Batata Movies – O Poder De Diane. Uma Barriga De Aluguel E Um Eletricista.

Cartaz do Filme

Mais uma produção francesa. “O Poder de Diane” (“Diane a les épaules”) é uma comédia levinha e despretensiosa que tem uma barriga de aluguel, um casal gay e um eletricista. Como eles interagem? A barriga de aluguel é da Diane em questão (interpretada por Clotilde Hesme). Ela engravidou para dar a criança para o casal composto pelos músicos Thomas (interpretado por Thomas Suire) e Jacques (interpretado por Grégory Montel).

Diane, uma mulher num turbilhão de emoções…

Enquanto passa pela gravidez, Diane procura reformar a casa dos avós para poder vendê-la. Para isso, ela vai contar com a ajuda do eletricista italiano Fabrizio (interpretado pelo bom ator Fabrizio Rongioni, de “La Sapienza”). Os dois começam um namoro, com bons e maus momentos, enquanto o casal de músicos está em turnê no Japão. Quando eles retornam, passam a fazer parte do cotidiano do outro casal, o que acrescenta mais alguns elementos meio que tragicômicos à película que se intitula uma comédia, embora o filme tenha mais a cara de um drama leve e uma história relativamente divertida (mas também tensa) sobre relações humanas.

Gerando um filho para um casal gay…

O filme procura adicionar esses elementos (a já citada barriga de aluguel, o casal gay e o eletricista hetero) de uma forma um tanto engraçada, mas a coisa parece não decolar muito. Ou seja, o filme até te entretém e prende sua atenção, mas não apresenta nada de muito espetacular que valha a pena o ingresso. É uma história com suas graças e suas tensões, mas fica somente nisso.

Um namoro com um eletricista…

O elenco também tem uma atuação mediana. Clotilde Hesme, que interpreta a protagonista, faz uma Diane meio louca de pedra, meio sensível. O filme acaba girando em torno da moça, mas sem muita convicção. Fabrizio Rongione, talvez o ator mais conhecido do staff, fica um pouco deslocado como o eletricista que pisa em ovos, dada a situação delicada de sua namorada. Já os atores que interpretam o casal gay têm algumas tiradas um tanto cômicas, mas nada além disso.

Vai ser um relacionamento difícil…

Como se pode ver, “O Poder de Diane” não é um filme que se tenha muito o que dizer. Uma comédia que tem três elementos (a barriga de aluguel, o eletricista e o casal gay) que poderiam ter sido mais bem aproveitados e interligados. Um elenco cujas atuações foram medianas e um desfecho que poderia ter sido mais interessante se não buscasse uma possibilidade para um “happy end”. Um programa para simples e mero entretenimento. Nada mais.

Batata Movies – A Revolução Em Paris. Didático No Factual.

Cartaz do Filme

Dentro do Festival Varilux de Cinema Francês 2019, tivemos o excelente “A Revolução em Paris”, um drama histórico sobre a Revolução Francesa. Foi feito um filme bem didático, privilegiando a parte factual da coisa. Como a Revolução Francesa é um assunto extenso, que durou vários anos, privilegiou-se o recorte temporal que foi da Queda da Bastilha à execução de Luís XVI na guilhotina.

Françoise, a personificação de Marianne…

Para quem já se esqueceu das aulas de História, vai aqui um plot histórico rápido. A situação da França no fim do século XVIII era de crise profunda. Famílias inteiras passavam muita fome devido à situações como enchentes, nevascas e secas. Como se isso não bastasse, ainda tinham que pagar impostos pesados para que o rei desse privilégios para a nobreza feudal e o clero. Houve uma convocação da Assembleia dos Estados Gerais, onde o rei ouvia sugestões do clero, da nobreza e do Terceiro Estado. Essa última classe social consistia no grosso da sociedade e foi sugerido por ela que clero e nobreza pagassem impostos, mas essas duas classes se negaram a isso.

