Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). O Tigre Branco. Ascensão Social E Luta De Classes.

O Tigre Branco - Filme 2021 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Mais um filme concorrente ao Oscar 2021. “O Tigre Branco”, da Netflix, concorre à estatueta de Melhor Roteiro Adaptado e é um daqueles filmes que nos lança à reflexão. Para podermos falar do filme, vamos lançar mão dos spoilers de sempre.

O Tigre Branco”. Como ser bilionário a qualquer preço – Observador
Balram, em busca de ascensão social…

O filme conta a trajetória de Balram (interpretado por Adarsh Gourav), um rapaz indiano de origem muito humilde que pretende ascender na vida como criado de uma família da elite que oprime o seu vilarejo. Ele consegue se tornar o motorista particular de um dos filhos da família, Ashok (interpretado por Rajkummar Rao), um rapaz que não concordava com o tratamento violento que seu pai e seu irmão dava para seus criados. Ashok, inclusive, era muito ocidentalizado e tinha uma namorada, Pinky (interpretada por Priyanka Chopra), que vivia nos Estados Unidos e estava completamente fora de sintonia com as práticas elitistas da família, numa sociedade de castas onde há grande discriminação. É nesse meio que Balram busca sobreviver e buscar espaço numa sociedade onde a maioria pobre vive no “galinheiro”, uma metáfora que diz que as pessoas vão para a imolação sem qualquer reação, de forma muito passiva. Balram fará de tudo para se tornar um criado exemplar, mas a única resposta a isso era mais e mais violência por parte do pai e irmão de Ashok. Até o momento em que Pinky atropela uma criança na rua e a mata. O pai e irmão mais velho de Ashok convencerão Balram a assinar uma declaração de culpa pelo acidente, mesmo ele não tendo estado ao volante. O acidente implodirá o relacionamento entre Ashok e Pinky. Esta vai embora da Índia, com Ashok caindo em desgraça e se tornando violento com Balram. Mesmo fazendo de tudo para seu patrão sair da fossa, Balram começa a perceber que a elite a que serve não merece aquele tipo de tratamento e ele começa  buscar seu espaço de formas menos lícitas, ganhando dinheiro por fora de todo  o jeito. As malas de dinheiro que a família de Ashok dá para políticos para corrompê-los e a leitura labial em que ele vê Ashok e o irmão conversando para demiti-lo fazem com que nosso protagonista tome uma medida muito radical, que é a de matar o seu chefe e roubar uma dessas muitas malas de dinheiro para ele começar a vida como um empresário empreendedor nesse novo eldorado do mundo que é a Ásia, depois da decadência dos brancos do Ocidente.

Leia a crítica de O Tigre Branco
Ele será um motorista de uma família da elite…

O filme é muito perturbador, exibindo de forma bem contundente todo o preconceito que existe no sistema de castas da Índia, onde uma grande ostentação convive com uma miséria absoluta. Balram, nosso protagonista de origem humilde, se vê entre a exploração dos mais ricos e a tirania de sua avó, que mantinha a família confinada em seu bolsão de pobreza. Balram só vai poder sair da influência da avó se ele se comprometer a sustentar a numerosa família. Quando o empregado faz algo considerado errado pelos patrões, a família rica, que sabe de tudo dos empregados, até para saberem onde irem atrás quando dá algo errado, costuma ir ao vilarejo provocar um massacre. Assim, nosso Balram, de uma forma até perversa, literalmente mata dois coelhos com uma cajadada só ao matar seu patrão. O grande detalhe aqui é por que Balram toma uma atitude tão radical. Ele é tratado como lixo tanto pelos seus pares (a família) quanto pelos que estão acima dele (a elite). E assim, o bom caráter que era, querendo fazer de tudo para ser um bom criado, percebe que, naquela sociedade, para almejar uma posição social maior, a figura do bom samaritano não se encaixa, e acaba corrompido pelo sistema para alcançar um status maior, não sem antes explodir em revolta, tal como um tigre branco, raro e único. E tal tática, ao contrário do que pode parecer, acaba dando certo, sendo este o único caminho que Balram tinha para poder alcançar seus objetivos.

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… e vai correr atrás de seus objetivos, sendo único e raro como um tigre branco…

Dessa forma, “O Tigre Branco” tem uma história muito cativante, que mantém o público interessado nela constantemente, sendo digna da indicação a roteiro adaptado que levou. Seria interessante se tal filme, ambientado na Índia, com questões caras àquele país, ganhasse a premiação.

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). O Céu Da Meia-Noite. Procurando Outra Casa Quando Temos Que Tomar Conta Da Nossa.

