Batata Movies – Blade Runner 2049. Replicantes Indo Além.

Cartaz do Filme

E estreou o tão esperado “Blade Runner 2049”. A ousadia em dar uma sequência a esse filme antológico da História do Cinema criou uma espécie de ideia geral de que a coisa não daria certo e estaria fadada ao fracasso. Essa é a maldição que os remakes e as sequências são obrigadas a passar: elas têm que ser, no mínimo tão contundentes quanto o filme original e o clima de descrédito é quem dita as regras iniciais, ou seja, o filme já começa condenado a largar atrás nessa insólita corrida de convencimento de público e crítica. Ainda mais com um filme do quilate de “Blade Runner”.

K. e Deckard. Em busca do filho de androide…

E qual foi o resultado? Essa película quilométrica, de cerca de duas horas e quarenta minutos, surpreendeu. Hampton Fancher e Michel Green, os roteiristas, e o diretor Denis Villeneuve conseguiram pegar o espírito da coisa e fizeram uma continuação à altura, tanto do ponto de vista estético quanto do ponto de vista narrativo. Mas, mais importante que isso, o filme tinha um clima de “Blade Runner” muito pronunciado, impactando o espectador como poucas vezes se vê hoje em dia. Para que a gente possa falar um pouquinho dessa boa continuação, os spoilers serão inevitáveis.

Sensualismo extremo de holografias nuas gigantes

Vemos aqui a história de K. (interpretado por Ryan Gosling), um androide que faz o mesmo papel que Deckard (interpretado por Harrison Ford) fazia: matar androides descontrolados. Mas, como assim? Depois do problema que os androides da Tyrell Corporation provocaram, a empresa acabou falindo, mas o espólio da empresa acabou sendo recuperado por outro megaempresário, Niander Wallace (interpretado por Jared Leto). Foram construídos novos androides obedientes aos humanos, mas os resquícios da linha anterior de androides permaneciam. Ao eliminar um deles numa fazenda, K. percebeu que havia um corpo enterrado por lá e que se tratava de uma androide fêmea, que tinha dado a luz!!! Ou seja, os replicantes conseguiram se reproduzir, algo que era incessantemente procurado por Wallace. Por uma coincidência de datas na sepultura da replicante e nos implantes de memória de K., ele passou a supor que era o tal filho perdido, embora tivesse nascido uma garota também que morreu em seguida. K., então, irá iniciar toda uma investigação para procurar o paradeiro do filho desaparecido, quem era a mãe e se o pai ainda estava vivo (o leitor mais atento já deve ter descoberto quem é esse pai e assa mãe).

Wallace. Sadismo com serenidade

O filme tem vários elementos interessantes. O principal deles é justamente a capacidade dos replicantes se reproduzirem. Ou seja, eles subiram um degrau no seu estágio de desenvolvimento e viraram a fonte de cobiça não somente de K. como também de Wallace. O mais curioso foi perceber como tal processo de reprodução ocorreu inteiramente ao acaso, sendo uma criação da natureza, ao invés de uma criação do homem, que corre atrás dela para estudá-la e procurar gerá-la artificialmente em laboratório. Esse era, pelo menos, o objetivo de Wallace, curiosamente um pesquisador cego que luta contra as limitações de sua pesquisa e de seus próprios sentidos. Por outro lado, a busca de K. já se revela em busca de identidade e de um passado perdido que pode aproximá-lo dos humanos, algo que o androide busca incessantemente, embora ele namore uma bela mulher virtual, Joi (interpretada pela lindíssima atriz cubana Ana de Armas) que também procura se tornar mais humana, o que é um sério problema, pois não há como se conseguir o prazer do toque. A introdução desses elementos novos já mostra como a agora franquia conseguiu ir além.

Claro/escuro mais expressionista que noir. Pessimismo latente

Mas foi dito acima que todo o clima de “Blade Runner” está lá. Os efeitos especiais conseguiram deixar todo o ambiente ainda mais soturno, onde a poluição e a chuva ácida davam o ar de sua (des)graça. É interessante notar que a Los Angeles de 2049 não é mais aquela metrópole homogênea que foi retratada no filme de 1982. Agora temos a cidade representada como uma espécie de enorme favela, mas há também fazendas, lixões e áreas descampadas, tudo com direitos a claros e escuros viscerais que lembravam menos o cinema “noir” (como o “Blade Runner” original lembrava) e muito mais um cinema expressionista, pelo forte contraste e pelo pessimismo latente impresso nas paisagens e imagens em geral. A coisa de se usar uma iluminação associada a um grande tanque d’água no escritório de Wallace deu um lindo efeito que potencializou o claro/escuro e aumentou o clima soturno da coisa. Ainda, dentro da estética vista em “Blade Runner 2049”, houve uma escolha muito feliz de não redesenhar a estética original. Assim, se por um lado tirou-se as japonesas dos telões de outrora e colocou-se imagens de sensacionais mulheres nuas holográficas (a tal namoradinha virtual de K.), por outro lado os anúncios da Atari e da Pan Am ainda estão lá, assim como a propaganda de uma escola de balé da União Soviética. Esse “Fan Service” ajudou em muito na aceitação do filme por parte dos fãs mais antigos de raiz (pelo menos no meu caso; e não devemos nos esquecer de que a versão de 1982 se passa no ano de 2019). Aliado a isso, não podemos nos esquecer de que algumas tomadas nesse novo filme faziam menção direta a tomadas do filme de 1982. O close do globo ocular está lá, assim como uma prostituta que lembra muito a Pris de Daryl Hannah. O convívio entre o velho e o novo também aparece vívido nessa nova versão. Assim, a modernidade dos patrocínios holográficos virtuais convive com os interiores antigos de casas, seja no apartamento de K., ou na cozinha da fazenda.

Fan Service no fotograma!!!