Um Luís XVI muito blasé…

Assim, o Terceiro Estado se intitulou Assembleia Nacional e se reuniu em separado para escrever uma Constituição para a França, numa clara afronta ao poder real, já que um rei absolutista colocado no trono por Deus teria que obedecer um conjunto de leis criado pelos súditos. Com isso, o rei decide dissolver a Assembleia Nacional, mas esta contra-ataca com a ajuda do povo mais pobre dos meios urbanos (“sans-culottes”; esse termo é utilizado, pois as pessoas não tinham dinheiro para comprar as caras calças culottes, que tinham uma folga no quadril) e destroem a Bastilha, uma prisão para os opositores do rei. Além disso, obrigam Luís XVI a sair de Versalhes e se estabelecer em Paris.

Os “sans-culottes”…

A Assembleia Nacional, enquanto redige a Constituição, também redige a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, um conjunto de ideias Iluministas que são a base dos atuais Direitos Humanos. Mas a França está sob ataque dos outros países absolutistas da Europa, que temem que as ideias revolucionárias se alastrem pelos seus territórios.O próprio rei da França, Luís XVI, participa, às escondidas, dessa conspiração e é descoberto, sendo condenado por alta traição e guilhotinado.

Robespierre, verborrágico e sereno…

Vemos todos esses momentos e mais alguns dados factuais que ajudam a rechear todo o contexto durante a exibição da película, que mostra, também, outras curiosidades. Em primeiríssimo lugar, esse é um filme que fala da Revolução do ponto de vista dos “sans-culottes” que, segundo a película, aparentavam ter uma vida política muito mais ativa do que se pensava, com direito até a parlamentar com os deputados da Assembleia Nacional, cuja relação era conflituosa pois os “sans-culottes” eram vistos como escória da sociedade até por alguns segmentos mais conservadores da Revolução como os girondinos, colocados à direita da Assembleia.

O cartaz do Festival Varilux desse ano…

Por outro lado, os jacobinos, colocados à esquerda, primavam pelas pautas sociais, até para que não houvesse uma revolta generalizada da população e a Revolução perdesse o controle, indo de Danton, passando por Robespierre (interpretado por Louis Garrel) e chegando a Marat (interpretado por Denis Lavant), o mais radical de todos. Logo, vemos que os revolucionários não eram exatamente um grupo coeso e houve vários conflitos entre eles dentro de todo o processo.

Marat (com um pano na cabeça). O mais inflamado…

O que podemos falar dos atores? Dentre os acima citados, Garrel fez um Robespierre altamente sereno e verborrágico. Lavant fez um Marat bem vibrante, como não poderia deixar de ser. Mas os “sans-culottes” merecem destaque. Olivier Gourmet faz um fabricante de vidros que tinha muita consciência política mas que fica cego num dos combates populares contra setores mais conservadores da Revolução. E a belíssima Adèle Haenel faz Françoise, uma mulher do povo, praticamente uma encarnação de Marianne, o símbolo da República Francesa e o cartaz do Festival Varilux desse ano. Já Laurent Lafitte fez um Luís XVI demasiadamente blasé e que foi tratado na película mais como vítima do que como vilão. Confesso que soou esquisito isso, pois fica parecendo que os revolucionários, ao executarem o rei na guilhotina, tinham um caráter mais bárbaro e vingativo do que o ato de praticar justiça. E devemos nos lembrar sempre que a guilhotina foi uma invenção para tornar as execuções mais rápidas e indolores, pois as decapitações, antes da guilhotina, eram feitas com machados e nem sempre a cabeça saía toda logo na primeira machadada, sendo o condenado obrigado a sofrer sucessivos golpes de machado no pescoço até a cabeça se separar completamente do corpo, tornando todo o processo mais longo e bem mais doloroso.

O rei no cadafalso. Traíra!!!

Dessa forma, “A Revolução Em Paris” é um filme obrigatório que passou no Festival Varilux de Cinema Francês 2019 e que deve entrar em circuito. Vale a pena dar uma conferida, já que temos aqui uma história contada de uma forma bem didática com direito a alguns detalhes factuais que nos ajudam a entender o contexto da Revolução. Programa imperdível.

Batata Movies – Graças A Deus. Mexendo Em Feridas Do Passado Para Não Se Jogar Fora O Futuro.