O Céu da Meia-Noite: Críticas AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Mais um filme que concorre ao Oscar. “O Céu da Meia-Noite” concorre ao Oscar de Melhor Efeitos Visuais e conta com atores de peso como George Clooney (que também assina a direção), Felicity Jones (de “Rogue One”) e David Oyelowo (de “Selma”). Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

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Augustine, um cientista em busca de planetas…

Vemos aqui a história de um cientista, Augustine (interpretado por Clooney), que descobriu uma que uma das luas de Júpiter podia sustentar vida, o que rendeu uma missão tripulada até lá. O grande problema é que, durante essa missão, o ser humano, que já maltrata o planeta Terra de longa data, conseguiu finalmente tornar o planeta inviável para a vida, obrigando as pessoas a viverem nos subterrâneos para terem uma sobrevida. Mas Augustine ficaria na superfície, esperando a missão à lua de Júpiter retornar, para alertar os astronautas a não voltarem para a Terra. Totalmente sozinho depois da evacuação da população, ele encontra uma garotinha sozinha e toma conta dela. Os dois vão precisar ir até uma estação de comunicação, onde há melhores condições de se comunicar com a missão, passando por muitos perigos e dificuldades. Paralelamente, vemos a volta da missão, onde tudo ia muito bem até o momento em que a nave saiu de sua trajetória e foi alvejada por detritos no espaço. No momento do conserto, mais detritos apareceram, causando a morte de uma astronauta. Próximos ao planeta, os astronautas finalmente falam com Augustine, que os alerta do perigo de retornarem à Terra, mas dois decidem retornar ao nosso planeta pelos laços afetivos e familiares, enquanto que um casal decide retornar à Júpiter e viver na lua.

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Uma garotinha vai ser a companhia de Augustine num mundo pós-apocalíptico…

O filme tem um ritmo extremamente lento, com duas histórias (a de Augustine e a da missão à lua de Júpiter) fluindo separadamente, somente se encontrando ao final, de uma forma até interessante que compensa a letargia da coisa. A indicação para os efeitos visuais valeu, a meu ver, muito mais pelas imagens das paisagens da lua de Júpiter do que pelas imagens da nave em si. Mas a grande atração da película sem a menor sombra de dúvida é a mensagem de alerta que ele traz sobre a forma mundana como estamos tratando o nosso planeta. Chega a ser uma ironia pesquisarmos exoplanetas a enormes distâncias, buscando condições semelhantes às da Terra quando tratamos tão mal o nosso planeta aqui bem pertinho. Podemos ver essa contradição bem expressa em cores vivas no personagem de Augustine. Quando jovem, ele era um pesquisador muito estimulado em fazer essa busca pelos exoplanetas com condições semelhantes à da Terra. Mas, em sua idade avançada, o desgosto e a doença o tomam, ao perceber que todo o seu esforço de uma vida parecia ter ido em vão, pois a Terra não mais comportava a vida. O seu esforço só não foi totalmente em vão, pois ao descobrir a lua de Júpiter que reunia condições para a vida, a humanidade poderia reaparecer a partir dali, com o casal de astronautas esperando uma filha como uma nova versão de Adão e Eva sendo expulsos do paraíso (ou indo para ele, depende do ponto de vista) para perpetuar a humanidade. Haverá uma relação entre Augustine e esse casal, mas vou parar com os spoilers por aqui.

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A humanidade ressurge de um casal…

Há uma pequena ligação com Jornada nas Estrelas nesse filme. O jovem Augustine foi interpretado por Ethan Peck, que interpretou Spock em Discovery, e Tim Russ (o vulcano Tuvok, de Voyager) aparece muito rapidamente e de relance (na verdade, a gente mais o escuta do que vê) ao início do filme, sendo um amigo de Augustine que se despede dele durante a evacuação das pessoas da superfície do planeta.

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Filme tem bons efeitos visuais, dignos da indicação…

Dessa forma, se “O Céu da Meia-Noite” é um filme de ritmo muito lento, o espectador é premiado com a mensagem do filme de cuidado com a preservação de nosso planeta e pela forma como as duas histórias que corriam em paralelo se ligam ao final. O filme também tem uma forte ligação pessoal entre os personagens que vale a pena conferir e não direi aqui.

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). Pieces Of A Woman. Ou Uma Mulher Em Pedaços.

