Mais um tesouro…
Autor: Carlos Lohse
Batata Movies – Oh, Lucy! Do You Speak English?
Uma co-produção Japão/Estados Unidos. “Oh, Lucy!” é um filme sobre rumos que tomamos em nossas vidas. Um filme que pode nos mostrar quanto o humano é bom ou cruel. Um filme de temática ácida e não muito feliz. Mas um filme que nos faz refletir.
A história gira em torno de Setsuko (interpretada por Shinobu Terajima), uma senhora de meia idade que tem um empreguinho ordinário numa empresa. Ela tem uma sobrinha, Mika (interpretada por Shioli Kutsuna), que pede que ela assista a uma aula de inglês em seu lugar. A moça já combinou de pagar todo o curso e não pode quebrar o contrato. Setsuko vai numa aula grátis e conhece o professor americano John (interpretado por Josh Hartnett) que tem um método, digamos, peculiar para a cultura japonesa: ele dá nomes em inglês para seus alunos e pede que eles se cumprimentem e se abracem ternamente. Setsuko irá praticar isso com seu professor e outro aluno, que terá o nome americano de Tom (interpretado por Koji Yakusho). A senhora, que tem uma vida sem graça e solitária, vai ficar maravilhada com a pedagogia do professor John. Entretanto, quando ela volta para a segunda aula, descobre que John não mais trabalha lá e que retornou para os Estados Unidos. Desolada, ela sai do curso e, na rua, ainda consegue ver John indo embora com Mika. Setsuko procura a mãe de Mika, sua irmã Ayako (interpretada por Kaho Minami) e descobre que a mãe nem está aí para o paradeiro da filha. Mas Setsuko recebe um postal de Mika. Ayako visita Setsuko para lhe dar o dinheiro do curso de inglês e descobre onde a filha está pelo endereço do postal. Setsuko pede férias para ir atrás de John e Mika, sendo que Ayako também vai. Ao chegarem aos Estados Unidos, as vidas de Setsuko, Ayako, John e Mika nunca mais serão as mesmas.
A primeira coisa que chama a atenção no filme é a crueza das relações humanas entre os japoneses. Suicídios, cinismos, solidão, dureza, tudo isso parece fazer parte do cotidiano dos japoneses, onde tem-se a impressão de haver um exagero ao se montar tal estereótipo. E, como redenção a todas essas características negativas, a cultura do abraço e do afeto, ensinada por um americano, cuja cultura também sabemos que não prima muito pelo contato físico. Dessa forma, tal diferenciação cultural soou um tanto artificial, exceto pela professora substituta de John, que logo rechaçou a pedagogia do abraço. De qualquer forma, esse era o elemento necessário para se dar um pouco mais de graça à vida vazia e seca de Setsuko, e ajudá-la a sair do estado de letargia. O problema é que, ao tentar ter uma vida mais leve e colorida, Setsuko entra em atrito com os demais personagens pelos mais variados motivos. E aí é que a gente vê o elemento humano se digladiando em todos os seus defeitos e empáfias, o que faz com que todos se machuquem muito. Se esse filme tem poucos e leves momentos engraçados, progressivamente a história vai ficando tensa e pesada, onde o ego inflado de cada um leva a situações mais e mais tensas e angustiantes. Dessa forma, podemos dizer que “Oh, Lucy!” é um filme triste, embora um esboço de “happy end” se vislumbre no ar, algo pouco suficiente para o sofrimento visto ao longo da exibição.
Uma curiosidade aqui foi ver o nome de Will Ferrell na produção. Associado a filmes de humor, Ferrell consegue levar a cabo aqui um projeto bem mais marcado por um conteúdo fortemente dramático. O tom de drama regado em desesperança chama a atenção e ver o nome de Ferrell envolvido nisso não deixa de ser uma surpresa, muito boa, aliás.
Assim, “Oh, Lucy!” é um bom filme. Um drama forte, tingido com tristeza e desesperança, provocado pelo egoísmo das pessoas que se machucam umas às outras. Um filme que exagera um pouco em estereótipos que servem para contextualizar construções de personagens. E um filme que nos faz refletir como devemos tratar o próximo, sem direito a cinismos ou más intenções matreiras de machucar a outrem. Vale a pena dar uma conferida.
