Batata Movies – Ford VS Ferrari. Desenvolvendo Uma Lenda.

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Cartaz do Filme

Um filmaço para quem gosta de automobilismo. “Ford VS Ferrari” fala da entrada da Ford em automobilismo de competição e de sua rivalidade com a Ferrari na prova das 24 Horas de Le Mans. A equipe italiana tinha uma hegemonia incontestável na famosa prova e a Ford chegou com força total para colocar essa hegemonia em xeque. Para podermos analisar melhor o filme, vamos precisar de spoilers aqui.

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Carroll Shelby, uma lenda do automobilismo, tem uma difícil tarefa…

O filme gira em torno de dois personagens principais. Carroll Shelby (interpretado por Matt Damon) tinha sido o primeiro americano a ganhar as 24 Horas de Le Mans, mas precisou abandonar a sua carreira pois estava com um problema no coração. Com isso, Shelby começa a vender automóveis, tendo bom trânsito entre as montadoras e o meio das corridas. Já Ken Miles (interpretado por Christian Bale) era um mecânico de oficina falido que preparava seus carros para corridas, um cara muito porra louca de temperamento bem explosivo. O que eles terão a ver com a Ford? A empresa estava com problemas de venda de seus carros e o responsável pelo marketing da empresa, o lendário empresário Lee Iacocca (interpretado por Jon Bernthal) defende a ideia da empresa entrar no automobilismo de competição para a marca ficar mais antenada com o público mais jovem. Foi tentada uma parceria com a Ferrari, que também estava falida, mas o vazamento da negociação empurrou a Fiat para uma parceria com o “Cavalinho Rampante”, que se tornou mais vantajosa que a proposta da Ford. Isso fez com que o Comendador Enzo Ferrari acabasse sendo bem ríspido com os executivos da Ford e, principalmente, com Henry Ford II, o que levou o empresário a aceitar a idéia de competir com a Ferrari nas 24 Horas de Le Mans. Shelby é recrutado para tal tarefa, que recruta Miles. Mas este último é mal visto pelos executivos da Ford, que boicotam o trabalho de Miles, justamente ele que consegue preparar o carro com tanta eficiência. Assim, Shelby terá que pagar um dobrado para manter Miles na equipe, inclusive como piloto, a contragosto dos executivos da Ford.

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Ken Miles, um excelente piloto e acertador de carros…

O filme tem uma excelente reconstituição histórica, principalmente no que tange a um automobilismo de décadas atrás, com direito ainda a alavancas de marchas e a montagem artesanal dos carros, onde um preparador experimentava o carro e ia fazendo os ajustes, sem direito a qualquer tecnologia ou telemetria para ajudar, o que deixava o filme muito gostoso de se ver. As cenas de corrida também foram muito bem feitas e eram emocionantes, com a reconstituição dos autódromos de Daytona e, principalmente, Le Mans, feita de forma magistral. Os carros também foram um deleite, com destaque, obviamente, para as Ferraris, lindas de morrer.

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Juntos, os dois terão o desafio de levar a Ford à vitória em Le Mans…

E os atores? Esse filme tem um nome: Christian Bale. Sua atuação foi para lá de magnífica. Ken Miles conseguia ser um paizão, um bom marido, um excelente acertador de carros, um sujeito muito engraçado e um porra louca de cabeça quente em quase todas as situações. Foi até covardia para o Matt Damon colocar Bale atuando ao seu lado nesse filme, tamanho o talento de Bale, que na minha modesta opinião, deveria ter ganho o Oscar de Melhor Ator para “Vice” este ano. Só ver esse ator já vale o ingresso, num filme que tem também um excelente roteiro, que prende a atenção do espectador em todas as suas duas horas e meia de exibição.

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As baratinhas sempre são uma atração à parte…

Assim, “Ford VS Ferrari” é um daqueles filmes que é um programa obrigatório não somente para os fãs de automobilismo, mas também para os cinéfilos mais exigentes, pois tem uma história muito bem contada num roteiro bem escrito e cativante e a atuação primorosa de Christian Bale como a cereja do bolo. Um programa imperdível.

Batata Movies – O Irlandês. Scorsese À Antiga.

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Cartaz do Filme

Martin Scorsese volta à cena com o filme “O Irlandês”. Essa é uma película que está disponível no Netflix a partir do próximo dia 27 de novembro, mas como se trata de um filme também estrelado por Robert De Niro e Al Pacino com um baita cheiro de Oscar, fica muito difícil não querer ver na telona as limitadas sessões disponíveis. Como este escriba acabou perdendo as sessões de “Roma” e viu o Oscar de Melhor Fotografia deste ano no celular, assim que “O Irlandês” se tornou disponível no cinema, fui correndo ao Estação Botafogo para assistir. Houve dois problemas: a venda era feita em separado para uma sessão que lotou o cinema. Assim, tivemos problemas como, por exemplo, a impressora instalada no notebook não funcionar direito e o ingresso demorar para sair, ou só ser aceito pagamento no cartão e não em dinheiro. Esse é o tipo de coisa que precisa ser melhor vista quando a Netflix fizer essas sessões de cinema. O outro problema é que a película tem uma duração de, praticamente três horas e meia. Ou seja, tem que ter disposição. Para que a gente entenda melhor o filme, vamos lançar mão de spoilers aqui.

