Réquiem para um compositor…
Autor: Carlos Lohse
Batata Arts – Tesouros da Batata (63)
Outro tesouro!!!
Batata Movies – Aliados. Dormindo Com o Inimigo?
O Oscar do ano passado teve outro concorrente que foi indicado, mas não levou. “Aliados”, do lendário Robert Zemeckis, concorreu à categoria de Melhor Figurino e é mais um daqueles filmes que abordam o inesgotável tema da Segunda Guerra Mundial. É uma história de espionagem e drama, com direito a uma enorme pulga atrás da orelha.
Vemos aqui a história de Max Vatan (interpretado por Brad Pitt), um espião que tem uma missão a ser realizada em Casablanca (só para ficar no climão dos filmes de guerra): eliminar o embaixador nazista. Para isso, ele fará contato com Marianne Beauséjour (interpretada pela sempre bela Marion Cotillard), uma outra espiã que será a sua “esposa”. Como o casal também é constantemente vigiado por espiões nazistas, os dois precisam fazer de tudo para parecerem marido e mulher o tempo todo, o que provoca uma atração entre os dois espiões. Chega o dia do atentado e tudo ocorre de forma bem sucedida. Aliás, a coisa foi até bem sucedida demais, pois o casal nem foi perseguido quando fugiu da cena do atentado. Os dois, então, decidem casar de verdade e têm uma filha, morando na Inglaterra, numa época em que o país era severamente bombardeado pela Força Aérea Nazista.
Mas um dia, a vida de Max vai realmente virar de cabeça para baixo quando seus superiores o chamam e dizem a ele que há fortes indícios de que sua esposa é uma espiã alemã. Isso será checado e, caso a esposa seja realmente a espiã, o próprio marido terá que matá-la, caso contrário ele será acusado de alta traição e fuzilado. Simples assim. A partir desse momento, Max vai começar uma corrida contra o tempo para investigar toda a situação e concluir se sua esposa realmente é uma traidora ou não.
Ufa, dá para perceber como a coisa é angustiante e dramática, dando a esse filme cores fortes de drama. Imagine a situação de você dormir com o inimigo, a mãe de seus filhos, e ainda ter que executar a pessoa que ama? Isso foi de uma agonia extrema, e todo esse tormento só poderia ser parcialmente aliviado, tanto para o protagonista quanto para o espectador, por uma busca pela verdade, pois se Max descobrisse se sua esposa era uma traidora ou não antes de seus superiores, ele teria uma margem um pouco maior de autonomia para lidar com a situação e tempo para decidir o que fazer. Aí entra o outro gênero do filme, baseado na investigação e na espionagem, que alivia o forte peso do drama envolvido.
Essa parte da investigação deixa o filme bem instigante, onde o voyeurismo tomava ares muito intensos em alguns momentos e a busca por pistas e paradeiros em pleno ambiente da guerra, onde até linhas inimigas tinham que ser atravessadas, davam à película leves tons de ação, embora não possamos dizer que esse filme possa ser propriamente considerado de ação.
E a indicação ao Oscar de Melhor Figurino? Creio que ela foi acertada, principalmente quando vemos o vestuário de Marion Cotillard. Ela estava simplesmente deslumbrante e elegantérrima, provocando uma babação geral no público masculino. Sua atuação também foi primorosa, chegando a engolir Brad Pitt em alguns momentos.
Não que o casal como um todo não tenha tido uma boa química (foi muito bom ver os dois atuando), mas a natureza mais complexa da personagem de Cotillard, que teve que ser uma espiã assassina fria, uma esposa apaixonada, uma mãe devotada e uma mulher frágil, lhe deu muito mais chances de demonstrar todo o seu talento em contrapartida ao personagem de Brad Pitt, muito mais plano em suas características. E, cacilda, que mulher bonita é Marion Cotillard! Devoção de “star system” puro! A gente realmente vai ao cinema para ver essa linda atriz francesa!
Assim, “Aliados” é uma película e tanto, com uma boa história onde o forte drama é atenuado por um bom filme de espionagem e ainda temos o privilégio de idolatrar Cotillard em toda a sua exuberância, ajudada pelo excelente figurino, digno da indicação que recebeu ao Oscar. Vale muito a pena assistir.
Batata Movies – Lion, Uma Jornada Para Casa. Busca Insólita.
