Batata Movies – Jurassic World, Reino Ameaçado. Mais Uma Vez, O Grande Vilão É O Homem.

 

Cartaz do Filme

E estreou o esperado “Jurassic World, Reino Ameaçado”. Confesso a vocês que, desde que vi o primeiro “Jurassic Park”, não gostei muito da cara do filme. Sei lá. Acho que foi aquele dinossauro abrindo a porta que eu não engoli muito, e também pelo fato de ter sido um ardoroso fã de “Elo Perdido” na minha infância, associando as imagens de dinossauros com meninas louras de trancinhas, com o Tchaca e os sleestaks. De qualquer forma, decidi voltar a ver um filme de dinossauros depois de algum tempo de abstinência e fazer uma pequena análise dele. Lembrando sempre que alguns spoilers rolarão por aqui.

Adestrando um dinossauro

E qual foi a minha impressão dessa nova película? Pelo que eu me lembre, sempre ficou meio implícito nos filmes que o grande vilão da história não são exatamente os bichões em si, mas o ser humano, que pisa continuamente na bola ao querer brincar de ser Deus e de tentar ganhar dinheiro com os lagartos terríveis. Dessa vez, o herói do filme, Owen Grady (interpretado por Chris Pratt, de “Os Guardiões da Galáxia”) é chamado para salvar os dinossauros do parque, que serão extintos por um vulcão ativo, sob a promessa de que eles ficarão isolados numa nova área longe dos humanos. Mas, na verdade, são pessoas inescrupulosas que tocam o projeto e, ao fim das contas, elas pretendem usar os dinossauros para vendê-los em um leilão, onde há todo o tipo de gente ruim que se pode conhecer. Para piorar a situação, um dinossauro é desenvolvido por engenharia genética, sendo ele uma verdadeira máquina de guerra, pronta para matar o que vê pela frente. E aí, tome dinossauro virtual de todos os tamanhos e tipos, com os humanos “bonzinhos” tendo que pagar um dobrado para não serem devorados pelas feras.

Participações de Jeff Goldblum…

Apesar do tema ser um tanto repetitivo, a película não cansa, pois as cenas dos bichões perseguindo as pessoas são cobertas de muito suspense. Ah, e a espécie desenvolvida geneticamente também abre portas! O que é mais interessante é a proximidade de Owen com um dinossauro chamado Blue, uma fera que tem uma inteligência bem desenvolvida, ao ponto de Owen conseguir uma espécie de comunicação rudimentar com ela e estabelecer um adestramento. É claro que os humanos ruins irão tripudiar do bichinho, que terá que ser curado com uma transfusão de sangue, cujo doador é um tiranossauro (!). Como tal coisa inusitada aconteceu? Deixo para vocês verem na película.

… Toby Jones…

No mais, o elenco tem nomes poucos conhecidos ou com carreiras mais sólidas em séries de TV. Um destaque especial fica para os nomes de Jeff Goldblum (que faz uma ponta recordando dos perigos do Homem brincar de Deus), Toby Jones (que marcou presença como um cientista da Hydra em filmes do Capitão América) e James Cromwell (o Zephran Cochrane de “Jornada nas Estrelas, Primeiro Contato”). No mais, o T-Rex e os brontossauros eram os mesmos…

… e James Cromwell…

Assim, “Jurassic World, Reino Ameaçado”, é um filme que mais uma vez prima pelo CGI que busca imaginar como seria uma coexistência entre dinossauros e seres humanos. Mesmo que se insista na temática, nunca é demais denunciar o poder do ser humano e da engenharia genética em animais irracionais, onde o Homem brinca de Deus e cria feras incontroláveis a seu bel prazer, causando morte e sofrimento em função de caprichos e ganância.

Chris Pratt fazendo uma selfie com o dinossauro mais perigoso…

Vale sempre a pena a gente se lembrar disso e que uma punição ao ser humano é uma mera consequência de seus atos tresloucados. Só por essa lição, o filme já vale, pois ele deixa de ser um mero entretenimento e introduz uma reflexão. Vale a pena assistir.

 

Batata Movies – Aliados. Dormindo Com o Inimigo?

Cartaz do Filme

O Oscar do ano passado teve outro concorrente que foi indicado, mas não levou. “Aliados”, do lendário Robert Zemeckis, concorreu à categoria de Melhor Figurino e é mais um daqueles filmes que abordam o inesgotável tema da Segunda Guerra Mundial. É uma história de espionagem e drama, com direito a uma enorme pulga atrás da orelha.

