Ainda dentro do Festival do Rio 2017, foi exibida a co-produção Argentina-Colômbia “Matar Jesus”. Essa excelente película lança uma questão mais do que ancestral: até onde vale a pena a vingança? Você só se sentirá verdadeiramente saciado se você retribuir todo o mal que sofreu de alguém ou é melhor esperar que a própria pessoa que te fez o mal se estrepe totalmente e assistir a tudo de camarote sem qualquer sensação de culpa ou de arrependimento? Muitos filmes já trabalharam essa questão, uns pendendo para uma resposta, outros pendendo para outra resposta. Agora, essa película revisita o tema, tomando como cenário o ambiente violento da Colômbia.
Vemos aqui a história de Paula (interpretada por Natascha Jaramillo), uma bela estudante universitária, filha de um professor que leciona na mesma universidade a disciplina de ciência política. Preocupado com as questões sociais, esse professor fala de resistência dos menos favorecidos às injustiças. Um belo dia, Natascha volta com seu pai para casa de carro, mas a viagem termina numa emboscada onde dois homens numa moto assassinam seu pai. Natascha conseguiu ver o assassino do pai na garupa da moto. Mas percebeu na delegacia que a polícia agiria com morosidade nas investigações. Num desses acasos da vida, Natascha encontra o assassino numa danceteria, e ele não a reconhece. A moça aproveita a oportunidade para se aproximar do bandido, que atende pelo nome de Jesus. Mas essa aproximação em busca de uma vingança não será feita sem percalços, onde Paula passará por muitas situações altamente espinhosas, descortinando um submundo totalmente alheio à sua realidade de classe média.
O filme mostra uma direção bem clara quando se refere à questão da vingança. Desde o início, os planos de Paula para matar Jesus são impedidos por vários obstáculos. O alto preço de uma arma ilegal, a dificuldade em manuseá-la, o ambiente altamente violento em que Paula se metia, parecendo uma ida a um caminho sem volta, o fato de Jesus andar permanentemente armado e ser amigo de policiais corruptos, etc., tudo contribuía para que os planos de vingança de Paula terminassem de forma extremamente trágica, bem ao estilo “A vingança é a arma do otário”. Chegava a ser doloroso ver Paula se enrolando cada vez mais naquelas situações escabrosas, onde sua vida passava por riscos cada vez maiores, e a moça não recuava, dando a impressão de que ela mergulhava de cabeça em uma autoimolação, indo a um matadouro. Entretanto, a alternativa a isso não era das melhores. A segurança de seu lar burguês vinha junto com um ar de tumba, pois a casa havia perdido toda a vida com a morte do pai e marido (quem já perdeu um ente querido de dentro de casa sabe muito bem do que estou falando). Uma das provas disso está na sequência em que Paula passa a noite de natal na casa da família de Jesus, onde há muita celebração e alegria, com as famosas luzinhas de natal piscando em todo o canto, enquanto que, na sua casa, a escuridão e o silêncio prevaleciam. Isso fez até que Paula, num ato de desespero, saísse à toda da casa de Jesus em pleno natal e adentrasse a sua casa em busca dos enfeites natalinos e das luzinhas que, mesmo que mal arrumadas, tiravam um pouco da morbidez de seu lar. Assim, só restava à Paula a sua busca cada vez mais insólita por vingança.
O desfecho do filme, apesar de muito previsível, ainda assim nos deixa com uma sensação de indignação, pois ficou aquele sentimento de muito barulho por nada. Mas também pareceu um castigo muito adequado a Jesus, e creio que esta foi a mesma conclusão que Paula tomou. Então, o filme termina com uma sensação de que a justiça será feita, mas também não deixa de ter uma certa ideia de vazio.
Dessa forma, “Matar Jesus”, apesar do tema já batido da vingança, veio como uma interessante curiosidade do Festival. Esperamos que saia comercialmente por aqui, pois é um filme relativamente inquietante que merece a atenção do espectador.