Batata Movies – Aqueles Que Ficaram. Delicadeza À Toda Prova.

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Cartaz do Filme

Um filmaço da Hungria, que representa seu país na corrida ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, e está entre os finalistas. “Aqueles Que Ficaram” traz mais uma vez a inesgotável temática da Segunda Guerra Mundial, mais especificamente das sequelas que o conflito pode deixar nas pessoas de um país. O detalhe é que isso é mostrado para nós com uma delicadeza que beira o idílico, mesmo se o terreno não fosse o mais propício para isso. Para podermos entender melhor o filme, vamos lançar mão de spoilers aqui.

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Um médico que perdeu a famíla na guerra…

A história fala do ginecologista Körner Aladár (interpretado por Károly Hadjuk), que fez o parto de uma menina, Klára (interpretada por Abigél Szõke). Mas a guerra veio, matando os pais de Klára e a família de Körner. Anos depois, Klara vai com sua tutora (que também perdeu o marido na guerra) para o consultório, pois a menina não consegue menstruar. Klára é a típica adolescente chata e menina problema na escola, muito em virtude do trauma de guerra. Mas a menina se afeiçoa a Körner e passa a viver com ele, numa relação um tanto pai e filha. O problema é que, com o fim da guerra, o regime socialista implantado, representado aqui pela direção da escola de Klára, não vê com bom os olhos a relação do médico com a menina, suspeitando de pedofilia. Assim, vemos o dia a dia desse aparentemente estranho casal que precisa superar os preconceitos para poder viver junto.

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Uma adolescente que perdeu os pais na guerra…

O filme, num primeiro momento, incomoda em virtude dos estereótipos que povoam nossas cabeças. Mas, com o transcorrer da exibição, fica claro que não há maldade naquele relacionamento, mas sim pessoas que tiveram suas vidas destroçadas pela guerra buscando uma reconstrução, apoiando-se umas nas outras lançando mão do afeto. Körner perdera toda a família e precisava de uma filha postiça. Klára perdera os pais e precisava de uma figura paterna. À medida que a relação dos dois vai se estreitando, vemos a aparição de ciúmes entre os dois e uma leve insinuação sexual. Mas Körner consegue uma namorada (uma de suas pacientes, que perdeu o marido), até por sugestão de Klára, e esta consegue um namorado, o que esfria o suposto apelo sexual entre Körner e Klára, não sem algum sofrimento embutido nisso. De qualquer forma, o peso do idílico é muito maior no filme e seu desfecho mostra isso, com todos os personagens do filme se encontrando numa janta depois de três anos, escutando a morte de Stalin ao rádio, o que seria um indício de dias melhores. Vemos até um sofrimento final de Körner pela “perda” de Klára para o namorado, mas logo ele se recompõe para retomar o clima suave, delicado e idílico da película, que acaba sendo o grande personagem.

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Um relacionamento idílico, embora com algum apelo sexual…

As atuações foram muito boas. Károly Hadjuk deu uma serenidade ímpar a Körner, o que contribuiu demais para o clima delicado do filme. Já Abigél Szõke foi mais explosiva, até porque interpretava uma adolescente problemática, mas igualmente frágil, que não aceitava a morte dos pais e caía em prantos à menor carência emocional que sentia, sendo muito dependente emocionalmente de Körner, o que afastava o apelo sexual da relação, embora esse apelo, volta e meia, desse sua cara, mesmo que de forma tímida. O único problema é que as cenas do apartamento de Körner eram demasiadamente escuras, o que pareceu a adoção de um clima mais soturno para representar o pós-apocalipse da guerra. Realmente incomodou um pouco, mas nada que tire a pegada delicada e idílica do filme.

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Klára tinha uma forte dependência emocional…

Dessa forma, “Aqueles Que Ficaram” é uma película obrigatória, pois aborda o trauma da guerra, um tema muito pesado, de uma forma muito delicada e afetuosa, embora haja um leve apelo sexual em alguns momentos na relação entre Körner e Klára. Vale muito a pena pela experiência.

Batata Movies (Especial Festival do Rio 2019) – Son Mother. A Tradição Como Destruidora De Vidas.

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Cartaz do Filme

Mais um importante filme do Festival do Rio 2019. “Son Mother” é uma co-produção Irã/República Tcheca de 2019 dirigida por Mahnaz Mohammadi. Vista como persona non grata pelo governo iraniano, ficando até presa por um período, Mohammadi é contundente com a religiosidade e as tradições iranianas no que tange aos vários problemas e dilemas que ela pode trazer para as pessoas. E isso se manifesta de forma notória em sua filmografia, como podemos ver nesse filme. Já falei em resenhas pregressas de como um certo preconceito burro contra o cinema iraniano tirou essas películas de nossas salas e de como o Festival é uma das poucas oportunidades de termos contato com o cinema iraniano novamente, cinema esse que rendeu dois Oscars de Melhor Filme Estrangeiro em poucos anos e que ainda é visto de forma muito injusta por aqui. Vamos lançar mão dos spoilers.

