Batata Movies – Espiões. Ação, Crime e República de Weimar.

Spione - Wikipedia
Cartaz do Filme…

Mais um filme da fase alemã de Lang. “Espiões” (“Spione”, 1928) é outro longa de Lang com uma duração maior do que a normal, cerca de duas horas e meia (filmes como “Metrópolis” e “A Mulher na Lua”, que serão futuramente resenhados aqui, se incluem nessa categoria), regado a muita ação, um vilão emblemático (interpretado por Rudolf Klein-Rogge) e alguns elementos que nos lembram um pouco a História da República de Weimar e que pareciam prever o futuro de uma forma assustadora. Para podermos falar dessa película, vamos precisar liberar os spoilers de noventa e dois anos.

Fritz Lang - Spione (Spies), 1928. Beginning. - YouTube
Haghi, o grande protagonista do filme…

O plot é o seguinte. Haghi (interpretado por Klein-Rogge) é o dono de um banco que também lidera uma rede de espionagem que rouba documentos secretos e tratados. A polícia tenta desbaratar essa rede de espionagem e lança mão de vários agentes para isso. Só que muitos deles acabam assassinados. A bola da vez será o agente 326 (interpretado por Willy Fritsch), que iniciará uma investigação. Haghi, então, enviará Sonja (interpretada por Gerda Maurus) para seduzir 326 e matá-lo. Mas ela se apaixona pelo agente e o poupa. Com isso, Haghi à manterá confinada e vai lançar mão dela em outras missões. Durante a exibição do filme, vemos um jogo de gato e rato entre a polícia e a organização secreta de Haghi, que continuará a roubar documentos secretos. Ao final, depois de muitas investigações e subtramas, a polícia consegue chegar ao banco de Haghi, que libera um gás venenoso em todo o prédio para fugir. A polícia consegue descobrir que Haghi é um agente duplo, cujo disfarce é o de um palhaço num show de variedades. Ele é cercado pela polícia durante uma de suas apresentações e acaba se suicidando com um tiro na cabeça.

Esse é um filme surpreendente, por ter uma trama muito intrincada, que muito exige a atenção do espectador, até porque essa é uma película muda. O que chama a atenção é que o mocinho do filme não é exatamente o protagonista. Ele até some do filme um pouco, depois que é enganada por Sonja, que também desaparece. Esse é um filme cheio de subtramas, onde Haghi sempre ganha da polícia e consegue seus objetivos, sendo esse o grande protagonista do filme, mesmo que agindo nos bastidores. Dentre as subtramas, chama a atenção a que envolve os japonses, onde o Dr. Masimoto (interpretado por Lupu Pick), conversa com um 326 arrasado no bar depois deste ter sido enganado por uma mulher e Masimoto o ter aconselhado a não se deixar levar por uma mulher, ele mesmo irá ser seduzido por uma agente de Haghi e perderá um documento secreto para ela, depois de Masimoto ter sacrificado três agentes com documentos falsos, que também foram pegos por Haghi. Com isso, Masimoto acaba se suicidando, ao bom estilo japonês. Mais uma vez, Lang insere as culturas orientais em seu filme.

Fritz Lang's Spione (Spies) 1928 DVD/Blu-Ray Review – South West ...
O número 326, ornado por cartazes de “Metrópolis”…

O que muito chama a atenção é a forma como a República de Weimar aparece no filme. O início da película mostra todo um rosário de crimes de Haghi, onde víamos até assassinatos de políticos, algo que acontecia naqueles dias de Alemanha da década de 20, onde grupos extremistas faziam ataques a políticos com os quais eles não concordavam em seus procedimentos. O próprio Haghi é a personificação de um grande empresário capitalista cruel, que muito contribuiu para a ascensão do nazismo no país. A cena do ataque ao Banco de Haghi impressiona não somente pela ação e violência, mas também pela incômoda previsão do uso do gás venenoso. O filme também tem um certo quê premonitório ao seu desfecho quando Haghi, o agente duplo, cercado por todos os lados, acaba cometendo suicídio. Impossível não fazer uma analogia com Hitler, que também foi um agente duplo antes de manipular o Partido dos Trabalhadores Alemães (que, inclusive, ele foi incumbido pela polícia de vigiar), e transformá-lo no Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Devemos lembrar também que Haghi não era um criminoso comum, somente interessado pelo dinheiro. Seu real interesse era ter posse de segredos de estado e tratados, para ter a capacidade de um certo poder político de manipulação. Ou seja, um grande empresário capitalista que busca o poder político de formas ilícitas. Nada mais contemporâneo do contexto histórico de Weimar.

Spies (aka, Spione) (Fritz Lang, 1928) – Offscreen
Sonja, que arrisca a vida por 326…

Assim, “Espiões” é um grande filme de Lang, que pode até ser alçada á categoria de uma grande produção, pela grande duração do filme, pelo roteiro intrincado e pela forma como Lang traz, nas entrelinhas, todo o contexto histórico da República de Weimar, indo até, de forma assustadora, ao premonitório. Não deixem de ver abaixo o filme na íntegra, com intertítulos em espanhol.

https://www.youtube.com/watch?v=a7wofbg27qA

Batata Movies – Corações Em Luta. Mais uma Vez A Questão Dos Duplos.