E os atores? A escolha de Ryan Gosling para protagonista foi boa, segundo as más línguas, pois ele faria muito bem o papel de um robô. Mas, brincadeiras à parte, sua interpretação não comprometeu, apesar de muito plana (quando ele deu uma explosão emocional, a coisa destoou um pouco do conjunto da obra). Ford também foi bem, embora fique o estigma de que um ex-protagonista já não possa fazer muito por causa da idade avançada. Foi bom rever Robin Wright, no papel da tenente Joshi, uma policial que conseguia ser uma chefe bem dura mas compreensiva com o subordinado K. Agora, na minha modesta opinião, quem deu um show de interpretação foi Jared Leto. A forma como ele conduziu seu personagem Wallace, com falas bem contidas e mansas, enquanto cometia as maiores barbaridades, foi de dar medo. É impressionante como a serenidade aliada ao sadismo produz um forte impacto. E Leto trouxe isso muito bem. Seu rosto angelical se encaixa perfeitamente bem nesses papéis mais psicóticos. E o ator parece ter plena consciência disso.

Atari de volta em 2049!!!!

É claro que todo filme tem seus problemas. Na minha modesta opinião, foram dois aqui. O primeiro foi a sua longa duração, que deixou a coisa muito maçante em alguns momentos. Um filme mais curto poderia ter contado a história com mais desenvoltura. O outro problema foi no teste que K. precisava fazer para provar a sua fidelidade de androide aos humanos. Ficar repetindo termos incessantemente não pareceu provar qualquer fidelidade aos criadores ou manter características supostamente humanas. Na versão antiga, a gente entendia quando o teste mostrava quando o androide era pego. Aqui, foi uma espécie de devaneio em que a gente não entendia como o androide era aprovado ou não, o que foi uma pena, pois essa parte no filme original era muito marcante e aqui não foi tão bem trabalhada assim. Pareceu algo jogado somente para a gente se lembrar de que havia testes na versão de 1982.

Não parece a Pris, interpretada por Daryl Hannah em 1982???

Assim, “Blade Runner 2049” é um feliz caso de continuação que deu certo. Se o filme não é perfeito em alguns pontos (como todo filme não o é), pode-se dizer que a película acertou em muitos pontos, mantendo o clima do filme original e ampliando a questão estética e narrativa. Novos elementos foram adicionados sem se esquecer do espírito do original. E essas coisas casaram muito bem. Se você é um grande fã de “Blade Runner”, esse é um programa obrigatório. E esse é o tipo do filme que eu vou comprar o DVD depois, até para poder fazer um estudo comparativo mais profundo. Não deixe de ver.

Batata Antiqualhas – Jornada Nas Estrelas. Radiografando Um Longa: A Procura De Spock (Parte 2).

 

              A Excelsior. Tecnologia de ponta

O terceiro longa da tripulação da série clássica retoma os debates filosóficos. Muito me impressiona a frase de McCoy após a explosão da Enterprise: “Você fez o que qualquer um faria, Jim: transformar a morte numa chance de vida”, ou seja, se o filme começou num tom mais pessimista, a explosão da Enterprise, um dos mais proeminentes ícones da série, traz, nas palavras de McCoy, a direção num futuro novamente esperançoso. Indo ainda na argumentação de um futuro de esperança, alguns veem a ressurreição de Spock carregada de simbologia religiosa, algo que praticamente não era visto na série clássica. Todo o ritual de transferência do Katra, o “fal tor pan”, realizado pela sacerdotisa T’Lar (magnificamente interpretada por Judith Anderson, de 87 anos na época e há 14 anos sem atuar, no alto de seus 1,42 m!!!!) nos remete a representações de profunda religiosidade, assim como o fato de se mencionar que Spock possuía um Katra (alma). Talvez o que mais tenha chegado próximo na série clássica tenha sido o ritual do Pon Farr de Spock, que todos os vulcanos homens têm de sete em sete anos, uma espécie de ritual de acasalamento. Logo, a ideia principal do filme, segundo Nimoy (o sacrifício de um amigo por outro) tem camufladas conotações religiosas, incomuns no universo de Jornada nas Estrelas até então.

Saavik. Vulcana presente na “ressurreição” de Spock

O torpedo Gênese retorna na discussão ética. Agora, o projeto de terraformação é mais visto como uma arma, consequência de um “mito de Frankenstein”, onde o homem, ao irresponsavelmente brincar de Deus e tentar criar vida, traz apenas desgraças e sofrimentos. O filho de Kirk, David, usa protomatéria instável para o torpedo gênese, o que cria um planeta de vida curta que logo se destruirá. Ou seja, o mesmo planeta que ressuscita e regenera o corpo de Spock, acelera seu envelhecimento e pode, inclusive, acabar com ele. Além disso, klingons e Federação disputam a posse do torpedo, que se torna uma verdadeira alegoria das armas nucleares da guerra fria. Assim, essa visão de Gênese alertada por McCoy no filme anterior indica limites ao possibilismo humano, que leva o homem, de forma arrogante, a crer que pode fazer qualquer coisa, brincando de Deus.

A morte de David também é algo importante no filme. Como vemos perdas aqui, não? Esse foi o primeiro longa de Jornada nas Estrelas que vi no cinema e muito me chamou a atenção de ver o Spock morto, o filho de Kirk sendo assassinado, a Enterprise explodindo! Eu, que acabara de chegar ao universo de Jornada nas Estrelas (antes disso, só tinha lembranças difusas de episódios da série clássica e elogios de meu pai a saga lá no início da década de 1970) fiquei chocado. Poxa, mal cheguei e estão acabando com tudo? Talvez a perda mais traumática de um mocinho que eu tenha presenciado antes tenha sido Obi Wan Kenobi, no episódio quatro, alguns anos antes. Mas eu nunca havia presenciado mocinhos sofrerem tantas perdas de uma vez! De qualquer forma, a perda de David, com Kirk caindo sentado no chão mostrou o duro golpe que o aparentemente indestrutível almirante sofrera. E mostra o surgimento de seu ódio mortal pelos klingons, somente superado em “A Terra Desconhecida”.