Pieces of a Woman - Filme 2021 - AdoroCinema
Cartaz do Filme…

Dando sequência às nossas análises de filmes que concorrem ao Oscar, vamos falar hoje de “Pieces Of A Woman”, mais uma produção da Netflix que concorre a estatueta de Melhor Atriz para Vanessa Kirby. Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

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Martha de Sean, um casal que passará por um pesado trauma…

Vemos aqui a história de um casal, Martha (interpretada por Kirby) e Sean (interpretado por Shia LaBeouf). Eles estão prestes a ter uma filha e querem fazer o parto em casa. A parteira que acompanhou toda a gravidez estava ocupada no dia do nascimento da bebê e eles receberam a ajuda de uma parteira “reserva” por assim dizer. O problema é que o nascimento foi todo complicado e a menina acabou morrendo. Isso foi apenas o início de uma via crucis para Martha, que teve que lidar com os procedimentos que iria realizar com o corpo da criança (enterro ou doação do corpo para pesquisas), o processo em cima da parteira e a relação com o marido que ficou em frangalhos. Para piorar toda a situação, a mãe de Martha, Elisabeth (interpretada por Ellen Burstyn) se achava no direito de se intrometer na vida da filha e nas suas decisões, o que gerava ainda mais atritos. E, no meio dessa tempestade toda, as perdas ficam ainda maiores, com somente uma coisa principal a fazer: aguentar a maré brava passar. Mas não sem tomar algumas atitudes que serão decisivas para conseguir a paz de espírito e seguir em frente.

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Um parto difícil e fracassado…

O filme tem um ritmo lento e, obviamente, é muito pesado, onde parece haver uma depressão coletiva na maioria dos os personagens, algo bastante comum nesse contexto. O ritmo lento o torna um pouco maçante, mas ele também desperta uma angústia muito forte quando vemos a vida das pessoas desmoronando. Vanessa Kirby, a indicada à Melhor Atriz, passou por várias fases ao longo do filme. A primeira, pouco tempo depois da morte da bebê, mostrava uma Martha tão letárgica que ela parecia indiferente à tudo, até à morte da filha. Nesse ponto, o personagem de LaBeouf foi bem mais enfático e mostrou um sofrimento bem pronunciado, assumindo um comportamento mais frio com o transcorrer do filme, até o afastamento total. Martha, por sua vez, tem uma explosão de paroxismo quando discute com a mãe num encontro familiar, com esta falando também de seus sofrimentos pregressos, quando era perseguida pelos nazistas e foi obrigada a fazer o parto sozinha em que nasceu Martha (foi uma bela atuação de Ellen Burstyn aqui). E sua grande participação no filme foi seu depoimento no julgamento da parteira, que não vou comentar aqui porque já dei spoilers demais.

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Uma parteira que será julgada…

O filme tem uma metáfora bem interessante. Martha, depois que perde o filho, come uma maçã no trem, cercada por pais junto de seus filhos. De repente, ela tira da boca uma sementinha de maçã. Ela irá cultivar sementes de maçã, colocando-as no algodão molhado (da mesma forma que fazíamos no ensino primário com os feijões) para que elas germinassem e fossem plantadas. Essa metáfora é responsável pela cena final do filme que, depois de maltratar bastante o espectador com uma história sofrida e pesada, nos fornece um happy end.

Pieces of a Woman - O PipoqueiroO Pipoqueiro
Uma mãe que quer decidir pela vida da filha…

Dessa forma, “Pieces Of A Woman” é mais um candidato ao Oscar que merece a atenção. É um filme sofrido e difícil de assistir, mas tem uma boa atuação de Kirby, que foi em várias camadas. Sem dúvida, uma concorrente de peso ao posto de Melhor Atriz.  

Batata Movies 2 (Especial Oscar 2021). Destacamento Blood. Ressurreição Da Guerra.

Destacamento Blood - Filme 2020 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Mais um filme que concorre ao Oscar 2021. “Destacamento Blood” (“Da 5 Bloods”), de Spike Lee, concorre à estatueta de Melhor Trilha Sonora Original. Esse era um filme em que eram esperadas mais indicações, mas a coisa ficou somente nessa única indicação mesmo. Esse é um outro filme que conta com a presença de Chadwick Boseman, que concorre ao Oscar de Melhor Ator em “A Voz Suprema do Blues”. Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.

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Ex-combatentes de volta ao Vietnã, mais o filho de um deles…

O filme fala de quatro ex-combatentes do Vietnã que voltam ao país para procurar os restos mortais de seu superior, Stormin’ Norman (interpretado por Boseman). Mas essa viagem tinha outro motivo implícito, que será explicado num flashback da guerra. Os quatro ex-combatentes faziam parte do chamado “Destacamento Blood” e estavam numa missão num helicóptero que foi derrubado e caiu próximo de um avião americano também derrubado. Eles encontraram no avião uma espécie de baú cheio de barras de ouro, que seria enviado para uma comunidade vietnamita como pagamento para se apoiar os americanos. Os soldados enterraram esse baú e acordaram que um dia iriam juntos pegar esse ouro enterrado. Mas, para tirar o ouro do Vietnã, precisariam da ajuda de um atravessador francês, Desroche (interpretado por Jean Reno). Eles fazem um acordo com ele, mas obviamente serão traídos, o que vai provocar uma reedição da guerra, mas agora na disputa pelo ouro.

