode parecer incoerente. Mas também é libertadora, pois vimos todo o sofrimento nas costas do Anakin jovem nos três primeiros episódios. Assim, nada mais justo do que o jovem Anakin desfrutar de dias melhores em sua outra vida num plano mais etéreo. Só a lamentar todo o mal provocado por ele, consequência de males também sofridos por Anakin…

Na imagem original, um Anakin mais envelhecido.

Batata Antiqualhas – Anakin Skywalker. Vilão Ou Vítima? (Parte 1)

Um dos ícones mais amados de todos os tempos.

 

Na esteira da estreia de Rogue One (aguardem resenha em breve), vamos falar de um ícone de Guerra nas Estrelas. Nas minhas andanças por eventos organizados pelo Conselho Jedi e o Abacaxi Voador, um detalhe me chamou muito a atenção. Quando o assunto é “Guerra Nas Estrelas” (Star Wars é coisa para os mais novos), impressiona muito a quantidade de camisas e imagens referentes a Darth Vader. Aquela carinha preta, cheia de grades no lugar da boca e sem qualquer expressão facial, totalmente fria, exerce um profundo fascínio nos fãs do filme e foi além, se tornou um verdadeiro ícone cultural. Mas Darth Vader é a encarnação do mal, o cara é ruim toda a vida. Mata seus subordinados com a força do pensamento, persegue impiedosamente um grupo de insurgentes, quer levar o seu próprio filho para as forças do mal estimulando seu ódio. Tais atitudes são consideradas repugnantes para a esmagadora maioria das pessoas em várias sociedades e culturas diferentes. Mesmo assim, sua imagem é exaltada em convenções, filmes, mídias em geral. O que aconteceu? A grande maioria das pessoas pirou? Por que tanta exaltação a uma figura tão venal? Por que Luke Skywalker, Han Solo ou a Princesa Léia, que são os mocinhos, ficam numa posição tão secundária?

Sufocos à distância…

Uma das hipóteses principais que buscam explicar a fascinação humana pelos vilões é que eles são os transgressores, não respeitam a lei, não estão nem aí para os valores morais de uma sociedade, ou seja, são totalmente avessos a regras, como se isso significasse uma espécie de liberdade. Nós, os pobres mortais, submetidos às leis e convenções da sociedade, muitas vezes somos obrigados a engolir sapos no nosso dia-a-dia e, ao entrar numa sala de cinema para ver um filme, presenciar o vilão chutando o pau da barraca seria uma espécie de catarse. Nos projetamos para aquele indivíduo mau que não tem freios nem limites e aliviamos nossas frustrações provocadas por situações cotidianas mal resolvidas, pois a lei nos impõe um freio. O que quero dizer aqui? Que devemos pegar uma arma e resolver tudo à nossa maneira? Claro que não! Quando as pessoas vivem juntas, ninguém pode fazer o que bem entender, pois caso isso aconteça, tudo vira uma bagunça e todos saem prejudicados. Mas também é fato de que, às vezes as leis não respeitam a vontade da maioria dos cidadãos e até privilegiam uma minoria em detrimento de uma maioria. Daí um vilão e seus maus atos tornarem-se uma catarse para o indivíduo.

Mais mau que o pica-pau.

Mas, e o nosso Darth Vader? A hipótese acima é suficiente para entender toda exaltação ao mais fiel discípulo do Imperador? Se considerarmos a primeira trilogia (os episódios quatro, cinco e seis) talvez sim, pois o lado humano do personagem só foi brevemente pincelado na segunda metade de “Retorno de Jedi”. Entretanto, a segunda trilogia (os episódios um, dois e três, que nem todo mundo gosta) teve o grande mérito de construir o personagem Anakin Skywalker. E aí, a discussão se torna muito mais complexa. Dessa forma, a saga que aconteceu há muito tempo numa galáxia muito distante deixa de ser uma espécie de conto de fadas espacial e atinge questões muito mais profundas, tornando-se um produto cultural altamente reflexivo. Mas essa discussão precisa ser feita numa segunda parte deste artigo. Até lá!

Em guerra contra o próprio filho.

Batata Antiqualhas – Jiraiya, O Incrível Ninja (Parte 2)

Espada Olímpica!!!

Vamos hoje continuar a falar de um dos mais populares seriados japoneses da década de 1980, “Jiraiya, O Incrível Ninja”.