Os efeitos visuais merecem destaque. Além da já citada Ave de Rapina klingon, a doca espacial adicionou um elemento de grandiosidade, mostrando a Enterprise como parte integrante de algo maior, a Federação Unida de Planetas. A explosão da Enterprise também foi algo muito marcante, sendo um segredo escondido a sete chaves durante as filmagens, em virtude da previsibilidade da ressurreição de Spock, mas infelizmente tornou-se um spoiler mais tarde. A nova nave Excelsior também chama a atenção, com seu número de série NX-2000 (o X indica que ela ainda era um protótipo pronto para testes; vejam que na série “Enterprise”, o número de série é NX-01) e velocidade transdobra (transwarp), com o intuito de ser a nave mais rápida da Federação. Aliás, vamos aproveitar aqui para falar da origem do prefixo NCC 1701. Reza a lenda que esse prefixo foi inspirado em um dos registros internacionais de aviões dos Estados Unidos, NC (só para lembrarmos, a aviação foi uma das inúmeras coisas que Gene Roddenberry fez em vida). Um segundo C teria sido colocado para diferenciação. O 1701 significa que era o 17º desenho de cruzador espacial, sendo o primeiro daquela série.

             Judith Anderson, a dama do teatro

Um outro detalhe importante nos efeitos especiais é a coerência científica da imagem da Enterprise em velocidade de dobra, algo que já havia aparecido em “A Ira de Khan”.. Vemos riscos luminosos vermelhos e azuis saindo dela. Aquilo tem uma motivação fisica, o efeito doppler. Quando um carro vem em nossa direção numa estrada, suas ondas sonoras são comprimidas entre ele e o nosso ouvido, tornando o comprimento de onda (a distância entre duas cristas) menor, fazendo o som mais agudo. Quando o carro passa por nós, a fonte de som (o carro) passa a se afastar e o comprimento de onda aumenta, tornando o som mais grave. É por isso que temos aquela distorção no som do carro quando ele passa por nós. No caso da Enterprise à velocidade da luz, algo semelhante ocorre, mas aí a diminuição do comprimento de onda da imagem da nave que se aproxima está mais próxima da cor azul, dando o aspecto azulado à dianteira da nave (as luzinhas azuis estão mais à frente), enquanto que o aumento do comprimento de onda quando ela se afasta está mais próximo da cor vermelha (as luzinhas vermelhas estão mais na parte traseira da nave). Esse fenômeno, chamado de desvio para o azul (aproximação) e desvio para o vermelho (afastamento) é utilizado em astronomia para calcular velocidades de afastamento e aproximação de corpos celestes (geralmente um sistema binário de estrelas) com relação a nós.

Dobra espacial respeitando o efeito doppler

Alguns fãs não acham “A Procura de Spock” um bom filme (o próprio Roddenberry criticava a violência excessiva contida nele, contaminado pela febre de filmes violentos da década de 1980), mas como tudo o que existe na vida, há coisas boas e ruins, sem falar que o filme teve também boa recepção de público e crítica na época. De qualquer forma, esse longa manteve o fôlego da franquia e adicionou elementos novos como a religiosidade e uma visão mais detalhada dos klingons.

Batata Antiqualhas – Jornada Nas Estrelas. Radiografando Um Longa: A Procura De Spock. (Parte 1)

                   Cartaz do Filme

Falemos do terceiro longa da franquia. Como vimos nos artigos de “A Ira de Khan”, o desejo de se continuar as aventuras da tripulação da Enterprise era premente ao final das filmagens, principalmente porque se percebeu que financeiramente a Paramount estaria dando um tiro no pé caso encerrasse a franquia naquele contexto. Para corroborar essa impressão, o filme havia ido bem nas bilheterias. Nimoy parecia mais por cima da carne seca do que nunca. Tanto que ele pediu a direção do filme, no que foi prontamente aceito (Meyer, o diretor de “A Ira de Khan”, não aceitou dirigir a sequência, pois ficou chateado com as alterações no final do filme; para ele, Spock deveria ter morrido e ponto final). Entretanto, seguiram-se longas semanas de silêncio e nada do projeto ser tocado adiante. Ao ligar para o chefão da Paramount, Michael Eisner, Nimoy foi surpreendido com a alegação de que ele não poderia dirigir o filme, pois ele não gostava do personagem Spock e que a ideia de matá-lo seria do próprio Nimoy, algo que foi desmentido imediatamente pelo intérprete do vulcano. Desfeitos os desentendimentos, as filmagens foram adiante.

                                            Elenco

Só para rapidamente relembrarmos, o filme começa com todas as cenas da morte de Spock em “A Ira de Khan”, para se retomar o gancho. Kirk retorna à Terra com grande parte da tripulação de novatos transferida e ainda sentindo a perda do amigo. Assim, o tom otimista do final do filme anterior se desvanece por completo. McCoy, por sua vez, comporta-se de forma estranha e invade os aposentos de Spock, falando como ele e pedindo para ser levado ao Monte Seleia em Vulcano. Inicialmente, Kirk acha bizarra aquela atitude de McCoy, mas logo entenderá o que está acontecendo quando o embaixador Sarek, pai de Spock, vai à sua casa. Ele interpela Kirk porque o almirante não levou o Katra (alma) de Spock para Vulcano. Kirk disse que Spock não lhe passou o Katra. E aí, observando os arquivos da nave, Kirk conclui que Spock passou seu Katra para McCoy através do elo mental (“Lembre-se”). Assim, os corpos de Spock e McCoy teriam de ir a Vulcano para o cerimonial que daria um fim digno a Spock. Mas o corpo de Spock estava no planeta Gênese, região com acesso restrito imposto pela Federação, onde somente David, o filho de Kirk e a vulcana Saavik estudavam o processo de terraformação. Além disso, a Enterprise, muito danificada e velha, iria para o ferro velho. Kirk, então, terá que violar todas as regras para ir a Gênese e recuperar o corpo de Spock. Mas uma Ave de Rapina Klingon, liderada pelo capitão Kruge (interpretado pelo competente Christopher Lloyd) está no caminho para atrapalhar os planos do almirante. Kruge quer o projeto Gênese para usá-lo como arma. Caberá a Kirk recuperar Spock, que se regenerou ao ser sepultado em Gênese, devido ao processo de terraformação, e enfrentar Kruge.