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Leila e Amir. Separados pela tradição…

O plot é o seguinte. Leila (interpretada por Raha Khodayari) é uma viúva com dois filhos pequenos, um menino e uma menininha. Ela trabalha numa fábrica e é vista com preconceito pelos homens da fábrica, sendo destratada por eles e recebendo severos pitos de seu patrão. Ao mesmo tempo, um dos motoristas de van da fábrica que transporta os empregados, Kazem,  propõe casamento para a mesma, que é pressionada a se casar pelas convenções sociais. O grande problema é o seguinte: o motorista tem uma filha e, se houver o casamento, ela não poderá viver com o filho de Leila, Amir, sob o mesmo teto, por alguns anos, o que vai implicar que Leila precisará colocar o filho em algum lugar por um tempo (até a filha de Kazem se casar). Inicialmente, Leila fica relutante em fazer isso, mas as pressões que essa sociedade altamente patriarcal e machista vão impor à viúva a forçam a aceitar o casamento (Leila será demitida da fábrica). E aí sobrará para o pobre do Amir que vai ser colocado numa escola para surdos-mudos com a documentação irregular e vai ter que fingir ser um deles, num ambiente de educação muito rígida.

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Kazem quer se casar com Leila, mas rígidas convenções complicam as coisas…

A diretora Mahnaz Mohammadi consegue ser muito contundente ao mostrar como a tradição (vista como a grande vilã do filme) consegue destruir a vida das pessoas. Se num primeiro momento Leila sofre demais com os preconceitos e as convenções da tradição no seu ambiente de trabalho, num segundo momento a película se volta para a realidade cruel de Amir, que tinha uma vida normal, atarefado com seus afazeres escolares e em cuidar da irmãzinha pequena para a mãe que passava todo o dia na fábrica. Só que as obrigações da tradição impõem o menino a viver escondido e sob um rígido regime numa escola de surdos-mudos. O menino chega a fugir da escola e vagar pelas ruas sem eira nem beira, como um menor abandonado, sendo ameaçado até por um pedófilo numa das caronas que pegou. Tudo isso para não passar pela “situação imoral” de conviver com a filha de seu enteado debaixo do mesmo teto enquanto ela não casa. É doloroso para Amir e para nós quando, num encontro com Kazem, ele vê a imagem da nova família com a mãe sorridente e sua irmãzinha juntamente com Kazem no celular do motorista, para novamente se desvencilhar e fugir pelo mundo. Sem destino, resta a Amir retornar para a escola de surdos-mudos e, como a mãe não retornou para regularizar a situação dos documentos do filho (até porque ela não tinha acesso a esses documentos), restou a Amir ficar confinado num orfanato, sendo o desfecho do filme com o menino tendo uma visão da mãe chegando para tirá-lo de lá, que se desvanece na realidade do orfanato, que se parece com uma prisão. Mais contundente e agressivo com o espectador impossível, fazendo com que este sinta toda a dor de Amir.

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Amir é obrigado a encarar uma triste realidade…

Assim, “Son Mother” é um importante filme de denúncia de uma situação em que as convenções morais de uma religião aprisionam as pessoas de uma forma implacável e covarde. Um filme para muito se pensar onde Mohammadi não tem papas na língua ao gritar contra as injustiças de seu país.

https://www.youtube.com/watch?v=L2k88BxOgEo

Batata Movies (Especial Festival do Rio 2019) – Deus É Mulher E Seu Nome É Petúnia. A Macedônia Na Idade Média.

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Cartaz do Filme

O Festival do Rio 2019 começou tardiamente em virtude das dificuldades econômicas e o período nefasto que atravessa nosso país. Ainda assim, no melhor sentido da palavra resistência, mesmo um tanto combalido, o festival aconteceu. E um dos filmes em cartaz foi o enigmático “Deus É Mulher e Seu Nome é Petúnia”, que é uma película sobre machismo numa Macedônia de contornos ainda medievais, lançando mão de um forte tom de denúncia. Um filme que tem elementos que chegam às raias do odioso. E um filme totalmente necessário. Vamos lançar mão de spoilers aqui.