Outro elemento muito atraente em “Jiraiya” era o seu grande humor, o que acontecia também nas outras séries. Key e Manabu zoavam Toha o tempo todo, e Toha também não ficava atrás. Existe um episódio onde a família está em treinamento e, durante um intervalo, Toha conversa com Tetsuzan. Manabu vem por trás de Toha e dá uma paulada na cabeça dele, que estava desprevenido. Toha bota Manabu para correr e Tetsuzan só fala, desanimado: “assim não dá para continuar”. Os efeitos especiais eram também às vezes, um tanto toscos, que fariam Georges Meliès esconder o rosto de vergonha. Mas nos matavam de tanto rir. A fauna do Império dos Ninjas, com guerreiros de todas as matizes e cores, abusando do metálico, eram igualmente hilárias.

Os amigos do Jiraiya!!!

Tinha um defeito na série. Ela era um tanto violenta. Além de Jiraiya pulverizar seus inimigos com a poderosa espada olímpica, uma espada ninja que ficava laser somente nas mãos do protagonista (originalmente conhecida como Jikô Shinku Ken), muitos dos capangas de Dokusai, os ninjas corvinhos que voavam e tudo, sofriam às vezes mortes violentas, tomando estreladas, flechadas, ou despedaçados em grandes explosões. Me lembro de um episódio em que Tetsuzan, desarmado, sofre um ataque de espada de um dos corvinhos e o mata, tomando a espada do coitado, dando-lhe uma chave de braço e cortando a nuca do bichinho com a própria espada dele. Meio pesado para uma série infanto-juvenil na minha modestíssima opinião.

Família de Feiticeiros. Os inimigos do Jiraiya

Mas, qual era o eixo principal da história, que conduziu todos os cinquenta capítulos que tinham uma duração média de 22 a 24 minutos? Existia um grande tesouro alienígena, Pako, uma espécie de cápsula do tempo enviada há séculos por uma civilização muito mais avançada que a Terra. Ao chegar ao nosso planeta, os japoneses medievais acharam que ela era uma dádiva divina, que ficaria guardada até que um mensageiro chegasse para levá-la. Mas Pako foi soterrada por um terremoto. Lamentando a perda, o povo deixou para as futuras gerações uma tábua de barro gravada com a localização de Pako. Ao desvendar todo o mistério, o príncipe Taishi desenterrou Pako e a enterrou novamente, ordenando ao ninja Shinobi a guarda da tábua de barro. A tábua de barro ficou posteriormente sob a guarda da família Togakuri e foi passada de geração a geração, com Tetsuzan sendo o representante da 34ª geração. Metade da tábua está com Tetsuzan. A outra metade está nas mãos de Dokusai, chefe da família dos feiticeiros, um antigo companheiro de treinamento de Tetsuzan e que quer usar o tesouro para o mal. Dokusai, inclusive, matou a esposa de Tetsuzan, na luta pela tábua de barro que localiza Pako. Mas a disputa por Pako não ficará só entre os Togakuri e os feiticeiros.

Kinin Reiha, do serviço secreto japonês, a protetora de Jiraiya. Era tão magrinha que até a roupa de malha que ela usava ficava frouxa.

O Império dos Ninjas também vai querer colocar a mão no tesouro e irá em sua busca. Alguns ninjas do Império se tornarão aliados de Jiraiya, como o inglês cristão Barão Olm, que quer usar Pako para o bem, mas outros serão poderosos inimigos. O serviço secreto japonês também ajudará Jiraiya, nas figuras de Kinin Reiha, incumbida de proteger Toha, e Yannin Spiker. Há também o americano, Dr. Smith, um ocidental com um barbão que o torna a cara do Karl Marx, sendo o primeiro discípulo de Tetsuzan, e que quer aliar a arte ninja a tecnologia. Ele conserta a armadura de Jiraiya num episódio, e insere um monte de componentes tecnológicos no carro de nosso herói, transformando o automóvel no Black Storm, uma espécie de Supermáquina nipônica. Num episódio, Jiraiya ia ser derrotado por seu oponente e o Dr. Smith deu uma ajudinha com uma caneta que paralisava o inimigo, e ai, o nosso herói teve tempo para se recuperar e derrotar seu adversário. Trapaça? Espírito de equipe? Tirem suas próprias conclusões.

Os corvinhos!!!

Dessa forma, “Jiraiya, O Incrível Ninja” é uma série que nos deixa muitas saudades, talvez a melhor de todas dentre a vasta fauna de seriados japoneses da década de 1980. Um herói sem grandes poderes, que se baseia em seu treinamento, que não se “transforma”, mas sim veste sua própria armadura. Ah, e faz comida, lava e passa. E não deixe de ver abaixo a entrevista com o próprio Jiraiya no programa The Noite, do Danilo Gentili, no ano de 2014.