Um casal fake…

Vemos aqui a história de Max Vatan (interpretado por Brad Pitt), um espião que tem uma missão a ser realizada em Casablanca (só para ficar no climão dos filmes de guerra): eliminar o embaixador nazista. Para isso, ele fará contato com Marianne Beauséjour (interpretada pela sempre bela Marion Cotillard), uma outra espiã que será a sua “esposa”. Como o casal também é constantemente vigiado por espiões nazistas, os dois precisam fazer de tudo para parecerem marido e mulher o tempo todo, o que provoca uma atração entre os dois espiões. Chega o dia do atentado e tudo ocorre de forma bem sucedida. Aliás, a coisa foi até bem sucedida demais, pois o casal nem foi perseguido quando fugiu da cena do atentado. Os dois, então, decidem casar de verdade e têm uma filha, morando na Inglaterra, numa época em que o país era severamente bombardeado pela Força Aérea Nazista.

Cumprindo uma missão…

Mas um dia, a vida de Max vai realmente virar de cabeça para baixo quando seus superiores o chamam e dizem a ele que há fortes indícios de que sua esposa é uma espiã alemã. Isso será checado e, caso a esposa seja realmente a espiã, o próprio marido terá que matá-la, caso contrário ele será acusado de alta traição e fuzilado. Simples assim. A partir desse momento, Max vai começar uma corrida contra o tempo para investigar toda a situação e concluir se sua esposa realmente é uma traidora ou não.

Um fuga bem sucedida…

Ufa, dá para perceber como a coisa é angustiante e dramática, dando a esse filme cores fortes de drama. Imagine a situação de você dormir com o inimigo, a mãe de seus filhos, e ainda ter que executar a pessoa que ama? Isso foi de uma agonia extrema, e todo esse tormento só poderia ser parcialmente aliviado, tanto para o protagonista quanto para o espectador, por uma busca pela verdade, pois se Max descobrisse se sua esposa era uma traidora ou não antes de seus superiores, ele teria uma margem um pouco maior de autonomia para lidar com a situação e tempo para decidir o que fazer. Aí entra o outro gênero do filme, baseado na investigação e na espionagem, que alivia o forte peso do drama envolvido.

Um casal de verdade…

Essa parte da investigação deixa o filme bem instigante, onde o voyeurismo tomava ares muito intensos em alguns momentos e a busca por pistas e paradeiros em pleno ambiente da guerra, onde até linhas inimigas tinham que ser atravessadas, davam à película leves tons de ação, embora não possamos dizer que esse filme possa ser propriamente considerado de ação.

Uma terrível dúvida…

E a indicação ao Oscar de Melhor Figurino? Creio que ela foi acertada, principalmente quando vemos o vestuário de Marion Cotillard. Ela estava simplesmente deslumbrante e elegantérrima, provocando uma babação geral no público masculino. Sua atuação também foi primorosa, chegando a engolir Brad Pitt em alguns momentos.

Uma investigação…

Não que o casal como um todo não tenha tido uma boa química (foi muito bom ver os dois atuando), mas a natureza mais complexa da personagem de Cotillard, que teve que ser uma espiã assassina fria, uma esposa apaixonada, uma mãe devotada e uma mulher frágil, lhe deu muito mais chances de demonstrar todo o seu talento em contrapartida ao personagem de Brad Pitt, muito mais plano em suas características. E, cacilda, que mulher bonita é Marion Cotillard! Devoção de “star system” puro! A gente realmente vai ao cinema para ver essa linda atriz francesa!

Uma mãe fragilizada…

Assim, “Aliados” é uma película e tanto, com uma boa história onde o forte drama é atenuado por um bom filme de espionagem e ainda temos o privilégio de idolatrar Cotillard em toda a sua exuberância, ajudada pelo excelente figurino, digno da indicação que recebeu ao Oscar. Vale muito a pena assistir.

Batata Movies – Lion, Uma Jornada Para Casa. Busca Insólita.

Cartaz do Filme

“Lion, Uma Jornada Para Casa”, foi um filme que concorreu ao Oscar no ano passado (mas não levou nenhum). Dirigido por Gath Davis, ele concorreu, na época, a seis estatuetas (melhor filme, ator coadjuvante para Dev Patel, atriz coadjuvante para Nicole Kidman, trilha sonora, roteiro adaptado e fotografia). Apesar de não premiada, essa película nos traz boas recordações. Esse é mais um daqueles filmes baseados numa história real, que deixam as pessoas maravilhadas de como a vida imita a arte. Uma história não muito simples que amplifica aos nossos olhos uma tragédia pessoal que precisa de um desfecho. Lembrando sempre que, como é um filme de mais longa data, tomarei a liberdade de usar spoilers.