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Olha só o cartão de visitas…

A história começa em meados da década de 50 e gira em torno do irlandês Frank Sheeran (interpretado por De Niro), um ex-combatente da Segunda Guerra Mundial que esteve na Itália, se tornou motorista de caminhão transportando carnes e ganhava um por fora desviando a mercadoria. Seu advogado, ligado à máfia ítalo-americana, conseguiu tirá-lo da situação e isso foi meio que a porta de entrada para que Frank entrasse para o mundo do crime. Ele irá trabalhar para Russell Bufalino (interpretado por Joe Pesci), com quem irá desenvolver uma relação de fidelidade total. Através desse submundo, ele irá também conhecer Jimmy Hoffa (interpretado por Pacino), o famoso líder sindical dos caminhoneiros que desapareceu e não foi encontrado até hoje. Vamos vendo, ao longo do filme, como Frank se envolve cada vez mais com o mundo do crime, não somente de forma profissional, mas também de forma afetiva com Bufalino e Hoffa, onde chegará um momento em que Frank terá que fazer escolhas muito duras. O mais curioso aqui é que o filme é contado em flash-back, de forma que vemos Frank bem idoso num asilo, mostrando que ele foi um dos poucos que conseguiram sobreviver à violência do submundo da máfia ítalo-americana.

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Joe Pesci também é uma grande presença…

A primeira coisa que vem às nossas cabeças quando vemos esse filme é a película “Os Bons Companheiros”, onde temos também De Niro e Pesci fazendo um filme sobre a máfia ítalo-americana. Entretanto, há algumas diferenças. Enquanto que o filme “Os Bons Companheiros” parecia ser algo mais estritamente ligado à máfia ítalo-americana, com uma crueza bem maior (lembro-me da psicopatia do personagem de Joe Pesci nesse filme), em “O Irlandês” temos um filme menos violento (mas, ainda assim com a violência típica dos filmes de máfia ítalo-americana) e vemos a máfia conectada com outros núcleos, tais como o movimento sindical e o desaparecimento de Hoffa, a família Kennedy no poder e a questão da Revolução Cubana. Ou seja, é um filme com um desdobramento muito maior que o torna bem mais rico e interessante pelo forte background histórico. Fica bem clara a interação de todos esses núcleos, dando a entender que Kennedy foi assassinado a mando da máfia, assim como a mesma teve participação no episódio da Baía dos Porcos e no desaparecimento de Hoffa. É um filme que exige muito da atenção do espectador pelo rosário de personagens e situações onde os mesmos interagem. E tudo isso em mais de três horas de exibição. Pelo menos, se o espectador não conseguiu pescar toda a história e seus meandros, ele vai ter nova chance de fazer isso através do Netflix, o que é acalentador. De qualquer forma, vale muito a experiência de se ver a película no cinema, pois temos um roteiro para lá de primoroso e muito bem trabalhado em toda a sua complexidade.

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Filme mostra a passagem do tempo, com a máfia bem conectada a isso

Agora, definitivamente o mais espetacular foi ver as duplas De Niro-Pacino e De Niro-Pesci atuando. Um baita de um cast que vale demais o ingresso! Não é todo o dia que a gente tem a oportunidade de ver tanta gente muito boa trabalhando junta! E, mesmo com as mais de três horas de exibição, ficou um gosto de quero mais. Confesso que não me contento em ter esse filme somente no streaming e gostaria muito de conseguir uma cópia em DVD para ver quando quisesse (sempre há a possibilidade da Netflix retirar o filme quando os acessos baixarem no futuro). É nessas horas que a gente percebe como vale a pena passar por todas as dificuldades para ver uma produção como essa numa boa sala de cinema.

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Robert De Niro e um Scorsese com muito frio…

Dessa forma, “O Irlandês” é um programa imperdível que vale o ingresso e a experiência de vê-lo em uma boa sala de cinema. Um filme de Scorsese à antiga, o Scorsese que fala do mundo do crime ítalo-americano, com um elenco magnífico que interage de forma bem azeitada e redondinha. Um deleite para os olhos obrigatório para qualquer indivíduo que se diz ser cinéfilo.

Batata Movies (Revival) – Glória Feita de Sangue, de Kubrick.

Cartaz do Filme

O filme “Glória Feita de Sangue”, de Stanley Kubrick, é um dos filmes de guerra mais contundentes que existem. Pode-se dizer que foi um filme feito com muita coragem, pela forma franca com que alguns assuntos são tratados, numa época em que a Guerra Fria estava a pleno vapor (1957) e noções como a de patriotismo eram incontestáveis nos Estados Unidos. Mas Kubrick contestou.

Kirk Douglas em atuação memorável

Vemos aqui a história ambientada na Primeira Guerra Mundial. O ano é 1916 e presenciamos a famosa “guerra de trincheiras”, onde não existem muitos avanços dos exércitos contra as linhas inimigas. No exército francês, o general Broular (interpretado por Adolphe Menjou, antiga estrela do cinema mudo, que contracenou com Rodolfo Valentino em “O Sheik” e foi um dos protagonistas de “Casamento ou Luxo”, de Chaplin) instiga o general Mireau (interpretado por George Macready) a tomar uma posição alemã conhecida como “o formigueiro” sem qualquer espécie de ajuda, algo considerado praticamente impossível. Tomado pela vaidade e pela possibilidade de glória, Mireau aceita o desafio. Os soldados de Mireau são comandados pelo coronel Dax (interpretado por um vivaz Kirk Douglas), que não concorda com a missão praticamente suicida mas é obrigado a executá-la. Durante o ataque, uma parte do exército simplesmente não conseguiu sair da trincheira em virtude do fogo cruzado alemão, o que muito irritou Mireau, que chegou a dar ordens para atirar nos próprios soldados em virtude de sua suposta covardia, mas foi desobedecido. Como era necessária uma punição exemplar, três soldados foram escolhidos para serem julgados pela corte marcial, cuja pena seria a capital.