Vier um die Frau (1921) - IMDb
Cartaz do Filme

Mais outro filme da fase alemã de Fritz Lang. “Corações em Luta” (“Vier Um Die Frau”, 1921) é também fruto de um roteiro de Thea Von Harbou e foi encontrado na Cinemateca Brasileira em São Paulo no ano de 1986. Para podermos falar dessa película, vamos liberar os spoilers de noventa e nove anos.

Four around the Woman (aka, Vier um die Frau) (Fritz Lang, 1921 ...
William e Florence. Um vigarista e uma mulher fiel..

O plot é bem simples. Harry Yquem (interpretado por Ludwig Hartau) compra uma jóia para sua esposa Florence (interpretada por Carola Toelle) num submundo de ladrões. Lá, ele vai encontrar William Kraft (interpretado por Anton Edthofer), um vigarista de hábitos requintados e que tem um irmão gêmeo, Werner, que foi amante de Florence antes de seu casamento arranjado com Harry. Na noite do casamento de Florence, Werner a visitou e Harry ia flagrar a futura esposa com Werner no quarto. Para que a moça não fosse culpada, Werner simulou um assalto e amarrou Florence antes de fugir. Mas Harry sempre ficou com a pulga atrás da orelha com relação a isso. Harry, ao ver William, confundiu-o com Werner e armou uma espécie de armadilha para flagrá-lo com Florence. Mas William é que foi a casa de Florence. Como Harry cometeu muitos crimes ao se enfiar no comércio de jóias no submundo, um grupo de assaltantes foi à sua casa, onde um tiroteio aconteceu e Florence foi atingida. A moça não morreu, mas acabou vendo o marido sendo preso, depois que Harry matou um detetive contratado por ele para espionar a esposa e que foi confundido também com um amante por Harry. O filme termina com a inocente Florence prometendo esperar o amado Harry sair da prisão, mesmo com Werner ajudando com a polícia a evitar o assalto da casa de Harry.

Quatre Hommes autour d'une Femme (Vier um die Frau) (1921) de ...
Werner, obrigado a viver na miséria do submundo…

É um filme um pouco enrolado, talvez pelo fato da cópia da Cinemateca Brasileira provavelmente não estar inteira. Mas o que chama a atenção é o fato de vermos uma película inicialmente de tons mais policiais, com Harry se disfarçando para fazer as suas atividades ilícitas no submundo, assim como Werner, sem dinheiro, precisando sobreviver naquele meio. Com o tempo, o filme se transforma mais num drama conjugal onde Harry busca investigar a esposa para descobrir se ela o traiu ou não. Temos a presença de um flashback no filme, onde testemunhamos o que aconteceu na noite de casamento de Florencce, um flashback que chega meio que sem avisar, e que exige a atenção do espectador. Mas o mais interessante aqui é que, a exemplo do que vimos em “Depois da Tempestade”, a questão do duplo foi novamente utilizada, onde Harry confundiu William com Werner. Se o último nutria um amor sincero por Florence, William, por sua vez, tinha um caráter mais baixo e via Florence como mais uma vítima de suas conquistas, algo que somente não aconteceu quando ele percebeu a confusão que Harry fez com as identidades dele e de seu irmão. No mais, temos a presença de uma amiga de Florence que encarnava a infidelidade em pessoa, mais para ser uma espécie de contrapartida à própria fidelidade de Florence, que mesmo apaixonada por Werner, acaba declarando juras de amor a Harry ao final do filme, dando um quê conservador à película. Se há uma suspeita de Harry com relação à fidelidade de Florence, essa se mostra a perfeita casada ao final.

Four Around the Woman, the German Silent Drama by Fritz Lang | Fandor
Harry. Assolado pela dúvida…

Dessa forma “Corações em Luta”, apesar de um pouco confuso, mostra um filme policial que depois descamba mais para um drama conjugal. A questão dos duplos novamente é usada para dar um gosto especial ao drama, que tem um desfecho conservador, sem maiores voos altos. E não percam a oportunidade de assistir ao filme na íntegra, com intertítulos em português (da época em que o filme foi exibido no Brasil) abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=Ouju7iGkotM

Batata Movies – Depois Da Tempestade. Confusões Com O Amor Livre.