“Lion, Uma Jornada Para Casa”, foi um filme que concorreu ao Oscar no ano passado (mas não levou nenhum). Dirigido por Gath Davis, ele concorreu, na época, a seis estatuetas (melhor filme, ator coadjuvante para Dev Patel, atriz coadjuvante para Nicole Kidman, trilha sonora, roteiro adaptado e fotografia). Apesar de não premiada, essa película nos traz boas recordações. Esse é mais um daqueles filmes baseados numa história real, que deixam as pessoas maravilhadas de como a vida imita a arte. Uma história não muito simples que amplifica aos nossos olhos uma tragédia pessoal que precisa de um desfecho. Lembrando sempre que, como é um filme de mais longa data, tomarei a liberdade de usar spoilers.
Vemos aqui a trajetória do pequeno Saroo (interpretado por Dev Patel em sua fase adulta), um menininho que vive no interior da Índia com seu irmão mais velho, sua mãe e sua irmãzinha caçula. Os dois irmãos vivem de fazer pequenos biscates na rua, trazendo sempre um pouco de leite ou algumas frutas para a mãe, que trata a todos com muito carinho. É o ano de 1986 e a pequena família vive em situação de miséria extrema. Um belo dia, Saroo e seu irmão vão para uma estação de trem de madrugada para procurar algum biscate. O irmão mais velho deixa Saroo na estação, não sem antes pedir ao garotinho que fique onde está. Mas o irmão demorou para voltar e Saroo, ao procurá-lo, acabou entrando num trem vazio e adormeceu. O problema é que o trem deu a partida e andou por muito tempo até chegar a Calcutá, muito longe da terra natal de Saroo. Ele vai viver como menino de rua, até que vai parar numa espécie de reformatório. Dali, ele irá para a Austrália, onde foi adotado por um casal. Os anos passaram e Saroo cresceu, tornando-se um rapaz que queria fazer hotelaria. Mas, ao entrar em contato com alguns colegas de origem indiana, Saroo ficou com vontade de procurar sua família original na Índia, tarefa um tanto difícil, já que ele tinha uma lembrança apenas muito vaga do vilarejo em que morava e nem sabia onde ele ficava localizado na Índia.
Esse é um filme que se apoia numa bela história. A saga de Saroo para encontrar sua família original tem lances muito dramáticos, despertando uma série de dores que atingiam principalmente o protagonista, mas também todos os que estavam à sua volta. Pode-se dizer que esse momento mais angustiante tornou a história também um pouco morosa, e assim sentimos uma relativa descontinuidade no roteiro (as sequências da infância de Saroo eram mais instigantes num ritmo rápido, e o desfecho foi emocionalmente muito intenso; no meio de tudo isso, uma parte lenta e depressiva, que foi a busca).
O filme também se ampara no bom elenco. Dev Patel merece a indicação a melhor ator coadjuvante, apesar de ser o protagonista principal do filme (estratégias da Academia), mostrando que não é mais um carinha simpático que apareceu em Hollywood.
Ele conseguiu trabalhar muito bem os sentimentos bem díspares de seu personagem, indo de uma amabilidade muito grande, passando a uma angústia profunda, com pitadas de uma melancolia inerte. Agora, a grande surpresa foi ver Nicole Kidman no papel da mãe adotiva de Saroo, uma distinta senhora idealista que buscava dar um lar à crianças que sofriam neste mundo. Podemos dizer que a química entre Kidman e Patel foi perfeita neste relacionamento entre mãe e filho, sendo que as sequências em que os dois apareciam contracenando juntos eram os grandes presentes que esse filme nos dava. E não podemos nos esquecer da presença de Rooney Mara, que fazia a namorada de Saroo, uma personagem que acompanhou de perto as angústias do namorado.
Assim, “Lion, Uma Jornada Para Casa” é um bom filme que apostou numa história real, inserindo forte carga dramática, um modelo que, volta e meia se repete, mas que aqui foi bem trabalhado. Esse também é um filme de ator, onde vamos alegres ao cinema para vermos as atuações de Dev Patel e Nicole Kidman. Vale a pena procurar o DVD ou no Youtube.
Batata Literária – Fome
Estou com fome
Muita fome!
Mas por que isso?
Falta de grana?
Ah, só um pouquinho…
Mas tenho dinheiro para comer um joelho
Lá no chinês da esquina
Só que não como…
O motivo da minha fome é outro
É o peso do meu corpo
É a necessidade de emagrecer
A sociedade não gosta dos gordos
Daí, eu precisar ficar fininho
Pois, só assim eu fico gatinho
E não sou mais olhado de forma torta
Ao ser aceito, minha alma se conforta
Mas esse não é o único motivo
Sou vítima da diabete
Se como, morro
Se não como, morro
O açúcar é o meu baygon
Até as comidas mais leves e saudáveis viram açúcar
Meu corpo já nasceu condenado
A um rosário de moléstias inclementes
Por isso, fecho a minha boca
Me livro, por ora, das garras melíticas
Mas caio no colo das úlceras e gastrites
E meu estomago dói intensamente
Em tempestades de azia
Fico eu mole, e fraquejo
Mas não estou cuidando de minha saúde?