Cena do fuzilamento…

Dos três soldados escolhidos, um foi sorteado, outro foi escolhido pois não se dava bem com um dos capitães e outro era considerado “socialmente indesejável”. O coronel Dax foi advogado de defesa dos três soldados, mas o julgamento era de cartas marcadas, com praticamente nenhum direito de defesa, o que provocou protestos irados de Dax. Ao fim, os três soldados foram fuzilados.

General Mireau: busca de promoção pessoal com o desperdício de vidas humanas.

Tudo isso sob os olhares frios dos grandes generais. Para não ficar um clima de injustiça total, o general Mireau ainda passou por um inquérito depois da denúncia do coronel Dax de que Mireau mandara atirar em seus próprios soldados. Mas o grande mérito do filme foi a resistência do coronel Dax a todas as injustiças impostas pelos grandes generais franceses. Ainda, Dax menciona uma frase que deve ter provocado grande impacto na época em que o filme foi rodado: “o patriotismo é o último refúgio dos canalhas”. “Glória Feita de Sangue” é um filme que questiona desmandos da hierarquia militar, critica um patriotismo exacerbado e expõe cruamente as injustiças da guerra. A cena final é exemplar.

A comovente cena da canção da prisioneira alemã.

Os soldados da companhia de Dax estão se divertindo num bar quando seu dono traz ao pequeno palco uma moça alemã que havia sido capturada. Depois de ser vaiada, tripudiada e desrespeitada pelos soldados franceses, ela começa a cantar para diverti-los. Sua canção é cheia de melodia e tristeza, expressa na lágrima que sai de seu olho. Os franceses param com o barulho e as risadas e passam a cantarolar a melodia cantada em alemão pela moça. Muitos deles com o semblante fechado e também com lágrimas nos olhos. Tudo isso sob o olhar atento e a expressão melancólica do coronel Dax. Momento sublime de um filme importantíssimo de Kubrick.

Batata Movies (Revival) – 2001, Uma Odisseia no Espaço – Ficção Científica como Arte.

Cartaz do Filme

Falar de uma obra de arte sempre é algo difícil. Ainda mais quando se trata de “2001, uma Odisseia no Espaço”, de Kubrick. Lembro-me quando esse filme passou na TV pela primeira vez. Eu era moleque e não entendia aquela sucessão de imagens e sons tão estranhos. Esperava algo no estilo “Guerra nas Estrelas” Quebrei a cara.Mas o filme me despertou muita inquietação. A primeira vez que escutei alguma explicação sobre ele foi de um professor de ciências que dizia que o filme buscava mostrar que, por mais que a gente avance e busque inovar, sempre retornamos ao ponto de partida. Sei lá, num primeiro momento, não me convenci muito.

Descoberta instigada pelo monólito, que traz a sobrevivência.

Busquei então o livro e, só aí, pude entender do que se tratava a história, embora o filme a contasse com algumas modificações. Definitivamente, nem sempre uma imagem vale mais que mil palavras. Mas, mesmo assim, Kubrick mostrou a força das imagens nesse filme. Um filme quase sem diálogos. Um filme praticamente mudo, criando arte através da simbiose entre imagem e música, algo que o mestre tanto valorizava. O coro de vozes altamente angustiantes nas cenas do monólito extraterrestre, seja diante dos homens pré-históricos, seja diante da naveDiscovery nas cercanias de Júpiter expressam o medo e o receio humanos diante do sobrenatural (minha mãe costumava dizer que parecia que havia um monte de almas penadas gritando no filme).

O monólito alienígena.

O acoplamento da nave espacial à gigantesca estação rotatória que simula a força de gravidade ao som de Danúbio Azultransforma a física em arte, como se as forças que regem o movimento das máquinas criadas pelo homem fossem uma grande dança exaltando o triunfo possibilista da engenhosidade humana. A imagem da Discovery a caminho de Júpiter sob uma música muito melancólica, expressão pura da solidão no espaço profundo, na minha modesta opinião o momento mais lindo e poético do filme. A viagem de Dave em velocidades altíssimas dentro de um caleidoscópio coloridíssimo com um fundo musical altamente desesperador, desespero esse expresso nas imagens congeladas e aterrorizadas da face de Dave, num contraponto à alta velocidade a qual ele está submetido.

Osso e nave: frutos da tecnologia

Dizem que esse momento do filme é o que mais se aproxima no cinema a uma viagem que um viciado em LSD faz. Ou seja, Kubrick, com o poder de suas imagens, nos deixa “doidões” sem a gente precisar se drogar. Só esses momentos já fazem de 2001 uma obra prima em termos cinematográficos. Mas há ainda mais. Esse trabalho foi, com certeza, um dos melhores filmes de ficção científica da história do cinema, se não foi o melhor. Uma civilização alienígena que salva o homem da extinção lá na pré-história, sugerindo telepaticamente que o osso seja usado como arma para o homem ter o que comer. O osso travestido em nave espacial, consequência do primeiro avanço tecnológico que foi usar o osso como porrete, o que salvou o homem. A presença de um monólito na Lua, que emitiria um sinal assim que o homem lá chegasse, avisando a civilização alienígena dos progressos tecnológicos da humanidade.

Estação Espacial: Rotação Traz Simulação de Gravidade.

A viagem a Júpiter para investigar o outro monólito gigante. A presença de HAL 9000, um computador que tem consciência de si mesmo e que tem emoções (o medo de HAL ao ser desligado por Dave e suas súplicas doem na gente a qualquer tempo, é um sentimento forte e atemporal). O contato com o monólito e a velocidade warp de Dave, que termina numa pequena sala, um ambiente produzido pelos alienígenas para que Dave se torne mais confortável. A velocidade de seu metabolismo aumentada para seu rápido envelhecimento e morte, para fundir seu corpo com a espécie alienígena.

A Solitária Discovery no Espaço.