Das wandernde Bild (The Moving Image) (1920) - Filmaffinity
Cartaz do Filme

Mais uma película da fase alemã de Fritz Lang. “Depois da Tempestade” (“Das Wandernde Bild”, 1920) tem um roteiro, no mínimo curioso. Vemos aqui todo um imbróglio surgido a partir de um apologista do amor livre, ou seja, aquele que quer apenas juntar os trapinhos com a companheira, não formalizando o casamento, o que era um escândalo para a sociedade da época. Esse foi o primeiro filme da parceria Fritz Lang – Thea von Harbou, com esta última assinando o roteiro. Um detalhe interessante aqui é que esse filme era considerado perdido, mas foi recuperado a partir de uma cópia que se encontrava na Cinemateca Brasileira, em São Paulo. Para podermos entender um pouco melhor o que foi essa confusão toda, vamos precisar liberar os spoilers de um século.

Das wandernde Bild 1920 | Free Download | Cinema of the World
Irmgard foge de um passado complicado…

Vemos aqui a história de Irmgard (interpretada por Mia May), que conhece um distinto cavalheiro de nome Georg Vanderheit (interpretado por Hans Marr), um adepto do amor livre, ou seja, ele defende uma união não-formal entre homem e mulher. Irmgard inicialmente começa trabalhando como a secretária de Georg, mas logo os dois se apaixonam e Irmgrad engravida. Mas Georg mantém suas convicções e não quer formalizar um casamento. Irmgard, então, se casa com o irmão gêmeo de Georg, John. Georg, desiludido, foge. Ao saber de tudo, John se revolta, o que provoca a fuga de Irmgard para o interior.

The Wandering Image - Wikipedia
Ela era perseguida por John, com quem se casou…

John a persegue e a moça foge para as montanhas, onde encontra Georg vivendo como eremita numa cabana. John quase os mata explodindo uma pedreira em cima da cabana de Georg, mas Will Brand (interpetado por Rudolf Klein-Rogge), que está apaixonado por Irmgard, consegue salvar o casal e, na perseguição a John, este morre, caindo num precipício. Irmgard pede que Georg volte a viver com ela, mas este, fez uma promessa a uma imagem da Virgem Maria de que somente deixaria as montanhas se a imagem da Virgem andasse. Will Brand tenta se aproximar de Irmgard. Mas, nesse meio tempo, um tronco de árvore cai da ribanceira e atinge a imagem da Virgem Maria. Georg então acha que a imagem andou e acha que isso é um sinal para procurar Irmgard. Os dois terminam a história vivendo juntos nas montanhas dentro de um amor sincero.

TeleCineBrasil: Das Wandernde Bild - A imagem em movimento (Depois ...
Georg, adepto do amor livre, renunciou a tudo depois de uma grande decepção…

Esse é um filme de plot muito simples não fosse a questão do amor livre, que detonou toda a crise, um tema demasiadamente moderno para a época. Há, ainda, a curiosidade de testemunharmos o ator Hans Marr interpretando o mocinho e o bandido, já que se tratavam de irmãos gêmeos, inserindo aí a questão dos duplos, algo vindo do barroco e do expressionismo, e que veríamos novamente em “Metrópolis”. O personagem de Rudolf Klein-Rogge, Will Brand, acaba sendo o bonzinho que se apaixona pela mocinha, mas fica a ver navios quando ela prefere ter uma vida feliz com Georg, já que este, que era adepto do moderno amor livre, estranhamente só se une à sua amada depois que vê concretizada uma promessa à Virgem Maria. Talvez a sua desilusão amorosa, ao ver sua amada casando com seu irmão, tenha o feito abandonar totalmente a sua vida moderna e o levado a mergulhar em claustro na tradição. Essa dubiedade do personagem também pode ser vista como um sinal do duplo. Pelo menos Will Brand ficou com a herança da família, pois ele era primo de Georg. O casamento de Irmgard com John tirou a Will Brand o direito da herança; como a moça não era apaixonada por Brand, ela abriu mão da herança em favor de Brand, e assim nosso gentleman, que foi infeliz no amor, pelo menos ficou com a herança.

TeleCineBrasil: Das Wandernde Bild - A imagem em movimento (Depois ...
Promessa à Virgem Maria..

Dessa forma, “Depois da Tempestade” é um filme da fase inicial de Lang que marca o início de sua parceria com The von Harbou, mostra a curiosidade de se trabalhar o tema do amor livre e flerta com a questão dos duplos, uma herança não só do barroco como do expressionismo. Aproveitem para assistir abaixo esse filme com intertítulos em espanhol, que só não se perdeu totalmente por mérito da Cinemateca Brasileira, que conservou uma cópia.

https://www.youtube.com/watch?v=THFKG9c4-Ls

Batata Movies – As Aranhas (Parte 2), O Barco De Diamantes. Sai O Culturalismo, Fica O Imperialismo.

The Spiders Blu-ray - Fritz Lang
Cartaz do Filme

Dando sequência às análises de filmes de Fritz Lang na Batata Espacial, vamos falar hoje da segunda parte do filme “As Aranhas”, intitulado “O Barco de Diamantes”. Lembrando que essa película foi rodada em 1920 e os spoilers de um século estão liberados.