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Boseman em mais um filme…

O filme mistura dois gêneros. Por um lado temos uma película de ação e de guerra, com direito a todos os traumas passados, manifestos sobretudo num dos ex-combatentes, Paul (interpretado magistralmente por Delroy Lindo), que pirou na batatinha legal nas condições inóspitas da selva e na presença dos capangas de Desroche. Por outro lado, temos um filme bem Spike Lee mesmo, com muitas informações sobre  situação dos soldados negros durante a guerra do Vietnã, com direito a muitas imagens de arquivo, citações e falas de figuras importantes como Mohammad Ali ou Martin Luther King Jr., tendo uma cara mais documental. Esse aspecto mais militante do filme o torna mais didático e talvez os membros da Academia não tenham se sentido muito à vontade com tal característica dúbia, que provocava algumas descontinuidades no roteiro. Ou seja, temos aqui a mistura de informações bem verídicas com uma ópera do absurdo mais espetaculosa do que qualquer coisa, dando a impressão que a gente via dois filmes ao mesmo tempo, onde sentíamos uma conexão entre eles em alguns momentos, mas uma desconexão total em outros. Ainda assim, a película é cativante, seja pelo seu teor de informações, seja por uma história que é bem contada.

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Exumando um herói…

O grande ícone da história é, sem a menor sombra de dúvida, o personagem interpretado por Boseman, Stormin’ Norman que, além de ser o líder do destacamento, também abriu os olhos de seus comandados para a questão racial nos Estados Unidos e a posição do soldado negro na guerra. Ou seja, Norman era um misto de superior, professor, pai e mentor intelectual dos membros do destacamento. A morte dele foi um trauma para todos, mas especialmente para Paul, que era o amigo mais próximo e tinha pesadelos diariamente com seu amigo morto. Não é à toa que o homem surtou na floresta, mergulhando numa paranóia pura e se tornando uma figura muito perigosa para todos.

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Spike Lee e a galera…

Dessa forma, é até uma pena que “Destacamento Blood” não tenha obtido mais indicações para o Oscar. Apesar de misturar um gênero um pouco mais documental com um filme de ação, a película prende a atenção do espectador do início ao fim, mesmo que o filme não seja tão cativante quanto um “Infiltrado na Klan”. Está lá no Netflix.

Batata Movies (Especial Oscar 2021). A Voz Suprema Do Blues. Fantasmas Do Passado.

A Voz Suprema do Blues - Filme 2020 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Dando sequência às nossas análises de filmes concorrentes ao Oscar 2021, vamos falar hoje de “A Voz Suprema do Blues” (“Ma Rainey’s Black Bottom”), que concorre a cinco estatuetas (Melhor Atriz para Viola Davis, Melhor Ator para Chadwick Boseman, Melhor Figurino, Melhor Design de Produção, Melhor Maquigem e Cabelo), além de ter ganho o Globo de Ouro para Melhor Ator de Drama, para Chadwick Boseman. Para que possamos analisar melhor o filme, vamos lançar mão de spoilers aqui.

A Voz Suprema do Blues' traz Chadwick Boseman em último papel | VEJA
Uma estrela…