Cartaz do Filme

Um bom filme francês que esteve no Festival Varilux desse ano e que entra em circuitão. “Graças a Deus”, de François Ozon, aborda um tema espinhoso que já foi tratado em outros filmes: os casos de pedofilia na Igreja Católica. Tema que é considerado tabu até hoje (no início desta película mesmo é dito que o filme é uma “história de ficção” baseada em eventos reais), sempre é importante prestar atenção em estreias de filmes que abordem essa temática, onde o cinema cumpre sua função social de denúncia. Mais uma vez, os spoilers serão necessários aqui.

Guérin. Uma vítima luta por justiça…

O filme começa com Alexandre Guérin (interpretado por Melvil Poupaud), uma vítima de abuso sexual, durante os anos de sua adolescência, do Padre Bernard Preynat (interpretado por Bernard Verley). Ele descobre que o padre ainda lida com crianças depois de muitos anos e quer pedir que a Igreja Católica o afaste dessa função. Entretanto, a instituição enrola Guerín e a coisa fica por isso mesmo, pois a vítima não pode entrar na justiça contra o religioso, pois o crime já prescreveu. Mas há outras vítimas.

François, uma abordagem mais agressiva…

François Debord (interpretado por Denis Ménochet) também foi molestado pelo padre e, no caso dele, o crime não havia prescrito. Ele não ficou tão preso aos grilhões de sua fé e denunciou o caso do padre à polícia, além de divulgá-lo na mídia. Já Emmanuel Thomassin (interpretado por Swann Arlaud), uma das vítimas mais traumatizadas e arrasadas do padre, inclusive fisicamente, acabará por ser o responsável por meter um processo no padre na justiça. De qualquer forma, a película deixa o caso em aberto em seu desfecho, pois o padre ainda não foi julgado por seus crimes e a justiça age de forma muito morosa nesse caso.

Emmanuel, o que mais sofreu…

Dá para perceber, ao ler rapidamente a sinopse da película, que a história não prioriza um protagonista em si. Na verdade, o filme é dividido em três núcleos, onde cada um deles tem o seu protagonista. Cada vítima do padre dá um passo no ato de incriminar o pedófilo. E podemos ver como pessoas de comportamentos diferentes lidam com situação tão espinhosa. Ainda, essas pessoas irão interagir e reagir de forma diferente ao fazerem parte de uma associação que irá buscar justiça no caso específico de abusos cometidos pelo Padre Preynat, o que leva a alguns desentendimentos.

Vem cá, meu filho…

Tudo isso leva à conclusão de que a Igreja Católica ainda é uma instituição que controla demasiadamente as mentes e corações dos indivíduos. Algumas vítimas faziam as denúncias pela integridade da Igreja, acima de tudo. Outros se preocupavam com a continuidade de Preynat como padre, ainda ligado a crianças. Já outros simplesmente faziam denúncias para atacar a Igreja em toda a sua hipocrisia. Agora, foi sintomática a presença de vítimas que sequer quiseram denunciar o padre, mesmo com visíveis traumas psicológicos.

O poder da Igreja sobre as pessoas, muito bem pictoricamente representado…

Assim, “Graças a Deus” foi um importante filme que denuncia um problema gravíssimo e presente da Igreja Católica que já existe há muito tempo e sempre foi tratado com muita morosidade pela instituição. E, enquanto isso, mais vidas são destruídas, pois foram violadas quando somente queriam exercer sua fé e sua espiritualidade. É um tema que sempre tem que ser revisitado e denunciado. E o cinema é uma ótima ferramenta para isso, como vemos no caso dessa película de importância fundamental.

Batata Movies – O Professor Substituto. Ecologia Hardcore.

Cartaz do Filme

Entra ano, sai ano, e nunca vi nenhum filme do Festival Varilux de Cinema Francês. Esse ano, no apagar das luzes, decidi finalmente prestigiar o Festival e fui ver “O Professor Substituto”, um filme que começa parecendo ser de um gênero e termina sendo outra coisa totalmente diferente, num daqueles plot twists de arrasar quarteirões. Vamos lançar mão dos spoilers aqui, lembrando sempre que vários filmes desse festival entram em circuito comercial depois.

