Blog

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). O Som Do Silêncio. De Qual Mundo Você É?

O Som do Silêncio - Filme 2019 - AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Vamos hoje prosseguir em nossas análises dos filmes que concorrem ao Oscar nesse ano de 2021. “O Som do Silêncio” (“Sound Metal”), na Amazon Prime, concorre a seis estatuetas (Melhor Filme, Melhor Ator para Riz Ahmed, Melhor Ator Coadjuvante para Paul Raci, Melhor Som, Melhor Roteiro Original e Melhor Montagem). Para podermos falar desse filme, vamos recorrer aos spoilers de sempre.

Crítica | O Som do Silêncio (Prime Video, 2019): uma aula de imersão sonora  - Cinema com Rapadura
Ruben, um homem perdido na surdez…

Vemos aqui a história de Ruben (interpretado por Riz Ahmed, que trabalhou em “Rogue  One”), um baterista que mora num motohome e viaja em turnê com sua namorada Lou (interpretada por Olivia Cooke) fazendo apresentações de música. Os dois conseguem levar essa vida mambembe numa boa, até que um dia Ruben acorda, de uma hora para outra, com sua audição seriamente comprometida, o que vai prejudicar enormemente seu trabalho e sua vida com Lou. Ao se consultar no médico, ele toma conhecimento de uma cirurgia onde se pode colocar um implante para recuperar parcialmente a audição, embora tal cirurgia seja muito cara. Enquanto ele não consegue fazer essa cirurgia, o rapaz irá para uma espécie de centro que acolhe pessoas consideradas deficientes físicas pela sociedade, liderado por Joe (interpretado por Paul Raci), que busca ver essas pessoas não como deficientes, mas sim como seres humanos que merecem uma integração com uma sociedade formada somente por elas, sem qualquer contato com o mundo exterior. Isso vai separar Ruben de Lou, com a moça voltando para a França, para viver com o pai (interpretado por Mathieu Amalric). Ruben fica arrasado com a situação e tem dificuldades iniciais para adaptação. Mas, pouco a pouco, vai se integrando com aquela sociedade e passa até a ter uma vida feliz. Entretanto, ele quer voltar à sua vida anterior de viagens e turnês com Lou. Para isso, vai vender sua bateria, equipamentos de som e seu motorhome para conseguir o dinheiro suficiente para a cirurgia dos implantes. Quando ele mostra a Joe que fez a cirurgia, este diz que a comunidade que criou não toma suas pessoas como deficientes e pede que Ruben se retire da mesma, perdendo espaço naquele microcosmos onde já estava tão integrado. Ao fazer o ajuste final do implante para finalmente voltar a ouvir, ele escuta apenas um som pouco claro e muito metálico, que mais incomoda do que esclarece as coisas à sua volta. Ruben irá a França para se reaproximar de Lou, mas encontra todo um contexto onde ele não se encaixa mais (o pai da moça veladamente hostil e sua namorada adaptada à nova realidade). Com isso, Ruben vai embora e anda pelas ruas de Paris cercado por aquele som metálico infernal do implante. Ele para numa praça e arranca os implantes recaindo na surdez total, refletindo sobre os rumos que sua vida deve tomar dali em diante.

Crítica | O Som do Silêncio (Sound of Metal)
Apesar da surdez, ele quer continuar a trabalhar como baterista…

É um filme angustiante, pois ele nos dá a dimensão exata de todas as experiências sonoras (ou a falta delas) à medida que Ruben vai perdendo sua audição. Daí a indicação, justíssima, ao Oscar de Melhor Som. A nova condição de Ruben o arranca do mundo real e da sociedade em que ele estava acostumado para viver num novo mundo com pessoas que tinham a mesma condição dele, sendo obrigado a se integrar nessa nova sociedade, cujo líder, Joe, fazia questão de frisar que elas não eram deficientes e sim pessoas que tinham direito a uma integração, independentemente da condição em que estivessem.

Culturadoria
Ele terá que se afastar de Lou, sua namorada…

Mas quando pensamos que Ruben conseguirá se adaptar totalmente a essa nova condição, como realmente estava se adaptando, na verdade nosso protagonista entendia que aquele momento seria algo transitório, com ele podendo voltar à sua vida antiga e a rotina de viagens e turnês. Isso fortemente decepcionou Joe, pois Ruben já havia chegado a um nível de integração que ele era considerado importante para outras pessoas. E a visão de Ruben de que a surdez era uma deficiência o impossibilitava de continuar naquela comunidade. Ruben somente vai perceber que não podia voltar ao mundo de antes quando ele revê Lou na França e percebeu que a volta à sua vida antiga com a namorada era impossível, além do fato de que a cirurgia do implante havia condenado o rapaz a escutar um infernal e incompreensível som metálico (daí o título original do filme, “Sound Of Metal”). O arrancar do implante ao final do filme mostra Ruben desistindo definitivamente de sua vida anterior e abraçando uma nova vida com a surdez. O espectador pode até se perguntar: ele voltará para a comunidade de Joe? Será aceito depois da pisada de bola que deu? Vemos como o desfecho ficou em aberto para que o espectador possa preenchê-lo dentro de suas expectativas.

Crítica | O Som do Silêncio – Indicado ao Oscar é favorito para estatueta  de Melhor Som | CinePOP
Aprendendo a viver num novo mundo…

As atuações foram muito boas. Ahmed deu a medida certa do desespero que é chegar a essa condição de forma repentina. Ele ficou angustiado, perdido, teve explosões de paroxismo. Indicação merecida, que será um páreo duro com Boseman. A indicação de Raci para coadjuvante parece justa, embora a gente sinta que esse ator teve muito pouco tempo de tela, até para um coadjuvante. Assim, a indicação de Raci pode significar que, no pouco tempo em que apareceu, seu carisma e sua atuação foram de uma notabilidade acima da média.