Vemos aqui a história de Ma (interpretada por Viola Davis), uma grande cantora de blues e um dia de gravação de um disco seu com sua banda. Ma, por ser uma estrela, sabe muito bem se impor numa sociedade altamente racista e é muito exigente com tudo, para desespero de seu empresário e do dono da gravadora, homens brancos que, segundo a cantora, querem aprisionar a sua música numa caixa para ganhar dinheiro. Ma tem muita consciência de que, se ela não dá mais dinheiro, será tratada com o racismo de sempre, que todos conhecemos. Assim, enquanto está na crista da onda, é ela quem dá as cartas, sendo bem agressiva, pois o fantasma do passado do racismo está bem ali. Esse fantasma também assombra Levee, o jovem trompetista da banda (interpretado magistralmente por Chadwick Boseman), que não aceita os conselhos dos músicos mais antigos da banda, querendo trilhar seu próprio caminho ao jeito que quiser. Seu grande fantasma foi, aos oito anos, ter visto a sua mãe ser estuprada por homens brancos, pois seu pai conseguiu juntar dinheiro e comprar uns terrenos que pertenciam aos brancos. Ele pegou uma faca e conseguiu, mesmo criança, ferir alguns deles antes de ser ferido seriamente, o que levou ao fim do estupro. Seu pai abandonou as terras e levou sua família para outro lugar, sumindo em seguida. Ele voltou e matou alguns brancos antes de ser enforcado. Tal vida pregressa fez com que ele se tornasse muito agressivo em alguns momentos, sendo violento com o membro religioso da banda, numa total descrença em Deus em virtude de sua infância violenta, e inclusive matando o pianista da banda por ter pisado em seu sapato sem querer, depois do empresário branco negar a gravação de suas composições. Ou seja, a agressividade de Levee e de Ma é usada como uma espécie de defesa contra a sociedade racista, com Ma canalizando isso numa direção produtiva e obtendo o que quer dos brancos, mas com Levee, por ser mais jovem, não sabendo fazer essa canalização com eficiência, respondendo à sua volta de uma forma muito desproporcional e agressiva. É claro que uma hora, Ma e Levee entrariam em conflito, o que provocou a demissão sumária deste, caindo em desgraça em seguida com a negação da gravação de suas músicas e com o homicídio.

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Um trompetista sem papas na língua…

O filme começa num tom descontraído e divertido, onde a interação entre os membros da banda cria esse clima. Mas, com o tempo, ele se torna tenso, tanto pela agressividade de Ma quanto pelo temperamento descontrolado de Levee, tendo um desfecho trágico e triste, manifesto no choro de Ma, que percebe que sua época e reinado estão acabando.

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A banda…

Davis e Boseman merecem demais o prêmio de melhor atriz e ator. Somente 25% dos atores de Hollywood são negros. Assim, quem alcança o estrelato acaba sendo muito competente no que faz como podemos ver aqui. Davis conseguia misturar agressividade com mortificação, esta última ao falar da condição do negro na sociedade americana e como os empresários brancos a viam, ou seja, como uma máquina de fazer dinheiro que poderia ser descartável a qualquer momento. Mortificação também ao perceber que seu sucesso teria um fim um dia. Já Boseman está muito magro e diferente, provavelmente por causa da doença que o vitimou. Ele conseguia fazer uma mistura de irreverência com explosões paroxistas de violência, tanto que o grande momento do filme foi Levee  falando do estupro da mãe e da morte do pai. A dor saltava de seus olhos, juntamente com as lágrimas.

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Levee e seu fantasma do passado. O melhor momento do filme…

Dessa forma, “A Voz Suprema do Blues” é mais um filmão que concorre ao Oscar e confesso que vou torcer muito por Davis e Boseman. Seria uma premiação muito merecida.

Batata Movies (Especial Oscar 2021). Mank. Desafiando Um Sistema.

Crítica | Mank — Vortex Cultural
Cartaz do Filme…

Vamos continuar aqui a falar dos filmes que concorrem ao Oscar. E hoje vamos pegar um peixe bem graúdo, pois “Mank” concorre a dez estatuetas (Melhor Filme, Melhor Ator para Gary Oldman, Melhor Diretor para David Fincher, Melhor Atriz Coadjuvante para Amanda Seyfried, Melhor Som, Melhor Design de Produção, Melhor Fotografia, Melhor Maquiagem e Cabelo, Melhor Figurino, Melhor Trilha Sonora). Para podermos falar desse filme, disponível no Netflix, vamos precisar de spoilers.

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Um roteirista malucão…

A película fala da vida de Herman Mankiewicz (interpretado por Gary Oldman), o roteirista do clássico “Cidadão Kane”, de Orson Welles. Para quem não conhece “Cidadão Kane”, esse é considerado um dos clássicos do cinema, pois trabalhou de forma magistral a técnica cinematográfica, além de trabalhar um tema muito polêmico na época em que foi produzido (1941), que foi, de uma certa forma, satirizar e criticar a trajetória do magnata da comunicação e entretenimento William Randolph Hearst.  Ou seja, era um projeto que, desde o seu início já estava fadado à perseguição e execração por parte do mainstream. Mank, como era conhecido Mankiewicz, era uma pessoa muito irreverente, possuidor de uma inteligente e fina ironia, além de ser acometido pelo alcoolismo. Roteirista da MGM, ele era contemporâneo de vários nomes conhecidos do cinema, como Louis B. Mayer, Irving Thalberg e Marion Davies, esposa de Hearst. E seu convívio com tais figuras seria a inspiração para escrever o roteiro de “Cidadão Kane”, que ganhou o Oscar de Melhor Roteiro.