Encarando uma sala hostil…

O filme começa com um professor e seus alunos na sala de aula. Enquanto a turma faz a atividade proposta pelo professor, este coloca uma cadeira perto da janela, sobe nela e se joga no pátio. Chega, então, um professor substituto, Pierre Hoffman (interpretado por  Laurent Lafitte), que vai ter que interagir com a turma. O problema é que os alunos dessa turma são superdotados e se comportam de forma extremamente arrogante, sofrendo bullying dos demais colegas da escola e formando um grupo muito fechado, praticamente impenetrável. O relacionamento entre esses alunos e Hoffman será conflituoso ao extremo e o professor resolve investigar os adolescentes à distância, descobrindo um comportamento muito paranoico, onde eles se agridem mutuamente, como se eles se preparassem para viver em condições altamente adversas. Hoffman também descobre que eles escondem uma série de DVDs que eles produziram onde preveem um futuro apocalíptico para a humanidade, já que esta destrói o planeta. Esse comportamento estranho dos alunos desperta todas as suspeitas do mundo no professor, que teme pelo pior.

Uma líder negativa e destrutiva…

Pois é. Somente com essa pequena sinopse dá para perceber que o roteiro é um retalho de gêneros. No começo, temos indícios de que teremos um drama adolescente onde o professor parece ter um papel fundamental num grupo de adolescentes traumatizados. Mas logo percebemos que não é nada disso e o filme adquire contornos de um suspense pesado, onde os jovens parecem ser uma ameaça letal à integridade do professor. Um flerte também com o terror? Talvez. Mas, finalmente, o filme adquire um certo tom de denúncia dos maus tratos ao meio ambiente que ameaça a própria espécie humana, chegando a um desfecho apocalíptico e surpreendente que sai completamente do tema escolar inicial. Definitivamente, é o tipo do filme que não deixa você num estado letárgico, ou seja, não há espaço para a monotonia aqui.

Turma de comportamento muito estranho…

E os atores? Laurent Lafitte, o ator que interpreta o protagonista Pierre Hoffman, teve uma atuação relativamente convincente, onde seu ar de perplexidade foi mais marcante do que qualquer outro estado emocional. Também pudera. As situações peculiares que presenciamos ao longo da película beiram realmente o surreal. Mas devemos dar um destaque todo especial aqui a jovem atriz Luàna Bajrami, que faz a líder dos jovens superdotados, Apolline. A menina atuou muito bem e foi extremamente odiosa, tornando-se a antagonista perfeita, conseguindo a redenção de sua personagem no desfecho da película, com um gesto bem sutil e simples.

Um desfecho surreal…

Dessa forma, “O Professor Substituto” foi uma boa surpresa dentre as películas do Festival Varilux de Cinema Francês de 2019. A mistura de gêneros teve como destaque principal o suspense com leve pitadas de terror, que conduziu o filme na maioria de sua exibição, embora o desfecho apocalíptico tenha sido também uma boa surpresa. Vale a pena dar uma conferida com ele no circuitão.

Batata Movies – Obsessão. Paranoia Clássica.

Cartaz do Filme

Isabelle Huppert está de volta, mas agora numa produção americana. “Obsessão” é o clássico filme de suspense onde alguém tem aquela fixação por uma pessoa e, paranoicamente, começa a persegui-la. Cabe aqui a paranoia (e, infelizmente, alguns clichês) a Huppert, enquanto que a perseguida inocente será interpretada por Chloë Grace Moretz. Vamos lançar mão dos spoilers aqui.

Duas amiguinhas…

O plot é muito simples e é o seguinte: Frances (interpretada por Moretz) perdeu a mãe e tem uma relação conflituosa com o pai desde então. Um belo dia, a moça encontra uma bolsa perdida no metrô e o nome de Greta Hideg (interpretada por Huppert) num documento de identidade. Ela consegue localizar a senhora e elas se tornam amigas.

Greta parecia superfofa…

Mas Frances descobre um monte de bolsas iguaizinhas a que ela achou, com nomes e telefones coladas na parte de trás delas. Frances irá entrar em pânico e vai tentar se desvencilhar de Greta, que diz ser viúva e ter uma filha estudando no exterior. Logo, logo, Greta irá começar a perseguir Frances até conseguir mantê-la em cárcere privado. Tudo isso regado a muito suspense e lances, digamos, violentos e neurastênicos.