Acho que eu enlouqueço…
Batata Movies – Cães Selvagens. Um Crime Que Não Compensa.
Imagine você testemunhar Nicolas Cage e Willem Dafoe trabalhando juntos. Para o primeiro, é uma boa oportunidade, depois do baque que ele sofreu em sua carreira (a gente tem visto o ator aparecendo até de forma muito obscura como coadjuvante de luxo em alguns filmes por aí). Já para o segundo, é mais uma película de sua boa e muito prolífica carreira. Mas, para um enorme azar de Cage, a coisa não deu muito certo. E olha que o filme foi dirigido por Paul Schrader, responsável por roteiros como “Taxi Driver” e “Touro Indomável”.
Vemos aqui a história de três ex-presidiários, Troy (interpretado por Cage), Mad Dog (interpretado por Dafoe) e Diesel (interpretado por Christopher Matthew Cook). A ideia inicial do trio é retomar uma vida normal longe da criminalidade. Mas a verdade é que, em nenhum momento, eles saem do submundo. Troy quer levar uma prostituta para passear em Nice, mas a moça declina do convite. Mad Dog está tão ensandecido em sua ânsia de matar que ele nem consegue, digamos, relaxar. E Diesel até tenta engatar uma conversa com uma moça que não pertence ao submundo, mas é também um tanto perturbado e não consegue. O que resta aos três? A velha vida de crimes e trabalhos sujos que vão lhes render um parco dinheiro. Mas como é dito por aí, o crime não compensa. E então…
O filme tem influências. Tarantino é uma delas, embora a coisa pareça um decalque mal feito, pois Tarantino consegue combinar com maestria grandes paroxismos de violência com um humor negro escrachado. Já “Cães Selvagens” têm uma violência explícita e é só, violência essa onde os personagens usam e abusam da maldade contra inocentes, não despertando qualquer simpatia do público, muito pelo contrário. A gente quer o tempo todo que os caras se ferrem de verde e amarelo, tamanhas as atrocidades psicóticas que eles cometem. Esse filme lembra, também, e guardadas as suas devidas proporções, a película de Fritz Lang “Vive-se Só Uma Vez”, estrelada por Henry Fonda e Sylvia Sidney, onde um ex-presidiário (interpretado por Fonda) busca recomeçar a sua vida com a namorada (interpretada por Sidney), mas a marca de criminoso na vida do personagem de Fonda criou uma barreira entre o protagonista e a sociedade, dando um desfecho trágico ao casal. Aqui a temática do ex-preso que não consegue se ressocializar por preconceito é repetida, mas explorada de forma muito mais pobre que no filme de Lang, já que os três personagens protagonistas praticamente não saem da vida marginal quando fora da cadeia. E isso para vermos num momento mais à frente da película o pensamento de Cage resmungando que ex-criminosos não tinham uma chance de recuperação na sociedade. Pelo menos, o desespero do personagem de Dafoe (e sua ótima atuação, obviamente), que queria sair de sua bolha psicótica e ser uma pessoa normal, foi algo bem mais sincero, mas muito efêmero. Ou seja, o tema da falta de oportunidade de ex-presidiários era uma boa ideia que poderia ter sido bem mais explorada.
Apesar dos problemas da película, houve uma grande qualidade nela, que foi toda uma gama de efeitos visuais que ilustravam o barato de nossos protagonistas quando eles estavam doidões e se afogavam nas drogas. O uso do CGI na criação de imagens totalmente artificiais deu toda uma plasticidade especial à materialidade visual do filme, tornando-o mais atraente (ou menos repulsivo).
Assim, “Cães Selvagens”, apesar das boas influências, não rendeu um bom resultado, pois aproveitou mal as ideias a que se propôs, teve um roteiro um tanto truncado e até mal explicado em algumas passagens, além de criar um clima de antipatia entre público e personagem. Esse último fator até é um pouco mais original, mas tem o efeito colateral de deixar o final da película altamente previsível. Como ponto a favor, bons efeitos visuais que deram plasticidade às alucinações por vício às drogas. E mais um filme mediano de Nicolas Cage, cuja carreira não consegue deslanchar novamente. Você pode até procurá-lo por aí para ver, mas não espere muito.
Batata Movies – Colheita Amarga. Stalinismo, Fome E Genocídio.