Via Streaming - Dica da Semana: “O Som do Silêncio”
Qual mundo ele deve escolher???

Dessa forma, “O Som do Silêncio” é mais um filme que vem forte nesse Oscar de 2021. É uma película que fala de dois mundos e da posição de um homem perante eles.  E da capacidade do ser humano de se adaptar à novas condições.  

Batata Movies (Especial Oscar 2021). Uma Noite Em Miami. Revendo Posições.

Uma Noite em Miami - Filme 2020 - AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Vamos continuar a conversar sobre os filmes que concorrem ao Oscar neste ano de 2021. “Uma Noite em Miami”, da Amazon Prime, concorre a três estatuetas: Melhor Ator Coadjuvante para Leslie Odom Jr., Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Música (ou canção). Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

Estreia de “Uma Noite em Miami” nesta sexta-feira
Uma conversa sobre a luta pelos direitos civis e sobre a vida privada de quatro homens…

O filme se passa na noite de 25 de fevereiro de 1964, onde houve um encontro fictício entre Cassius Clay (interpretado por Eli Goree), Malcolm X (interpretado por Kingsley Ben-Adir), Jim Brown (jogador de futebol americano, interpretado por Aldis Hodge) e Sam Cooke (músico, interpretado por Leslie Odom Jr.). Tal encontro, organizado por Malcolm X, seria para que eles pudessem estabelecer parâmetros em comum na luta das negros pelos direitos civis na década de 60. O encontro comece de forma muito amistosa e cordial. Mas, aos poucos, as diferentes visões de mundo vão tornando a noite muito tensa. O principal fator de tensão, que chegou às vias de fato inclusive, foi o desentendimento entre Malcolm X e Sam Cooke, com o primeiro achando que o segundo tinha a música como um instrumento muito valoroso para a causa, mas Cooke somente fazia música para agradar a brancos. Cooke rebatia esse argumento dizendo que sua música lhe dava uma independência financeira e fazia os brancos colocarem dinheiro nas mãos dele, além de fazer também músicas mais militantes. Outro fator de discórdia, rapidamente sanado, foi entre Clay e Malcolm X. O primeiro havia se tornado campeão mundial dos pesos pesados naquela noite, com apenas vinte e dois anos, se convertendo ao islamismo por intermédio de Malcolm X. Entretanto, Malcolm X estava se desligando do movimento islâmico ao qual fazia parte, pois não concordava com alguns procedimentos deste, querendo fundar seu próprio movimento e Clay seria um bom chamariz para fiéis. Clay se sentiu usado e somente se reconciliou com Malcolm X depois de muita conversa. Já Jim Brown pensava em seguir a carreira de ator no cinema, mas Cook achava que ele devia continuar a seguir sua carreira no futebol americano, pois negros só receberiam pequenos papéis nos filmes. Ou seja, cada um apitava na vida particular do outro, pois essas vidas particulares estavam entrelaçadas com uma causa maior, que era a luta pelos direitos civis. Mas o mais interessante nessa conversa conflituosa foi ver como nossos personagens reviam suas posições e mudavam (ou não) as suas convicções.

Uma Noite em Miami", no Amazon Prime, é uma pequena obra-prima | A Gazeta
Nem sempre se consegue chegar a um acordo…

O filme se passa a maior parte do tempo dentro de um quarto de um pequeno hotel, onde esses quatro personagens reais se encontram e aparam suas arestas. Se Leslie Odom Jr. recebeu a indicação para Melhor Ator coadjuvante, devemos dizer que todos os atores foram excelentes em seus papéis e transpiravam carisma. Fiquei muito impressionado com a atuação de Kingsley Ben-Adir, que fez um Malcolm X muito sereno, mas também muito perturbado e transtornado com as perseguições que sofria dos brancos, praticamente antevendo sua morte. Ele também conseguia ser explosivo ao expor o seu ponto de vista e desabar quando sentia que o desentendimento atrapalhava o andamento das coisas, se debulhando em lágrimas na frente de Jim Brown. Aldis Hodge, o ator que interpretou Jim Brown, foi o mais centrado de todos ali, expondo suas ideias e pensamentos de forma bem clara e concisa, sem entrar no cavalo de batalha dos conflitos. Eli Goree talvez tenha recebido a tarefa mais fácil, pois fazer um Clay caricato em suas fanfarronices pode ser algo muito adaptado para um overaction. Mas ele não ficou apenas na fanfarronice e foi inseguro (como todo jovem de vinte e dois anos o é) e terno nas horas certas. Odom Jr. foi sem dúvida o mais carismático de todos e merece a indicação a ator coadjuvante de longe, com um personagem muito seguro de si e que não levava desaforo para casa.

Crítica | Uma Noite em Miami tem a força das palavras - Canaltech
Leslie Odom Jr. Indicação para Melhor Ator Coadjuvante…

Dessa forma, “Uma Noite em Miami” é mais um filmaço que concorre ao Oscar que merece demais a nossa atenção, pois aborda um tema nevrálgico na cultura dos Estados Unidos (a questão da luta pelos direitos civis) e conta com um elenco que trabalhou muito bem e com muito carinho os seus personagens. É um show de atuação do início ao fim.

Batata Séries – Jornada Nas Estrelas, DS9 (S01 Ep 04), Babel. Arma Biológica.

All The Things Star Trek: Deep Space Nine Did Wrong In Quarantine During ' Babel' - CINEMABLEND
Um O’Brien confuso…

Dando sequência às nossas análises de episódios de Jornada nas Estrelas, retornemos a DS9 e ao quarto episódio da primeira temporada, intitulado “Babel”.

