Chegamos ao sexto episódio da primeira temporada de “Jornada nas Estrelas, Discovery”. “Lethe” traz para nós uma forte diferença em relação aos episódios anteriores. Escrito por Joe Menosky, que fez roteiros para outras séries de Jornada nas Estrelas, e Ted Sullivan, o episódio tem como tema central uma viagem que Sarek faz para tentar um acordo com duas casas klingon que estão em conflito contra a casa de Kol. Mas o vulcano que o acompanha na nave é um “extremista da lógica”, que é contra a interação de Vulcano com os humanos, e provoca uma explosão na nave de Sarek, que consegue levantar um campo de força a tempo, mas fica ferido. Como o katra (alma) de Sarek tem uma ligação, mesmo à distância, com a mente de Burnham, esta sente o perigo pelo qual o pai passa e ela pede a Lorca que a Discovery vá salvá-lo, sendo prontamente atendida pelo capitão. Quando chegam próximo à nave de Sarek, Burnham tenta fazer o elo mental com o pai de forma mais efetiva e entra na mente dele. Ela pode então presenciar o dia em que foi reprovada pelos vulcanos para entrar no grupo expedicionário por ser humana demais. E toda vez que Sarek a vê, ele tenta expulsá-la de sua mente. Na primeira vez, ela é atirada com um empurrão do pai. Mas nas outras vezes que ela retorna à mente, a moça fica lutando uma espécie de karatê vulcano com o Sarek, o que ficou um tanto ridículo. Burnham irá descobrir que, como Sarek tinha dois filhos de origem humana, os vulcanos disseram a ele que escolhesse apenas um deles para entrar no grupo expedicionário vulcano, ao que Sarek escolheu Spock e manteve essa decisão escondida de Burnham por anos, o que traumatizou a moça, que se sentiu a pior das criaturas por ter falhado como elemento de ligação entre humanos e vulcanos. Sarek, por sua vez, sentiu vergonha de ter feito a filha adotiva sofrer e, para arrematar, ainda o fato de que Spock preferiu a Frota Estelar só aumentou em Sarek a sensação de que ele cometeu um erro.
Mas a história teve um outro núcleo. Ao querer ajudar Burnham a salvar Sarek, Lorca passou por cima de protocolos da Federação, o que lhe rendeu uma visita da Almirante Cornwell para lhe dar uma chamada de atenção. Aproveitando o fato de que os dois são amigos e Cornwell inclusive foi a psicóloga dele que deu o laudo dizendo que tudo estava normal com nosso tresloucado capitão, Lorca seduz Cornwell, primeiro com umas bebidinhas, depois na cama. Enquanto Lorca dorme, Cornwell tateia as cicatrizes que estão nas costas do capitão e ele acorda de repente apontando um phaser que estava escondido na cama na cara dela. Foi o suficiente para a almirante dar um tremendo piti, dizendo que ele forjou os testes psicológicos e que ele não está habilitado para comandar a Discovery por ser um caso patológico, etc, etc. Só que Sarek não está habilitado por hora a fazer a reunião com os klingons e Cornwell vai precisar ir em seu lugar. Está na cara que a almirante será vítima de uma emboscada e será sequestrada pelos klingons, tudo isso para que Lorca não perca o comando da Discovery. O episódio termina com Lorca ordenando a Saru que peça instruções à Frota do que fazer a respeito do sequestro de Cornwell (não podemos desrespeitar os protocolos da Frota, não é mesmo?), mas com o phaser escondidinho lá na parte de trás de sua calça.
Qual foi o ponto positivo desse episodio? Trabalhou-se mais a relação entre Burnham e Sarek. Sabemos um pouco mais da infância da protagonista e de seus traumas. Além de ter perdido os pais biológicos num ataque klingon, a própria Burnham quase perdeu a vida num atentado dos extremistas da lógica vulcanos. Ela somente sobreviveu porque Sarek colocou parte de seu katra na mente de Burnham, e isso explica porque os dois conseguem fazer o elo mental à distância, sendo uma explicação bem convincente para algo que parecia absurdo. O fato de o pai ter escondido que ele precisou fazer uma escolha entre os dois filhos para entrar no grupo expedicionário vulcano foi algo que trouxe muito trauma à Burnham e arranhou a relação entre os dois. Assim, o episódio acertou muito no desenvolvimento desses dois personagens. Acertou também no desenvolvimento de Lorca, que se revelou psicologicamente comprometido e muito vulnerável, algo relativamente bom para um capitão que era somente visto até agora como uma figura muito sinistra. Essa complexificação progressiva dos personagens é frutífera para a série, desde que se não faça o que se fez com Saru, que a cada semana mostrava uma oscilação brusca de comportamento.
Mas o episódio deu novamente uns chutes no saco dos fãs mais de raiz, como Discovery tem sempre o costume de fazer. A tal cena de karatê entre Burnham e Sarek foi simplesmente ridícula. Tudo bem que isso pode ter sido feito para atrair um público mais novo, etc., etc., mas, por exemplo, jamais imaginaria Mark Lenard e Leonard Nimoy numa situação tão constrangedora. Só que isso não foi o pior. Sim, falo dos extremistas da lógica, que acham que atos terroristas são a coisa mais lógica a se fazer para purgar o relacionamento dos vulcanos com os emotivos terráqueos. Isso vai contra tudo o que os vulcanos são. Eles abraçaram a lógica justamente para purgar a violência. E agora usam a violência para proteger a lógica??? Que ilógico, não??? Há alguns trekkers que acham que os vulcanos são extremamente arrogantes e que tratam os humanos com desdém, e aí os extremistas da lógica até cairiam bem nesse ponto de vista, mas cá para nós, confesso que não me enquadro nesse time pela razão que descrevi acima. Criar um grupo vulcano extremista da lógica é muito pior do que colocar quilos e quilos de borracha na maquiagem de um klingon.
Outra coisa que incomodou bastante foi o piti da almirante. Lorca faz um monte de arbitrariedades, sacrificando tardígrado e tudo, e a mulher reclama que ele tem um phaser debaixo do travesseiro? E, devemos nos lembrar que ela não tem muita moral para reclamar das coisas não, pois ela é uma psicóloga que dormiu com seu paciente. O que o Dr. McCoy diria disso? Pelo menos, o previsível roteiro (nesse ponto, pelo menos) a fez de refém dos klingons e agora Lorca deve ser o salvador da pátria. Ou será que ele vai protelar o resgate da Almirante para não perder o comando da Discovery??? Hummmm, ficaria muito interessante!!!
Dessa forma, parece que dessa vez a história ficou mais interessante que as anteriores, até porque saiu um pouco do clima de guerra e desenvolveu mais os personagens. Ou seja, foi um episódio que até agora se desenvolveu de forma mais destacada dos demais, que se comportam interligados como uma espécie de novelão, característica mais vigente nas séries de streaming. Vale a pena dar uma conferida nesse. Resta agora saber se a série tomará novos rumos ou voltará para o que tem sido antes do episódio dessa semana. Vamos aguardar.
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