Crítica | As Aranhas – Parte 2: O Barco de Diamantes – Plano Crítico
Lio Sha à procura do diamante…

Qual é o plot? O herói Kay Hoog procura sua vingança contra Lio Sha e organiza uma batida policial onde a vilã consegue fugir. Ela está atrás do diamante cabeça de Buda, cuja posse dará poder sobre todo o continente asiático, ampliando a teia das Aranhas por aquela parte do mundo. Os poderes de um vidente serão utilizados para se saber o paradeiro do diamante, que está com o contrabandista inglês John Terry. Lio Sha seqüestra a filha de Terry para chantageá-lo. Hoog, ao saber que o diamante pode estar com Terry, o procura mas fica sabendo que foi um antepassado de Terry que consegui o diamante e que ele estaria nas Ilhas Malvinas. Hoog e Sha se encontram novamente nas Malvinas e o protagonista consegue achar o diamante primeiro numa espécie de gruta. Mas é aprisionado por Sha. O problema é que a gruta libera um gás venenoso que mata Sha e seus capangas. Hoog consegue fugir com o diamante e liberta a filha de Terry. É o fim das Aranhas.

Kitsch, Sensation – Kultur und Film: Die Spinnen • Senses of Cinema
Kay Hoog atrás de pistas…

“O Barco de Diamantes” segue a mesma pegada de aventura vista no primeiro filme, embora seja menos impactante por não se tratar de uma novidade, seguindo a regra de que, geralmente, toda sequência é pior do que o primeiro filme. Mas agora há mais elementos exóticos. A sequência da cidade subterrânea chinesa impressiona, assim como a sequência do vidente indiano. De qualquer forma, o elemento estrangeiro parece ser tratado aqui com mais preconceito de que em “O Lago Dourado”. Se no primeiro filme, os incas eram vistos como fanáticos que faziam sacrifícios ao Sol, ainda havia todo um ornamento da arquitetura nativa que parecia dar àquele povo alguma exaltação, isso sem falar da doçura da nativa Naela, que inclusive se torna a esposa do protagonista europeu. Já em “O Barco de Diamantes”, os chineses são tratados como pessoas ardilosas e traiçoeiras, chegando a viver nos subterrâneos, tais como insetos. O ritual indiano do vidente que ceifa a sua vida para dar a informação da localização do diamante, nos dá a impressão de que a vida humana está abaixo dos interesses da ambição para os povos asiáticos. Povos esses que querem o diamante para poder controlar seu continente, não dando brechas para a presença imperialista européia. Caberá ao herói europeu Hoog tomar o diamante para que os europeus possam ter garantida a sua presença imperialista na Ásia, à despeito de As Aranhas desejarem a posse do diamante para também terem uma maior influência sobre o continente, o que reforça o argumento imperialista. Ou seja, se em “O Lago Dourado” há uma presença culturalista e imperialista no filme, em “O Barco de Diamantes”, o culturalismo é chutado para escanteio para dar lugar a um fulgurante imperialismo em todo o seu preconceito às culturas “primitivas”.

Como haveria mais duas partes a serem filmadas da saga de Kay Hoog, pareceu que o desfecho de “O Barco de Diamantes” ficou em aberto, pois esperava-se que Hoog fizesse um par romântico com Ellen, a filha de Terry, o que não aconteceu. De qualquer forma, a organização criminosa foi destruída e Lio Sha pagou o seu crime de ter matado Naela com a sua própria vida.

Fritz Lang, Die Spinnen (1919) | nãomef
Um mordomo suspeito, para variar…

Dessa forma, “O Barco de Diamantes” dá um final à série “As Aranhas”, dois filmes de aventura, com cara de Indiana Jones pré-expressionista, e que alimenta todos os preconceitos oriundos da expansão imperialista europeia pelo mundo àquela época. Veja o filme com legendas em inglês abaixo.

Batata Movies – As Aranhas, Parte 1, O Lago Dourado. Culturalismo E Imperialismo.

The Spiders (film) - Wikipedia
Cartaz do Filme

Dentro da retrospectiva de Fritz Lang que a Batata Espacial está organizando, vamos retornar a 1919 e falar do filme “As Aranhas” (“Die Spinnen”), que é dividido em duas partes: “O Lago Dourado” e “O Barco de Diamantes”. Esses são os filmes mais antigos dirigidos por Lang que ainda existem, pois “Halbblut” (1919) e “Der Herr, Der Liebe” (1919), são considerados perdidos. Vamos, primeiro, falar de “O Lago Dourado”, deixando “O Barco dos Diamantes” para outra ocasião. Lembrando sempre que os spoilers de cento e um anos estão liberados.