O desfecho do bebê, fruto da mistura entre as duas espécies, vendo o planeta Terra, ao som de Assim Falou Zaratrusta, de Richard Strauss. Tudo isso passado em imagem viva diante de nossos olhos, praticamente sem diálogos, toda a linguagem cinematográfica presente dentro da materialidade das imagens, com a música reforçando e ratificando os significados.

HAL 9000: um computador com sentimentos.


Lembro-me aqui de meu professor. Por mais que a gente busque avançar, sempre retornamos ao ponto de partida. Com o renascimento de Dave, podemos dizer que meu mestre tinha lá uma certa razão.

A visão aterrorizada de Dave durante seu warp.

Entretanto, renascemos, reciclamos, sempre para buscar um novo futuro. Voltar ao ponto de partida, voltar às origens (como o toque que o Dr. Floyd faz com a mão no monólito da Lua, o mesmo toque que o homem pré-histórico faz no monólito no passado distante) pode até ser algo bom, precisamos de nossas referências e raízes.

Dave, em seu leito de morte, perante o monólito alienígena.

Mas a raiz é a base para crescermos e buscarmos sempre um futuro melhor para todos nós. 2001 também tem essa mensagem implícita. Definitivamente, esse filme é um patrimônio da humanidade!

Dave mesclado com a espécie alienígena. Delicadeza e perplexidade. 



Batata Movies – O Segredo Do Abismo. Inteligências Abissais.

Cartaz da versão estendida
Cartaz do Filme

Vamos hoje recordar mais uma memorável sessão do Cineclube Sci Fi, realizada no Planetário da Gávea, desta vez com o filme “O Segredo do Abismo”. Realizada em 1989, essa película mostrou uma história um tanto desconexa e sem propósito quando da sua exibição ocorrida já no século passado. A versão apresentada no Planetário foi uma edição do diretor e roteirista James Cameron, onde a coisa teve um pouco mais de sentido. Vamos falar agora um pouco dessa nova história.

Virgil, o líder da equipe

O filme começa com um acidente onde um submarino nuclear americano naufragou após um enorme objeto não identificado subaquático cruzar o seu caminho. Para fazer o resgate, foram contratados trabalhadores de uma empresa de prospecção de petróleo, especializados em trabalhar em águas profundas, já que o submarino naufragou numa fossa abissal. A equipe era liderada por Virgil (interpretado pelo sempre eficiente Ed Harris) e foi contratada, pois o salvamento se fazia urgente em virtude do fato de que ogivas nucleares estavam no submarino e a equipe de Virgil era a mais próxima ao local do acidente. Mas esse salvamento não se faria de forma tranquila. Vários militares seals participariam da missão e queriam total controle das ações. Ainda, a esposa de Virgil, Lindsey (interpretada por Mary Elisabeth Mastrantonio) chegou para tumultuar o ambiente em virtude de querelas pessoais e profissionais (Lindsey estava se separando de Virgil e ainda não se conformaria com uma situação mal resolvida com a equipe do marido).

Lindsey, em litígio com Vitgil e a equipe…

Assim, a missão adquiriu contornos de muita tensão. Para piorar, o líder dos seals respirou oxigênio puro de forma excessiva nos procedimentos de mergulho a grandes profundidades e “pirou na batatinha”, querendo assumir o controle da missão a qualquer custo. E tudo isso acontecendo no meio de um conflito entre Estados Unidos e União Soviética, já que o naufrágio do submarino americano despertou uma série de suspeitas de um ataque soviético. Logo, a equipe de salvamento tinha que correr contra o tempo para evitar uma Terceira Guerra Mundial! Ufa! Você pode até me perguntar: será que foi possível resolver tantos problemas num filme só? Por incrível que pareça, sim! Mas numa versão estendida de três horas! Porque ainda tem os ETs subaquáticos, lembra? A situação enrolou ainda mais com um acidente que deixou a equipe isolada debaixo d’água e com o estoque de oxigênio limitado. Nesse ínterim, houve o contato imediato de terceiro grau, quando a equipe soube da existência da espécie alienígena que a contactava com volumes d’água que sondavam os humanos e até tomavam a forma deles, num dos poucos usos da computação gráfica da película.

Contatos Imediatos de Terceiro Grau debaixo d’água…

Assim, resolvido o imbróglio com os seals, Virgil decidiu encarar a fossa abissal com uma roupa de mergulho cheia de um líquido rico em oxigênio, onde nosso protagonista “respirava” tal líquido e podia encarar melhor a enorme pressão da água a grandes profundidades. Lá, praticamente inconsciente, foi salvo pelos alienígenas que o colocaram numa espécie de bolha de ar com uma grande tela virtual que exibia programas de tv da Terra. Com essas imagens, os extraterrestres argumentavam que a raça humana era muito agressiva e devia ser destruída. Por controlarem a água, os alienígenas formariam enormes ondas que destruiriam a cidade. Mas eles desistiram, pois captaram uma mensagem de Virgil a Lindsey, que dizia que a amava, pois enquanto ele descia a fossa, abissal, Virgil percebeu que não conseguiria retornar e morreria ali.

ETs subaquáticos fluoresecentes

Assim, mandou a mensagem de amor e despedida à esposa, que os alienígenas captaram e, de forma muito piegas, perceberam que a humanidade ainda tinha salvação e desistiram de destruí-la. O filme termina com a grande “nave espacial” alienígena que estava submersa chegando à tona, trazendo um monte de navios afundados com ela, a equipe toda salva e Virgil e Lindsey dando um beijo apaixonado sobre o OVNI subaquático. Que fofo!
Apesar dessa pieguice mais ao final, esse “corte do diretor” James Cameron de três horas de duração deu mais substância à história pois, na versão original, toda a parte “guerra fria” do filme não existia, assim como as enormes e ameaçadoras ondas que iriam destruir as cidades. Na versão original, não se tinha uma ideia exata do papel dos ETs, o que ficou mais claro na versão estendida, onde também ficou notória a mensagem pacifista de Cameron e o alerta que ele fazia à humanidade da preservação de nosso planeta, que estamos destruindo o lugar que moramos, etc., exatamente a mensagem que ele quis passar em “Avatar” muitos anos depois.