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Petúnia, uma mulher humilhada…

Vemos aqui a trajetória de Petúnia (interpretada por Zorica Nusheva), uma moça na casa dos trinta anos que trabalhou apenas como garçonete e é formada em História. Ela vive em Stip, uma pequena cidade da Macedônia, e tem uma entrevista de emprego arrumada por uma mãe rigorosa, que a vê com um certo desprezo. A entrevista se revela um desastre total, pois o possível patrão inicialmente insinua um assédio sexual e depois a humilha como mulher e por ser gorda. Revoltada, Petúnia anda pelas ruas e encontra, no rio local, um ritual religioso com o padre ortodoxo lançando uma cruz ao rio gelado onde os homens da cidade irão disputá-la. Quem pegar a cruz terá boa sorte e prosperidade. O problema é que somente homens podem participar do ritual. E Petúnia, numa atitude totalmente inusitada, se joga ao rio e acaba pegando a cruz. Isso irá dar uma confusão de proporções colossais, com a polícia batendo à porta da moça e a levando para a delegacia. Como se trata de uma violação de uma tradição religiosa mas nenhuma lei secular foi desrespeitada, os policiais têm uma verdadeira batata quente nas mãos, precisando resolver o problema, mas não podendo prender Petúnia. A situação se agrava quando os homens que participavam do ritual da cruz tentam invadir a delegacia para agredir Petúnia, numa verdadeira caça às bruxas, sendo alguns deles presos. Petúnia somente consegue o apoio de uma repórter de TV que tenta denunciar a situação medieval pela qual a moça passava.

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Uma mulher num estranho ritual religioso masculino…

Esse é um filme que mostra, de forma contundente, a forma desprezível como a mulher é tratada em sociedades que se apegam a tradições religiosas em alguns rincões da Europa, onde as mesmas são proibidas de participar de rituais exclusivamente masculinos. Ou seja, é mais um caso de filme onde a tradição é vista como vilã, num momento do mundo em que grupos conservadores e de direita tomam cada vez mais frente. E a constatação de como um tema que fala de harmonia e amor como a religião ajudam a potencializar tanto ódio e preconceito em situações específicas.

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Pegando a cruz….

Apesar do tema pesado (o filme é vendido como uma comédia, mas ele pode ser muito tenso em várias passagens), optou-se por um happy end onde Petúnia sai da delegacia com sua cruz pela porta da frente e a devolve, de livre e espontânea vontade, para o padre, o que pareceu soar um pouco falso. De qualquer forma, ainda assim a película serviu como uma reflexão profunda sobre o conservadorismo de um país como a Macedônia, gritado a plenos pulmões pela trama como ainda muito medieval.

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Querelas com o poder religioso…

Dessa forma, “Deus É Mulher e Seu Nome é Petúnia” é mais uma película que é um reflexo dos tempos sombrios que passamos referentes aos avanços dos grupos conservadores pelo mundo e que precisam ser denunciados aos quatro ventos. Uma película um tanto pesada, mas absolutamente necessária.

Batata Movies – Argila. Um filme À Frente De Seu Tempo.

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Cartaz do Filme

A Academia Brasileira de Letras e a Cinemateca do MAM do Rio de Janeiro iniciaram uma parceria e criaram um cineclube com o nome de Cine Academia Nelson Pereira dos Santos. Tal iniciativa é de grande valia para a cultura não somente do Rio de Janeiro como de nosso país, nesses tempos tão sombrios e complicados. A ideia é realizar, em toda primeira terça-feira de cada mês, no Espaço Itaú de Cinema, a exibição de um filme brasileiro de relevância para a História de nosso cinema, seguido de um debate, ao bom espírito da tradição cineclubística, onde a exibição vem acompanhada de um esforço coletivo de reflexão. Há, também, uma intenção em se chamar a atenção para o estado precário de conservação de filmes importantes para a História do Cinema Brasileiro, um problema gravíssimo para a preservação de nossa memória, que já sofreu com a perda total de películas como “Favela dos Meus Amores”, de Humberto Mauro e estrelado por Carmen Santos. O primeiro filme no Cine Academia a ser exibido foi “Limite”, de Mário Peixoto (a Batata Espacial postou recentemente um texto sobre “Limite”), e os palestrantes foram o cineasta Walter Salles e o Presidente da Academia Brasileira de Letras Marco Lucchesi. O segundo filme foi “Argila”, de Humberto Mauro, protagonizado por Carmen Santos, que vamos tratar aqui.