Die Spinnen – Wikipédia, a enciclopédia livre
Kay Hoog, o protagonista…

Qual é o plot do filme? Em São Francisco, Kay Hoog (interpretado por Carl de Vogt) encontrou, enquanto estava em seu iate no mar, uma garrafa com uma mensagem dentro. A mensagem falava de um tesouro do povo Inca, algo que atrai Kay. Ele comunica aos seus pares que vai viajar para o Peru, pois ele iria participar de uma competição. Ao comunicar que vai atrás de um tesouro, ele desperta a atenção de Lio Sha (interpretada por Ressel Orla), que é a líder de uma organização criminosa chamada “As Aranhas”. Ela manda seus capangas invadirem a casa de Hoog para roubar a mensagem que estava na garrafa e organiza a viagem para o Peru. Hoog também viaja para lá e consegue recuperar a mensagem na garrafa. Hoog e Sha chegam ao Peru e o primeiro se apaixona por Naela (interpretada por Lil Dagover), uma espécie de sacerdotisa do Sol, que era obrigada por seu povo a estar em rituais de sacrifícios. A moça pede para Hoog fugir, pois os incas não poupam os brancos. Naela mostra a região onde estão os tesouros incas, que possuem velas que não podem ser acesas, pois estão amaldiçoadas. Os incas aprisionam Lio Sha, que será oferecida em sacrifício. Mas a quadrilha das Aranhas ataca os incas, provocando grande confusão. Eles encontram o ouro e acendem as velas amaldiçoadas para iluminação, despertando a maldição e levando a uma grande tragédia, onde o ouro é arrastado para o fundo do mar com muitos capangas, sobrando apenas Liu Sha e mais outro capanga. De volta a São Francisco, Hoog tem uma vida feliz com Naela. Liu Sha o procura, dizendo que está apaixonada, mas Hoog diz que vive bem com Naela. Como represália, as Aranhas matam Naela, deixando uma aranha em cima de seu corpo como marca de que foram responsáveis pelo crime. Hoog se agarra ao corpo morto de sua amada, jurando vingança.

The Spider Who Loved Me | supervistaramacolorscope
Lio Sha, a vilã, e os motivos pré-colombianos…

Esse filme chama a atenção para uma das características de Lang já mencionadas aqui: a sua paixão por culturas fora da Europa. O diretor, em sua juventude, fez viagens pela Ásia e vemos as chamadas culturas “exóticas” marcando presença em seus filmes, seja  na fase alemã, seja na fase americana. Aqui é feita toda uma construção em cima da cultura inca que, à despeito de algumas imprecisões históricas e geográficas (a principal riqueza inca era o ouro, ao invés da prata, os sacrifícios ao Sol eram mais característica da cultura asteca e das demais culturas pré-colombianas do México e os tesouros incas acabarem soterrados no mar para uma cultura que vivia nos Andes), muito impressionou com a construção arquitetônica dos templos, de motivos pré-colombianos bem pronunciados. Se houve um cuidado em se mostrar uma suposta cultura inca, ainda assim podemos perceber um quê imperialista, com europeus indo à busca de tesouros de culturas “primitivas”. A nativa Naela inclusive pede para que o herói branco e europeu Hoog se proteja dos incas, além de ser contra a cultura de sacrifício da qual a própria Naela é sacerdotisa. Não podemos nos esquecer que esse é um filme de aventura, baseado em romances juvenis do gênero, que seria construído em quatro episódios, mas onde somente dois episódios foram produzidos.

Acervo História do Cinema: As Aranhas Alemanha 1919 Fritz Lang
Hoog salva Naela de uma perigosa cobra…

Outra coisa que chama a atenção é a vilã do filme. Lio Sha, além de seu nome de clara origem asiática, ainda é a chefe de uma organização criminosa, que se veste com roupas masculinas e lida com gente da pior espécie, ela mesma sendo uma pessoa sem nenhum caráter. É interessante ver Lang colocando uma mulher num personagem que, muito provavelmente, seria interpretado por um homem em 1919. Lio Sha talvez tenha sido o personagem mais carismático da trama, até mais do que o protagonista Kay Hoog. Ao contratar capangas mexicanos para a missão e ver a luta de Hoog com tais capangas, sentimos uma presença de Western, gênero com o qual Lang teria um contato mais íntimo em sua fase americana décadas depois.

The Spiders (film) - Wikipedia
Naela morta, e a marca dos assassinos…

Dessa forma, “As Aranhas, Parte 1, O Lago Dourado”, é um curioso filme de Lang feito nos primórdios de sua carreira. Destinado a ser um filme de entretenimento e aventura, aparece aqui todo um cuidado (ainda que pouco acurado) de retratar uma cultura considerada exótica pelos europeus, mesmo que a aventura insira um quê imperialista no filme. A grande virtude aqui é o exotismo e a complexidade da personagem Lio Sha, uma mulher moderna líder de uma organização criminosa, que marca seus crimes sempre com a presença de uma aranha. Não deixem de ver abaixo o filme na íntegra, legendado em inglês.

Batata Movies – Os Corruptos. Um Fritz Lang Muito Violento.

The Big Heat - Wikipedia
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana e “Noir” de Fritz Lang. “Os Corruptos” (“The Big Heat”, 1953), é um filme bem violento para os padrões da época, de um realismo agressivo e intenso, ao bom estilo de medidas extremas para situações extremas. Para podermos analisar essa película, vamos precisar liberar spoilers de sessenta e sete anos.