                                            Kruge

Apesar de não ter sido um filme tão bom quanto “A Ira de Khan”, “A Procura de Spock” tem seus méritos. Em primeiro lugar, deu mais espaço para os klingons nos longas, criando todo um universo para essa espécie alienígena, utilizado inclusive nas séries que viriam. Os inimigos da Terra haviam aparecido apenas no início de “Jornada nas Estrelas, o filme”, onde o capitão da nave era Mark Lenard (o pai de Spock) e os poucos diálogos em Klingon foram feitos por… James Doohan! Isso mesmo, o sr. Scott!!! Em “A Procura de Spock”, foi contratado um linguista para desenvolver o idioma klingon, o mesmo que havia feito o rápido diálogo em vulcano de Spock e Saavik para o segundo filme. A Ave de Rapina, originalmente concebida para os Romulanos, (daí as penas em relevo na carcaça da nave) causou muito espanto, pois lembrava os ombros de um homem musculoso (essa foi a ideia), sem falar que as asas eram móveis. Reza a lenda que Nimoy preferiu usar Klingons a Romulanos, pois os primeiros eram mais teatrais e adequados para trabalhar com uma situação de beligerância que remetia à Guerra Fria (olha ela aí de novo!). Mas a Ave de Rapina permaneceu, é dito, por questões de economia. E, cá para nós, ficou muito bom o design da bichinha! Ainda sobre os Klingons, não podemos nos esquecer do desenvolvimento da maquiagem por Robert Fletcher, que diminuiu as cristas na testa dos Klingons (no primeiro filme elas obscureciam muito os rostos dos atores), mas manteve o estilo. Segundo Fletcher, Gene Roddenberry não gostava dessa maquiagem, pois ele achava que os Klingons deveriam se parecer mais com os humanos, como o era na série clássica. Outras referências, por sua vez, diziam que essas cristas pronunciadas na testa sempre fizeram parte dos anseios de Roddenberry ainda na série clássica. Para finalizar sobre os Klingons, não podemos nos esquecer da excelente e dramática atuação de Christopher Lloyd como Kruge, expressando muito bem o espírito da cultura Klingon e se esforçando para reproduzir as entonações do idioma alienígena recém-criado.

                       Batalhas com klingons

Como “Jornada nas Estrelas” sempre implica em discussões muito vastas, nos vemos na segunda parte desse artigo. Até lá!

Batata Antiqualhas – Jornada Nas Estrelas. Radiografando Um Longa. A Ira De Khan (Parte 2).

 

              Tripulação da Enterprise de volta

Como Khan voltou nesse longa? A U.S.S. Reliant fazia uma expedição para encontrar um planeta totalmente sem vida para lançar o torpedo Gênese, um dispositivo criado pela Dra. Carol Marcus (interpretada por Bibi Besch), um antigo caso de Kirk, que conseguia fazer a terraformação num planeta sem vida. Chekov estava na missão da Reliant. Ao chegar a Ceti Alfa 5, Chekov se depara com Khan, que estava muito revoltado com Kirk, já que o então capitão (e agora almirante) não havia voltado para verificar os progressos de Khan e seus comandados. Seis meses depois de Khan ser deixado lá, o planeta vizinho Ceti Alfa 6 explodiu e transformou Ceti Alfa 5 num lugar totalmente inóspito, onde a companheira de Khan acabou morrendo. Khan, em sua sede de vingança, rapta a Reliant e toma o torpedo Gênese. Como Chekov, sob o efeito de um verme instalado em seu córtex cerebral por Khan, disse a Dra. Marcus que Kirk confiscaria o torpedo, a Dra. entra em contato com o almirante para tomar satisfações. Mas o mal sinal da transmissão e a consequente má comunicação fazem com que Kirk vá para Regula 1 (o planeta em que a Dra. Marcus faz as experiências com Gênese). Lá, a Enterprise encontrará a Reliant, onde haverá uma batalha entre o almirante e o produto desenvolvido por engenharia genética do fim do século XX.

              Khan, um vilão à altura de Kirk

Quais são os destaques desse longa? Em primeiro lugar, algumas discussões sobre as implicações morais de certos avanços tecnológicos. Ao saber do projeto Gênese, o Dr. McCoy o vê mais como uma “arma do fim do mundo”, pois se o torpedo Gênese é utilizado num planeta com vida, ele “apaga” a vida existente para colocar uma nova vida em seu lugar. Já Spock vê Gênese como uma ferramenta que pode criar novos locais habitáveis, a menos que caia “em mãos erradas”. Ao que McCoy retruca: “o que são exatamente mãos erradas?”. Outro avanço tecnológico posto em questionamento é justamente a engenharia genética, que cria espécies consideradas “superiores” a outras, podendo levar a guerras e destruições. A discussão das implicações morais da engenharia genética é um tema bem atual, principalmente quando nos lembramos dos questionamentos envolvidos em clonagens e usos de células-tronco. É notável perceber como uma série de ficção científica da década de 1960 já abordava esses temas, trazendo-os de volta à tona em 1982, quando o longa foi realizado.

           Filme com perdas, até para o Sr. Scott

Em segundo lugar, o filme faz um debate filosófico sobre a vida e a morte. A trapaça que Kirk fez no teste da nave Kobayashi Maru, onde os futuros capitães lidarão com a situação de morte de forma inevitável, mostra a não aceitação do almirante em encarar situações de morte e derrota, que inevitavelmente acontecem. Daí o seu dilema com a passagem do tempo e o grande trauma com a morte de Spock, onde o próprio Kirk reconhece que foi uma lição à sua presunção de sempre enganar a morte. Mas a necessidade de se fazer uma sequência de “Jornada nas Estrelas” acaba redimindo Kirk, pois ele fica ungido de novas esperanças, manifestas na explosão de vida de Gênese e nas palavras otimistas de Spock quanto ao futuro (“sempre existem possibilidades”) nas quais Kirk se agarra. Outro destaque que redime Kirk é a reconciliação com seu filho David (interpretado por Merritt Butrick).