Um menininho perdido…

Vemos aqui a trajetória do pequeno Saroo (interpretado por Dev Patel em sua fase adulta), um menininho que vive no interior da Índia com seu irmão mais velho, sua mãe e sua irmãzinha caçula. Os dois irmãos vivem de fazer pequenos biscates na rua, trazendo sempre um pouco de leite ou algumas frutas para a mãe, que trata a todos com muito carinho. É o ano de 1986 e a pequena família vive em situação de miséria extrema. Um belo dia, Saroo e seu irmão vão para uma estação de trem de madrugada para procurar algum biscate. O irmão mais velho deixa Saroo na estação, não sem antes pedir ao garotinho que fique onde está. Mas o irmão demorou para voltar e Saroo, ao procurá-lo, acabou entrando num trem vazio e adormeceu. O problema é que o trem deu a partida e andou por muito tempo até chegar a Calcutá, muito longe da terra natal de Saroo. Ele vai viver como menino de rua, até que vai parar numa espécie de reformatório. Dali, ele irá para a Austrália, onde foi adotado por um casal. Os anos passaram e Saroo cresceu, tornando-se um rapaz que queria fazer hotelaria. Mas, ao entrar em contato com alguns colegas de origem indiana, Saroo ficou com vontade de procurar sua família original na Índia, tarefa um tanto difícil, já que ele tinha uma lembrança apenas muito vaga do vilarejo em que morava e nem sabia onde ele ficava localizado na Índia.

Ele consegue uma família nova…

Esse é um filme que se apoia numa bela história. A saga de Saroo para encontrar sua família original tem lances muito dramáticos, despertando uma série de dores que atingiam principalmente o protagonista, mas também todos os que estavam à sua volta. Pode-se dizer que esse momento mais angustiante tornou a história também um pouco morosa, e assim sentimos uma relativa descontinuidade no roteiro (as sequências da infância de Saroo eram mais instigantes num ritmo rápido, e o desfecho foi emocionalmente muito intenso; no meio de tudo isso, uma parte lenta e depressiva, que foi a busca).

Mas a adaptação pode ser difícil…

O filme também se ampara no bom elenco. Dev Patel merece a indicação a melhor ator coadjuvante, apesar de ser o protagonista principal do filme (estratégias da Academia), mostrando que não é mais um carinha simpático que apareceu em Hollywood.

Logo, o menino crescerá…

Ele conseguiu trabalhar muito bem os sentimentos bem díspares de seu personagem, indo de uma amabilidade muito grande, passando a uma angústia profunda, com pitadas de uma melancolia inerte. Agora, a grande surpresa foi ver Nicole Kidman no papel da mãe adotiva de Saroo, uma distinta senhora idealista que buscava dar um lar à crianças que sofriam neste mundo. Podemos dizer que a química entre Kidman e Patel foi perfeita neste relacionamento entre mãe e filho, sendo que as sequências em que os dois apareciam contracenando juntos eram os grandes presentes que esse filme nos dava. E não podemos nos esquecer da presença de Rooney Mara, que fazia a namorada de Saroo, uma personagem que acompanhou de perto as angústias do namorado.

Procurando por suas origens…

Assim, “Lion, Uma Jornada Para Casa” é um bom filme que apostou numa história real, inserindo forte carga dramática, um modelo que, volta e meia se repete, mas que aqui foi bem trabalhado. Esse também é um filme de ator, onde vamos alegres ao cinema para vermos as atuações de Dev Patel e Nicole Kidman. Vale a pena procurar o DVD ou no Youtube.

Batata Movies – Cães Selvagens. Um Crime Que Não Compensa.

Cartaz do Filme

Imagine você testemunhar Nicolas Cage e Willem Dafoe trabalhando juntos. Para o primeiro, é uma boa oportunidade, depois do baque que ele sofreu em sua carreira (a gente tem visto o ator aparecendo até de forma muito obscura como coadjuvante de luxo em alguns filmes por aí). Já para o segundo, é mais uma película de sua boa e muito prolífica carreira. Mas, para um enorme azar de Cage, a coisa não deu muito certo. E olha que o filme foi dirigido por Paul Schrader, responsável por roteiros como “Taxi Driver” e “Touro Indomável”.