Os Corruptos (The Big Heat, 1953) – Análise Indiscreta
Bannion. Um homem em busca de vingança…

Qual é o plot? A película começa com um policial se suicidando. O sargento da polícia Dave Bannion (interpretado por Glenn Ford) investiga a situação e tudo leva a crer que o policial realmente se suicidou, sobretudo depois que ele conversa com a viúva do morto. Mas uma amante do policial levanta dúvidas sobre as reais causas do suicídio. Depois disso, a amante aparece morta. Bannion começa toda uma investigação que é seguidamente obstruída por seus colegas policiais e superiores, assim como ele não consegue ir para a frente quando interroga as pessoas. Logo, Bannion percebe que há um esquema de corrupção que envolve não somente a polícia como a máfia local, liderada por Mike Lagana (interpretado por Alexander Scourby). Bannion irá ameaçar Lagana dentro de sua própria casa, o que faz os capangas do mafioso instalarem uma bomba no carro do sargento. Sua esposa irá usar o carro, o que vai detonar a bomba e provocar a sua morte. Bannion, revoltado, acusa todos os seus colegas e se desliga da polícia, iniciando uma investigação por conta própria, onde vai lançar mão de muita violência para desbaratar todo o esquema de corrupção.

The Big Heat (1953) — The Movie Database (TMDb)
Ele não mede esforços em buscar seus objetivos…

O leitor pode até lembrar que tal enredo é muito visto em filmes de cultura de violência, ao melhor estilo de porrada, bomba e tiro que vemos hoje. Mas na época, isso era uma novidade, pois o cinema não mostrava tais questões de violência cotidiana de uma forma tão crua, como, por exemplo, explodir a esposa do homem que luta por justiça, o que o torna extremamente violento contra os algozes. E aí, a gente tem que tirar o chapéu para Glenn Ford, que foi mau que nem um pica-pau nesse filme, a ponto dele tentar estrangular a viúva do policial que se suicidou, já que ela estava envolvida no esquema. Não podemos nos esquecer que estamos falando do “mocinho” do filme. Ele agiu como um rolo compressor que não parava, impondo um baita de um respeito contra seus inimigos. Entretanto, devemos mencionar outra personagem aqui. Trata-se de Debby (interpretada por Gloria Grahame), namorada de Vince Stone (interpretado por um jovial Lee Marvin, de cabelos pretos e tudo), um dos capangas de Lagana. Ela procura Bannion depois deste dar uma dura em Stone em um bar. Mas Bannion, duro como uma pedra, nada quis com a moça.

Faded Video: The Big Heat (1953)
Debby dará alguma humanidade a Bannion…

Entretanto, Stone colocou um de seus capangas para vigiar a moça e, quando ela retorna à casa do bandido, este age de forma extremamente agressiva com ela, jogando café fervendo em seu rosto e deformando-a. Posteriormente, será a vez de Debby fazer o mesmo, conseguindo sua vingança. Ou seja, uma violência explícita e crua que deve ter chocado bastante na época. Parecia que Lang tinha elencado Gloria Grahame para papel de Cristo em seus filmes, já que ela também interpretou a esposa espancada e morta pelo marido em “Desejo Humano”, que também era estrelado por Glenn Ford (e já analisado aqui na Batata Espacial). Grahame também será “sacrificada” aqui, morrendo ao final do filme. Mas ela vai ter uma importância sobre o protagonista, devolvendo um pouco da humanidade a ele, a ponto de Bannion não matar Stone quando tinha a faca e o queijo na mão para isso. Talvez o maior castigo para Stone fosse passar o resto de seus dias com o rosto deformado pelo café fervendo e preso na cadeia. No fim, optou-se pelo “happy end”, com Bannion (com a ajuda de alguns amigos, diga-se de passagem) conseguindo desbaratar todo o esquema de corrupção, prendendo os envolvidos e voltando ao seu emprego. Até defendo um “happy end” aqui, dada a crueza e violência explicita que vimos nesse filme.

The Big Heat (1953) - Debby's revenge - Gloria Grahame, Glenn Ford ...
Vingança de rostos queimados…

Dessa forma, “Os Corruptos” é um grande filme “Noir” de Fritz Lang, talvez um dos mais viscerais e agressivos ao público. Ele antecede os filmes de cultura de violência surgidos ali na década de 80, onde um herói sedento por vingança e muito violento detona todos os seus inimigos depois de ter sua família destruída por eles. Mas ainda ficou um traço de humanidade no protagonista graças à figura de Debby. Infelizmente, não temos o filme na íntegra. Fica aqui a cena em que Debby tem sua face desfigurada pelo café fervendo. Imaginem o impacto disso há sessenta e sete anos.

Batata Movies – O Tesouro Do Barba Rubra. Um Contrabandista Com Um “Filho” A Tiracolo.