         Com esse berro, nem precisa de rádio!

A presença de Ricardo Montalban no longa também é digna de destaque. Ele chega aos Estados Unidos como um dos ícones latinos da “política de boa vizinhança” promovida pelos americanos durante a Segunda Guerra Mundial, onde astros da América Latina como Cesar Romero e a nossa Carmen Miranda também fizeram parte. Os números de dança de Montalban de sombrero mexicano numa justa roupa verde escura são antológicos! E a sua grande presença como Khan no episódio “Semente do Espaço”, como um inimigo à altura de Kirk também chama muito a atenção. O mais curioso é que, na época, Montalban era o senhor Rourke da série “Ilha da Fantasia”, onde ele usava um terno branco, juntamente com o anão Tatu, e sua postura era muito solene e discreta para com os visitantes da ilha. Para ele retomar Khan, interpretado por ele mais de dez anos antes, foi necessário rever o episódio da série clássica várias vezes para recuperar o espírito selvagem do personagem. Outro detalhe que marcou foram os peitões de Fafá de Belém de Montalban no filme, que segundo Nicholas Meyer, o diretor, eram de verdade. Me lembro na época que a transformação de Montalban de senhor Rourke para Khan (água para vinho) chegaram a chocar. Os diálogos entre Khan e Kirk, onde um procura atingir e magoar o outro (nas palavras do próprio Khan) também são memoráveis. Um personagem realmente consegue tirar o outro do sério. O berro que Kirk dá no rádio (“KHAN!!!!!!”) cheio de fúria nem precisava daquele rádio, Khan já poderia escutá-lo do outro lado do planetóide. Só pareceu um pouco incoerente Khan, que era um sujeito tão inteligente, cair nas pilhas de Kirk de forma tão fácil e previsível. O mais interessante é que os dois personagens não se encontram pessoalmente e o duelo da astúcia dos dois se dá no interior da nebulosa Mutara, onde as duas naves fazem um voo cego e sem escudos, dada a interferência da nuvem nos equipamentos das naves.

      Bom duelo de naves na Nebulosa Mutara

Por fim, a morte de Spock. As cenas dos últimos momentos do vulcano com Kirk são bem convincentes e emocionantes, assim como a cerimônia fúnebre, com Spock sendo lançado ao espaço num torpedo fotônico. Kirk e Shatner pareceram realmente ser uma pessoa só naquele momento de muita dor com a morte de um ente querido. Mas Spock foi lógico até o fim, pois “a carência da maioria sobrepuja a carência da minoria… ou a de um só”.

                             Funeral de Spock

Muitos fãs adoram esse longa que, como pudemos ver, é cheio de elementos que já o diferenciam do primeiro longa, “Jornada nas Estrelas, O Filme”. Questões morais e filosóficas, um bom vilão, um desfecho de morte para um dos principais protagonistas (senão o principal), tornam “A Ira de Khan” uma referência no universo de “Jornada nas Estrelas”.

Batata Antiqualhas – Jornada Nas Estrelas. Radiografando Um Longa. A Ira De Khan (Parte 1)

                 Cartaz do Filme

O segundo longa-metragem da tripulação da série clássica trouxe novos e curiosos elementos para a saga de “Jornada nas Estrelas”. Mas, inicialmente, vamos falar como se deu a produção desse filme. Harve Bennett, responsável por escrever a história do longa, viu toda a série clássica em películas de 16 mm num intervalo de três meses. O que lhe chamou mais a atenção foi o episódio “Semente do Espaço”, onde a tripulação da Enterprise encontra uma antiga nave da Terra, de nome Botany Bay.

                     Harve Bennett com Nimoy

O que sucede em seguida? Nessa nave, encontram-se, em estado criogênico, seres humanos produzidos por engenharia genética na segunda metade do século XX, que são uma espécie de “super-homens”, altamente fortes e inteligentes, que passaram a dominar o mundo e entraram em guerra (as guerras eugênicas). Alguns deles, liderados por Khan, fugiram e se colocaram em estado criogênico, sendo descobertos pela Enterprise em pleno século XXIII. Inicialmente, Khan irá se mostrar um cordial hóspede, mas com o tempo, ele tentará dominar a Enterprise. Obviamente, a tripulação não permitirá que isso aconteça, mas também não acabará com o inimigo, que será enviado para o planeta Ceti Alfa 5 para viver num mundo selvagem que será ideal para sua sede de conquista de Khan. E assim, se plantou a semente do espaço, com um inimigo que não foi derrotado de todo pela Enterprise. Ao fim, Kirk e Spock especulam sobre qual seria o resultado daquela semente plantada. Assim, Harve Bennett teve a ideia de desenvolver essa história no segundo longa. Leonard Nimoy, nosso Spock, foi chamado mais uma vez para fazer o filme e novamente ele negou, havendo especulações de que ele fazia esse charme todo para obter uma vantagem financeira a mais.