Troy quer uma nova vida depois da prisão…

Vemos aqui a história de três ex-presidiários, Troy (interpretado por Cage), Mad Dog (interpretado por Dafoe) e Diesel (interpretado por Christopher Matthew Cook). A ideia inicial do trio é retomar uma vida normal longe da criminalidade. Mas a verdade é que, em nenhum momento, eles saem do submundo. Troy quer levar uma prostituta para passear em Nice, mas a moça declina do convite. Mad Dog está tão ensandecido em sua ânsia de matar que ele nem consegue, digamos, relaxar. E Diesel até tenta engatar uma conversa com uma moça que não pertence ao submundo, mas é também um tanto perturbado e não consegue. O que resta aos três? A velha vida de crimes e trabalhos sujos que vão lhes render um parco dinheiro. Mas como é dito por aí, o crime não compensa. E então…

Mad Dog, um homem atormentado…

O filme tem influências. Tarantino é uma delas, embora a coisa pareça um decalque mal feito, pois Tarantino consegue combinar com maestria grandes paroxismos de violência com um humor negro escrachado. Já “Cães Selvagens” têm uma violência explícita e é só, violência essa onde os personagens usam e abusam da maldade contra inocentes, não despertando qualquer simpatia do público, muito pelo contrário. A gente quer o tempo todo que os caras se ferrem de verde e amarelo, tamanhas as atrocidades psicóticas que eles cometem. Esse filme lembra, também, e guardadas as suas devidas proporções, a película de Fritz Lang “Vive-se Só Uma Vez”, estrelada por Henry Fonda e Sylvia Sidney, onde um ex-presidiário (interpretado por Fonda) busca recomeçar a sua vida com a namorada (interpretada por Sidney), mas a marca de criminoso na vida do personagem de Fonda criou uma barreira entre o protagonista e a sociedade, dando um desfecho trágico ao casal. Aqui a temática do ex-preso que não consegue se ressocializar por preconceito é repetida, mas explorada de forma muito mais pobre que no filme de Lang, já que os três personagens protagonistas praticamente não saem da vida marginal quando fora da cadeia. E isso para vermos num momento mais à frente da película o pensamento de Cage resmungando que ex-criminosos não tinham uma chance de recuperação na sociedade. Pelo menos, o desespero do personagem de Dafoe (e sua ótima atuação, obviamente), que queria sair de sua bolha psicótica e ser uma pessoa normal, foi algo bem mais sincero, mas muito efêmero. Ou seja, o tema da falta de oportunidade de ex-presidiários era uma boa ideia que poderia ter sido bem mais explorada.

Juntos com Diesel, eles não conseguem deixar a vida de crimes…

Apesar dos problemas da película, houve uma grande qualidade nela, que foi toda uma gama de efeitos visuais que ilustravam o barato de nossos protagonistas quando eles estavam doidões e se afogavam nas drogas. O uso do CGI na criação de imagens totalmente artificiais deu toda uma plasticidade especial à materialidade visual do filme, tornando-o mais atraente (ou menos repulsivo).

Paul Schrader

Assim, “Cães Selvagens”, apesar das boas influências, não rendeu um bom resultado, pois aproveitou mal as ideias a que se propôs, teve um roteiro um tanto truncado e até mal explicado em algumas passagens, além de criar um clima de antipatia entre público e personagem. Esse último fator até é um pouco mais original, mas tem o efeito colateral de deixar o final da película altamente previsível. Como ponto a favor, bons efeitos visuais que deram plasticidade às alucinações por vício às drogas. E mais um filme mediano de Nicolas Cage, cuja carreira não consegue deslanchar novamente. Você pode até procurá-lo por aí para ver, mas não espere muito.

Batata Movies – Colheita Amarga. Stalinismo, Fome E Genocídio.

Cartaz do Filme

Um filme de impacto passou nas telonas. “Colheita Amarga”, de George Mendeluk, aborda uma tragédia humanitária conhecida como Holomodor, uma política genocida imposta por Stalin contra a Ucrânia, que consistia simplesmente em deixar as pessoas daquele país sem comida até morrerem de inanição. Tal ato de extermínio eliminou de 7 a 10 milhões de pessoas, sendo revelada somente após o fim da União Soviética em 1991, e mais tarde, reconhecida até pela própria Rússia. Antes de analisarmos o filme, fica aqui o alerta de que teremos spoilers ao longo do artigo.