Império Retrô | Arte, Moda e Comportamento: Carmen Santos e a construção da  personagem feminina brasileira
Carmen Santos, estrela de “Argila”…

Rodado em 1940, “Argila” é um filme que tem elementos que podemos dizer que são reflexo de sua época, mas que também estão à frente de seu tempo. O plot é o seguinte: Gilberto (interpretado por Celso Guimarães) é um talentoso artesão que gosta de fazer vasos artísticos, mas seu talento é rechaçado pelo dono da empresa de cerâmica onde trabalha, pois este quer que sejam produzidas apenas peças de interesse comercial. Na região (Corrêas, Distrito de Petrópolis) vive também Luciana (interpretada por Carmen Santos), uma viúva entusiasta da arte brasileira, que dá recepções e festas em seu rico castelo, para uma elite completamente fútil e que valoriza a arte europeia, sobretudo a da Grécia Antiga, principalmente o personagem Barrocas (interpretado por Floriano Faissal). Luciana contrata Gilberto para trabalhar em seu Castelo com dedicação quase exclusiva, o que enerva sua namorada Marina (interpretada por uma jovial Lídia Mattos). Há um claro interesse de Luciana por Gilberto, assim como pela cerâmica de Marajó, que o artesão consegue confeccionar com bastante desenvoltura. O detalhe é que o suposto namoro começa a ficar muito falado e o pai de Marina, com muito jogo de cintura, por pertencer a um estrato social mais baixo, atenta Luciana para o fato de que Gilberto é comprometido com sua filha. A ricaça entende o recado nas entrelinhas e acaba com qualquer chance de um enlace amoroso com Gilberto, que já estava disposto a abandonar sua futura esposa e cair nos braços de Luciana.

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Lídia Mattos e sua Marina, uma das fortes mulheres de “Argila”

A primeira coisa que chama a atenção em “Argila” é a valorização de temas nacionais. Não podemos deixar de esquecer que Getúlio Vargas manda criar o INCE (Instituto Nacional do Cinema Educativo), que foi capitaneado pelo próprio Humberto Mauro, com o objetivo de se fazer filmes que exaltassem temas nacionais. “Argila” vai muito em direção a isso, principalmente no que se trata à divulgação da cerâmica marajoara, onde temos até um trecho de uma palestra de Roquete Pinto, um entusiasta da cultura brasileira, assim como Mauro (no debate depois da sessão, André Di Mauro, neto de Humberto Mauro, chegou a comentar que Pinto e Mauro chegavam a acampar numa deserta Barra da Tijuca para ficar em contato com a natureza e falavam somente tupi-guarani ao acamparem). Luciana funciona como uma espécie de mecenas da cultura nacional, indo na contramão da elite brasileira supostamente letrada que valorizava mais a cultura estrangeira, onde Barrocas era a principal expressão, sendo um alívio cômico, sofrível para nossos olhos contemporâneos, assim como Ferreirinha, que se destacou por gritar ao telefone (a ligação devia ser realmente muito baixa na época), soletrando as palavras e se perdendo nisso.

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Gilberto e seu ofício de artesão…

O filme também exalta muito as diferenças entre as classes sociais. O núcleo da elite fútil que é recebida pacientemente por Luciana se contrapõe à classe humilde e trabalhadora da qual Gilberto e Marina fazem parte. Esse estrato social é totalmente ignorado pela elite, justamente com exceção de Luciana, que vê valor nas pessoas humildes, ainda que com um certo distanciamento. Mas é bem clara a diferenciação social no trato que os personagens da elite dão à empregada negra de Luciana, Vavá, praticamente de forma escravocrata. É curioso também perceber como Luciana, apesar de valorizar a gente humilde, lança mão da diferenciação social para afastá-la de Gilberto, para que este pudesse voltar à sua amada Marina. O único momento em que há uma aproximação entre a elite e a classe trabalhadora está na festa de São João, onde simpatias são feitas pelos dois grupos sociais, que compartilham uma mesma tradição popular.

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Cena de “Argila” de forte apelo sexual…

As personagens femininas também são um destaque. Marina é um exemplo de pureza imaculada. Há um fotograma muito interessante onde isso se manifesta, quando Marina faz o mesmo semblante da imagem da Virgem Maria logo acima de sua cabeça no momento em que Gilberto a abandona mais uma vez para ver Luciana. Apesar disso, Marina se coloca com muita propriedade em sua oposição aos assédios de Luciana em cima de Gilberto, sendo uma personagem um tanto forte, apesar de sua aparência frágil. Mas Luciana é, definitivamente, a personagem mais forte (e empoderada) do filme. Temos uma mulher moderna, à frente do seu tempo, entusiasta da cultura brasileira, além de ser uma mulher que assedia (inclusive com fortes insinuações sexuais, quando nos lembramos da cena em que ela observa avidamente Gilberto trabalhando e fumando sensualmente um cigarro) o homem que deseja. Isso para os anos 40, numa sociedade conservadora como a brasileira de então, era algo muito forte e desafiador das tradições. Entretanto, ainda que Luciana fosse uma transgressora, ela não abriu mão da preservação da instituição do casamento, sacrificando o seu amor por Gilberto para garantir o matrimônio dele com Mariana. Ou seja, moderna, ma non tropo.  