                  Khan em “Semente do Espaço”

Foi passado a ele que Spock morreria no filme, dando um desfecho glorioso para o personagem, o que chamou sua atenção. Mas inicialmente ele não gostou do roteiro, pois Spock morreria no início do filme. Coube a Nicholas Meyer, o diretor, reescrever todo o roteiro em doze dias, para espanto de todos, pois além de fazer isso em tempo recorde (segundo William Shatner, o capitão Kirk, ninguém reescreve um roteiro em doze dias), a história ficou boa. Mas, à medida que as filmagens caminhavam para seu desfecho, havia um ar de arrependimento com relação à morte de Spock, principalmente pelo fato de que se extinguiria uma franquia que dava tão certo financeiramente. A exibição para o público teste foi um desastre, pois o filme terminava com o corpo de Spock sendo lançado no espaço, o que provocou um tom fúnebre na plateia, uma noção arrasadora de que “Jornada nas Estrelas” havia chegado ao fim. Decidiu-se, então, dar um novo desfecho (a contragosto de Meyer) em que houvesse mais esperança de uma continuação. Foi pedido a Nimoy que, na cena de sua morte, ele colocasse um gancho que poderia levar a uma sequência. Foi aí que Nimoy inventou o elo mental com o Dr. McCoy inconsciente, falando a palavra “Lembre-se”. Essa cena era vaga o suficiente para se criar qualquer argumento que justificasse um novo filme. Outros elementos interessantes surgiram ao final, como um Kirk mais esperançoso no futuro (seu desânimo com a passagem do tempo e a velhice foi notório ao longo da trama) e a frase de Spock citada por Kirk: “Sempre existem possibilidades”. O epíteto “Espaço, a fronteira final”, etc., narrado por Spock ao fim do filme, nos dá a certeza de que haverá uma continuação e, apesar de ter sido “cafona” (nas palavras do próprio Harve Bennett), tinha que ser daquele jeito, onde até a crítica especializada da época acabou concordando que era a coisa certa a fazer.

Morte de Spock. Grande desfecho e                     arrependimento

No próximo artigo, vamos destrinchar as principais qualidades desse filme para o universo de “Jornada nas Estrelas”. Até lá!

Batata Antiqualhas – Jornada Nas Estrelas. Radiografando Um Longa. O Filme (Segunda Parte).

 

Wise, Rodenberry, Shatner, Kelley e Nimoy. Pérola de bastidor.

Quais são as grandes virtudes de “Jornada nas Estrelas, o Filme”? Em primeiro lugar, o filme se aproxima de uma das propostas da série, que é a de fazer uma ficção científica intelectualizada. Víamos alguns episódios que acompanhavam esse esquema. Era colocado um problema inicial, que geralmente ameaçava a integridade da nave e da tripulação, e quebrando muito a cabeça, nossos personagens buscavam a solução para sair daquela enrascada que o desconhecido colocava à sua frente. Eu me lembro de um episódio em que era encontrado um buraco no espaço e, ao entrar para investigar, eles se depararam com um enorme ser vivo em formato de ameba gigante, que sugava toda a energia à sua volta, inclusive da Enterprise. A partir daí, a tripulação passava o resto do episódio procurando uma forma de sair dali. Nesses momentos, a série se aproxima da ficção científica da melhor qualidade.

Um elo mental que revela inquietações.

Ainda seguindo a linha de ficção científica requintada, a insistência em Kirk de colocar a nave em dobra, com o seu reator de dobra ainda defeituoso, enfiou a Enterprise num buraco de minhoca (forte distorção espaço-temporal provocada por um intenso campo gravitacional, ou no caso do filme, pelo reator de dobra em mau funcionamento), onde a velocidade aumentava de forma descontrolada, criando uma violenta distorção espaço-temporal que impossibilitava a reversão da dobra. Quanto maior a velocidade, mais lentamente a tripulação se comportava. Por que isso?

Vulcano na versão original de 1979.

Na Teoria da Relatividade Especial de Einstein, existe o chamado “paradoxo dos gêmeos”, onde dois irmãos gêmeos (Ulisses e Homero) participam de uma experiência. Ulisses fica sentadinho na sua cadeira no planeta Terra, enquanto que Homero pega uma nave espacial e viaja a velocidade da luz. Para Homero, que viaja a altíssima velocidade, o tempo passa mais lentamente, ao passo que, para Ulisses, o tempo passa normalmente. Assim, quando Homero retorna à Terra, a viagem para ele passou, digamos, poucos dias. E para Ulisses, que ficou sentadinho aqui na Terra, a viagem durou muitos anos. Dessa forma, Homero ainda está jovem e Ulisses está velhinho. Já que há esse paradoxo, como seria a visão que Ulisses teria de Homero dentro da nave quando ela estivesse à velocidade da luz? Ulisses veria Homero se mexendo muito lentamente. É o que vemos dentro da Enterprise, quando ela está em altíssima velocidade num buraco de minhoca. Agora, no filme esse paradoxo só ocorre quando o sistema de dobra está com defeito, é claro!

Vulcano digitalizado na versão do diretor: seguindo os storyboards originais.

E adivinhe quem o conserta? Lógico, meu caro, é o Spock, que toma o lugar de Decker como oficial de ciências sem que o já rebaixado personagem reclame, ao contrário do que ele fez com Kirk. Como disse um dos produtores do filme, “Jornada nas Estrelas sem Spock (e Nimoy) é a mesma coisa que um carro sem rodas”.

Enterprise no buraco de minhoca. Paradoxo dos gêmeos na materialidade das imagens.

Falando em Spock, é o momento oportuno de falar de sua cena de choro na “versão do diretor” do longa. A lágrima do Vulcano por V’Ger tem grande carga simbólica, pois é o reconhecimento de seu dilema razão X emoção que aparecia na série clássica, jamais confirmado por ele. Por ser meio humano, meio vulcano, reconhecer suas emoções era visto como um sinal de fraqueza pelo oficial de ciências, que sempre lançava mão de argumentos lógicos para dissimular suas manifestações emocionais. Essa característica, aliada à sua retórica altamente refinada, sincera e irônica tornaram, a meu ver, o personagem Spock um dos mais amados de todos os tempos. É comovente ver o sentimento de compaixão de Spock por V’Ger, exatamente pelo fato do vulcano se identificar com a máquina, cuja lógica e raciocínio não são suficientes para completar sua essência. O vazio de emoções e a falta de respostas a questões tão metafísicas como “O que eu faço no mundo?”, ou “Qual é a razão de minha existência?” tornam a vida de V’Ger incompleta e desalentadora e parece que Spock passa pelos mesmos dilemas, assim como todos nós, que também buscamos respostas para essas perguntas e, volta e meia, também passamos por momentos de instabilidade emocional.