 O tal “líquido respirável”

Curiosa também era a forma dos alienígenas, que pareciam enormes águas vivas fluorescentes. Sabemos que, a grandes profundidades existem alguns seres vivos que emitem luz própria para atrair seres vivos que servem de alimento, embora nas profundezas abissais praticamente não haja vida. Dadas essas formas marinhas dos ETs, ficou a impressão de que essa espécie alienígena já habitava o fundo do mar há muito tempo e, pela teoria da evolução das espécies de Charles Darwin, já teria assumido aquelas formas mais vistas em seres marinhos.
Assim, pode-se dizer que essa versão estendida de “O Segredo do Abismo” é muito mais interessante que a versão original, pois acrescentou mais elementos à trama e deu uma mensagem à história, tornando-a motivo de reflexão. Mais uma boa escolha do público para o Cineclube Sci Fi.

Um disco voador subaquático emergindo

Após a exibição do filme, tivemos duas rápidas palestras de Naelton Araújo, astrônomo do Planetário da Gávea, mestre em educação, gestão e difusão em Ciências e que mantém o blog pessoal Céu Urbano, e Rafael Pinotti, M.Sc. em Físico-Química pela UFRJ, onde se graduou em Engenharia Química. Trabalha desde 1990 na Petrobrás como Engenheiro de Processamento. Naelton Araújo lembrou de alguns detalhes do “making of” do filme, como o fato dos atores terem precisado fazer um curso de mergulho para fazer as gravações e das más recordações em rodar o filme em condições altamente adversas, feitas num tanque de um antigo reator nuclear, com uma água com muito cloro para evitar doenças. Naelton ainda lembrou que o tal “fluído respirável” já existe, mas ainda não é utilizado para mergulhos de humanos. Um dos membros da equipe de Virgil tinha um ratinho branco de estimação e ele foi, de fato, submetido ao tal líquido, apesar de a cena ter sido editada. A menção a tal líquido apareceu em outros filmes mais recentes como “Oblivion”.

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Naelton Araújo, palestrante

Naelton ainda lembrou que o filme ganhou o Oscar de melhores efeitos especiais em 1990. Já Rafael Pinotti tratou mais da parte científica do filme. Ele lembrou, por exemplo, que as plataformas de prospecção de petróleo a grandes profundidades não são tripuladas, como o filme fantasiosamente mostrava. Pinotti ainda enfatizou que há regiões com petróleo disponível, mas que ainda não foram exploradas principalmente por causa de seu difícil acesso, como o Mar do Ártico, que tem um quarto das reservas distantes de petróleo. Foi ainda lembrado do barateamento do preço do petróleo na época, provocado, sobretudo, pelos Estados Unidos, que inundou o mercado com óleo retirado do solo e, enquanto o petróleo estiver barato, pouco investimento será aplicado na tecnologia de prospecção.

Com relação à situação do filme de ETs vivendo debaixo d’água, Pinotti lançou um questionamento: a tecnologia pressupõe uma manipulação de objetos, algo mais difícil de fazer na profundidade. Assim, seria pouco provável que houvesse uma vida inteligente tecnológica debaixo d’água, embora haja bons exemplos de vida inteligente subaquática como os cetáceos e os polvos. Pinotti também lembrou da pouca quantidade de água existente no planeta, com oceanos de profundidade média de três quilômetros. A pouca quantidade de água é vista também em outros planetas do sistema solar. E nos planetas extrassolares? O primeiro desses planetas foi detectado na década de 1990. Hoje, com a melhoria dos instrumentos de observação, há mais de dois mil planetas extrassolares detectados. E aí descobrimos que nosso sistema solar não é típico, pois foram descobertos planetas semelhantes a Júpiter mais próximos das estrelas dos sistemas. As teorias sobre o sistema solar diziam que os planetas mais próximos ao Sol (Vênus, Terra, Marte, por exemplo) tinham uma atmosfera com espessura bem menor que os planetas mais afastados do Sol (Júpiter, Saturno, Urano, Netuno, por exemplo). A observação de planetas extrassolares a princípio desmente tal teoria. Há também nos planetas extrassolares as chamadas “Super Terras”, onde há muitos planetas maiores em massa que a Terra e menores que Urano e Netuno.

Há uma proporcionalidade entre a quantidade de rocha do planeta e a quantidade de água. Como a água e a rocha crescem com o volume em quilômetros cúbicos e ocupam uma área em quilômetros quadrados, há uma especulação de que os oceanos de água em Super Terras possam ter centenas de quilômetros de profundidade. Perguntado pelo público se os cometas da nuvem de Oort que circunda o sistema solar podem ter contribuído para a formação da água do planeta (cometas são compostos de gelo e poeira), tanto Naelton quanto Rafael foram categóricos em afirmar que existem poucas evidências observacionais disso e não se pode esquecer que os asteroides também trouxeram água, o que também tem poucas evidências observacionais. Assim, os palestrantes acreditam que parte da água tenha vindo dos cometas, parte tenha vindo dos asteroides e parte tenha vindo das próprias rochas de nosso planeta, sem uma preponderância mais específica.

A palestra ainda tocou em assuntos como quais são as visões que os humanos têm dos ETs (medo, esperança e curiosidade), onde o medo suscita mais questões. Falou-se, também, do pessimismo em se encontrar inteligência extraterrestre, pois em cinquenta anos de observação de rádio, não houve qualquer evidência encontrada e o fato de que o filme pode ter sido inspirado num conto de H. G. Wells, “O Abismo”, que também tratava da exploração de fossas submarinas.