Yuri, um artista buscando reconstruir sua vida

A história é focada em uma pequena vila no interior da Ucrânia, onde vive Yuri (interpretado por Max Irons), um jovem com alma de artista que adora pintar e que tem em sua família um antepassado guerreiro que ele considera um herói nacional. Yuri é apaixonado pela jovem Natalka (interpretada por Samantha Barks), uma antiga amiguinha de infância. Tudo é muito idílico, romântico e prosaico até o dia em que chega a notícia de que o Czar foi assassinado, um sinal de tempos mais livres para o seu país.

Natalka, o grande amor de Yuri…

Entretanto, alguns anos depois, os bolcheviques dos soviets começam a chegar e a impor a pedagogia estatizante do partido comunista para aqueles pequenos fazendeiros do interior, além de um ateísmo forçado. A onda de violência provocada pelo povo invasor faz com que Yuri vá tentar a sorte na capital, Kiev, para depois levar sua esposa para lá. Só que a repressão stalinista piorava tudo à sua volta. Yuri vai então ter que lutar contra todas essas situações adversas para ter a sua amada a seu lado novamente.

Um Stalin um tanto quanto caricato…

Esse é um filme de denúncia, onde o cinema cumpre sua função social, como tantos outros já mencionados por aqui. Esse é um genocídio pouco falado e que deve ser divulgado aos quatro ventos para que nunca mais aconteça. O filme também não deixa de ser uma peça de propaganda do Ocidente (a produção é canadense) contra o regime socialista, demonizando ao extremo todos os seus membros, embora, por incrível que pareça, vejamos algumas relativizações. Chama muito a atenção as atitudes do personagem Sergei (interpretado por Tamer Hassan), o líder dos bolcheviques que espezinha ao máximo a comunidade de Yuri, sendo o verdadeiro cão chupando manga, mas que faz pequenas e rápidas concessões. Ou um soldado soviético que não aceita as agruras que Stalin pratica contra os agricultores ucranianos e se volta contra seu próprio exército. Mas temos principalmente o personagem Mikola (interpretado por Aneurin Barnard), um amigo de infância de Yuri e que se torna um idealista que acredita que pode conciliar o nacionalismo ucraniano com as premissas socialistas. Creio que tal relativização serviu para amenizar um pouco a extrema e negativa carga nas tintas com que os socialistas foram pintados nesse filme, praticamente nazificando-os, o que poderia dar a impressão de a coisa (a virulência dos soviéticos) não ser tão exacerbada assim, dada a forma muito exagerada da crueldade exposta no filme. Não é à toa que, ao final da película, foram exibidos muitos dados reais do Holomodor em si, para dar mais legitimidade às cenas de extrema e injustificada violência do filme.

Mikola, um idealista…

É claro que a película apresentou alguns elementos dramáticos que davam um sabor especial a essa história baseada em fatos reais. A história de amor, a reação heroica dos ucranianos ao invasor, com direito a morte do vilão e atos heroicos do mocinho, etc., ou seja, uma tentativa de se encaixar um happy end ou um arremedo dele, já que tivemos um desfecho meio que aberto, o que deu uma certa elegância a uma película cheia de lances espetaculares e um pouco exagerados.

Sergei, o vilão clássico, “ma non troppo”…

Só cabe dizer mais um pequeno detalhe: o filme tem uma cereja bem vistosa no bolo, que é a participação de Terence Stamp como o avô de Yuri, Ivan, onde tivemos uma interpretação bem sóbria e austera, dando muita elegância ao personagem.

Participação magistral de Terence Stamp

Assim, “Colheita Amarga” é um filme importante, pois denuncia um genocídio. O único problema foi colocar toda uma carga de maldade muito excessiva nos soviéticos. Não que eles não tenham sido, mas tais exageros e violências gratuitas podem deslegitimar essa construção que se pretende fazer do Holomodor. Provavelmente, veio dessa preocupação a leve relativização da figura do invasor soviético e dos ideólogos do socialismo. De qualquer forma, é um filme atraente e até esteticamente interessante, por apresentar uma boa fotografia, sobretudo do casal protagonista e dos dias idílicos pré-stalinistas na vila ucraniana.

https://www.youtube.com/watch?v=zSIOybTKzFc

Batata Movies – Roda Gigante. Mais Um Woody Allen.

Cartaz do Filme

Woody Allen volta à cena com mais um filme, desta vez com o bom “Roda Gigante”. Uma película mais voltada para a tragédia do que para a comédia. Um filme, acima de tudo, inusitado.