Um filme de impacto passou nas telonas. “Colheita Amarga”, de George Mendeluk, aborda uma tragédia humanitária conhecida como Holomodor, uma política genocida imposta por Stalin contra a Ucrânia, que consistia simplesmente em deixar as pessoas daquele país sem comida até morrerem de inanição. Tal ato de extermínio eliminou de 7 a 10 milhões de pessoas, sendo revelada somente após o fim da União Soviética em 1991, e mais tarde, reconhecida até pela própria Rússia. Antes de analisarmos o filme, fica aqui o alerta de que teremos spoilers ao longo do artigo.
A história é focada em uma pequena vila no interior da Ucrânia, onde vive Yuri (interpretado por Max Irons), um jovem com alma de artista que adora pintar e que tem em sua família um antepassado guerreiro que ele considera um herói nacional. Yuri é apaixonado pela jovem Natalka (interpretada por Samantha Barks), uma antiga amiguinha de infância. Tudo é muito idílico, romântico e prosaico até o dia em que chega a notícia de que o Czar foi assassinado, um sinal de tempos mais livres para o seu país.
Entretanto, alguns anos depois, os bolcheviques dos soviets começam a chegar e a impor a pedagogia estatizante do partido comunista para aqueles pequenos fazendeiros do interior, além de um ateísmo forçado. A onda de violência provocada pelo povo invasor faz com que Yuri vá tentar a sorte na capital, Kiev, para depois levar sua esposa para lá. Só que a repressão stalinista piorava tudo à sua volta. Yuri vai então ter que lutar contra todas essas situações adversas para ter a sua amada a seu lado novamente.
Esse é um filme de denúncia, onde o cinema cumpre sua função social, como tantos outros já mencionados por aqui. Esse é um genocídio pouco falado e que deve ser divulgado aos quatro ventos para que nunca mais aconteça. O filme também não deixa de ser uma peça de propaganda do Ocidente (a produção é canadense) contra o regime socialista, demonizando ao extremo todos os seus membros, embora, por incrível que pareça, vejamos algumas relativizações. Chama muito a atenção as atitudes do personagem Sergei (interpretado por Tamer Hassan), o líder dos bolcheviques que espezinha ao máximo a comunidade de Yuri, sendo o verdadeiro cão chupando manga, mas que faz pequenas e rápidas concessões. Ou um soldado soviético que não aceita as agruras que Stalin pratica contra os agricultores ucranianos e se volta contra seu próprio exército. Mas temos principalmente o personagem Mikola (interpretado por Aneurin Barnard), um amigo de infância de Yuri e que se torna um idealista que acredita que pode conciliar o nacionalismo ucraniano com as premissas socialistas. Creio que tal relativização serviu para amenizar um pouco a extrema e negativa carga nas tintas com que os socialistas foram pintados nesse filme, praticamente nazificando-os, o que poderia dar a impressão de a coisa (a virulência dos soviéticos) não ser tão exacerbada assim, dada a forma muito exagerada da crueldade exposta no filme. Não é à toa que, ao final da película, foram exibidos muitos dados reais do Holomodor em si, para dar mais legitimidade às cenas de extrema e injustificada violência do filme.
É claro que a película apresentou alguns elementos dramáticos que davam um sabor especial a essa história baseada em fatos reais. A história de amor, a reação heroica dos ucranianos ao invasor, com direito a morte do vilão e atos heroicos do mocinho, etc., ou seja, uma tentativa de se encaixar um happy end ou um arremedo dele, já que tivemos um desfecho meio que aberto, o que deu uma certa elegância a uma película cheia de lances espetaculares e um pouco exagerados.
Só cabe dizer mais um pequeno detalhe: o filme tem uma cereja bem vistosa no bolo, que é a participação de Terence Stamp como o avô de Yuri, Ivan, onde tivemos uma interpretação bem sóbria e austera, dando muita elegância ao personagem.
Assim, “Colheita Amarga” é um filme importante, pois denuncia um genocídio. O único problema foi colocar toda uma carga de maldade muito excessiva nos soviéticos. Não que eles não tenham sido, mas tais exageros e violências gratuitas podem deslegitimar essa construção que se pretende fazer do Holomodor. Provavelmente, veio dessa preocupação a leve relativização da figura do invasor soviético e dos ideólogos do socialismo. De qualquer forma, é um filme atraente e até esteticamente interessante, por apresentar uma boa fotografia, sobretudo do casal protagonista e dos dias idílicos pré-stalinistas na vila ucraniana.
Batata Jukebox – Proteção (Plebe Rude)
Contemporânea e antológica!!!!