Como podemos ver, mais uma edição do Cineclube Sci Fi que trouxe bons frutos. Uma versão estendida de “O Segredo do Abismo” que tornou a história mais coesa, boas palestras de pesquisadores renomados e o bate papo agradável. Vale muito a pena recordar tais palestras.

Batata Movies – Malévola, Dona Do Mal. Uma Guerra Feudal???

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Cartaz do Filme

A Disney dá a “Malévola” a sua continuação. “Dona do Mal” foi um filme, na minha modesta opinião, melhor que o primeiro “Malévola”, até por ser bem mais conflituoso e, eu diria, inesperadamente violento. Mas, ainda assim, um filme que levou a uma interessante reflexão. Para podermos entender melhor a película, vamos lançar mão de spoilers aqui.

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Uma Malévola de face mais poligonal…

O plot é um tanto simples. Há o reino dos humanos e o reino dos seres da floresta. Aurora (interpretada por Elle Fanning), que também atende pela alcunha de “Bela Adormecida”, ainda tem Malévola (interpretada, como todos nós sabemos, por Angelina Jolie) como madrinha, e acaba acertando os ponteiros com o Príncipe Phillip (interpretado por Harris Dickinson), do reino dos humanos, para se casarem. Obviamente, Malévola não vai gostar nem um pouquinho disso, mas Aurora consegue convencer a madrinha a ir ao castelo dos pais do Príncipe Philip. O problema é que a Rainha Ingrith (interpretada por Michelle Pfeiffer), mãe do Príncipe Philip, também não quer o casório e começa a produzir conflitos durante o jantar, o que vai levar Malévola a uma explosão de ódio, enquanto que o Rei John (interpretado por Robert Lindsay) cai, moribundo.

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Asas expressionistas. Como me lembro de “Fausto”, de Murnau!!!

Ingrith na hora acusa Malévola de tê-lo amaldiçoado e ordena que ela seja alvejada enquanto esta sai voando do castelo. Ferida, Malévola é resgatada pelo seu povo, que sempre viveu escondido dos humanos e alguns de seus membros querem a guerra, enquanto que outros querem a paz com os humanos. Aurora fica no Palácio de Ingrith, achando que Malévola a abandonou. E Ingrith continua os preparativos para o casamento, que na verdade será uma armadilha para atrair os seres da floresta para o seu reino para serem envenenados por uma espécie de pozinho produzido por um gnomo especialista em venenos e poções.

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Ingrith, a verdadeira vilã…

Como dito acima, essa é uma história mais violenta que a primeira, onde vemos fadas morrendo intoxicadas e se transformando em flores, além de haver uma monumental cena de guerra no clímax do filme. Confesso que tudo isso me incomodou um pouco, pois eu esperava algo mais próximo do lúdico de um conto de fadas. O filme até parece ir na direção de algo mais lúdico no seu início, mas à medida que a personagem de Ingrith se revela em toda a sua veia perniciosa, o filme vai para uma direção muito pesada. Ver fadinhas e homens árvore gigantes morrendo e se transformando em flores e árvores inertes me pareceu um pouco pesado para um filme destinado ao público infantil. Pelo menos, nesse momento a presença do Príncipe Philip foi marcante, onde ele foi uma voz decisiva para um cessar fogo nessa guerra bem feudal. O mesmo Príncipe Philip, que até aquele momento, não havia feito nada de relevante na película e habitava uma posição entre o coadjuvante e o figurante no filme.

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Príncipe Philip. De coadjuvante a personagem decisivo no fim da guerra…

Toda essa iniciativa do Príncipe consegue colocar um freio nas maldades de Malévola, que entrou na guerra arrebentando com tudo, mas vai parando em sua violência ao ver o ato de compreensão e tolerância do Príncipe. Pode-se dizer que o Príncipe “salva” a protagonista que é condenada na película desde sempre. A grande mensagem do filme é, então, a questão da tolerância com o próximo, com aquele que é diferente de você, se bem que essa lição, dessa vez teve um gosto amargo, pois mostrou-se de forma bem nítida as conseqüências nefastas da intolerância. Assim, a mensagem do filme é bem construída, embora tenha sido um pouco pesada para o público alvo, que é de uma faixa etária bem baixa. Não é à toa que é citado, durante a exibição, que este não é um conto de fadas.

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Cena impagável de bastidores…

Dessa forma, “Malévola, A Dona do Mal” é uma interessante película, melhor que o primeiro filme dessa personagem repaginada, pois aborda a questão do respeito às diferenças, embora a coisa tenha sido feita de uma forma um pouco pesada para o público infantil, pois exibe violência, guerra e mortes. Apesar desse pequeno exagero, o óbvio happy end de conto de fadas foi mantido, o que dá uma leveza compensadora às partes mais pesadas da película. E optou-se não destruir fisicamente a vilã (Me refiro a Ingrith, obviamente), mas sim dar a ela um desfecho mais cômico. Vale a pena dar uma conferida.

Batata Movies – Planeta dos Macacos. Um Grande Clássico da Ficção Científica.