Ginny, uma mulher infeliz…

Vemos aqui a história de Ginny (interpretada por Kate Winslet), uma dona de casa que trabalha de garçonete num bar e que vive dentro de um parque de diversões, em frente a roda gigante e ao lado de uma irritante barraca de tiro ao alvo, numa decadente Coney Island da década de 50. Um belo dia, uma moça chega ao parque, procurando o marido de Ginny, Humpty (interpretado por Jim Belushi). Trata-se de Carolina (interpretada por Juno Temple), filha de Humpty, que não falava com o pai há cinco anos mas que agora o procura, pois ela se casou com um mafioso e foi obrigada pela polícia a depor contra o marido, sob a pena de ficar na cadeia. Carolina agora é procurada pelos mafiosos e vai se esconder na casa do pai, para o desespero de Ginny, que é infeliz no casamento e ainda tem um filho piromaníaco, fruto de um relacionamento anterior. Como se não bastassem todos esses problemas, Ginny vai se envolver com um salva-vidas, Mickey (interpretado por Justin Timberlake), buscando um certo alívio em sua vida altamente estressante. Até o dia em que Mickey conhece Carolina. Paremos com os spoilers por aqui.

Dificuldades de relacionamento com o marido…

Os últimos filmes de Allen têm sido ou de comédias mornas, de um fim com acentuado anticlímax (caso de “Cafe Society”, com Jesse Eisenberg), ou então de filmes com uma pegada maior de suspense (caso de “O Homem Irracional”, com Joaquin Phoenix), sendo estes últimos de suspense mais instigantes.

Ginny tenta aliviar suas mágoas ao lado de Mickey

Parece que “Roda Gigante” atingiu um meio termo entre esses dois pólos, pois o anticlímax está lá no desfecho (que, obviamente, não direi aqui), mas há, também, uma leve pegada de suspense no caso dos mafiosos. Agora, o grande ingrediente do filme é um drama psicológico profundo, com um leve, e quase imperceptível, humor negro (o filme, definitivamente, não é bem exatamente para rir, embora tenha momentos engraçados), que conta uma tragédia sobre pessoas convencionais de um nível social baixo, cuja desilusão no relacionamento é o mote principal. Há um leve arremedo intelectual no passado de Ginny (que queria ser atriz e tinha alguma experiência em teatro) e Mickey (um cara que fazia pós-graduação e se encantava com literatura), mas isso ficou mais como um elemento para cimentar o relacionamento entre a atriz frustrada e o salva-vidas cheio de frescor (no bom sentido, é claro) e esperançoso no futuro de sua vida.

Carolina, perseguida pela máfia…

O filme é muito focado nas angústias de Ginny, uma personagem com a qual rapidamente nos identificamos, muito em virtude do sofrimento explícito de suas angústias (quem não as tem?). A interpretação de uma Kate Winslet envelhecida, mas não menos linda e sensual, com seu uniforme apertado de garçonete dos anos 50, foi simplesmente magistral e, mesmo que não fosse um filme de Woody Allen, o preço do ingresso já valia a pena pela presença da atriz. Outra grata surpresa foi a interpretação (e a volta) de Jim Belushi. Lembrado mais por suas películas de humor regadas à ação (ou vice-versa), Belushi surpreendeu como o marido vaca-brava e rude, mas, ao mesmo tempo, totalmente dependente emocionalmente, o que o fazia ir da bravata à submissão em questão de segundos. Tal complexidade fazia a gente também se afeiçoar com ele.

O diretor Woody Allen e seu elenco

Asssim, “Roda Gigante” pode ser considerado um bom filme de Woody Allen, depois de uma certa decepção com “Cafe Society”. O diretor, conhecido pelas películas de humor, investiu mais no suspense nos últimos anos, e conseguiu misturar os dois gêneros nessa película relativamente bem. Vale a pena pegar em DVD se você não viu no cinema. E, afinal de contas, é um filme do Woody Allen, que, por seu nome, acaba sendo uma espécie de programa obrigatório para o cinéfilo que se preza.

Batata Movies – Deadpool 2. Reinventando-se.

Um dos muitos cartazes do filme.