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Uma doce Marion Davies…

O filme mostra duas histórias paralelas. A primeira delas mostra o processo turbulento de escrita do roteiro de “Cidadão Kane”, onde Mank padecia de um acidente automobilístico, acamado com uma perna quebrada. Ele teve todo um staff à disposição para escrever sua história, cujo cronograma se atrasava mais por suas bebedeiras, o que rendia pressões de Orson Welles em cima dele. À medida que o roteiro saía e as pessoas mais próximas iam tendo contato com o manuscrito, elas alertavam Mank de que isso acabaria de vez com sua carreira. A resposta era sempre dada com irreverência.

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A amizade entre Mank e Davies é marcante no filme…

A segunda história é um flashback, passado em 1934, que mostra um Mank mais jovem e já bêbado como roteirista da MGM, convivendo com as pessoas do meio. Podemos ver figurinhas carimbadas do cinema e suas virtudes e defeitos. Um Louis B. Mayer (interpretado por Arliss Howard) muito falso, um Irving Thalberg (interpretado por Ferdinand Kingsley) sem escrúpulos, um William Hearst (interpretado por Charles Dance) aristocrático, uma Marion Davies (interpretada por Amanda Seyfried) muito simpática e doce. O filme mostra muito quem era quem naqueles tempos de crise provocados pela depressão, com toda essa elite cinematográfica apoiando o candidato republicano ao governo e nosso Mank, com sua irreverência e língua ferina remando contra essa maré, o que rendia olhares tortos por parte de uns, mas a simpatia de Hearst, que gostava de ter Mank em seus eventos sociais, muito mais pela sua retórica do que por qualquer outra coisa. Foi também notável o relacionamento de Mank com Davies, vista como uma espécie de bibelô de Hearst por aquela sociedade, mas sendo escutada por Mank em suas ideias e pensamentos. Mal saberia ela que seria retratada em “Cidadão Kane” de uma forma pouco positiva, pois Mank a colocou como uma peça de coleção do sombrio palácio de Hearst, metaforizado em Charles Foster Kane, e condenada a uma vida de ócio onde montava quebra-cabeças diariamente. Entretanto, Davies não ficou revoltada com Mank e isso não abalou a amizade dos dois.

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Excelente caracterização de Orson Welles…

O clímax do filme foi um jantar à fantasia de Hearst, onde Mank, totalmente bêbado, fala aos convidados um roteiro sobre um magnata das comunicações e inspirado em Don Quixote de La Mancha, claramente satirizando Hearst, atirando para todos os lados sem dó nem  piedade, será aí que Mayer deixará a sua falsidade de lado e irá dizer que metade do salário de Mank é pago por Hearst o único que sabe a parábola do macaco do realejo, que Mank perguntava a todos durante o filme: o macaco recebe tudo do dono do realejo, mas é manipulado por ele.

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A caracterização de Hearst também ficou muito boa…

O filme tem atores com boas atuações. Charles Dance fez um ótimo Hearst, inabalável em seu comportamento aristocrático. Seyfried faz jus à indicação para Atriz Coadjuvante, pois as conversas de Davies com Mank foram um momento delicioso do filme, não se deixando abalar ao contracenar com o medalhão Oldman. Tom Burke fez um Orson Welles fantástico (parece que o homem ressuscitou nas telas). Mas o filme realmente é de Gary Oldman, que mais uma vez colocou todo mundo em seu bolso, fazendo um Mank com mais defeitos que virtudes, mas ainda assim despertando demais a simpatia por seu forte carisma. Se ganhar a estatueta de Melhor Ator, será merecido.

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Clímax do filme. Um bêbado no jantar…

Dessa forma, “Mank” é mais um daqueles filmes sobre o cinema e sua história que se torna uma referência obrigatória para os cinéfilos. É uma película que necessita de muita atenção do espectador, por estar muito focada em seus diálogos, mas temos uma boa caracterização de época, figurinos e um delicioso preto e branco que a cor no cinema jamais enterrou de vez. E, melhor de tudo, tem no Netflix.

Batata Movies (Especial Oscar 2021) – Relatos Do Mundo. Fazendo A Sua Própria História.

Relatos do Mundo - Filme 2020 - AdoroCinema
Cartaz do filme…

A seção Batata Movies, depois de um breve hiato, está de volta para falar dos indicados ao Oscar deste ano de 2021. Infelizmente, vivemos em tempos complicados e nem sempre vamos poder ter acesso a todos os filmes. Mas a ideia é poder falar do máximo de filmes possíveis aqui. E vamos começar com uma produção disponível na Netflix. “Relatos do Mundo” (“News Of The World”) traz o astro Tom Hanks e concorre a quatro estatuetas (Melhor Design de Produção, Melhor Som, Melhor Fotografia e Melhor Trilha Sonora Original). Para podermos falar sobre o filme aqui, vamos precisar lançar mão dos spoilers.