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Filme conseguia ser bem ousado para a época…

E o trabalho de Humberto Mauro nesse filme, do ponto de vista cinematográfico? Temos aqui um primor de fotografia, onde abusou-se do uso de claros e escuros de forma muito artística. A cena em que Luciana interpreta uma Julieta sob o Canto de Romeu mostra o valor da cinematografia de Mauro, assim como sua caminhada noturna num fantasmagórico vestido branco sobre um fundo negro onde a cabeça de Luciana desaparecia. A cena sensual do fumo de cigarro aqui já citada também é um exemplo desse primoroso uso do claro e do escuro. A montagem também pode ser frenética em alguns momentos, como vemos novamente na cena em que Luciana seduz Gilberto com o cigarro, onde closes dos olhos de Gilberto se alternam com as investidas de Luciana. Vendo “Argila”, podemos perceber claramente todo o talento de Mauro para o oficio do cinema.

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Carmen Santos, uma grande figura do cinema brasileiro, com Humberto Mauro (de óculos escuros), o diretor de “Argila”

Após a exibição do filme, tivemos o debate com Carla Camurati e André Di Mauro. Enquanto que Camurati exaltou todo o teor de dramaturgia do filme e a figura icônica de Carmen Santos, Di Mauro se ateve mais às pesquisas que fez sobre seu avô, Humberto Mauro, para a realização de seu documentário em homenagem ao cineasta (já resenhado aqui na Batata Espacial) que está entre os cem finalistas ao Oscar de Melhor Documentário para o ano que vem.

Lídia Mattos – Wikipédia, a enciclopédia livre
Mesmo numa idade mais avançada, Lídia Matos não perdeu sua doçura…

Dessa forma, “Argila” é um filmaço que faz parte da História muito frutífera de nosso cinema. Ou seja, esse é o tipo do filme que tem que ser preservado a todo custo por sua cinematografia, mas também por sua dramaturgia, pelo seu documento de época e pelas visões à frente de seu tempo. O Cine Academia Nelson Pereira dos Santos está aí para chamar a atenção para a preservação de nossos filmes. Mas também para fazer uma discussão altamente reflexiva sobre nosso cinema e nossa cultura. E como esse é um filme muito importante, nao deixem de assisti-lo na íntegra abaixo…

Batata Movies – Retablo. Homofobia Hardcore.

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Cartaz do Filme

Uma curiosa co-produção Peru/Alemanha/Noruega. “Retablo” é um filme sobre a cultura Quíchua (também conhecida como Inca), mas também é um filme sobre uma homofobia para lá de visceral. E o amor incondicional de um filho pelo pai, capaz de suportar todos os preconceitos. Para podermos falar sobre esse filme, vamos precisar de spoilers.

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Pai e filho mantendo uma arte bem tradicional…

Vemos aqui a trajetória de Noé (interpretado por Amiel Cayo) e Segundo (interpretado por Junior Bejar), pai e filho, que mantêm viva a tradição de construir retábulos em sua região, que são caixas de madeira decoradas com pinturas e pequenas figuras de massa que reproduzem famílias tradicionais, figuras religiosas e outros temas. Noé é visto como o artista local, o mestre, que recebe muitas encomendas de retábulos. Segundo segue à risca o oficio do pai e sua tradição artística, abrindo mão de trabalhar em lavouras como camponês. Mas o filho irá flagrar o pai numa prática homossexual, o que vai desnorteá-lo completamente. Ele mantém o segredo do pai, mas muda completamente seu comportamento, tornando-se muito agressivo, e provocando a desconfiança de sua mãe. Infelizmente, as preferências sexuais do pai vêm à tona na comunidade, o que provoca uma reação violenta da mesma (Noé recebe uma surra violenta) e sua esposa o abandona. Segundo, que estava indignado com o comportamento do pai, fica impactado pela violência extrema com a qual ele é tratado pela comunidade, e decide ficar com ele. Sem qualquer perspectiva de vida, Noé se suicida. E Segundo irá fazer um último retábulo cujo tema é o ofício de pai e filho, enterrando o pai junto com o presente.