E estreou o novo “Deadpool”. Confesso que fiquei um pouco temeroso com essa continuação, em primeiro lugar pela conhecida “Maldição da Sequência”, onde, na grande maioria das vezes, a sequência de um filme é pior do que o primeiro E, principalmente, pelo fato de que, desta vez, o super-herói não era uma mais uma novidade para o grande público. A forma como Deadpool foi apresentado e o forte tom de humor negro do primeiro filme foram coisas surpreendentes a meu ver. Como seria agora que o super-herói já era conhecido? Como seria a pegada do humor, que geralmente é algo muito difícil de se fazer?

Um casal apaixonado (filme família)

Bom, para falarmos desse filme, os spoilers infelizmente serão necessãrios. Nosso herói (interpretado por Ryan Reynolds) está muito deprimido, pois perdeu a namorada depois de um ataque de gangsters à casa em que moravam. Depois de tentar o suicídio, sem sucesso, já que ele se regenera constantemente, é acolhido na mansão dos X-Men por Colossus. Para espairecer, ele se torna uma espécie de “X-Men estagiário” e, em sua primeira missão, ele toma contato com o jovem Russell (interpretado por Julian Dennison), um garoto gordinho cheio de ódio no coração que tem o poder de lançar chamas com as mãos e sair explodindo tudo por aí. Por uma, digamos, falta de habilidade de Deadpool de lidar com a situação, ele e Russell vão parar na cadeia.

Cable, um excelente personagem com o toque de Josh Brolin…

Lá, eles serão perseguidos por Cable (interpretado por Josh Brolin), um homem que veio do futuro para matar Russell sob o argumento de que ele se tornará uma pessoa muito perigosa (a esposa e a filha de Cable foram incineradas por Russell em dias ainda vindouros). Como Deadpool não sabe de nada, ele busca salvar o garoto e o pau quebra entre Deadpool e Cable. Mas o filme ainda vai ter algumas reviravoltas que não vou falar aqui.
Bom, à respeito de meu temor no primeiro parágrafo, quando disse que não me sentia seguro se a sequência poderia ser considerada boa por não se tratar mais de uma novidade, o início do filme me trouxe um pouco de receio. Parecia que ia ser mais sem graça mesmo.

Russell, muito ódio no coração…

Mas, paulatinamente, o humor deixou de ser sem graça e passou a funcionar muito bem, brincando com o poiticamente incorreto e sendo humor bem negro em alguns momentos, como a sequência da descida de para-quedas da X-Force. Meio que se ri de nervoso de toda aquela situação, tamanho o grau de inusitado ali. Outro ponto bizarro aqui, e que parece ter sido mais explorado nesse filme, foi o poder de regeneração de Deadpool, que possibilitou que nosso personagem fosse espezinhado ao máximo, sendo seu corpo quebrado, torcido, partido ao meio, e sempre se regenerando (parecia até personagem de desenho animado que é massacrado continuamente e volta novinho em folha).

Cala a boca, Deadpool!!!

Outra situação em que se ria de nervoso. Ou seja, o humor negro do filme é altamente agressivo e ácido, da mesma forma que ocorreu na primeira película, se reinventando e não deixando a peteca cair.

Dominó, uma sortuda de respeito…

Não faltaram piadas de bom gosto e de gosto duvidoso com os X-Men, assim como foi feita uma troça com a classificação indicativa do filme passar de 18 para 16 anos, essa sim uma excelente jogada de marketing, já que isso foi ventilado pela mídia antes da estreia. Além disso, o filme sempre teve boas e instigantes cenas de ação que, em Deadpool, definitivamente não são a atração principal, dado o grande grau de inusitado do humor do filme.

X-Force!!!!

Uma boa surpresa foi Josh Brolin no papel de Cable. Sua atuação foi muito boa, confirmando todo o seu talento exibido interpretando Thanos em “Guerra Infinita”. Mesmo sendo considerado um personagem sisudo e sério, as boas falas e a interpretação de Brolin encaixaram bem Cable na história (sem qualquer trocadilho infame), gerando uma ótima química com Deadpool, que o sacaneava constantemente, além de haver situações para lá de constrangedoras, onde Cable reagia com um “Jesus”, tipo “não acredito no que vejo ou no que ouço”, o que foi muito engraçado.

Posições inusitadas (tem hora que parece pornochanchada…)

Assim “Deadpool 2” conseguiu manter o nível do primeiro filme, mesmo que não tenha sido mais uma novidade. A pegada de humor negro se renovou, com uma dose de surreal e inusitado, e o universo desse herói ganhou novos personagens que podem dar muito caldo em eventuais sequências, sobretudo Cable, com a boa interpretação de Josh Brolin. Nosso herói de duplo sentido (no bom sentido) vale a pena a sua visita ao cinema.