McCoy dando uma bronca em Kirk, após ele forçar a barra com a tripulação exigindo o sistema de dobra.

A viagem solitária de Spock num traje espacial com força de propulsão ao longo da nave de V’Ger é curiosa, pois o vulcano encontrava todas as informações acumuladas pela nave ao longo de sua viagem. Ao presenciar uma imagem de Ilia, que foi absorvida por V’Ger e que enviou uma sonda em formato de Ilia para interagir com a tripulação da Enterprise, Spock tenta fazer um elo mental. Mas a sobrecarga de informação é tanta que ele fica inconsciente. Durante o elo mental, vemos o rosto em agonia de Spock com várias imagens sobrepostas passando muito rapidamente por sua face. A solução do filme está lá (quem é V’Ger). Se colocarmos o aparelho de DVD quadro a quadro, vemos imagens da Voyager e das figuras humanas desenhadas em seu disco de ouro preso à fuselagem da nave. Típica mensagem subliminar.

Spock e sua viagem insólita pela nave de V’Ger.

Por fim, o primeiro longa de “Jornada nas Estrelas” é altamente kubrickiano, tanto do ponto de vista estético quanto do ponto de vista do enredo. Esteticamente, o interior da nave de V’Ger se aproxima em alguns momentos do caleidoscópio da viagem warp de David Bowman ao se aproximar do monólito. Do ponto de vista do enredo, assim como Bowman interage com a espécie alienígena para criar um novo ser híbrido, a mesclagem final de Decker, Ilia e V’Ger cria também um novo ser, onde essa fusão se manifesta de forma até mais profunda do que em Kubrick, pois liga com total harmonia o racionalismo exacerbado de V’Ger com a emoção e amor de Decker e Ilia.

Fusão de Decker e Ilia com V’Ger. Nova espécie, assim como em Kubrick.

Concluindo estas linhas, volto a confirmar que “Jornada nas Estrelas, o Filme” é um longa a altura de todo o carisma e sucesso dessa série que é um verdadeiro fenômeno cultural, pois aliou ação, humor e entretenimento a um aguçado debate intelectual. E tudo isso na TV e numa cultura de massa taxada de burra pela escola de Frankfurt, composta de pensadores como Adorno e Walter Benjamin. Que bom que toda regra tem sua exceção!

Nave de V’Ger. Outra manifestação kubrickiana.

E não deixem de rever abaixo a antológica abertura do filme onde três cruzadores klingons enfrentam a nuvem de V’Ger. Só lembrando que o capitão klingon é Mark Lenard, o ator que interpreta Sarek, o pai de Spock.

Batata Séries – Jornada Nas Estrelas, Voyager. Demônio. Formas De Vida Líquidas Querem Sensações.

                     Um episódio de Voyager…

A Batata Espacial tem o orgulho de apresentar uma nova seção: a Batata Séries. Aqui  você vai ter a oportunidade de ler análises e reflexões de episódios de séries de TV. E como trekker que eu sou, não poderia deixar de começar com um episódio da série Voyager, da franquia de Jornada nas Estrelas. Vamos falar aqui do 24º episódio da 4ª temporada, intitulado “Demônio”. Antes de mais nada, lembremos que a Voyager é uma nave da Frota Estelar que faz uma viagem do Quadrante Delta da galáxia ao Quadrante Alfa, onde está a Terra, e essa viagem tem uma duração de setenta anos, já que a distância a se cumprir é muito grande (setenta mil anos-luz). E, justamente pela necessidade de se cumprir uma grande distância, a nave e sua tripulação sofrem com a carência de recursos, que chegaram a níveis críticos. Depois da necessidade de se poupar energia e de muitas buscas, foi encontrado um planeta que pode fornecer material para recuperar a energia da nave. Mas esse planeta é de classe Y, também conhecido como “classe demônio”, que é altamente inóspito para os seres humanos (temperaturas e pressões elevadas, elementos químicos altamente tóxicos na atmosfera, etc.). A capitã Janeway já desistia de explorar o planeta quando o jovem alferes Kim disse que era capaz de buscar o material, mesmo com todas as condições adversas. Ele somente precisava de uma pessoa para ajudá-lo. E, para isso, chamou seu amigo Tom Paris.

Kim, querendo mostrar serviço, tem uma ideia…

Ao descerem no planeta, no entanto, Kim e Paris se depararam com uma espécie de substância viscosa que sugou o alferes. Paris salva o amigo, mas defeitos na roupa atmosférica dos dois, provocados pela gosma fazem-nos ficar desacordados. Com a demora da resposta dos dois, a capitã Janeway decide resgatá-los e pousa a Voyager na superfície do planeta. Qual não é a surpresa que os tripulantes da nave têm quando encontram Paris e Kim andando sem roupas de proteção e em perfeita saúde na superfície do planeta? O problema foi quando os dois retornaram ao interior da Voyager e não conseguiam mais viver no ambiente interno da nave. Depois de muitas elucubrações e especulações, além de investigações científicas (como toda boa série de ficção científica deve ter!), foi descoberto que aqueles não eram o Kim e o Paris reais, mas sim aquela substância viscosa que se apropriou do DNA dos dois e fez novos Kim e Paris. A Voyager já havia conseguido o material para restaurar a energia da nave e o Kim e Paris originais já haviam sido achados, mas a nave afundava na substância viscosa, que não queria que a nave abandonasse a superfície do planeta, pois queria os padrões de DNA dos tripulantes para terem acesso às sedutoras sensações humanas. Janeway fez, então, um trato com a espécie alienígena, e forneceu os padrões de DNA dos membros da tripulação que quisessem doá-los em troca da substância libertar a nave. O episódio termina com a Voyager levantando voo e a “tripulação” se despedindo na superfície do planeta.