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Levando as encomendas pelas cidades…

É um filme bem triste. Mas ele não poderia terminar de outra forma. O que choca muito é a violenta homofobia explícita que vemos na película, onde não há qualquer perdão para Noé naquela comunidade, sendo tratado de forma implacável até pela esposa, que o abandona, não sem chorar muito e ficar inconformada com a opção do filho de permanecer com o pai. O próprio Segundo é uma expressão dessa homofobia, não aceitando de imediato a condição do pai. O grande detalhe aqui é que a violência da homofobia é tanta que Segundo consegue rever os seus conceitos e o amor pelo pai e pelo ofício do retábulo acabam falando mais forte, a ponto dele defender abertamente o pai e seu ofício. A cena de briga de Segundo com um rapaz que o trata de forma extremamente preconceituosa por causa da opção sexual do pai é emblemática. Depois de apanhar do garoto, Segundo o ataca e o agride de forma extremamente agressiva, causando espanto entre todos que assistem em volta e sendo uma resposta na mesma moeda para a homofobia igualmente agressiva.

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Mantendo o ofício do pai, apesar de todos os problemas…

O filme termina com Segundo trancando a casa vazia, não sem levar o material de pintura que o pai usava para fazer o seu ofício, num claro indício de que ele manterá a tradição. Um fio de esperança num cenário totalmente distópico em virtude do preconceito.

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Sozinho no mundo em virtude do preconceito…

Assim, podemos dizer que “Retablo” é mais um grande filme onde o cinema denuncia de forma marcante o preconceito e a intolerância. Um filme que choca pela sua violência e intensidade da homofobia. Mas também um filme onde o amor entre pai e filho consegue enfrentar de peito aberto tanta intolerância. Um programa imperdível.  

https://www.youtube.com/watch?v=jCgmz8p8wxc

Batata Movies – A Resistência De Inga. Luta Contra A Corrupção.

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Cartaz do Filme

Uma co-produção Islândia/Dinamarca/Alemanha. “A Resistência de Inga” é um filme que fala de uma luta de uma viúva contra a corrupção e a opressão de uma cooperativa sobre uma comunidade. Para podermos entender melhor esse filme, vamos precisar lançar mão dos spoilers.

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Inga, uma mulher traumatizada com a perda do marido…

A Inga em questão (interpretada por Arndís Egilsdóttir) é casada com um fazendeiro. O casal está afogado em dívidas com a cooperativa em questão, pois ela obriga os fazendeiros da região a comprar e vender produtos somente com ela, praticando um monopólio que explora os produtores locais. O esposo de Inga acaba morrendo num acidente de carro, mas depois há muitas suspeitas de que tenha sido um suicídio, até porque Inga descobre que seu marido era obrigado pela cooperativa a extorquir os produtores locais que “saíam das regras”, já que ele também estava endividado. Inga irá começar um movimento de resistência contra a cooperativa em questão, brandindo a bandeira do livre mercado contra o monopólio.

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Lutando contra o poder corrupto de uma cooperativa…

Esse é um filme que realmente exalta a competição do livre mercado e demoniza a cooperativa como um bastião de corrupção. Quando vemos um discurso tão dicotômico assim, há de se abrir os olhos para as nuances da coisa. Se um monopólio pode ser prejudicial para uma comunidade, até que ponto também um mercado totalmente livre sem qualquer medida protecionista é totalmente benéfico? Há uma discussão entre Inga e o dono da cooperativa falando da importância da mesma para a economia da sociedade. Devemos nos lembrar que a importância da cooperativa para a comunidade pode ser vista como uma coisa, e suas práticas altamente extorsivas contra a comunidade como algo totalmente diferente. Uma cooperativa que funciona sem extorquir seus membros pode proteger também os mesmos das intempéries da economia capitalista. Mas esse não foi o caso aqui no filme.

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Não se dobrando ao aliciamento…

Numa situação dessas, tudo indicava que um final feliz seria falso. Mas o diretor Grimur Hákonarson optou por um desfecho híbrido, pois os produtores de leite conseguiram criar sua cooperativa própria e se livrar das garras da cooperativa corrupta, o que seria o happy end, mas as represálias contra Inga foram inevitáveis e ela acaba perdendo a fazenda em virtude das dívidas, sendo obrigada a recomeçar a sua vida em outro lugar. Até foi melhor assim, pois um final totalmente feliz soaria de uma forma muito falsa aqui.

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Buscando fundar uma nova cooperativa…

Assim, “A Resistência de Inga” é um curioso filme que trata de forma dicotômica uma questão que pode ser analisada de vários pontos de vista e vários meandros. De qualquer forma, é um filme que consegue agradar em seu final a gregos e troianos, pois consegue encaixar um happy end com um choque de realidade. Vale a pena dar uma conferida.  

Batata Movies – Um Dia De Chuva Em Nova York. Desencontros E Desencontros.