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Dill, um contador de histórias…

A história fala do capitão Kidd (interpretado por Hanks), um veterano da Guerra Civil Americana que era um tipógrafo e perdeu tudo com a guerra. Com isso, ele decide ganhar a vida viajando de cidade em cidade para ler as notícias de jornal para as pessoas. Um belo dia, ele encontra um homem negro enforcado e, com ele, uma menina lourinha que falava o idioma indígena Kiowa. Kidd analisa os documentos dela e percebe que a mocinha é de origem alemã, tendo tios a uma grande distância dali. O nome da garotinha é Johanna (interpretada por Helena Zengel) e Kidd decide fazer a longa viagem para levá-la para seus parentes. O grande problema é que ele vai passar por muitos perigos nessa viagem, o que vai fazer que os dois estreitem seus laços, à despeito da barreira linguística.

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Johanna, uma menina de passado traumático…

O filme aborda o estado de penúria dos Estados Unidos logo depois da Guerra Civil, enfocando especialmente o povo texano, que se sentia reprimido pelos yankees (ou azuis, como eram chamados no filme, em virtude do uniforme militar). As marcas da guerra ainda estavam muito recentes, e, se ainda há um ressentimento muito grande com relação a tudo isso hoje em pleno século vinte e um, imagine-se como não seria uns poucos anos depois de findada a guerra. Podemos ver todo esse ressentimento quando Dill lia notícias aos texanos de origem federal, onde a contestação era muito forte, e tudo isso sob os olhos de soldados yankees. Dill precisou ter um grande jogo de cintura, falando ao grande público prestes a explodir que a guerra realmente fez todos sofrerem bastante, sendo a voz que se solidarizava com o sofrimento coletivo.

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Os dois viajarão em direção à casa dos tios da garotinha…

Mas nem tudo é somente a dor do sofrimento. Por outro lado, vemos também todo um ódio contido nos mesmos texanos contra índios e negros e o surgimento de um comportamento muito autoritário, sobretudo num pequeno vilarejo controlado por uma espécie de ditador doméstico, que exigiu que Dill exaltasse seus grandes feitos perante a cidade. Mas nosso protagonista, acometido de um arroubo democrático com pouco espaço fértil para isso, decidiu colocar em votação as notícias que o público queria escutar, quase sendo morto por essa “provocação”. Aliás, esse é um filme que tem lá seus momentos de ação, mas somente como uma moldura para o relacionamento entre Dill e Johanna, a grande atração da película.  

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Eles vão passar por muitos perigos…

Dill, apesar de ser um contador de histórias, fazia questão que a menina esquecesse seu passado traumático (ela teve sua família alemã massacrada pelos índios e depois sua família índia massacrada pelos brancos) e olhasse para a frente, sem olhar para trás. Entretanto, a menina diz que, para seguir adiante, precisa-se primeiro olhar para trás. São realmente duas formas de se lidar com um passado violento, onde talvez a segunda seja a mais coerente, pois é muito difícil a gente encarar a nossa vida sem as experiências pregressas.

Dill era solitário, pois perdeu tudo na guerra, até a esposa, morta pela cólera. Mas ele sente que foi mais a praga da guerra que se abateu sobre ele, ratificando a ideia já citada de como o conflito deixa marcas em todos, inclusive em nosso protagonista. Por fim, ele descobre que pode criar um verdadeiro núcleo familiar com a menina, e que deixá-la com os tios foi um erro. Ele volta a tempo para corrigir isso e garantir o happy end nesse western de fim de século que na verdade se passa no sul dos Estados Unidos.

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Dill percebe quem é sua verdadeira famíla…

Hanks está fenomenal como sempre, mas a surpresa é a menina Helena Zengel, que falava e cantava em idioma indígena. A química entre os dois personagens foi perfeita, pois eles se uniram nas adversidades que a viagem trouxe.

Dessa forma, só lamento que “Relatos do Mundo” não tenha tido mais indicações. Uma indicação de Melhor Ator e Atriz Coadjuvante não seria nenhum exagero. As indicações para os Oscars técnicos correspondem, mas ficou um gostinho de quero mais pela beleza e teor cativante do filme.

Batata Movies – Quando Desceram As Trevas. Segunda Guerra, Espionagem E Noir.