O TESOURO DO BARBA RUBRA (Moonfleet, 1955) DVD legendado em ...
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana de Fritz Lang. “O Tesouro do Barba Rubra” (“Moonfleet”, 1955) é um filme de época, o que garante algumas cenas de ação, mas que tem como escopo principal um drama de tons psicológicos. Para podermos falar desse filme, vamos liberar os spoilers de sessenta e cinco anos.

Tuesday Morning Foreign Region DVD Report: "Moonfleet" (Lang, 1955 ...
Uma herança expressionista logo no início do filme…

O plot fala de Jeremy Fox (interpretado por Stewart Granger), um cavalheiro que vive na Inglaterra do século XVIII numa cidadezinha chamada Moonfleet. Ele teve um caso com uma moça e esta teve um filho (não fica claro se de Fox ou não). O detalhe é que essa moça morre e, antes disso, ela envia seu filho para que Fox possa criar. O grande detalhe aqui é que Fox lidera um grupo de contrabandistas por trás de sua fachada de gentleman e viver com esse menininho não vai ser uma tarefa fácil. O garoto se chama John Mohune (interpretado por Jon Whiteley) e ele desenvolve uma afeição imediata por Fox. Irresistível, eu diria, o que vai deixar nosso rígido Fox bem melindrado. Há, ainda, uma lenda de que existe um fantasma de um pirata chamado Barba Rubra que anda pelo cemitério da cidade, assustando a todos e um diamante perdido. Enquanto o disfarce de Fox é preservado, ele até consegue manter a sua vida de gentleman e contrabandista cuidando de Mohune. Mas, quando é descoberto, ele vai precisar bolar uma estratégia para fugir e o menino passa a ser um problema para ele, ainda mais porque Mohune descobre a atividade ilícita de Fox e passa a ser perseguido pelo próprio bando do gentleman. Mas, por mais que Mohune seja um problema para Fox e ele queira se livrar do garoto, mais a consciência pesa para nosso protagonista quando ele tenta fazê-lo, sempre voltando para Mohune. Vai chegar uma hora em que a despedida será inevitável, mas ela soará como um “até breve”, onde Mohune tem a convicção de que Fox voltará para buscá-lo. Ficou para o espectador imaginar uma continuação para esse filme. Hoje em dia, talvez tivéssemos um “Tesouro do Barba Rubra II, a Volta de Jeremy Fox”, mas não foi o que aconteceu na época.

Moonfleet | Fritz Lang | Flagey
Fox e Mohune. O filme se resume nessa forte relação…

Esse é um filme que não estamos acostumados a ver Fritz Lang realizar. Um filme de época, o que exige uma preocupação com figurinos e cenários, bem cuidados, diga-se de passagem. Há um momento em que o Lang raiz retorna, exatamente nas cenas noturnas do cemitério, onde uma estátua sinistra e negra de um anjo aparece ameaçadora. Aliás, essa estátua aterroriza o nosso John Mohune bem ao início do filme, um menininho muito esperto e fofinho, com muita personalidade. Ou seja, muito carismático. Podemos dizer que ele tem as suas ambigüidades, em sua fofura e sua personalidade. Mas se há um personagem ambíguo nesse filme, ele é Jeremy Fo. Mulherengo, cavalheiro e um contrabandista que precisa controlar violentamente seus capangas que frequentemente querem se rebelar. Como se não bastasse, ele ainda precisou fazer o papel de pai postiço de Mohune. E, cá para nós, não fica muito claro se ele era apenas um pai postiço ou pai mesmo do menino. Outra coisa que fica para a imaginação do espectador. Logo, a personalidade de Fox nem pode ser considerada ambígua ao final das contas, mas sim multifacetada. O que mais chama a atenção é que ele vai ser uma boa pessoa com Mohune, o que vai um pouco na contramão da visão negativa do humano que vemos nos filmes de Lang. E a coisa se torna até comovente, quando vemos um Fox ferido ainda se preocupando com o menino para depois partir para uma fuga bem mais arriscada do que a solução que ele havia conseguido e que descartava Mohune de vez.

Moonfleet | Sabzian
O menininho amolece o contrabandista durão…

Dessa forma, “O Tesouro do Barba Rubra” é um filme de Lang que chama a atenção por ser um pouco diferente dos demais. Uma criança fofa, mas com personalidade, um pai postiço multifacetado, tudo isso tendo a Inglaterra do século XVIII como pano de fundo. O filme não chega a um primor das películas “Noir” do diretor, mas é digno de atenção. Infelizmente, não foi achada uma versão completa no Youtube. Fica aqui um trecho da introdução do filme.

Batata Movies – Suplício De Uma Alma. Pena De Morte Ou Não, Afinal?

Suplício de uma Alma - 13 de Setembro de 1956 | Filmow
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana de Fritz Lang. “Suplício de uma Alma” (“Beyond a Reasonable Doubt”, 1956) é um filme que aborda a questão da pena de morte, um assunto para lá de batido. Mas, dessa vez, a questão dá um grande nó na cabeça do espectador, pois o roteiro de Douglas Morrow foi bem capicioso. Para podermos falar do filme, vamos liberar os spoilers de sessenta e quatro anos.