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Cartaz do Filme

Woody Allen está de volta em seu novo filme “Um Dia de Chuva em Nova York”. Temos aqui uma leve comédia romântica com um elenco, digamos, muito neófito. Parece até uma creche: Timothée Chalamet, Elle Fanning, Selena Gomez, Diego Luna, ou seja, um staff bem jovem. Há, também, presenças de atores um pouco mais rodados, como Liev Schreiber e Jude Law, mas a juventude dos atores realmente chama a atenção. De qualquer forma, ao contrário do que se pode esperar, esses jovens atores não foram mal por uma suposta inexperiência e deram conta do recado. Para podermos entender melhor a película, vamos precisar lançar mão de spoilers.

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Um casal cheio de planos com uma viagem…

A trama começa com um jovem casal, Gatsby (interpretado por Chalamet) e Asleigh (interpretada por Fanning), que estudam numa Universidade do interior. Ele é um bon vivant que rechaça a educação moral de sua família e consegue descolar um dinheiro em mesas de pôquer. Ela é uma jovem jornalista que consegue uma entrevista com um famoso diretor de cinema em Nova York. Os dois vão em viagem para a metrópole para a moça fazer sua entrevista, e Gatsby tem muitos planos para que os dois tenham uma baita de uma estadia na cidade. Mas tudo vai dar errado, pois Asleigh acaba ficando tão impressionada com as crises existenciais e bloqueios criativos do diretor que procura ajudá-lo, mas o ritmo dos acontecimentos e uma série de desventuras levam a moça a se envolver com outras pessoas do meio artístico, proporcionando-lhe uma experiência única que a afasta totalmente de seus compromissos com o namorado.

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Mas a situação complica num dia de chuva…

Já Gatsby, por sua vez, encontra a irmã caçula de uma antiga namorada, Chan (interpretada por Gomez) e, paulatinamente, vai ficando interessado na garota que outrora considerava irritante. As desventuras de se estar em Nova York no local e hora erradas levam Gatsby a ir para uma festa organizada pelos pais, algo que ele não queria nem um pouco, e isso acaba fazendo com que ele receba da mãe revelações bombásticas sobre o passado da família. Ao fim de um dia de muita chuva, o casal protagonista finalmente se reencontra e, no dia seguinte num passeio de charrete, Gatsby decide ficar em Nova York e abandonar Asleigh, pois percebeu que a química dos dois não dava certo. O filme termina com Gatsby e Chan se encontrando e começando um relacionamento.

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Encontrando a irmã caçula de uma ex-namorada…

Esse filme segue mais ou menos as tendências que temos visto nos últimos filmes de Allen: algo um tanto regular, nem muito bom, nem muito ruim. Filmes regulares, sempre com um humor refinado onde, no caso desse recente filme, tivemos um uso maior das tiradas engraçadas e muitas referências ao cinema mais antigo como matéria-prima para as piadas. Ou seja, um filme que foi apenas ligeiramente melhor que os mais recentes que Woody Allen tem realizado.

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Jude Law, destaque entre os mais veteranos…

De qualquer forma, foi bom ver esse elenco jovial mostrando seu talento. Chalamet, apesar de jovem, já tem uma estrada bem construída na sua carreira, até com direito a uma indicação a Oscar de Melhor Ator e foi o melhor entre os protagonistas. Fanning, que aparece em destaque em “Malévola”, faz uma personagem muito deslumbrada com o meio cinematográfico, parecendo um tanto artificial todo esse deslumbramento em alguns momentos. Mas era adorável a moça. Já Selena Gomez tinha boas falas, mas sua atuação ficou muito plana e presa a uma personagem que tinha mais cara de badass do que qualquer coisa. Diego Luna teve pouco espaço de tela, mas confesso que gosto muito dele desde “Rogue One” e gostaria de ter visto mais de sua atuação.

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Woody Allen dirigindo um elenco neófito

Dessa forma, “Um Dia de Chuva em Nova York” é meio que um “mais do mesmo” de Woody Allen, ligeiramente mais engraçado que seus últimos filmes, que tem tido um desempenho bem regular. Vale pelo elenco jovial que deu conta do recado relativamente bem, fora um deslize aqui ou ali. Vale também pela curiosidade mas não é para se esperar muito.

Batata Movies – Jedi Carioca

Fan films sempre são bem vindos, pois são feitos de fãs para fãs. Ainda mais quando o filme é justamente sobre um fã clube. O documentário “Jedi Carioca”, dirigido por Helvécio Parente, mostra a trajetória do Conselho Jedi do Rio de Janeiro, fã clube dos aficionados por “Guerra nas Estrelas”.