                     Prolongada falta de ar…

Esse é um episódio interessante do qual podemos tirar algumas reflexões. Em primeiro lugar, é usada a ideia de formas de vida não sólidas. Isso já foi feito em obras como “O Despertar dos Deuses”, de Isaac Asimov, onde víamos até forma de vida gasosas. Essa noção é altamente instigante, pois foge do lugar comum de vidas humanóides, algo tão presente no Universo de Jornada nas Estrelas, até porque para uma série de televisão é mais barato e fácil vestir um humano de alienígena. Em segundo lugar, houve uma dose moderada de etnocentrismo, pois elegeu as sensações humanas como incríveis e bárbaras. À despeito do fato daquelas sensações serem uma experiência totalmente nova para aquela espécie alienígena, ainda assim ficou uma impressão desconfortável de que tudo que vem do humano é bom e virtuoso, até os sentimentos e instintos mais primários. Herança humanista e renascentista? Talvez. Mas um tanto tendenciosa e demasiado utópica. A espécie daquele planeta poderia estar muito bem com uma matriz cultural própria e não ficar tão deslumbrada com um elemento alienígena. É só a gente se lembrar do elo de Odo em DS9.

                              Uma nave imersa…

O que incomoda no episódio são dois pontos: a quantidade de tempo que o Kim e o Paris originais ficaram sem oxigênio no planeta (até se buscou dar uma justificativa que não colou muito) e o fato de Janeway ter pousado toda a Voyager na superfície do planeta, apesar dos sérios riscos.

“Tripulantes” se despedem da Voyager…

Entretanto, ainda assim, “Demônio” é um bom episódio de Voyager. Há melhores e piores. Mas um bom episódio.

https://www.youtube.com/watch?v=U1ApfWtp5tg

Batata Movies – Homem Aranha, De Volta Ao Lar. Covardia Com A DC.

                Cartaz do Filme

A Marvel ataca novamente lançando desta vez a terceira geração do Homem Aranha. Estrelado agora por Tom Holland, o aracnídeo retorna em grande estilo, pouco depois de Mulher Maravilha ter sido lançada pela DC. E pode-se dizer que, mais uma vez a Marvel deu um toco na concorrente. Já está chegando a dar pena.

Peter Parker, agora interpretado por Tom Holland

O mais curioso é que a história das origens de Peter Parker não é contada, como já ocorrera nas versoes estreladas por Tobey Maguire e Andrew Garfield. Ja temos a referência direta a “Guerra Civil”, onde Parker tinha uma ligação com Tony Stark, que desenvolveu o super traje do Aranha. Sabemos que nos quadrinhos de “Guerra Civil”, esse traje era ainda mais irado que o do filme, mas podemos dizer que a roupa da pelicula também era rica em dispositivos, o que às vezes embananava nosso herói.

                               Tony Stark, o mentor

Por que esse novo Homem Aranha é tão bom? Em primeiro lugar, a Marvel lançou a receita de sempre, que é fazer um filme de ação com muito humor. Tem gente que não gosta muito disso. Mas eu devo confessar que adoro os filmes da Marvel, justamente por essa química muito bem feita (já tive a oportunidade de mencionar isso outras vezes). E o mais curioso é que fazer humor é algo muito difícil, sendo que é necessário, no mínimo, ser constantemente original. A Marvel consegue em seus filmes usar um gênero extremamente exigente e arriscado como o humor para justamente dar um novo frescor a cada história que conta na telona. E isso deu muito certo com um personagem engraçado e divertido como o Homem Aranha. Alías, devemos tirar também o chapéu para Tom Holland. A primeira impressão que ficou dele em “Guerra Civil” era a de que Holland não interpretava Peter Parker, mas sim interpretava Tobey Maguire interpretando Peter Parker. Nesse filme, o jovem ator consegue colocar um estilo todo seu, superando Andrew Garfield (que funciona muito melhor em filmes dramáticos) e, chegando perto de Tobey Maguire, ainda o melhor Homem Aranha em minha modestíssima opinião.

Michael Keaton arrebentou como o vilão Abutre

Uma grata surpresa foi a participação de Michael Keaton na película como o vilão Vulture (Abutre). Tem havido uma série de críticas aos vilões dos últimos filmes da Marvel (opinião que nem sempre eu compartilho). Mas agora parece que a Marvel trouxe um vilão à altura. Keaton term provado que ficou muito melhor com a idade, sobretudo quando vemos seus últimos trabalhos. E não foi diferente agora. Seu vilão se mostrou frio, calculista e, principalmente, com argumentos até certo ponto convincentes para ter se enveredado para o caminho do mal. Um homem que quer garantir o conforto da esposa e da filha e que diz uma grande verdade: “Os ricos não se importam com a gente”, ou seja, um cara que tinha empatado uma grana boa em reciclagem e que vai tomar uma rasteira (alerta de spoiler) justamente de quem? Isso mesmo, caro leitor! Tony Stark! Esse pequeno elemento faz a gente ter uma certa empatia com o bandido, apesar de tudo. E Keaton convencia em sua atuação, até nos momentos mais inusitados do filme. Mas não entrarei em detalhes.

                                   Que Tia May!!!

Outra coisa que ficou ótima no filme foi a repaginada em Tia May. Agora ela é uma Marisa Tomei na meia idade, como já tínhamos visto em “Guerra Civil”. Entretanto, aqui a atriz teve mais espaço para trabalhar a personagem, conquistando o coração da galera, mesmo que ela tenha ficado excessivamente doce e melosa em alguns momentos, ficando até meio bobinha. Entretanto, Marisa Tomei nunca esteve tão sensual num papel e enche os olhos vê-la da forma mais adocicada possível.

Por fim, o desfecho. Apesar de eu não poder contá-lo, achei-o muito engraçado e deu uma chave de ouro digna ao filme. Cenas pós-créditos? Há duas, tem que ficar até o finzinho, sendo que a última é também uma zoação.

Assim, nem sei se “Homem Aranha, De Volta Ao Lar” conseguirá os recordes de bilheteria de “Mulher Maravilha”, mas ficou a impressão de um filme melhor e que, confesso, me divertiu como há muito tempo eu não me divertia no cinema. Vá sem medo, vale muito a pena.

https://www.youtube.com/watch?v=iuGDjaZOKuk