Batata Movies – 10 Segundos Para Vencer. Agora É Na Real.
Um grande filme brasileiro sobre uma grande personalidade de nosso esporte. “10 Segundos Para Vencer”, de José Alvarenga, fala da trajetória do pugilista Éder Jofre, um dos dez maiores boxeadores de todos os tempos. Estrelado por Daniel de Oliveira e Osmar Prado, essa cinebiografia lembra grandes filmes sobre esse esporte tais como “Rocky”, “Creed” e “O Campeão”, com a grande vantagem de que temos uma história real aqui que nada fica a dever às fantasias da ficção.
Podemos ver nessa película, a vida de Jofre (interpretado por Oliveira) desde a infância até a conquista de seu segundo título mundial (Jofre foi campeão mundial em duas categorias – peso galo e peso pena – uma proeza considerada rara no mundo do boxe) aos 37 anos, sempre do ponto de vista do relacionamento com seu pai, Kid Jofre (interpretado por Prado), um treinador que exigia muita, mas muita dedicação, o que atrapalhava a vida de nosso protagonista com sua esposa Angelina (interpretada por Sandra Corveloni). O grande mote da história é justamente esse: Jofre continua se dedicando mais à profissão do que à família ou ele abandona o boxe para estar mais perto de sua esposa e de seu filho? Qualquer uma das opções que ele abrace pode trazer pontos positivos e negativos.
O filme também lança mão de imagens de arquivo, onde vemos lutas reais de Jofre com os seus oponentes, intercaladas com imagens tratadas por CGI (para parecerem velhas imagens de arquivo) onde Oliveira e Prado simulam as vitórias do famoso pugilista. Essa é uma escolha interessante, pois dá uma certa legitimidade à coisa, além de nos aproximar com o Éder Jofre real. Ao final da película, uma série de fotografias de Éder, seu pai Kid e sua família aparecem, nos aproximando mais ainda da realidade que o filme buscou ilustrar.
E os atores? Mesmo com Oliveira sendo o protagonista e atuando muito bem, esse filme definitivamente tem um nome: Osmar Prado. Sua atuação foi simplesmente impecável como Kid Jofre, o pai durão que não media esforços para tornar o filho um grande pugilista. Mas, ao contrário do que pode parecer, sua atuação não foi plana, mesmo que o personagem pareça ser de uma característica só.
O velho durão também aparentava fraqueza já na idade avançada com os problemas do pulmão agravados pelo fumo compulsivo. Vemos momentos, também, onde lágrimas sinceras brotam dos olhos do velho, ou a voz embargada quando conversa com o filho antes da luta que irá consagrá-lo com o segundo título mundial. Ou seja, Prado consegue fantásticas nuances emocionais em seu personagem, confirmando todo o talento que tem.
Assim, “10 Segundos Para Vencer” é um filme importantíssimo para nos recordar desse grande ídolo de nosso esporte, que é Éder Jofre, assim também como para apresentá-lo às futuras gerações. Temos um Daniel de Oliveira em boa atuação, pegando o sotaque e os trejeitos de Jofre mas, sem a menor sombra de dúvida, esse é um filme para a gente ver Osmar Prado atuando, o que já vale o preço do ingresso. Um ótimo filme brasileiro e um programa imperdível.
Batata Literária – A Irmandade.
A tarde caía
Os monges andavam pelo deserto ainda quente
Logo, viria a noite
Trazendo o prenúncio da morte
O pequeno e árido planeta logo seria pulverizado
Pelo braço flamejante
Era uma remanescente de supernova
Que se aproximava rapidamente do sistema planetário
Tal sistema era praticamente desabitado
Só um punhado de monges exilados
Vivendo no mais rude e medíocre dos planetas
Postos ali por seu próprio povo natal
Que abraçou a ciência e aboliu a fé
Expulsando os últimos remanescentes religiosos
Os monges mantiveram sua fé a duras penas
Mas agora seriam definitivamente dizimados
A quinta estrela do sistema aglomerado de Jaliel explodiu
Varrendo tudo o que vê pela frente
Os velhos monges apelaram para o Deus Kosh
Pediam a salvação de suas almas
Mas, acima de tudo, a preservação de suas vidas
Pois eram os últimos fiéis do grande Kosh e de suas palavras
Por que a irmandade remanescente
Seria ironicamente dizimada por outra remanescente?