Qual é o plot do episódio? Chefe O’Brien está muito atarefado, pois a estação está com vários defeitos. Um deles é o sintetizador de comida. O’Brien conserta um deles que parece sofrer uma pane inicial, mas funciona corretamente. Quando O’Brien se afasta, podemos ver que há uma maquininha no interior do sintetizador, como se ele estivesse sendo sabotado. Quark, que precisa que seus sintetizadores funcionem, burla a segurança e consegue descobrir quais sintetizadores funcionam na estação. Numa conversa entre Sisko e O’Brien, este último começa a falar coisas desconexas, provocando estranheza em Sisko. O’Brien faz o mesmo com Kira. Bashir o examina e diz que O’Brien parece ter uma afasia, ou seja o cérebro funciona normalmente, mas ele não consegue se expressar nem entende as mensagens dirigidas a ele. Mas não há qualquer evidência que tenha ajudado O’Brien ficar nesse estado. O mais grave é que os sintomas também aparecem em Dax. Bashir descobre que há uma doença parecida com a afasia sendo transmitida por um vírus e Sisko pede que Bashir coloque a estação sob quarentena. Quark não fechou sua casa e alegou a Odo que seu estabelecimento é serviço essencial (já ouvi isso em algum lugar). Odo, que sabia dos problemas dos sintetizadores de Quark, começa a desconfiar dele. E pega o ferengi usando os sintetizadores da tripulação, que funcionavam.

Watch Star Trek: Deep Space Nine Season 1 Episode 5: Babel - Full show on  Paramount Plus
Bashir terá um problema complicado para resolver…

Bashir descobre que o vírus está na comida dos sintetizadores e que uma mutação se propaga pelo ar. Ou seja, toda a estação está contaminada. Kira encontrou a maquininha do início do episódio e, ao examiná-la, ela descobriu que foi ela que produziu o vírus, sendo, então, uma sabotagem. E mais: a tecnologia da maquininha é cardassiana. Mas exames feitos por Bashir constatam que foram os bajorianos que criaram o vírus para atacar a estação quando ela estava em domínio cardassiano. O grande problema é que esse aparelhinho foi criado há dezoito anos e não há sinais de quem o confeccionou. O’Brien queima em febre e morrerá em doze horas caso o vírus não seja neutralizado. Mas o próprio Bashir começa a ser afetado pelo vírus.

Depois de muito procurar, Kira encontra o cientista que sabotou a estação, mas ele desligou na cara dela quando a Major tentou entrar em contato. Kira, explosiva, diz que vai abandonar a estação (e a quarentena) para falar pessoalmente com o cientista em Bajor. Odo recomenda a Sisko que a deixe ir, pois ela é tudo que eles têm agora. Uma nave tenta sair à força da estação e Sisko é obrigado à liberá-la. Mas o mecanismo de trava do anel de atracação enguiçou e a nave corre o risco de explodir, levando metade do anel de atracação. Odo vai liberar manualmente as amarras do anel de atracação, pois Sisko já foi afetado pelo vírus. Já Kira teletransporta à força o cientista para a nave auxiliar e se dirige à estação. Como Kira está contaminada, o cientista também está, o que o obriga a fazer um antídoto. Já Odo consegue a ajuda de Quark para sair das Operações e ir para o anel de atracação via teletransporte. Odo consegue tirar o capitão da nave e destravá-la para explodir no espaço. O cientista pegou as notas de pesquisa de Bashir e conseguiu confeccionar o antídoto. O episódio termina com Sisko felicitando O’Brien por sua volta, mas logo depois chamando a atenção do mesmo, pois o sintetizador não fez o café direito. Fim do episódio.

Star Trek: Deep Space Nine Rewatch: “Babel” | Tor.com
Um cientista que não quer ajudar…

O que podemos dizer do episódio “Babel”? É um episódio que trabalha ainda as sequelas de uma região de guerra, onde uma arma biológica é disparada por acidente depois da guerra (lembra muito as minas terrestres de Angola que mutilaram muitos civis, mesmo depois da guerra). No caso, a arma biológica desperta um vírus perfeito que se espalha na comida e no ar, infectando toda a estação, deixando a capacidade de comunicação das pessoas completamente comprometida, levando-as à morte. E aí vemos todo um conjunto de procedimentos e discursos que, infelizmente, são muito caros à nós atualmente: isolamento, quebra de isolamento, atividades essenciais, etc. É um episódio que trabalha o tema da epidemia, tema esse bem recorrente e que desperta tanta inquietação.

No mais, pudemos ver bons diálogos entre Odo e Quark, naquele ranço entre o agente da lei e o infrator que desperta algumas atividades hostis, mas que também tem uma amizade implícita bem lá no fundo. É o primeiro episódio onde vemos um ferengi tendo uma atitude mais altruísta, desde que bem recompensada posteriormente. Notamos aqui também que transmorfos e ferengis são bem resistentes a epidemias.

Dessa forma, “Babel” é um episódio de DS9 que trabalha um tema um tanto quanto batido até na franquia de Jornada nas Estrelas que é a epidemia, só que aqui como arma biológica de um pós-guerra. Os diálogos entre Odo e Quark também acabam sendo uma atração à parte, levando a mais um passo na construção desses dois personagens, que têm um relacionamento turbulento com uma pontinha amistosa. Vale a revisita.

Star Trek: Deep Space Nine Rewatch: “Babel” | Tor.com
Kira vai pegar o cientista à força…

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). O Tigre Branco. Ascensão Social E Luta De Classes.

