Mesmo com os protestos dos fãs por causa da morte de Spock, “A Ira de Khan” teve a maior arrecadação de bilheteria num fim de semana em sua época. Semanas depois do fim das filmagens, Nimoy assistiu ao filme na cabine de projeção de um cinema, uma experiência muito ruim, pois o ator se sentiu parcialmente culpado pela morte do personagem. Ele até pensou em sair da cabine antes do fim da exibição, mas ficou com medo de ser mal interpretado por público e imprensa, de pensarem que ele não gostou do filme. Ele estava com lágrimas nos olhos. Entretanto, a cena final, com o torpedo contendo o corpo de Spock na superfície do planeta Gênese fez Nimoy ter a certeza de que seria chamado pela Paramount para mais uma continuação, já que “A Ira de Khan” deixou elementos para isso. Essa sequência final do planeta Gênese não constava do roteiro original, mas foi acrescentada, pois nas exibições-teste do filme, a reação do público foi muito sombria ao final original. Com a sequência final de Gênese adicionada, o final seria um pouco mais esperançoso.
Apesar da esperança de voltar a atuar em “Jornada nas Estrelas”, Nimoy não sabia ao certo se queria fazer isso novamente. Dinheiro para ele já não era mais problema. Veio então a ideia de dirigir o filme, algo que Nimoy e Shatner já haviam tentado fazer na segunda temporada da série clássica, só que foi prontamente negado a eles. Ao se reunir com Gary Nardino, da Paramount, Nimoy sugeriu pegar a direção já que conhecia a fundo “Jornada nas Estrelas”. Para sua surpresa, Nardino aceitou sem titubear. Nimoy saiu da reunião surpreso, achando que tudo fora muito fácil. Harve Bennett já havia oferecido a Nimoy a direção de uma série de tv chamada “The Powers of Matthew Starr”, quase na mesma época de “A Ira de Khan”, o que lhe deu experiência e segurança suficientes para atuar na direção em “Jornada nas Estrelas 3”.
Duas semanas depois, Nimoy voltou a sugerir pegar a direção do filme a um alto executivo da Paramount, Michael Eisner. Nardino nada havia dito a esse grande executivo sobre a direção, deixando a batata quente para Nimoy, pois Nardino não queria se indispor com Eisner, seu chefe, se ele não concordasse com a direção a Nimoy. Nosso ator fez a sugestão a Eisner e, para a sua surpresa, também recebeu uma resposta afirmativa. Nimoy estava nas alturas. Mas era bom demais para ser verdade. Várias semanas se passaram e Eisner não retomou os contatos com Nimoy. Nosso ator então fez uma ligação para Eisner e escutou do executivo que não poderia lhe dar a direção do filme, já que Nimoy odiava Spock e “Jornada nas Estrelas”. Segundo o executivo, Nimoy teria colocado no seu contrato de “A Ira de Khan” que Spock deveria morrer. Era o fantasma de “Eu não sou Spock” retornando com força total. Nimoy imediatamente desfez o mal-entendido dizendo que essa exigência de matar Spock não constava de seu contrato, além de ter contado também sobre toda a má impressão causada por “Eu não sou Spock”. Foi assim que Nimoy conseguiu a direção do filme.
Ao começar a discutir o roteiro, Nimoy e Bennett decidiram inicialmente que a “ressurreição” de Spock ocorreria próxima ao fim do filme para manter um suspense contínuo. Obviamente, o “lembre-se” do elo mental de Spock a McCoy também seria usado. Mais tarde, surgiram outras ideias: a rápida evolução de Gênese e a proibição do acesso ao planeta, a presença do “katra” de Spock em McCoy, os klingons querendo o torpedo Gênese. Originalmente, os romulanos seriam os vilões da história, segundo as pretensões de Bennett. Mas Nimoy sempre teve muita curiosidade e interesse sobre os klingons, sugerindo a troca, no que foi prontamente aceito. A indignação de Sarek por Kirk não ter levado o katra de Spock a Vulcano foi mais um elemento adicionado ao roteiro, que ganhava cada vez mais forma. Assim, Kirk deveria levar o corpo de Spock e McCoy para Vulcano a fim de fazer a ressurreição. Mas a proibição de ir a Gênese imposta pela Federação e os klingons seriam os obstáculos a serem superados. Nimoy também pensou num tema chave para o filme. Em “A Ira de Khan”, o tema era “As necessidades de muitos superam as de poucos ou a de apenas um”. Agora, seria justamente o contrário. A lealdade e amizade por um amigo levariam muitos ao sacrifício, como em “Henrique V”, de Shakespeare, nas palavras de Nimoy. Assim, cada membro da tripulação teria uma tarefa específica na missão de trazer Spock de volta. Aqui, Nimoy acha que foi influenciado por “Missão Impossível”, onde os personagens tinham missões específicas em cada episódio para chegar ao objetivo da missão maior. O detalhe mais interessante é que isso não aconteceu especificamente com Chekov. Mas isso seria compensado em “Jornada nas Estrelas 4”.
Houve um problema para a escolha do elenco. Kirstie Alley quis um salário maior, pois havia sido mal paga em “A Ira de Khan”. Mas o valor do salário que ela queria era maior que o de De Forest Kelley, o que foi impossível. Assim, Robin Curtis foi escolhida para o papel de Saavik. Para o comandante klingon, Nimoy achou que Edward James Olmos, que trabalhou em “Blade Runner”, “Miami Vice” (o inesquecível tenente Castillo) e na nova versão de “Galáctica” (general Adama) era perfeito para o papel. Mas Bennett discordou. Até que Christopher Lloyd manifestou o desejo de fazer o papel. Alguns executivos do estúdio temeram por isso, já que Lloyd era conhecido por fazer comédias. Mas tanto Nimoy quanto Bennett tinham certeza de que o doutor Emmett Brown de “De Volta Para o Futuro” era um excelente ator e um camaleão, sendo perfeito para o papel do comandante Kruge. Para a sacerdotisa T’Lar, Spock tinha a lembrança de Celia Lovsky em “Tempo de Loucura”, na série clássica. Mas Lovsky já havia morrido e então Nimoy descobriu uma atriz de 85 anos interpretando “Medeia”, que muito o impressionou: Dame Judith Anderson. Ela não conhecia “Jornada nas Estrelas”, mas seu neto era um fã devotado. Além disso, a atriz e Nimoy se entenderam muito bem e ela adorou o roteiro.
No próximo artigo, vamos falar das filmagens de “A Procura de Spock”. Até lá!