Mas logo ficou claro que havia algo errado…

A primeira coisa a se lamentar no filme é a forma como se tratou a personagem de Huppert. Inicialmente uma francesa, descobre-se posteriormente que Greta é, na verdade, húngara, o que abriu margem para estereótipos e uma visão mais caricata e ridicularizada da personagem, o que foi uma pena. Suas citações em húngaro tiraram um pouco o terror da personagem, embora seus passinhos de balé num momento bem tenso do filme tenham sido muito engraçados e bem encaixados no contexto.

Caçada no metrõ…

Já Chloë Grace Moretz acompanhou Huppert como pôde mas fazia mais a cara de um bebezinho assustado do que qualquer outra coisa. É, realmente, um filme de Huppert em toda a sua plenitude. Típico filme que a gente vai ver para cultuar a artista que a gente gosta, mesmo que a película não seja de boa qualidade, como vemos nesse thriller cheio de clichês.

Moretz e sua cara de bebê assustado… ficou até meio zarolha…

Assim, “Obsessão” é mais um filme de suspense com mais do mesmo. Pelo menos, veio a Isabelle Huppert como atriz principal (não foi a Moretz a protagonista de jeito nenhum), embora sua vilã tenha sido estereotipada com uma série de clichês que nossa diva francesa não merecia. Fazer o que? Filme americano, diriam alguns. Mas valeu pela diversão e por ver um pouco de Huppert em ação.

Batata Movies – Deslembro. A Ditadura Sob A Ótica Infanto-Juvenil.

Cartaz do Filme

Uma curiosa co-produção Brasil, França e Catar. “Deslembro”, de Flávia Castro, é mais um filme que aborda a questão dos perseguidos políticos da ditadura militar da década de 60, só que do ponto de vista das crianças que tiveram parentes que sofreram perseguições. Esse não é um tema inédito (tivemos algo parecido no filme “O Ano Em Que Meus Pais Saíram De Férias”). Entretanto sempre é uma experiência curiosa ver como crianças e pré-adolescentes encararam essa situação insólita tão de frente.

Joana, uma menina tentando se adaptar a uma nova terra…

Vemos aqui a família de Joana (interpretada por Jeanne Boudier), uma pré-adolescente que vive em Paris e que está de mudança para o Brasil, seu país natal, em virtude da lei de anistia de 1979. Sua mãe vive com um ativista chileno e seu pai desapareceu no Brasil durante os anos mais pesados da repressão. Ao chegar ao Brasil, ela vê esse país inicialmente como uma terra estrangeira, pela qual não tem qualquer afinidade, e vai, aos poucos, buscando uma maior interação com sua terra natal. Para isso, ela contará com a ajuda da avó (interpretada por Eliane Giardini) e um namoradinho, que lhe apresentará o samba e a MPB. Joana sente muita falta de um núcleo familiar convencional, pois sua mãe e seu padrasto estão muito engajados no movimento político e estão constantemente ocupados ou até fora de casa. Mesmo sabendo de todo o passado pregresso do pai, ela não se conforma de a família já dá-lo como morto ao invés da condição oficial de desaparecido político.

Visitando um antigo aparelho…

O mais curioso desse filme é que ele, por mostrar as coisas sob uma ótica infanto-juvenil, fala de um tema altamente politizado (a luta contra a ditadura militar) da forma mais despolitizada possível. É curioso perceber como a película dá voz a um grupo que também foi vítima da ditadura e quase não tem direito a manifestação nesse contexto, que é o grupo das crianças de famílias que eram ativistas contra o regime de exceção. Só é pena que um protagonismo excessivo tenha sido dado a Joana, onde todos os seus dilemas, crises e aspirações inundam o filme. Havia crianças menores na película cujos anseios poderiam também ter sido explorados.

Filme sob uma ótica juvenil…

Pelo menos, a película terminou de forma bem simplória e singela, dando ao seu desfecho uma tremenda cara de anticlímax, algo bem mais adequado com a realidade, dando um ambiente de letargia de pessoas que passaram um pouco mais incólumes ao processo da ditadura, caso das crianças da história.