O Tigre Branco - Filme 2021 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Mais um filme concorrente ao Oscar 2021. “O Tigre Branco”, da Netflix, concorre à estatueta de Melhor Roteiro Adaptado e é um daqueles filmes que nos lança à reflexão. Para podermos falar do filme, vamos lançar mão dos spoilers de sempre.

O Tigre Branco”. Como ser bilionário a qualquer preço – Observador
Balram, em busca de ascensão social…

O filme conta a trajetória de Balram (interpretado por Adarsh Gourav), um rapaz indiano de origem muito humilde que pretende ascender na vida como criado de uma família da elite que oprime o seu vilarejo. Ele consegue se tornar o motorista particular de um dos filhos da família, Ashok (interpretado por Rajkummar Rao), um rapaz que não concordava com o tratamento violento que seu pai e seu irmão dava para seus criados. Ashok, inclusive, era muito ocidentalizado e tinha uma namorada, Pinky (interpretada por Priyanka Chopra), que vivia nos Estados Unidos e estava completamente fora de sintonia com as práticas elitistas da família, numa sociedade de castas onde há grande discriminação. É nesse meio que Balram busca sobreviver e buscar espaço numa sociedade onde a maioria pobre vive no “galinheiro”, uma metáfora que diz que as pessoas vão para a imolação sem qualquer reação, de forma muito passiva. Balram fará de tudo para se tornar um criado exemplar, mas a única resposta a isso era mais e mais violência por parte do pai e irmão de Ashok. Até o momento em que Pinky atropela uma criança na rua e a mata. O pai e irmão mais velho de Ashok convencerão Balram a assinar uma declaração de culpa pelo acidente, mesmo ele não tendo estado ao volante. O acidente implodirá o relacionamento entre Ashok e Pinky. Esta vai embora da Índia, com Ashok caindo em desgraça e se tornando violento com Balram. Mesmo fazendo de tudo para seu patrão sair da fossa, Balram começa a perceber que a elite a que serve não merece aquele tipo de tratamento e ele começa  buscar seu espaço de formas menos lícitas, ganhando dinheiro por fora de todo  o jeito. As malas de dinheiro que a família de Ashok dá para políticos para corrompê-los e a leitura labial em que ele vê Ashok e o irmão conversando para demiti-lo fazem com que nosso protagonista tome uma medida muito radical, que é a de matar o seu chefe e roubar uma dessas muitas malas de dinheiro para ele começar a vida como um empresário empreendedor nesse novo eldorado do mundo que é a Ásia, depois da decadência dos brancos do Ocidente.

Leia a crítica de O Tigre Branco
Ele será um motorista de uma família da elite…

O filme é muito perturbador, exibindo de forma bem contundente todo o preconceito que existe no sistema de castas da Índia, onde uma grande ostentação convive com uma miséria absoluta. Balram, nosso protagonista de origem humilde, se vê entre a exploração dos mais ricos e a tirania de sua avó, que mantinha a família confinada em seu bolsão de pobreza. Balram só vai poder sair da influência da avó se ele se comprometer a sustentar a numerosa família. Quando o empregado faz algo considerado errado pelos patrões, a família rica, que sabe de tudo dos empregados, até para saberem onde irem atrás quando dá algo errado, costuma ir ao vilarejo provocar um massacre. Assim, nosso Balram, de uma forma até perversa, literalmente mata dois coelhos com uma cajadada só ao matar seu patrão. O grande detalhe aqui é por que Balram toma uma atitude tão radical. Ele é tratado como lixo tanto pelos seus pares (a família) quanto pelos que estão acima dele (a elite). E assim, o bom caráter que era, querendo fazer de tudo para ser um bom criado, percebe que, naquela sociedade, para almejar uma posição social maior, a figura do bom samaritano não se encaixa, e acaba corrompido pelo sistema para alcançar um status maior, não sem antes explodir em revolta, tal como um tigre branco, raro e único. E tal tática, ao contrário do que pode parecer, acaba dando certo, sendo este o único caminho que Balram tinha para poder alcançar seus objetivos.

O Tigre Branco: Longa baseado no best-seller de Aravind Adiga ganha seu  trailer. Veja! - Home | SiriNerd
… e vai correr atrás de seus objetivos, sendo único e raro como um tigre branco…

Dessa forma, “O Tigre Branco” tem uma história muito cativante, que mantém o público interessado nela constantemente, sendo digna da indicação a roteiro adaptado que levou. Seria interessante se tal filme, ambientado na Índia, com questões caras àquele país, ganhasse a premiação.

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). O Céu Da Meia-Noite. Procurando Outra Casa Quando Temos Que Tomar Conta Da Nossa.

O Céu da Meia-Noite: Críticas AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Mais um filme que concorre ao Oscar. “O Céu da Meia-Noite” concorre ao Oscar de Melhor Efeitos Visuais e conta com atores de peso como George Clooney (que também assina a direção), Felicity Jones (de “Rogue One”) e David Oyelowo (de “Selma”). Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

O Céu da Meia-Noite': Trailer do Sci-fi com George Clooney é um espetáculo  visual; Assista! | CinePOP
Augustine, um cientista em busca de planetas…

Vemos aqui a história de um cientista, Augustine (interpretado por Clooney), que descobriu uma que uma das luas de Júpiter podia sustentar vida, o que rendeu uma missão tripulada até lá. O grande problema é que, durante essa missão, o ser humano, que já maltrata o planeta Terra de longa data, conseguiu finalmente tornar o planeta inviável para a vida, obrigando as pessoas a viverem nos subterrâneos para terem uma sobrevida. Mas Augustine ficaria na superfície, esperando a missão à lua de Júpiter retornar, para alertar os astronautas a não voltarem para a Terra. Totalmente sozinho depois da evacuação da população, ele encontra uma garotinha sozinha e toma conta dela. Os dois vão precisar ir até uma estação de comunicação, onde há melhores condições de se comunicar com a missão, passando por muitos perigos e dificuldades. Paralelamente, vemos a volta da missão, onde tudo ia muito bem até o momento em que a nave saiu de sua trajetória e foi alvejada por detritos no espaço. No momento do conserto, mais detritos apareceram, causando a morte de uma astronauta. Próximos ao planeta, os astronautas finalmente falam com Augustine, que os alerta do perigo de retornarem à Terra, mas dois decidem retornar ao nosso planeta pelos laços afetivos e familiares, enquanto que um casal decide retornar à Júpiter e viver na lua.