Ministry of Fear - Wikipedia
Cartaz do Filme

Ainda falando dos filmes da fase americana de Fritz Lang, vamos analisar hoje “Quando Desceram As Trevas” (“Ministry of Fear”, 1944). Esse é mais um filme “Noir” de Lang, enfocando uma história de espionagem ocorrida na Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial, com direito a espiões e bombardeios nazistas. Para podermos conversar sobre essa película, vamos liberar os spoilers de setenta e seis anos.

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Stephen Neale. Um homem que será envolvido numa trama internacional…

O plot é o seguinte. Stephen Neale (interpretado por Ray Milland), passa seus últimos momentos internado num manicômio psiquiátrico, depois de ser condenado a uma pena nesse estabelecimento por ser acusado de matar a esposa. Na verdade, a esposa padecia de um câncer e sofria muito com a doença, sendo que Stephen comprou veneno para aliviar sua dor, mas não teve coragem de ministrá-lo. Entretanto, sua esposa tomou o veneno mesmo assim, condenando o marido a uma pena no manicômio. Agora, fora da prisão, Neale vai para Londres, uma cidade sob bombardeios alemães. Mas nosso protagonista prefere o agito da cidade mesmo em perigo à solidão. Antes de chegar à estação de trem, passa por uma festinha local, onde inocentes senhoras arrecadam fundos de forma beneficente. Mal sabe Neale que elas fazem parte de uma rede de espionagem nazista e, depois da consulta com uma vidente, descobre o peso de um bolo que estava sendo oferecido a quem adivinhasse seu peso. Feliz da vida, nosso Neale leva o seu bolo, sem saber que existe nele um microfilme com segredos militares ingleses. Ao pegar o trem, um velho “cego” o acompanha. Mas o trem para por causa de um bombardeio nazista e o velho o ataca para tomar o bolo, fugindo do trem. Neale o persegue e o velho atira uma pistola contra ele. Mas o velho é atingido por uma bomb e morre. Ao chegar a Londres, Neale procura a instituição beneficente que organizou a festa e ele conhece os amáveis irmãos Willi (interpretado por Carl Esmond) e Carla Hilfe (interpretada por Marjorie Reynolds) e comunica o que aconteceu. Willi o leva para a casa da vidente com que Neale teve contato, mas lá ele vê que se trata de outra mulher, que faz uma sessão mediúnica onde um dos convidados é morto com um tiro depois que apagam as luzes. Como Neale soltou as mãos das pessoas durante a escuridão e ele estava armado, ele acaba sendo declarado o suspeito e foge com a ajuda de Willi. Agora, Neale terá que provar sua inocência e, ao mesmo tempo, desvendar toda a trama de espionagem nazista que ele ainda nem sabe que está acontecendo.

Ministry of Fear (1944) | The Criterion Collection
Um casal pouco convincente…

Lang foi convidado para dirigir esse filme, baseado numa história de Graham Greene que ele gostava muito, mas odiou o roteiro escrito. Mesmo assim, por ética profissional, assumiu a direção. Talvez seja por tudo isso que a história é um pouco enrolada e até enfadonha. O momento da sessão mediúnica só serviu para incriminar Neale, mas a Scotland Yard nem soube do ocorrido, procurando nosso protagonista como suspeito de outro crime, a morte de um investigador que ele contratou e que foi morto pelos espiões nazistas. A falsa vidente (interpretada pela bela Hillary Brooke) parecia que ia ter um destaque maior no filme, mas somente apareceu em mais um momento com o protagonista, sendo pouquíssimo aproveitada. O romance entre Neale e Carla até teve seus momentos de construção, mas pareceu um corpo estranho à história. Ou seja, tivemos aqui alguns floreios (ou barrigas) que tornaram tudo meio confuso, ainda mais para uma película de duração relativamente reduzida (pouco mais de oitenta minutos). Pelo menos, Lang brincou bem com o claro/escuro, sobretudo na sequência de ação final do filme, onde o tiroteio era feito ora sob escuridão completa, ora sob a luz de uma escadaria de um prédio, onde víamos os espiões nazistas. A piada final do bolo foi até engraçadinha, mas um tanto forçada, para coroar um filme que o próprio Lang não gostava muito (ele disse que, anos depois, ao ver o filme na TV, ele adormeceu).

Ministry of Fear (1944) – MUBI
Uma personagem pouco aproveitada…

Assim, “Quando Desceram As Trevas” poderia até ser um filme bom caso o roteiro não fosse um pouco enrolado, roteiro esse que nem Lang gostou muito. Pelo menos o diretor ainda conseguiu salvar um pouco o filme, trabalhando bem o claro/escuro e enxertando algumas boas cenas de ação. Mas há filmes “Noir” bem melhores que esse na carreira do diretor. Infelizmente, não há o filme facilmente à disposição na íntegra. Fiquem com o trailer abaixo.