Na longínqua década de 80, a gente tinha o hábito de ler todos os domingos no jornal “O Globo” um suplemento de quadrinhos chamado “Globinho”. Lá, podíamos ler várias tiras: Zé do Boné, Pinduca, Mickey, etc. Até o Incrível Hulk deu o ar de sua graça. Num daqueles domingos, provavelmente depois de uma vitória do Ayrton Senna na TV, abri um “Globinho” e me deparei com um tal de “Valerian, O Agente Espaço-Temporal”. Num primeiro momento, não dei muita bola para aquilo, pois as tiras contavam uma história em sequência todos os dias no jornal e não as acompanhei, pois a gente comprava o jornal somente aos domingos. Entretanto, a tira começou a contar uma nova história, até com o traço de um novo desenhista, e ela passou a ser semanal. Desse jeito, eu pude acompanhar a história. Lembro-me muito pouco dela, mas recordo-me que era muito instigante e aguardava sempre a tirinha da semana seguinte com grande ansiedade e expectativa. Qual não foi a minha surpresa quando vi o trailer de Valerian, ainda mais escrito e dirigido pelo ultra porra-louca Luc Besson? Confesso que fiquei com uma boa esperança de que a coisa fosse dar certo e aguerdei ansioso o filme desde o início do ano. Pois bem, vieram as primeiras exibições de cabine de imprensa e quem viu não teve uma boa impressão, muito pelo contrário até. O filme foi muito esculachado. Como eu queria muito ver essa película, fui assim mesmo.
Qual é a história de Valerian? O agente espaço-temporal e sua fiel escudeira/companheira/amante Laureline são agentes militares (Valerian é major e Laureline sargento) de uma espécie de Federação terrestre que administra uma gigantesca estação espacial conhecida como “A Cidade dos Mil Planetas”, contendo milhões de espécies de todo o Universo. Um setor dessa estação está radioativo e inacessível e Valerian, juntamente com Laureline, precisam investigá-lo. Mas esse setor abriga um segredo que confunde o papel de mocinhos e bandidos ao longo da história, só para fazermos uma sinopse bem rápida e não soltar muitos spoilers.
Qual foi a primeira grande coisa que a gente nota nesse filme? O impacto visual. Os efeitos especiais mostraram ao inicio um planeta alienígena altamente idílico e paradisíaco, supercolorido, dando um tom bem água com açúcar. Os nativos eram esguios e falavam quase sussurrando de forma bem doce, num forte contraste com a sociedade mecanizada e industrializada dos humanos da Cidade dos Mil Planetas. Apesar de muitos bichinhos alienígenas ao longo da película (e não é que Besson teve um surto de George Lucas?), o mundo paradisíaco inicial foi um belo cartão de visitas. Já a história, o enredo do filme em si, foi mediana e até um certo ponto entediante em alguns momentos, embora tivesse pitadas coerentes de distopia. A comunidade utópica da Cidade dos Mil Planetas tem seus problemas sociais e econômicos. E a escolha do grande vilão corroborava a distopia, bem ao estilo do “bandido mais próximo de si do que você imagina”, tomando um monte de atitudes politicamente incorretas, mesmo que a história esteja avançada cinco séculos no tempo.
O elenco teve algumas pérolas inusitadas, bem ao estilo doido de Luc Besson: um Rutger Hauer envelhecido, cuja aparição meteórica deu grande credibilidade ao início do filme, um Herbie Hancock (!) no papel de um militar de alta patente, passando uma visão muito austera, um Ethan Hawke todo iluminado (!!) como dono de casa de mulheres de fino trato, e uma Rihanna (!!!) no papel de uma sensual alienígena, cuja dança em pole dance assumiu uma plasticidade (e elasticidade) jamais vistas antes, graças ao bom e velho CGI. Agora, o grande problema do filme foi, sem a menor sombra de dúvida, a escolha dos atores do casal protagonista. Dane Dehaan, o Harry Osborne do Homem Aranha de Andrew Garfield, que interpretou Valerian, e Cara Delevingne, que interpretou Laureline, são muito fraquinhos. A voz de Dehaan parecia muito abobalhada e os trejeitos de Delevingne lembravam muito os de uma pré-adolescente malcriada. Sinceramente, eu não me lembro de Valerian e Laureline desssa forma. Ainda, apesar de minha experiência com os quadrinhos franceses de Valerian ter sido muito vaga, pode-se dizer que os atores aparentam ser relativamente novos para os personagens. Como a história é muito focada no casal protagonista, o filme acabou perdendo bastante.
Assim, “Valerian e a Cidade dos Mil Planetas” não é de se jogar fora, mas também não empolga. Vá ao cinema, mas não espere muito. Uma pena…