Batata Movies – O Sacrifício Do Cervo Sagrado. Crendice Superando A Razão.

Cartaz do Filme

Você conhece aquelas pessoas que costumam “rogar praga” nos outros? Volta e meia, a gente escuta um ou outro caso de um espírito de porco assim. Pois é, esse é justamente o tema do filme “O Sacrifício do Cervo Sagrado”, dirigido por Yorgos Lanthimos, onde o místico atropela a vida de pessoas que sempre se pautaram pelo racional. Devo confessar que, para me fazer mais claro aqui, vou precisar lançar mão de alguns spoilers.

Steven, um médico racional

Vemos aqui a história de Steven Murphy (interpretado por Colin Farrell), um renomado cardiologista casado com uma médica também bem sucedida, Anna Murphy (interpretada por Nicole Kidman). Eles vivem num mundo rico e perfeitamente racional, o que faz com que o casal trate seus filhos de forma muito fria e onde as regras bem cumpridas são o mote principal. Mas um pequeno detalhe irá causar muita turbulência nesse mundo aparentemente perfeito. Steven volta e meia se encontra com Martin (interpretado por Barry Keoghan), um adolescente com um comportamento no mínimo estranho, meio letárgico, meio receoso com o que Steven pensa sobre ele. Aos poucos, Martin vai entrando na família de Steven. Mas o que parecia ser um adolescente inseguro vai se revelar uma verdadeira ameaça quando Martin “roga” uma espécie de praga para a família de Steven: se ele não escolher um membro de sua família para matar, toda a família morrerá, com seus membros ficando inicialmente doentes, passando por outros problemas de saúde, até chegarem à morte.

Anna, uma médica racional

Martin rogou essa praga em Steven, pois o pai do garoto foi operado pelo médico e acabou morrendo. Havia uma suspeita não confirmada na película, de que Steven havia operado o pai de Martin depois de tomar umas bebidinhas e teria feito a cirurgia um pouco bêbado, o que teria matado o paciente. Para um homem de ciência como Steven, tal ameaça de Martin poderia até parecer uma bobagem, mas a coisa começa a ficar muito esquisita depois que seu filho caçula adoece e fica sem sentir suas pernas. Daí para a frente, o filme se torna uma grande jornada ao inusitado.

Martin, o rogador de pragas…

Esse, definitivamente, é um filme que trabalha dois pólos de forma bem dicotômica e antagônica: a superstição e a razão, com a primeira subjugando totalmente a segunda. A família inteiramente racional, sem qualquer pingo de emoção, que se transforma até em um bastião de arrogância e frieza robótica, é atingida em cheio por uma praga supersticiosa rogada de forma totalmente irracional. A situação inédita à qual a família é submetida faz com que ela não tenha qualquer ideia de como vai lidar com a adversidade, levando muitas vezes a situações em que seus membros saem completamente do controle. É um filme onde o irracionalismo prevalece em grande parte da exibição, quase sendo um personagem.

Martin se envolve com a filha da família…

E os atores, como foram? Colin Farrell foi muito bem, todo artificial como seu personagem exigia. Entretanto, as explosões emocionais, de tão intensas, destoavam um pouco do resto de sua interpretação, ficando um tanto caricatas. Kidman, por sua vez, conseguiu jogar um pouco melhor com essa variação frieza/emoção, pois sua personagem parecia ter mais interesse em resolver o problema e encarava a situação de uma forma, digamos, mais prática. O jovem ator Barry Keoghan foi um tanto plano, onde as nuances de sua atuação pareciam ser mais auxiliadas pelas falas. Só foi de se lamentar a curta e fugaz participação de Alicia Silverstone no papel da mãe de Martin. Com pouquíssimo tempo de tela, a impressão que se deu é de que a moça está no ocaso de sua carreira. Triste fim para quem já foi um dia a Batgirl.

O conflito entre o racional e o irracional…

Assim, “O Sacrifício do Cervo Sagrado” é um daqueles filmes que chamam a atenção pela sua dose de inusitado e pela sua clara afronta a cultura racional, que é subjugada por uma superstição. Para dar mais essência à mensagem do filme, o elenco de medalhões ajudou muito, sendo este também um filme de atores. É uma curiosa experiência assistir a esse filme, que aborda uma temática que não se vê todo dia por aí, sendo que essa película vale a pena uma visitinha.