O céu da meia-noite' é filme sobre arrependimento, redenção e esperança,  diz George Clooney | Cinema | G1
Uma garotinha vai ser a companhia de Augustine num mundo pós-apocalíptico…

O filme tem um ritmo extremamente lento, com duas histórias (a de Augustine e a da missão à lua de Júpiter) fluindo separadamente, somente se encontrando ao final, de uma forma até interessante que compensa a letargia da coisa. A indicação para os efeitos visuais valeu, a meu ver, muito mais pelas imagens das paisagens da lua de Júpiter do que pelas imagens da nave em si. Mas a grande atração da película sem a menor sombra de dúvida é a mensagem de alerta que ele traz sobre a forma mundana como estamos tratando o nosso planeta. Chega a ser uma ironia pesquisarmos exoplanetas a enormes distâncias, buscando condições semelhantes às da Terra quando tratamos tão mal o nosso planeta aqui bem pertinho. Podemos ver essa contradição bem expressa em cores vivas no personagem de Augustine. Quando jovem, ele era um pesquisador muito estimulado em fazer essa busca pelos exoplanetas com condições semelhantes à da Terra. Mas, em sua idade avançada, o desgosto e a doença o tomam, ao perceber que todo o seu esforço de uma vida parecia ter ido em vão, pois a Terra não mais comportava a vida. O seu esforço só não foi totalmente em vão, pois ao descobrir a lua de Júpiter que reunia condições para a vida, a humanidade poderia reaparecer a partir dali, com o casal de astronautas esperando uma filha como uma nova versão de Adão e Eva sendo expulsos do paraíso (ou indo para ele, depende do ponto de vista) para perpetuar a humanidade. Haverá uma relação entre Augustine e esse casal, mas vou parar com os spoilers por aqui.

O Céu da Meia-Noite' é mais conto de fadas do que uma aventura sci-fi -  16/12/2020 - Ilustrada - Folha
A humanidade ressurge de um casal…

Há uma pequena ligação com Jornada nas Estrelas nesse filme. O jovem Augustine foi interpretado por Ethan Peck, que interpretou Spock em Discovery, e Tim Russ (o vulcano Tuvok, de Voyager) aparece muito rapidamente e de relance (na verdade, a gente mais o escuta do que vê) ao início do filme, sendo um amigo de Augustine que se despede dele durante a evacuação das pessoas da superfície do planeta.

O CÉU DA MEIA-NOITE | Crítica do Neófito Nerdtrip
Filme tem bons efeitos visuais, dignos da indicação…

Dessa forma, se “O Céu da Meia-Noite” é um filme de ritmo muito lento, o espectador é premiado com a mensagem do filme de cuidado com a preservação de nosso planeta e pela forma como as duas histórias que corriam em paralelo se ligam ao final. O filme também tem uma forte ligação pessoal entre os personagens que vale a pena conferir e não direi aqui.

Batata Séries – Jornada Nas Estrelas, A Nova Geração (S01 Ep 04), O Último Guardião. Surgem Os Ferengis.

TNG 1x04: The Last Outpost | Trek Brasilis - A fonte definitiva de Star Trek  (Jornada nas Estrelas) em português

Continuando nossas análises de episódios de Jornada nas Estrelas, retornemos a TNG e ao quarto episódio da primeira temporada, intitulado “O Último Guardião”. Esse episódio é conhecido pelo surgimento dos ferengis na franquia.

Qual é o plot? A Enterprise persegue uma nave ferengi que roubou um conversor de energia. Será a oportunidade de se fazer um primeiro contato com os ferengis. Os ferengis saíram de dobra e começaram a alvejar a Enterprise. Picard diz para não retribuir o fogo e se afastar um pouco. Mas a Enterprise parece estar sem energia, enquanto que os ferengis se posicionam bem à frente. Data é consultado sobre os ferengis e ele diz que há informações controversas de que a principal característica dos ferengis é que eles são comerciantes em busca de mercadorias e territórios e atuam como o pior tipo de capitalismo que foi visto na Terra.

A Enterprise lança mão de um subterfúgio para escapar da nave ferengi, que a mantém presa e retira sua energia. Picard manda abrir um canal e exige que o conversor de energia seja devolvido. Depois, pratica o tal subterfúgio, sem sucesso, o que rende um “merd” de Picard (é, foi nesse episodio que ele falou um palavrão em francês). Os arquivos da Enterprise começam a ser lidos e Troi sugere a Picard que analise o planeta sobre o qual as duas naves orbitam.