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Cartaz do Filme

Vamos hoje recordar mais uma sessão do Cineclube Sci Fi. No mês de agosto de 2015, o Cineclube Sci-Fi exibiu no Planetário da Gávea um clássico da ficção científica. “Planeta dos Macacos” (“Planet of the Apes”), produzido em 1968, é um filme inspirado no livro de Pierre Boulle e provocou tanto sucesso que rendeu várias continuações no cinema, sem falar das histórias em quadrinhos, livros e até “remakes” mais recentes. Contando com atores de peso como Charlton Heston, Roddy McDowall e Kim Hunter, essa película tem o grande mérito de ser mais uma daquelas histórias que nos convida à reflexão. E o faz de modo muito inquietante.
Vemos aqui a história de quatro astronautas que fazem uma viagem em direção à um sistema planetário na constelação de Órion. Seguindo o modelo do paradoxo dos gêmeos da Teoria da Relatividade de Einstein, o tempo passa mais lentamente para quem viaja a velocidades próximas à da luz, fazendo com que, quando os astronautas tivessem chegado ao seu destino, dois mil anos já tivessem se passado na Terra. Esses quatro escolhidos (três homens e uma mulher) levariam a raça humana para outro recanto do Universo. Mas a coisa deu errado e a mulher morreu, pois sua câmara de hibernação se rompeu. Os três astronautas caíram num planeta aparentemente muito inóspito, com a paisagem altamente desértica. Mas logo eles descobririam uma região de vegetação e de seres humanos vivendo como se estivessem lá no paleolítico da pré-história, ou seja, somente coletando frutas nas árvores, além de não falarem uma palavra. Qual não foi a surpresa deles quando apareceram vários macacos que raciocinavam, falavam e atacavam os humanos para mantê-los presos como animais selvagens? Na violenta perseguição dos macacos aos humanos, um dos astronautas acabou morrendo, outro desapareceu e um terceiro, George Taylor (interpretado por Heston) acabou sendo capturado. Como ele havia sido alvejado no pescoço, não conseguia falar e foi encarado como um humano como qualquer outro, considerado selvagem. Mas ele se comunicava por sinais com a cientista Zira (interpretada por Kim Hunter), que tinha uma visão mais complacente com os humanos, juntamente com seu marido Cornelius (interpretado por MacDowell). Entretanto, eles eram malvistos pelo Dr. Zaius (interpretado por Maurice Evans), que via os humanos com muito preconceito, já que escrituras sagradas antigas diziam que o ser humano era tudo de ruim na face do planeta. Taylor tentará fugir e, quando é recapturado, fala e raciocina, para espanto de todos.

Taylor, Cornelius e Zira

O filme suscita muitas discussões. Como é dito na própria película, a teoria da evolução das espécies é meio que colocada “de cabeça para baixo”. E aí, os humanos são colocados num patamar de inferioridade como eles o fazem com os animais. Não é à toa que Pierre Boulle teve a ideia de escrever a história do filme ao visitar o zoológico e pensar como seria se fossem os humanos presos nas jaulas ao invés dos animais. A forma como os macacos tratavam os humanos tem muito da forma como os humanos tratam os demais animais. Mas a coisa vai além, já que, na situação do filme, tanto macacos como humanos (no caso especial de Taylor) são seres pensantes e que possuem cultura. Assim, há um caso bem evidente de preconceito e intolerância contra o outro, tão condenado pela antropologia cultural. É assombroso perceber que esse filme nunca foi tão atual. A cultura dos macacos misturava ciência e religião da forma mais promíscua, ou seja, rezando pela cartilha do etnocentrismo e do preconceito. O mais curioso é que Taylor, uma espécie de rebelde e revoltado com o mundo, topou fazer essa viagem porque ele estava totalmente descrente da raça humana e irá encontrar uma civilização de macacos que pensa igualzinho a ele, mas a ponto de repudiar a raça humana com extrema violência e intolerância e a aplicar processos por heresia para o casal Cornelius e Zira, macacos simpatizantes dos humanos, ao bom estilo dos Tribunais de Inquisição e Santo Ofício da Idade Moderna, que queimava quem discordasse dos dogmas estabelecidos (vale dizer que não somente católicos condenaram pessoas à fogueira, mas protestantes também, num momento em que a Europa passava por uma situação de intolerância total).

Elite, em seu preconceito, se fecha a novas formas de pensar…

E por que as escrituras sagradas antigas condenavam tanto os humanos? Aí entra o elemento reflexivo mais importante do filme. Quando Taylor conquista sua liberdade, levando a bela Nova (interpretada por Linda Harrison) em seu cavalo para começar uma nova vida, eles cavalgam pela praia. E aí, temos a famosa cena em que Taylor encontra a metade de cima da Estátua da Liberdade fincada na areia, e Taylor desce do cavalo e ajoelha-se na areia para amaldiçoar a humanidade, que enfim tinha conseguido destruir o mundo com a hecatombe nuclear (os tempos da Guerra Fria, sempre eles!).

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Pontepretano assumidíssimo! Isso é que é estar com a macaca!!!

Assim, se num primeiro momento toda a intolerância e preconceito dos macacos para com os humanos era algo que nos incomodava, agora que sabemos que na verdade Taylor estava no Planeta Terra de dois mil anos no futuro e que a tragédia nuclear havia acontecido, somos obrigados a dar o braço a torcer e a concordar em parte que “o macaco tá certo”, lembrando o bordão do programa de tv humorístico “O Planeta dos Homens”, que tinha os macacos Charles e Sócrates. Assim, as sagradas escrituras foram escritas pelos macacos seiscentos anos depois da destruição provocada pelos humanos e nossa espécie foi severamente condenada pela besteira que fizemos.

Sócrates. O macaco tá certo!!!!

Assim, o primeiro “Planeta dos Macacos” é um filme que tem uma grande importância, pois ele nos fala de preconceito, intolerância, etnocentrismo, mas também relativiza a questão quando nos faz um alerta de quais rumos a espécie humana quer dar para nosso planeta.
Após a exibição do filme, houve duas palestras. A primeira, feita pela antropóloga Eliana Granado, foi altamente pertinente para a análise do filme, já que ela justamente falou sobre as questões acima abordadas, como a oposição entre preconceito e tolerância, a importância de se respeitar o outro, a ideia de que não há cultura superior ou inferior, mas sim culturas diferentes, etc.