Descobrindo a dura realidade com a avó…

Assim, “Deslembro” é uma película que tem um título bem adequado: para se lembrar de todo aquele período sombrio que não se conheceu direito, é melhor se esquecer e olhar para a frente. A dor da perda de um pai não pode ser justificativa para um estado de letargia perante o mundo, embora essa perda sempre deixe uma sequela. Apesar de um ritmo muito lento, o filme merece uma conferida.

Batata Movies – Shazam. O Marvel da DC.

Cartaz do Filme

Quando eu vi o trailer de “Shazam” achei que o filme não ia ser lá essas coisas. Tudo parecia muito bobo, um super-herói adulto com mentalidade de adolescente. De fato, quem via o Capitão Marvel lá na TV da longínqua década de 70 (junto com a Deusa Ísis), percebia que havia um moleque, Billy Batson, gritar “Shazam!” e se transformar num adulto com uma capa branca de florzinhas amarelas (parecia uma toalha de mesa). Mas o Capitão Marvel daqueles tempos atuava como um adulto. Agora, não é bem assim. Vamos precisar de spoilers aqui para entender as coisas.

Billy Batson (de gorro) e seu “irmãozinho”…

O plot fala de Billy Batson (interpretado por Asher Angel), um menino de quatorze anos que se perdeu da mãe na infância e acaba ficando para lá e para cá em lares de acolhimento, ao mesmo tempo que procura sua mãe por aí. Num desses lares, ele tem nada mais, nada menos que cinco “irmãozinhos”. Um belo dia, ao estar no metrô, ele entra numa espécie de portal onde chega a uma caverna com um mago com cara de eremita chamado Shazam (interpretado por Djimon Hounsou), que mantém presos os Sete Pecados Capitais. Mas Shazam está fraco e velho, precisando passar o seu poder para uma pessoa de coração puro.

De repente, Billy Batson torna-se um super-herói…

Batson, obviamente, foi o escolhido e se transforma no super-herói (interpretado por Zachary Levi) quando pronuncia a palavra “Shazam!”. Mas o terrível Doutor Silvana (não, não era aquele cara que cantava no Chacrinha “Eu fui dar mamãe” não, é o interpretado por Mark Strong) quer esse poder e tenta tomá-lo do herói, lembrando sempre que Silvana libertou os Sete Pecados Capitais e tem os poderes desses pecados. O grande problema aqui é que nosso protagonista tem a idade de quatorze anos no corpo de um adulto e vê Doutor Silvana como uma grande ameaça. Ou seja, nosso herói precisa amadurecer, e bem rápido.

Aí, tudo é festa…

O filme, no final das contas, acabou sendo muito mais do que eu esperava. E por que isso? Apesar da falta de florzinhas amarelas na capa, a atuação de Zachary Levi foi impecável. Ele foi muito carismático e convencia bastante como um moleque no corpo de um adulto. E a coisa ainda ficou melhor, pois rolou uma baita química entre o protagonista e seu irmão de acolhimento Freddy (interpretado pelo surpreendente Jack Dylan Grazer), sendo os dois os responsáveis pelos melhores momentos da película. Os testes de superpoderes que os dois faziam eram simplesmente hilários, o que ajudou enormemente na empatia dos personagens com o público. Outro detalhe que chamou muito a atenção foram os outros irmãos de acolhimento de Batson. Além do já citado Freddy, que usava uma muleta, os demais irmãos eram outsiders por excelência, cada um à sua maneira. Se inicialmente a coisa poderia até parecer meio caricata, com o tempo os irmãos iam conquistando a gente em maior ou menor grau, e eles não são um mero suporte, uma mera escada para os personagens principais. Pode-se dizer que eles até chegaram a um nível respeitável de protagonismo, mas paro por aqui com os spoilers. Um detalhe que foi, na minha opinião, uma jogada de mestre, foi jamais citar o nome do personagem principal, que todos nós sabemos que é Capitão Marvel. Como não sou um especialista em quadrinhos, nunca entendi por que o Capitão Marvel é um herói da DC. Mas os roteiristas brincavam com esse paradoxo, inventando os nomes mais esdrúxulos para o herói enquanto ele descobria os seus poderes e isso funcionou muito bem. O mais engraçado também foi fazer brincadeiras e alusões divertidas aos demais heróis da DC, inclusive numa das duas cenas de pós-créditos.