The Last Outpost (Star Trek: The Next Generation) - Wikipedia
Ferengis surgem de forma ameaçadora…

Picard faz uma conferência rápida com sua tripulação e ouve a sugestão de Troi, onde o capitão deve negociar com os ferengis sem a empáfia anterior e ouvindo os termos dos alienígenas. O ferengi responde (ele se chama Daimon Tarr) e diz que é contra uma rendição incondicional. Ou seja, a energia que mantém a Enterprise presa também mantém a nave ferengi presa. Picard manda lançar uma sonda para verificar o que está acontecendo e pede contato visual para conversar. O ferengi aparece na tela e diz que vai devolver o conversor de energia além de oferecer os segundos oficiais ferengis de acordo com o código ferengi. Picard pede para aguardar. Numa reunião entre Picard, La Forge, Data e Riker, o andróide fala do scan feito no planeta e este planeta fez parte de uma civilização chamada Tkon, que era muito avançada onde o planeta abaixo erra uma espécie de guardião local, podendo até deslocar estrelas. A sonda manda a informação de que é o planeta que está mantendo presas as duas naves. O planeta não tem mais vida e Picard decide descer à superfície para explorá-lo, além de ter a ideia de convidar os ferengis a irem junto. Usando os argumentos de negociações e permutas, tão caros aos ferengis, Picard os convence a fazer uma missão conjunta com a Federação na superfície do planeta, embora Riker, Troi e Data estejam desconfiados da confiabilidade em cima dos ferengis. A missão precisa ter êxito logo, pois a energia da Enterprise cai a ponto de afetar os suportes de vida da nave.

O grupo avançado desce ao planeta, mas em locais diferentes. Data, Riker e La Forge se encontram, mas são atacados pelos ferengis, ficando inconscientes. Quando acordam, entram em luta corporal com os ferengis, mas Tasha rende a todos com um phaser. Os ferengis ficam impressionados em ver uma mulher vestida trabalhando com os homens da Federação, algo repugnante, segundo eles.

TNG 1x04: The Last Outpost | Trek Brasilis - A fonte definitiva de Star Trek  (Jornada nas Estrelas) em português
Data se enrola com as algemas chinesas…

O grupo avançado descobre que todo o planeta é uma espécie de coletor de energia. Uma forma de vida surgida da energia que paira sobre o planeta começa a se comunicar com eles. Uma forma de vida se materializa dizendo que é o guardião do Império Tkon. Riker e Data dizem que o Império foi destruído por uma supernova e o guardião não acredita. Os ferengis fazem uma série de acusações aos membros da Federação que dizem que cometeram falhas no passado. O guardião começa a citar Sun Tzu (“A Arte da Guerra”) e diz que os membros da Federação têm uma mente aberta que se deixa ser vista, ao contrário dos ferengis, que têm uma mente fechada, e faz amizade com os membros da Federação. Riker pede para que o guardião liberte a Enterprise e ele o faz. O guardião disse que ficou confuso com a Federação e os ferengis, pois eles primeiro queriam se destruir, mas depois cooperaram juntos. O guardião pergunta a Riker se deve destruir os ferengis e o Primeiro Oficial diz que não, pois os ferengis lembram o passado da Terra (não se pode odiar o que já se foi) e, se destruídos, não terão a oportunidade de aprender e avançar. Mesmo com o risco dos ferengis serem uma ameaça, eles merecem uma chance de crescer e aprender.

A Enterprise consegue recuperar o conversor de energia depois de um “pedido” do guardião aos ferengis. Riker pede a Picard para entregar uma caixa de algemas chinesas aos ferengis de presente. Fim do episódio.

TNG 1x04: The Last Outpost | Trek Brasilis - A fonte definitiva de Star Trek  (Jornada nas Estrelas) em português
Ferengis se tornam o alívio cômico do episódio. Reconhecem o ferengi do centro?

O que podemos falar do episódio “O Último Guardião”? Em primeiro lugar, esse é o episódio em que aparecem os ferengis. Foi uma ideia bem desenvolvida, mas talvez mal aproveitada nesse primeiro momento. Fez-se toda uma expectativa o início do episódio sobre os ferengis, a ideia de associá-los ao capitalismo selvagem foi muito boa, a imagem de Daimon Tarr era convincente e ameaçadora. O problema se deu na superfície do planeta, onde a postura dos ferengis acabou caindo mais para o alívio cômico do que para a pegada ameaçadora do início do episódio. E pior: as conversas entre o guardião e Riker sobre os ferengis colocam estes últimos numa posição de inferioridade, tal como se eles fossem uma raça atrasada perante todo o desenvolvimento moral da Federação. Isso cheirou a uma empáfia da Federação mais uma vez, algo que a gente já tinha visto um pouco em “Código de Honra”, o episódio anterior. Pelo menos, a gente sabe que os ferengis vão ser muito mais bem desenvolvidos em DS9. E se ali ainda houve um tom de alívio cômico para os ferengis, a gente também pode ver toda a sua cultura e cosmogonia mais bem definidas. As referências à cultura chinesa, sobretudo Sun Tzu, deram o aspecto literário ao episódio e caíram bem sendo, inclusive, bem aplicados ao desfecho do episódio, onde serviram de ponte para o entendimento entre Riker e o Guardião, mostrando para esse último a mente aberta de Riker e a aposta na confiança mútua, ao contrário dos ferengis, que fechavam a sua mente em virtude da desconfiança e da trairagem. Os membros da Federação optaram por jogar limpo e reconhecerem seus erros do passado, apesar da tática dos ferengis de acusá-los, muitas vezes até de forma mentirosa.

No mais, vimos mais desenvolvimentos de personagens. Picard mostra novamente o seu lado diplomático, não querendo partir para um conflito armado com os ferengis, à despeito das recomendações de Tasha e Worf, e parte para um diálogo dentro de parâmetros da cultura ferengi, depois das recomendações de Troi. Para Data, ficaram novamente bons diálogos que o transformaram numa espécie de alívio cômico no episódio, onde o episódio das algemas chinesas foi o mais marcante.

