Uma coisa muito atual, viva num passado distante que, pelo menos, tinha um espírito muito mais transgressor que hoje…
Autor: Carlos Lohse
Batata Arts – Tesouros da Batata (82)
Mais um tesourinho…
Batata Movies – Promessa Ao Amanhecer. Fazendo O Que A Mamãe Coruja Mandou.
Uma interessante produção francesa. “Promessa ao Amanhecer” fala da trajetória do renomado escritor polonês Roman Kacew, mais tarde conhecido como Romain Gary, e seu turbulento e afetuoso relacionamento com sua mãe Nina Kacew. É uma história muito comovente e um típico caso de vida que imita a arte de tão inusitada.
A película começa com Gary (interpretado por Pierre Niney) tendo uma crise nervosa e sendo conduzido de uma cidadezinha do interior do México para a capital, Cidade do México, por sua esposa Lesley (interpretada por Catherine McCormick). No meio da viagem, a moça encontra um manuscrito que conta a história do escritor com a sua mãe, gancho esse que nos remeterá a Polônia e à infância difícil do escritor. A mãe de Gary, Nina (interpretada de forma magistral por Charlotte Gainsbourg, talvez o melhor papel de sua carreira) era extremamente zelosa com o filho, acreditando sempre que ele seria uma grande pessoa: ora um diplomata, ora um escritor, ora um chefe de estado.
Essa crença (ou certeza) do futuro promissor do filho fazia, também, que ela fosse muito exigente e até dura com o menino que, mesmo assim, a amava incondicionalmente e se dedicava muito a corresponder às aspirações da mãe. A vida dos dois foi uma verdadeira roleta: da fria Polônia, eles foram para Nice, onde Nina passou a administrar um hotel. Mais tarde, Gary foi para Paris estudar, sempre escrevendo e buscando publicar suas obras com algum sucesso, chegando até a posição de combatente na Segunda Guerra Mundial e herói de guerra (e sempre escrevendo).
Esse é um filme que tem um certo tom de comédia, mas apenas em momentos mais pontuais. A vida de nosso Roman Kacew foi um tanto atribulada e nosso protagonista tinha uma tendência para a depressão e para a tragédia. Pode-se dizer que não há muito espaço para o “happy end” aqui, sobretudo nos créditos finais quando, com a ajuda de algumas fotos reais, é dito o que aconteceu com o escritor depois dos eventos exibidos no filme. De qualquer forma, é uma incrível história de vida.
Com relação ao desempenho dos atores, Pierre Niney fez um bom trabalho, prendendo a atenção do espectador com sua atuação, ora muito dramática, ora bem engraçada, ora angustiante. Mas ninguém consegue nesta película chegar à altura de Charlotte Gainsbourg, que roubou a cena de forma arrebatadora, fazendo uma matrona muito coruja, que podia ser bem afável, bem terna, mas também extremamente rígida e até violenta, com uma dose muito bem medida de insanidade. A gente fica maravilhado com a personagem, pois a atriz é tão cativante que fica impossível a gente não ver com carinho essa verdadeira mãezona, por mais constrangedora que ela possa ser em alguns momentos para o filho na frente dos outros. Dá para entender a ligação imediata dos dois, que sempre seguraram pesadas barras juntos e com a mãe sempre valorizando o filho. Eles realmente formavam uma boa equipe que encaravam as mazelas da vida de peito aberto.
Assim, “Promessa ao Amanhecer” é um filme que vale a pena a conferida do espectador, principalmente por causa do trabalho de Gainsbourg, mas também pela incrível história de vida que podemos presenciar, com doses relativamente fortes de melancolia. Um programa imperdível.
Batata Séries – Jornada Nas Estrelas Voyager (Temporada 6, Episódio 6). Charadas. Tuvokinho Paz E Amor.
O sexto episódio da sexta temporada de “Jornada nas Estrelas Voyager”, “Charadas” (“Riddles”), é um daqueles episódios de personagem. Ou melhor, de personagens. E aqui são duas figuras muito antagônicas, cujo relacionamento inusitado pode dar caldo para boas histórias. Isso mesmo, caro leitor trekker, acho que você já adivinhou: Neelix e Tuvok. Visto de forma um pouco torta por alguns, Neelix é o sujeito mais boa praça da nave (e, talvez, o mais esculachado por isso por conta da incompreensão humana). Ele é uma pessoa sempre aberta a ajudar ao próximo e a se envolver com os problemas dos outros. Por que será, então, que ele é visto com tanto pouco caso já que, talvez, ele seja o personagem que mais represente os ideais da Federação em termos de tolerância, diversidade e respeito? Por causa de ser, também, uma espécie de alivio cômico que alguns podem considerar inoportuno? Deixo a questão em aberto e ficaria estimulado a discuti-las com vocês.