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Uma cena antológica…

Para ilustrar suas argumentações, ela utilizou suas experiências de trabalho de campo com culturas indígenas e denunciou situações seriíssimas de genocídio e etnocídio ocorridas nos tempos atuais, além da insatisfatória política do governo para preservar a integridade das várias etnias indígenas, cada vez mais ameaçadas. O outro convidado palestrante foi Saulo Adami, um dos maiores especialistas em Planeta dos Macacos do país. Fã da saga desde criança, ele cedo começou a colher todo o tipo de informações sobre o filme, chegando a contatos com artistas, produtores e maquiadores que participaram do filme nos Estados Unidos. Sua pesquisa é tão respeitada que ele já foi convidado para dar palestras até no exterior. Saulo conversou com o público sobre suas experiências e contatos, além de ter passado pela experiência de ele mesmo ter sido maquiado e caracterizado como um macaco, além de bilhetes, fotos autografadas e outros itens que chegam a 1800. Essa edição do Cineclube Sci-Fi ainda contou com uma sessão de autógrafos dos livros dos dois palestrantes.

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Saulo Adami

Como podemos ver, a edição de agosto de 2015 do Cineclube Sci-Fi bombou. Um ótimo filme, excelentes palestrantes, bom debate, e uma sessão de autógrafos de quebra. Recordar é viver. Esperemos que, um dia esse cineclube retorne.

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Eliana Granado

Batata Movies – Projeto Gemini. Crise De Identidade.

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Cartaz do Filme

Will Smith está de volta em mais um filme de ação. “Projeto Gemini” tem um toque de ficção científica e traz de volta a discussão das questões éticas em clonagem, um assunto que tinha saído um pouco da pauta dos filmes mais recentes. Para a gente poder compreender melhor o filme, vamos precisar de spoilers aqui.

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Brogan, um matador profissional que vai encarar uma surpresa…

O plot é o seguinte. Henry Brogan (interpretado por Smith) é um assassino profissional que faz serviços para o governo americano. Entretanto, ele está cansado dessa vida e quer se aposentar. Mas um amigo seu diz que o último homem que ele matou não era um “bad guy”, mas sim uma espécie de queima de arquivo do governo. Como ele toma conhecimento desse problema, ele imediatamente se torna um alvo do governo americano, ficando marcado para morrer. E quem fica incumbido dessa difícil tarefa, já que Brogan é um profissional extremamente competente naquilo que faz é, nada mais, nada menos do que ele mesmo, pois foi um projeto ultrassecreto do governo de nome Gemini acaba clonando Brogan. E assim, uma versão mais nova dele o caça, sendo que, como os dois são praticamente idênticos, as cenas de perseguição e de ação vão pegar muito fogo.

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Júnior, cheio de dúvidas…

É claro que a principal atração de um filme desse naipe são as cenas de ação, de tiroteios, bombas e explosões, algumas com um CGI relativamente sofrível. Mas, pelo menos, a questão da clonagem dá um tom um pouco diferente para um filme que seria mais do mesmo. Obviamente, a questão ética surge no meio da conversa e a clonagem é vista como algo feito por mentes inescrupulosas que querem poupar a vida de soldados e sofrimentos de famílias, mas brincando de Deus e gerando outras vidas com o propósito da imolação e sacrifício. É claro que Brogan não vai querer dar cabo de seu rival e vai ter uma afinidade total com seu eu mais novo que, diga-se de passagem, está a cara de Will Smith quando fazia “Um Maluco No Pedaço”, que passava já há longínquos anos no SBT (tinha horas que eu me perguntava quando ia aparecer o Carlton e o Tio Phill). E, claro, os dois gradativamente se aproximam e se aliam no transcorrer do filme. O que incomodou um pouco foi que a igualdade genética dos dois foi explorada a um ponto de quebrar a regra do fato de o homem ser produto do meio em que vive. Ou seja, ainda que Brogan e Júnior sejam geneticamente idênticos, eles tiveram experiências de vida diferentes e isso é meio que atropelado ao longo da exibição da película, onde parecia que a igualdade genética determinava tudo entre os dois, o que sabemos que não é verdade. De qualquer forma, valeu pela discussão e pelo debate em torno da questão ética da clonagem humana. Mas outra coisa que devemos nos lembrar é que a versão clonada de Brogan não deveria ser mais jovem que ele, mas sim com sua mesma idade. O detalhe é que isso tiraria toda a graça de Brogan se ver mais jovem e buscar semelhanças de Júnior com a própria juventude de Brogan.

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Ele lutando contra ele mesmo…

Apesar de termos a presença de Clive Owen e Benedict Wong (de “Dr Estranho) no filme, essa é uma película toda centrada em Will Smith, como não podia deixar de ser. Seu personagem Brogan era um pouco durão e sisudo, com poucos espaços para algo mais descontraído e cômico. Já Júnior era bem mais interessante, com todos os dramas e inquietações de um praticamente pós-adolescente. Smith consegue convencer como um cara mais maduro e mais jovem ao mesmo tempo e sua atuação foi nota dez como sempre.

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Sempre vale a pena ir ao cinema para ver Will Smith…

Assim, “Projeto Gemini”, apesar de ser um filme bem convencional de ação, com os tiros, porradas e bombas de sempre, tem um toquezinho de ficção científica e de debate ético em torno da questão da clonagem humana, sendo um filme um pouco mais diferente da média dos filmes de ação. E tem Will Smith, o tipo do ator que a gente vai para o cinema assisti-lo, não importa qual seja o gênero de filme. Vale a pena dar uma conferida.