Dessa forma, “O Último Guardião” é um episódio interessante de Jornada nas Estrelas, A Nova Geração, por apresentar os ferengis (ainda que eles tenham sido mal aproveitados), lembrar da filosofia de Sun Tzu e dar uma passo a mais nas construções dos personagens Picard e Data. Vale a pena a revisita, até para ver Picard falar “merd!”.

Watch Star Trek: The Next Generation Season 1 Episode 4: The Last Outpost -  Full show on Paramount Plus
Picard fala um palavrão em francês…

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). Era Uma Vez Um Sonho. Uma Sofrida História Real Que Acontece Em Qualquer Esquina.

Era Uma Vez um Sonho - Filme 2020 - AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Dando sequência às nossas análises de filmes que concorrem ao Oscar, vamos falar hoje de “Era Uma Vez Um Sonho” (“Hillbilly Elegy”), mais uma produção da Netflix que concorre a duas estatuetas: Melhor Atriz Coadjuvante para Glenn Close e Melhor Maquiagem e Cabelo. Curiosamente, Ron Howard, o diretor do filme, não recebeu indicação para Melhor Diretor. Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

Era Uma Vez Um Sonho | Crítica: Um filme difícil de se assistir que tenta  desesperadamente garantir indicações para suas atrizes | Arroba Nerd
O jovem J.D. e sua avó Mamav…

Vemos aqui a história real de J. D. Vance (o livro é baseado em sua autobiografia), um rapazinho do interior que vive em Middletowm, uma cidade decadente de Ohio, considerado um lugar de interior, com gente muito simples, mas que também não progride muito na vida (o jovem J.D. é interpretado por Owen Asztalos e, na fase adulta, por Gabriel Basso). Sua mãe, Bev (interpretada por uma incrível e esculhambada Amy Adams) é uma enfermeira que se viciou em remédios, perdendo seu emprego e se tornando uma mulher muito descontrolada e agressiva, o que gerava muitas brigas internas na família. Quem apagava os incêndios era a mãe de Bev, Mamaw (interpretada também por uma inacreditável Glenn Close), que buscava restabelecer o equilíbrio de sua família caótica, pois como dizia Mamaw, a família era tudo o que eles tinham. A falta de perspectiva do lugar e das pessoas que viviam na cidadezinha só não era maior que esse caos familiar, propiciando um terreno fértil para ninguém ir adiante. O caso de Bev era emblemático, pois ela estudou e se formou como enfermeira, mas o vício destruiu qualquer chance de progresso dela, levando-a ao fundo do poço. Mamav a protegia de seus destemperos, o que levantava a ira de J.D., que reclamava com Mamav sobre isso e queria morar com ela, já que Bev fazia um enorme rodízio de maridos e amantes que somente desestabilizava ainda mais as coisas. Até que, um belo dia, Mamav não aguentou o baque de tudo e baixou no hospital. Foi ali que ela pôde dar um tempo e fazer uma reavaliação das coisas, saindo do hospital pela porta da frente e indo à casa de Bev para pegar J. D. para criar. O menino, que sempre foi um bom garoto, já começava a se perder com as amizades erradas, e Mamav começa a lhe impor limites. Até que ele finalmente cai na real e começa a lutar por algo melhor, trabalhando e estudando, enquanto sua mãe caía ainda mais no buraco.

Saiba a mudança de Amy Adams para 'Era uma vez um Sonho', da Netflix
Uma Amy Adams desfigurada pelo choque de realidade…

O tempo passou e J.D. foi para Yale estudar advocacia. Ele tem uma semana decisiva de entrevistas para conseguir um bom emprego num escritório. Mas consegue apenas uma entrevista, justamente no momento em que sua irmã liga e diz que sua mãe está no hospital com overdose de heroína. J.D. tem que retornar a Ohio para cuidar disso justamente a poucos dias da entrevista decisiva, ficando por lá o máximo de tempo que podia antes de retornar de carro, dirigindo por toda a noite (parece nome de música isso), para chegar a tempo da única entrevista que tinha conseguido. Mas a mãe teve alta do hospital, não tendo onde ficar, com nosso J.D. ainda andando por aí atrás de um lugar onde ela pudesse ficar provisoriamente, antes dele retornar para a entrevista. Realmente, não é mole não.

Era Uma Vez um Sonho: aqueles que conseguiram superar as adversidades -  Folha de Campo Grande
Uma família de interior, que tem somente a si mesma…

É um filme muito envolvente, pois mostra uma família mergulhada na instabilidade emocional, como há muitas por aí em cada esquina. Parecia que todas as dificuldades que J.D. passava com os seus só o deixava mais forte ainda para progredir e sair de toda a estagnação da cidade e de seu círculo familiar. A coisa teve cara de loop, pois era muito fácil culpar Bev por sua irresponsabilidade, mas ela também teve uma infância difícil com sua irmã, onde Mamav apanhava de seu marido bêbado e ela até botou fogo no corpo dele, com as meninas tendo que literalmente apagar o pai. J. D. vai encarar um mundo totalmente novo e cheio de preconceitos contra essa decadência interiorana, com ele sendo ríspido contra isso num meio altamente elitista, não se esquecendo de suas raízes. Entretanto, chega uma hora em que os problemas pregressos de sua família começam a impedi-lo de seguir adiante, e J.D. precisa tomar a dura decisão de não ficar o tempo todo prestando assistência à sua mãe, pois ele deve tocar a vida que está construindo.