Todas as noites, os monges saíam em peregrinação pelo deserto
Para encarar de frente o inimigo que vinha do céu
Perante o símbolo de grande morte
Os monges oravam a Kosh, pedindo por suas vidas
Mas a gigantesca chama se tornava cada vez maior
Banhando o céu noturno com um luminoso vermelho sangue
Trevas rubras mortais ameaçavam engolir os fiéis
Que, impassíveis, assistiam ao trágico espetáculo agarrados às suas crenças
Até que, um dia, a noite estava muito quente
Não estava mais escuro
Todo o céu tomado pelo rubro letal
Um calor insuportável e cheiro de morte
Nenhum sinal de Kosh e sua redenção
Os monges perdiam as esperanças…
A onda de choque já era visível,
Um véu branco, translúcido, que crescia
Vinha de longe, bem pequeno,
E se tornava cada vez maior,
Maior, maior, até que…
Todo o céu ficou coberto daquele véu branco,
Com o grande avermelhado por trás…
Começava a ventar…
Tempestades de areia derrubavam os monges…
Quem não havia ainda perdido os sentidos podia ver…
A onda de choque desabava rapidamente sobre o deserto…
Até que… uma explosão!
E tudo se silenciou…
Era o fim?
Só um véu negro e… o nada…
Parecia que muito tempo havia se passado…
Uma eternidade, talvez…
Mas eis que, de repente, surge uma luz…
Os monges ainda estão todos lá
E caminham em direção à luz
Chegando a ela, encontram uma silhueta
Era Kosh!
“Venham meus filhos”, disse o Deus, “Agora vocês levarão minha palavra a toda Jaliel”
“Vocês viajarão mais rápido que o pensamento
E estarão em todos os corações e mentes
Conciliando a fé com a razão”.
Batata Movies – Lámen Shop. Unindo Culturas E Famílias Pela Gastronomia.
Um interessante co-produção Singapura/Japão/França. “Lámen Shop”, de Eric Khoo, é um filme sobre culinária oriental e encontros. Uma doce e fofa película que fala, também, da família de forma muito terna. Mas que também pode desenterrar sérias feridas do passado. Falemos, agora, desse filme, sempre lembrando que usaremos spoilers aqui.
Vemos aqui a história de Masato (interpretado por Takumi Saito), um rapaz que trabalha com seu pai num restaurante lámen no Japão. Aqui no Brasil o termo lámen foi ridicularizado como miojo, aquele macarrãozinho barato com o maldito tempero que é uma sopa de química pura e que a gente come quando está sem grana. No Japão, ele era visto como um mero “macarrão chinês”, mas pouco a pouco ele foi se introjetando na culinária local ao ponto de se tornar um prato muito conhecido e restaurantes especializados em pratos com lámen proliferarem pelo país. Mas, voltando ao nosso protagonista, Masato tem uma relação distante e fria com o seu pai, um homem amargurado desde a perda da esposa. Um dia, o pai de Masato falece e, ao mexer em suas lembranças, ele vê muitas coisas de sua mãe, inclusive um caderno todo escrito em mandarim por ela, uma língua que Masato não conhece.
O rapaz tem vagas lembranças de sua estadia com a mãe em Singapura. E aí, ele decide procurar seu tio nesse país. Lá, ele consegue achar o tio e lhe pede para ensinar o prato típico da região, o Bak kut teh. Masato troca figurinhas com os chefs locais, ensinando sopas e lámens, enquanto aprende a culinária de Singapura. Mas, o que parece uma idílica farra gastronômica asiática também tem seus dissabores. A avó de Masato não quer conhecê-lo, pois ele é de origem japonesa e Singapura foi invadida pelo Japão em 1942, quando seu marido foi assassinado pelos nipônicos. Masato, então, terá um certo trabalho para se aproximar de sua avó.