Mas, do que se trata essa boa história? Neelix e Tuvok estão em missão diplomática (tentam fazer acordos entre duas raças alienígenas) na Delta Flyer. O cozinheiro tenta brincar de charadas com o vulcano que, muito a contragosto, participa. Mas Tuvok detecta uma anomalia no interior da nave que se revela um alienígena infiltrado e camuflado que o ataca e lhe provoca danos na sua atividade cerebral. O vulcano então fica com amnésia, não sabendo quem é e com uma alta instabilidade emocional e insegurança. Ele registrou no tricorder uma frequência que era a da camuflagem do intruso, mas o aparelho foi destruído. Essa frequência será fundamental para tirar a camuflagem dessa espécie e um trunfo para o sucesso da missão diplomática, sendo imperativo que Tuvok a recorde. O problema é que o vulcano está ainda em confusão mental e será essa a oportunidade que Neelix terá para se aproximar de seu colega, que se revelará uma figura extremamente doce e afável. Mas Neelix sabe que o mais justo para Tuvok será recuperar sua mente, conhecimento e personalidade anteriores. Será um processo um tanto doloroso em que Neelix será um apoio fundamental para o vulcano desamparado e inseguro.
Bom, dá para perceber que a querela alienígena do episódio é apenas um apoio para a história principal, que é o relacionamento de Tuvok com Neelix nesse momento de fragilidade do vulcano. Essa trama é muito interessante no sentido de que, volta e meia vemos situações como essa ocorrendo por aí. Uma pessoa que trata a outra com arrogância e até uma certa empáfia, que, de repente, por essas maldades que a vida faz, fica doente e impossibilitada, totalmente dependente da pessoa que foi sistematicamente maltratada. E a vítima desse relacionamento, ao invés de ser crua e vingativa, lança mão de continuar a tratar quem a tratou mal com afeto e ternura, não demonstrando qualquer rancor, ato extremamente nobre e até difícil de se fazer, algo que ainda dá esperança para o que é ser humano. Na minha modesta opinião, esse episódio engrandece demais o personagem Neelix aos olhos dos seus críticos mais duros e mostra o que é o propósito de Jornada nas Estrelas, que é uma visão positiva do ser humano e do ato de humanidade. Só é curioso que um alienígena tenha tido essa postura com outro, não havendo nenhum humano no meio. De qualquer forma, é um episódio que abre muito espaço para a reflexão e que nos obriga a fazer uma autoavaliação de como nós procedemos para com as pessoas que estão a nossa volta. Só essa contribuição já faz o episódio ser muito especial e nos ajuda a melhorar como indivíduos.
O mais curioso foi ver que, mesmo que Tuvok tenha voltado a ser o que era antes, ele ainda dá um sinal a Neelix de que a forma como foi tratado pelo colega não está esquecida, e aquele vulcano doce e inseguro, que fazia sobremesas muito gostosas, ainda está lá dentro do monumento à lógica que é esse personagem amado por muitos, mas também questionado por outros.
Dessa forma, “Charadas” é mais um episódio da sexta temporada de “Jornada nas Estrelas Voyager” que merece a atenção dos trekkers de plantão, por ser meio que um tapa na cara de nossa arrogância para com o próximo. Veja e procure se entender com a pessoa que você não dá muita bola, que acha chata, etc. A gente sempre tem um Neelix à nossa volta que não damos muita ideia, e não sabemos o que estamos perdendo.
Batata Literária – Crônicas de Bruxarias
Duas asas de morcego!
Três pernas de aranha!
Dois pelos de barba de bode e… voilá!
Está pronta a poção mágica!
Vou tirar minhas perebas!
Todas as acnes!
O tom esverdeado de minha cútis!
Assim, atingirei o meu grande objetivo!
E qual é esse objetivo?
Claro! Conquistar o príncipe encantado!
E tirá-lo daquela loura sem sal que é a princesa
Quero desmoralizar toda a Borgonha
E colocar a queridinha do rei para titia!
Ih, ih, ih, como sou diabólica!
A Família Real toda chorará rios de sangue!
E eu vou terminar com o gostosão!
Tudo dava certo no plano!
Me infiltrei na corte!
O príncipe me viu
Largou a branquela sirigaita
E comigo se casou!