Out of the Past: A Classic Film Blog
Spencer e Garrerr. Unidos contra a pena de morte…

O plot é o seguinte. Um renomado jornalista, Austin Spencer (interpretado por Sidney Blackmer) tem total aversão à pena de morte. Seu futuro genro, Tom Garrett (interpretado por Dana Andrews) largou o ofício de jornalista para se tornar um importante escritor e ficou bem interessado na questão de Spencer. Os dois discutem a seguinte situação: geralmente as condenações à pena capital possuem a característica de se basear apenas em provas circunstanciais. Spencer e Garrett acreditam que podem muito bem, num eventual homicídio, plantar provas falsas para incriminar uma pessoa e provocar uma condenação injusta. Assim, quando há o homicídio de uma dançarina, eles decidem plantar tais provas de forma que isso incrimine Garrett para, depois, tendo essa estratégia toda documentada, inocentar o acusado e das um duro golpe nas condenações à morte. Assim, Spencer e Garrett colocam seu plano em prática e Garrett é incriminado. O julgamento vai a um rumo em que há toda uma situação em que Garrett vai ser condenado. O grande problema é que Spencer morre num acidente de carro onde todas as fotografias que revelavam a farsa vão ser destruídas junto com ele, pois o carro pegou fogo. E, como ele usou uma câmara tipo polaróide (pois é, ela já existia nos Estados Unidos em 1956!!!), não há negativos. Caberá a futura esposa de Garrett, Susan (interpretada por Joan Fontaine) encontrar alguma prova que inocente Garrett. Será encontrada uma carta nos documentos de Spencer, inocentando Garrett e o governador irá lhe conceder o perdão. Entretanto, numa conversa entre Garrett e Susan, a moça descobre que Garrett conhecia o real nome da morta (ela era conhecida pelo nome artístico) e Garrett jurava de pés juntos que não a conhecia (Susan vai conhecer o nome real dela, pois foi feita toda uma investigação sobre a vida pregressa da morta, à qual Susan teve acesso). Garrett vai então confessar à Susan que ele conhecia a moça morta, que ela era um antigo caso dele e que ela começou a lhe pedir dinheiro quando Garrett se tornou um conhecido escritor. A ideia de Spencer de desqualificar a pena de morte pareceu a Garrett a oportunidade ideal de se livrar da moça. Susan ficou muito abalada com a situação e, criando muita coragem, comunicou a culpa de Garrett ao governador, que lhe negou o perdão, com a pena de morte triunfante ao final do filme.

Beyond a Reasonable Doubt (1956) – Wikipédia, a enciclopédia livre
Filme tem a participação de Joan Fontaine…

O filme começa com uma boa ideia: a condenação da pena de morte. E aí, é colocada toda uma situação, muito arriscada, diga-se de passagem, para se desmoralizar a pena de morte. É claro que alguma coisa teria que dar errado e Garrett ficaria numa situação muito complicada, tendo que provar sua inocência. Isso era mais do que óbvio quando vemos o plano sendo posto em ação. A gente só esperava quando a coisa fosse degringolar. Mas também ficava uma pulga atrás da orelha de até onde Garrett seria realmente culpado ou não, ou seja, um plot twist ao final. Esses eram os dois desfechos possíveis para o filme. Ou se usava um, ou se usava outro. Mas foram usados os dois, ao fim das contas. Fritz Lang sempre se disse realista e vemos um certo pessimismo em seus flmes quando ele aborda a questão humana. Esse pessimismo cai como uma luva quando vemos como a pena de morte é tratada. Se condenada ao início da película, ao final o espectador já não tem tanta razão dessa condenação devido à natureza sórdida de Garrett que é revelada nos momentos finais. Isso faz com que todo o esforço de Spencer caia por terra, e o mais cruel ainda, depois de morto o jornalista. Como se o acidente que provoca a sua morte funcionasse como uma espécie de punição pela tentativa de se questionar e atacar a pena de morte, que sai do filme totalmente soberana. Tirar a pena de morte da lei significa deixar um assassino impune. Ou seja, ela precisa existir, já que o ser humano é capaz das atitudes mais violentas. Essa acaba sendo a mensagem final do filme. A pena de morte é um mal necessário pela vilania humana e quem tentar mexer com ela acaba severamente punido. Nada mais agônico.

SUPLÍCIO DE UMA ALMA
Um assassino, que se faz de inocente, que se faz de assassino…

Assim, “Suplício de uma Alma” é mais um intrigante e inquietante filme de Fritz Lang. Se a película começa com uma tentativa louvável de se acabar com uma medida tão extrema, seu final pessimista mostra que tal medida é necessária, pois a humanidade nada tem de virtuosa. Infelizmente, não temos o filme na íntegra. Veja o trailer abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=shZfVgoCJUk