Apesar do clima de tensão entre Masato e sua avó, boa parte do filme se passa em brancas nuvens, com relações muito ternas entre os personagens e as receitas orientais sempre cimentando tais relações. Os atores trabalharam de forma muito suave e deu gosto de ver o trabalho de todo o elenco. Já a lembrança do ataque japonês, que era a potência imperialista da região, foi muito oportuna e pertinente, ainda mais porque tal beligerância era o fator que partia a família e trazia dor aos seus membros. E qual foi a melhor forma de combater isso? Isso mesmo, caro leitor! Com a comida! Assim como o lámen era uma comida que, pouco a pouco conquistou o público médio japonês, o Bak kut teh era uma comida das classes menos favorecidas em Singapura e se tornou uma espécie de ícone nacional (tal como a nossa feijoada por aqui). Esses dois pratos se tornaram uma espécie de embaixadores das duas culturas para promover o entendimento entre os povos do Japão e de Singapura, estancando as feridas do passado. São as duas culturas outrora inimigas voltando a interagir através da gastronomia.
Assim, “Lámen Shop” é um filmaço sobre o entendimento e a tolerância entre duas culturas. Um filme de atuações muito suaves e cativantes. E um filme de dar água na boca (toda a comida que vemos lá parece ser muito gostosa!). Um programa imperdível.
Batata Movies – Buscando… Sulu Stalkeando.
Um curioso filme vindo lá dos lados dos Estados Unidos. “Buscando…” é uma película que propõe trabalhar o gênero de suspense com uma temática muito atual atrelada à internet e às redes sociais. Com isso, o filme vai lançar mão de uma estética pouco usual: ele se passa totalmente dentro de uma tela de computador, como se o espectador estivesse sentado à própria máquina.
Vemos aqui a história de uma família, destroçada por uma doença. Um pai, David Kim (interpretado pelo “Sulu” John Cho), a mãe Pamela (interpretada por Sara Sohn) e a filha Margot (interpretada na adolescência por Michelle La). Pamela morrerá de câncer, deixando pai e filha sozinhos. Um belo dia, Margot diz que vai passar a noite na casa de amigos para estudar para uma prova e… desaparece, deixando David atordoado.
Ele entra em contato com a polícia e vai contar com a ajuda da investigadora Vick (interpretada por Debra Messing) para encontrar sua filha. Enquanto a policial faz as investigações de campo, David segue plugado no seu PC e no de sua filha stalkeando tudo o que vê pela frente para encontrar pistas do paradeiro de Margot. E aí, uma trama de suspense é desenhada.
A grande atração do filme é justamente essa estética baseada no que a gente vê nas telas de computador por aí, com direito a muitas consultas no Google ou conversas no whatsapp. Mas nada disso seria de muita serventia se não houvesse um roteiro bem escrito aqui. A história prende a atenção do espectador do início ao fim, mesmo que alguns possam achar o desfecho um pouco óbvio. De qualquer forma, a investigação das pistas pode assumir caminhos tortuosos, onde problemas muito contemporâneos tais como notícias e perfis fakes levam a perseguição de pistas erradas, introduzindo um elemento relativamente novo nessa proposta de suspense, o que ajuda a tornar a história ainda mais interessante.
Com relação aos atores, não há muito o que dizer. Nada de medalhões. O único ator que chama mais a atenção é John Cho, que interpreta o protagonista David Kim, e ainda sim porque ele é conhecido por ser o Sulu do “Star Trek de J. J. Abrams”. Pelo menos foi legal o ator ter a oportunidade de mostrar o seu talento num personagem que passa por várias situações espinhosas, como a perda da esposa e o sumiço da filha, embora sua atuação, se não comprometeu, também não teve nada de muito espetacular.
Assim, “Buscando…” é uma boa história de suspense, que consegue prender a atenção do espectador por despertar grande curiosidade. A gente tem a oportunidade de ver um gênero tão usado no cinema lançando mão de uma nova roupagem, que é o meio cibernético, trazendo elementos novos para a construção da narrativa como os perfis e notícias fakes. E um filme que mostra de forma definitiva como é o exercício de se stalkear tudo o que se vê pela frente. Vale a pena pelo roteiro e pela curiosidade.
Batata Jukebox – Quimeras (Zero)
Eu gosto muito dessa música…
Batata Jukebox – Suedehead (Morrissey)
Uma das primeiras solo do Morrissey