A moçoila para titia ficou
O rei se rasgou
E para a Lua de Mel lá eu vou!
Mas… raios! Foi aí que a coisa degringolou!
O efeito da poção passava
Tudo voltava a ser como antes…
Só que, aos poucos, de baixo para cima
Aí, nas núpcias eu me ferrei
Assim que o príncipe, para lá olhou
Ele, num pulo, se mandou
Pois ninguém até hoje uma clitóris verde beijou!
Batata Movies – Venom. Uma Interessante Releitura.
E finalmente temos “Venom”, com Tom Hardy no papel principal. Ok, as pessoas têm uma certa resistência com produções da Marvel encabeçadas pela Sony. O bonequinho do “O Globo” não foi nada gentil com o filme. Mas devo dizer que, em minha opinião pessoal, gostei muito, embora seja um pouco suspeito para falar já que gosto muito do personagem e sempre esperei pelo dia em que ele tivesse um filme solo decente. A ideia aqui é justamente fazer uma defesa dessa película, já que a crítica especializada a esculhambou tanto.
Como a trama foi construída? Eddie Brock (interpretado por Hardy) é uma espécie de repórter freelancer que usa o Youtube e seu celular para fazer reportagens que vende para um grande grupo de mídia. Um belo dia, seu chefe pede para fazer uma entrevista bem simples e rápida com Carlton Drake (interpretado por Riz Ahmed, que participou também de “Rogue One”), o presidente de uma empresa que realiza pesquisas científicas. Mas Brock fica meio contrariado, pois há rumores de que o empresário usa indigentes como cobaias humanas para seus experimentos científicos e que muitas pessoas morrem nesse processo.
Por intermédio de sua namorada Anne Weying (interpretada por Michelle Williams) ele consegue a entrevista, mas faz as perguntas que não devia, provocando sua demissão, a de sua namorada e, de quebra, o fim de seu relacionamento, deixando-o desempregado e amargurado. Meses depois, Brock é procurado por uma das médicas da empresa de Drake e diz que pessoas estão morrendo sim, pois elas são expostas a um simbionte alienígena altamente agressivo. Brock irá invadir o complexo e acaba sendo invadido por um desses simbiontes que começa a falar com o repórter, se intitulando Venom. Drake vai querer seu simbionte de volta e começará então uma perseguição com direito a muita bomba, porrada, tiro e, principalmente, cabeças devoradas por uma bocarra cheia de dentes afiadíssimos e com uma linguona bem inconveniente.
O grande barato desse filme é que temos uma releitura desse (anti) herói. A primeira coisa que logo chama a atenção é a ausência total do Homem Aranha na história, justamente por haver essa divisão do Universo da Marvel com a Sony no meio. De qualquer forma, se o fã mais fervoroso dos quadrinhos provavelmente se sentiu incomodado com essa ausência, por outro lado conseguiram criar uma história solo do Venom sem o aracnídeo que funcionou muito bem e deu autonomia ao protagonista sem aquela impressão dele ser uma espécie de escada para outro super-herói mais conhecido e consagrado.
Outra coisa que muito chamou a atenção foi a atuação de Tom Hardy e a construção do personagem Eddie Brock. Se nos quadrinhos, esse personagem é mais soturno e do mal, Hardy consegue fazer um Eddie Brock meio derrotadão, daqueles de desodorante vencido e sandálias que soltam as tiras, mas com um bom quê cômico.que ficou muito bom, sobretudo quando ele trocava umas ideias com o seu simbionte de estimação.
As falhas de caráter do personagem não foram exploradas de forma tão negativa, mas sim de uma forma positiva, dando a Brock uma pecha de cafajeste carismático e querido. Pena que o Venom em si apareça menos do que a gente gostaria até porque o protagonista quer vender mais sua imagem no filme, o que é algo inteiramente compreensível e que, pelo talento de Tom Hardy, é algo inteiramente justificável e necessário.
Uma coisa que incomoda um pouco é a duração do filme. Creio que, apesar dos 112 minutos de duração, ele poderia se estender um pouquinho mais e não se solucionar de forma tão rápida. Pelo menos, as duas cenas pós-créditos valem muito a pena e uma delas dá gancho para uma boa continuação. Agora é torcer para que o filme tenha fôlego para isso.
Assim, “Venom” é um bom filme para esse (anti) herói da Marvel, onde os efeitos especiais e as cenas de porrada, bomba e tiro ajudam muito. Mas o filme não seria bom se não tivéssemos a boa atuação de Tom Hardy no papel principal, reinventando um Eddie Brock sem ódio pelo Peter Parker. Vale a pena dar uma conferida.