Um Doutor Silvana turbinado…

Assim, pelo seu grau de humorismo e diversão, não é nenhum exagero dizer que “Shazam” seria uma espécie de “Guardiões da Galáxia” da DC e seria um barato ver esse herói numa Liga da Justiça com os demais heróis da DC. Creio que uma importante carta na manga possa ter aparecido aqui e que pode ser muito bem aproveitada. Vale a pena dar uma conferida.

Batata Movies – Godzilla 2, Rei Dos Monstros. Faltou O Ultraman.

Cartaz do Filme

E Godzilla tem a sua sequência. Pode-se dizer que foi mais do mesmo. É o tipo do filme que os saudosistas das séries Ultraman, Spectreman e similares usam para matar as saudades daqueles tempos áureos de infância (eu me incluo nisso). E tem a vantagem dos CGIs atuais. Mas sempre se sente a falta de um homem de lata gigante descendo a porrada nos monstros e gritando “Iáááá!!!”. Para podermos analisar o filme, vamos usar spoilers aqui.

Ele está de volta…

O plot é muito simples. Existe uma espécie de empresa, a Monarch (que não tem nada a ver com aquela marca antiga de bicicletas), que busca controlar os chamados titãs (que também não têm nada a ver com o grupo musical), que são monstros gigantescos que destroem tudo pela frente. Como se não estivessem satisfeitos com isso, os pesquisadores dessa empresa ainda fabricam mais monstros. Há, também, uma célula terrorista ecológica que quer, literalmente, soltar os bichos por aí.

Uma mariposa gigante???

Uma das cientistas da Monarch acredita que é a raça humana que destrói o planeta e soltar os titãs trará equilíbrio ecológico para a Terra. Só que todos os bichos serão soltos de uma vez, liderados por um dragão voador de três cabeças (!!!) provocando destruição total em todas as cidades importantes do mundo (mais uma vez o Brasil ficou fora da lista). Quem é o único ser vivo que pode impedir esse processo altamente catastrófico é Godzilla que, sabe-se lá por que (perguntem a ele), está do lado dos humanos.

Um dragão voador de três cabeças (credo!)

Se o roteiro do filme é pífio e cheio de questionamentos (trazer equilíbrio ecológico com vários bichões exterminando humanos aos milhões???), pelo menos as cenas de ação entre os titãs compensa um pouco a coisa. Ainda assim, são cenas muito densas e pesadas, entupidas com tanta informação que confundem um pouco. E as cidades destruídas não tinham algo de realístico, pareciam mais um cenário de jogo de videogame bem distópico. Pelo menos houve certa criatividade nos bichões dos titãs.

Uma mãe (com sua filha) tentando destruir o mundo…

Tínhamos aranha, mamute, dragão, insetos, além do próprio Godzilla. Falando do protagonista, é muito difícil de entender como um monstro tão poderoso, irracional e terrível vai ficar do lado dos humanos. Ele sempre foi meio que o vilão da história, sendo o monstro horrendo que destruirá tudo. Mas agora, nos filmes mais contemporâneos, seu papel é totalmente ressignificado, se tornando um monstro “do bem”. E aí, tome fauna de bichões para agirem como antagonistas ao dinossauro que solta raios da boca.

Um pai tentando salvar o mundo…

A sequência final ficou meio piegas, onde Godzilla concentrou tanta energia que fazia barulho de máquina de central elétrica. O som não se encaixa muito com o que a gente via, embora fossem imagens de muito impacto.

Monstro com barulho de central elétrica…

Assim, “Godzilla 2, Rei dos Monstros” é uma presepada homérica, como todo bom filme de monstro de origem japonesa deve ser. Um monstro que passou de vilão a mocinho, saindo na porrada com outras feras gigantes dos mais variados tipos e destruindo geral todas as cidades do mundo. Só faltou mesmo o Ultraman para a festa ficar completa.  Mas os fãs de Tokusatsu (como este escriba aqui) agradecem.