Helvécio Parente, o diretor

Produzido por Felipe Trotta e a produtora Escaravelho Filmes, esse documentário independente de uma hora e quarenta e sete minutos foi o resultado árduo de, em dois anos, reunir materiais como vídeos, fotos e entrevistas para conhecer a história do mais antigo fã clube de “Guerra nas Estrelas” do Brasil, que já tem 22 anos.

Felipe Trotta, o produtor

Tudo começou com um pequeno grupo de pessoas que era fissurado por “Guerra nas Estrelas”, mas não tinha com quem compartilhar e conversar sobre os filmes de George Lucas. Assim, houve uma das primeiras reuniões no Shopping Rio Sul, em Botafogo, ainda muito tímidas e com poucas pessoas.

Foto Histórica. O início do Conselho Jedi do Rio de Janeiro

O então pequeno fã clube, liderado por Brian Moura, tinha todas as restrições de comunicação na época, com uma internet ainda nascente. Mas a vontade de se encontrar para conversar sobre “Guerra nas Estrelas” com pessoas “da mesma tribo” era muito grande e, aos poucos, o pequeno grupo crescia, havendo os primeiros contatos com os fãs de São Paulo.

O incansável presidente do Conselho, Brian Moura

Viriam ainda as primeiras convenções Jedis em São Paulo, as primeiras reuniões no Rio de Janeiro em espaços maiores como o cinema Estação Botafogo, participações, às vezes um tanto inesperadamente esdrúxulas em programas de auditório de TV, toda a expectativa da volta de “Guerra nas Estrelas” com o Episódio 1, a organização dos Jedicons do Rio de Janeiro e a criação do Cineclube Sci-Fi.

Henrique Granado, há muuuito tempo atrás!!!

O documentário conta com vários depoimentos, como os do próprio Brian Moura, Henrique Granado, Alexandre Amaral, Roberta Manaá, Helvécio Parente, Priscila Queiroz, Tibério Velazquez, Marcelo Melo, dentre muitos outros, de fundadores do Conselho até as gerações mais novas de fãs, que fizeram a história desse simpático fã clube se desenvolver ao longo dos anos e crescer sempre em número de integrantes. A prova máxima disso são os créditos finais, onde os nomes dos integrantes do fã clube se estendem na tela por um bom tempo, com um número de pessoas muito maior do que os primeiros fãs de dezoito anos atrás.

Roberta Manaá passou como um cometa, deixando um rastro muito importante

A impressão que se tem é a de que o Conselho Jedi do Rio de Janeiro se transformou em uma grande família, onde sempre um novo membro é bem vindo e carinhosamente acolhido. Uma família que ainda cresce.

Alexandre Amaral deu o depoimento mais emocionado… Grande cara, grande coração!!!

É claro que nem sempre tudo são flores e é muito difícil organizar eventos para reunir os fãs. Assim, não podemos deixar de ressaltar como aqueles que estiveram à frente do Conselho e da organização de tais eventos sempre vão merecer nossa gratidão por dedicarem uma boa parte do tempo de suas vidas pelo simples prazer de reunir a galera que ama “Guerra nas Estrelas” e outros produtos culturais que são considerados hoje das tribos pop, geek e nerd.

Priscila Queiroz, que também teve grande importância

Nestes encontros, novos amigos são feitos, as pessoas se encontram para discutir e debater temas que gostam, há muita diversão e celebração. A existência de um grupo que faz tais atividades é muito importante numa época em que as pessoas vivem um clima de hostilidade extrema em que ninguém mais se respeita e a agressividade impera. Depois de alguns dias exaustivos de rotina nesse mundo completamente insano, essas pessoas que são obrigadas a enfrentar todas essas mazelas se encontram para, justamente se ampararem umas às outras, se alegrarem umas às outras, se respeitarem umas às outras. Tais atitudes ainda nos fazem crer no ser humano pois, por mais que a gente passe por adversidades, por mais que a gente rode por aí mergulhado nas angústias do dia a dia, ao final, só temos a nós mesmos. Só um ser humano pode amparar e ajudar o outro, não há muito como se fugir disso. O homem (e a mulher, é claro!) tende a se organizar em sociedade e sempre depende do próximo.

Eduardo Miranda, um especialista em “Guerra nas Estrelas” desde sempre.

Felizes são aqueles que conseguem estar num grupo de pessoas altamente solidário e que trata um ao outro com carinho e amizade. E esse é o caso do Conselho Jedi do Rio de Janeiro. Por isso, encerro estas linhas com apenas um desejo: “Vida Longa e Próspera ao Conselho Jedi do Rio de Janeiro!” (ops…)