Batata Movies – Papillon. Um Ótimo Remake.
O primeiro contato que tive com a história de “Papillon” foi lá na longínqua década de 80, quando o SBT (ou seria ainda a TVS?) exibiu a primeira versão do filme, de 1973. E que versão! Foi a primeira vez que a emissora de Sílvio Santos, então considerada uma espécie de “Patinho Feio” da televisão, exibiu, até onde me lembro, um filme de qualidade. Vejamos: o elenco tinha Dustin Hoffman e Steve McQueen, o roteiro era do lendário Dalton Trumbo e de Lorenzo Semple Jr, o mesmo que escreveu vários episódios do “Batman” do Adam West e o “Flash Gordon” lá de finais da década de 70 e início de 80, com trilha sonora do Queen (Flash! Ah ahhhhh!). Eu era muito novo quando vi esse filme e nunca mais o revi. Mas ficou na minha cabeça as cenas dos dois anos que “Papi” passou na solitária, onde ele era obrigado a comer baratas e lacraias (argh!).
Foi realmente um filme que vi há muito tempo e que ainda me lembro de algumas coisas por ter marcado. Qual não foi minha alegria ao ver outro dia no cinema um trailer de uma nova versão feita em 2017? Por isso mesmo, dei uma chegadinha ao Net Rio 5 para, com as parcas memórias da versão de 1973, ver o que essa nova versão tinha a oferecer.
A história (real) do filme é muito simples. Nosso amigo Henri ‘Papillon’(Papillon é borboleta, em francês) Charrière (interpretado por Charlie Hunnan) é um arrombador de cofres em Paris que acaba sendo emboscado por seus inimigos e injustamente acusado de assassinato, o que o leva a uma pena de prisão perpétua e uma espécie de “degredo” (expulsão definitiva) para um presídio na Guiana Francesa. Lá, as regras são muito claras. Quem tentar fugir, é morto. Se escapar para a floresta, morre de fome. Se tentar o mar, mata a fome dos tubarões. Se tentar fugir e for preso, dois anos na solitária. Mais uma tentativa de fuga e mais cinco anos de solitária e prisão perpétua na Ilha do Diabo.
Se matar um policial, execução na guilhotina. Neste cenário, Papillon, que já está ferrado com prisão perpétua mesmo, tentará fugir. E aí ele vai precisar de dinheiro, algo que outro detento mais rico (falsificava bônus de guerra), Louis Dega (interpretado por Rami Malek, o mesmo que fez Freddie Mercury em “Bohemian Rhapsody”) vai ter. O problema é que Dega é muito frágil e será um prato cheio para os detentos que querem matá-lo para conseguir seu dinheiro. Papillon vai fazer um trato com Degas e será uma espécie de guarda-costas em troca de um pagamento que vai ajudar a tirá-los da prisão. E aí o filme passa a ser a tentativa de fuga dos dois, não sem muitos percalços.
O filme é bom porque a história ajuda muito. Ela seguiu o roteiro do filme original. Mas houve alguns adendos. Não me lembro (e aí a minha memória pode me trair), por exemplo, no antigo filme, de ter visto a vida de Papillon na França, algo que aparece nessa nova versão. O desfecho da nova versão também é ligeiramente diferente. Já o restante do filme me pareceu ser muito fiel ao original, embora eu ache que a sequência da solitária ficou menos agressiva na versão nova (McQueen estava muito mais impecável e “degradado” na versão antiga, que realmente foi bem mais hardcore). Ainda assim, a versão de 2017 não decepciona e as atuações dos dois protagonistas foram muito boas, com um destaque para Malek que conseguiu ser um cara frágil e inseguro num ambiente muito hostil, mas mostrou uma explosão de violência que valeu o ingresso. Por seu personagem ter tido essas variações, a gente pode esperar que ele irá muito bem em “Bohemian Rhapsody”. Já Hunnan teve o fardo de ser comparado com McQueen e deu conta do recado, sobretudo nas suas simulações de loucura na solitária.
Assim, “Papillon” é um filme que vale muito a pena a conferida do cinéfilo mais exigente, que terá a oportunidade de ver um bom remake dessa conhecida película. Novos atores com boas atuações, uma história que foi tratada fielmente e com boas extensões que não desfiguraram a obra e, inclusive, a incrementaram. Programa imperdível.
Batata Jukebox – It´s a Mistake (Men at Work)
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