Criticado, novo longa de Glenn Close e Amy Adams é considerado o "filme  mais vergonhoso do ano" - Monet | Filmes
Mamav irá rever seus conceitos para salvar J. D. da mediocridade…

Esse é mais um filme pesado, mas muito cativante, pois a gente se identifica demais com os personagens. Quem nunca teve um arranca-rabo com um parente muito próximo? A gente abraça junto com J.D. todas as suas angústias, revoltas e esperanças. Glenn Close e Amy Adams estavam supremas, onde a maquiagem tirou qualquer glamour hollywoodiano delas e as tornaram pessoas reais, que passam por angústias reais, sendo um o filme um concorrente forte ao Oscar de Melhor Maquiagem e Cabelo. Mas toda a maquiagem não seria suficiente se não fosse amparada pelas atuações das duas atrizes. Amy Adams era o paroxismo em pessoa, indo do extremo agressivo ao sofrimento incontido, passando por raros momentos de carinho, enquanto que Glenn Close era um misto de serenidade e firmeza, sempre nas horas certas. Torço muito para Glenn Close aqui, pois já queria ter visto ela ganhar o Oscar de Melhor Atriz na última vez que concorreu. Que ela consiga a Melhor Atriz Coadjuvante agora.

Era Uma Vez um Sonho': Glenn Close passa por uma transformação incrível em  nova imagem de bastidores | CinePOP
A maquiagem e cabelo arrebentaram!!!

Dessa forma, “Era Uma Vez Um Sonho” pode até ser um filme que não tem muitas indicações, mas ainda assim é um filmaço, pois trabalha de forma bem contundente um choque de realidade ao radiografar uma família de interior dos Estados Unidos cheia de problemas e vivendo numa região decadente. Esse é um tema com o qual muitos se identificam, amparado por uma maquiagem e cabelo muito fortes e com atuações divinas de Amy Adams e Glenn Close. Merece, e muito, pelo menos um dos dois Oscars aos quais concorre.

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). Pieces Of A Woman. Ou Uma Mulher Em Pedaços.

Pieces of a Woman - Filme 2021 - AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Dando sequência às nossas análises de filmes que concorrem ao Oscar, vamos falar hoje de “Pieces Of A Woman”, mais uma produção da Netflix que concorre a estatueta de Melhor Atriz para Vanessa Kirby. Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

O Filme “Pieces of a Woman”. O drama americano “Pieces of a Woman”… | by  Marcia | Coadjuvante | Medium
Martha de Sean, um casal que passará por um pesado trauma…

Vemos aqui a história de um casal, Martha (interpretada por Kirby) e Sean (interpretado por Shia LaBeouf). Eles estão prestes a ter uma filha e querem fazer o parto em casa. A parteira que acompanhou toda a gravidez estava ocupada no dia do nascimento da bebê e eles receberam a ajuda de uma parteira “reserva” por assim dizer. O problema é que o nascimento foi todo complicado e a menina acabou morrendo. Isso foi apenas o início de uma via crucis para Martha, que teve que lidar com os procedimentos que iria realizar com o corpo da criança (enterro ou doação do corpo para pesquisas), o processo em cima da parteira e a relação com o marido que ficou em frangalhos. Para piorar toda a situação, a mãe de Martha, Elisabeth (interpretada por Ellen Burstyn) se achava no direito de se intrometer na vida da filha e nas suas decisões, o que gerava ainda mais atritos. E, no meio dessa tempestade toda, as perdas ficam ainda maiores, com somente uma coisa principal a fazer: aguentar a maré brava passar. Mas não sem tomar algumas atitudes que serão decisivas para conseguir a paz de espírito e seguir em frente.

Resenha | Pieces of a Woman (Original Netflix) - Entreter-se
Um parto difícil e fracassado…

O filme tem um ritmo lento e, obviamente, é muito pesado, onde parece haver uma depressão coletiva na maioria dos os personagens, algo bastante comum nesse contexto. O ritmo lento o torna um pouco maçante, mas ele também desperta uma angústia muito forte quando vemos a vida das pessoas desmoronando. Vanessa Kirby, a indicada à Melhor Atriz, passou por várias fases ao longo do filme. A primeira, pouco tempo depois da morte da bebê, mostrava uma Martha tão letárgica que ela parecia indiferente à tudo, até à morte da filha. Nesse ponto, o personagem de LaBeouf foi bem mais enfático e mostrou um sofrimento bem pronunciado, assumindo um comportamento mais frio com o transcorrer do filme, até o afastamento total. Martha, por sua vez, tem uma explosão de paroxismo quando discute com a mãe num encontro familiar, com esta falando também de seus sofrimentos pregressos, quando era perseguida pelos nazistas e foi obrigada a fazer o parto sozinha em que nasceu Martha (foi uma bela atuação de Ellen Burstyn aqui). E sua grande participação no filme foi seu depoimento no julgamento da parteira, que não vou comentar aqui porque já dei spoilers demais.

Netflix conta história real em Pieces of a Woman? Veja a verdade
Uma parteira que será julgada…

O filme tem uma metáfora bem interessante. Martha, depois que perde o filho, come uma maçã no trem, cercada por pais junto de seus filhos. De repente, ela tira da boca uma sementinha de maçã. Ela irá cultivar sementes de maçã, colocando-as no algodão molhado (da mesma forma que fazíamos no ensino primário com os feijões) para que elas germinassem e fossem plantadas. Essa metáfora é responsável pela cena final do filme que, depois de maltratar bastante o espectador com uma história sofrida e pesada, nos fornece um happy end.

Pieces of a Woman - O PipoqueiroO Pipoqueiro
Uma mãe que quer decidir pela vida da filha…

Dessa forma, “Pieces Of A Woman” é mais um candidato ao Oscar que merece a atenção. É um filme sofrido e difícil de assistir, mas tem uma boa atuação de Kirby, que foi em várias camadas. Sem dúvida, uma concorrente de peso ao posto de Melhor Atriz.