Batata Movies – A Ópera De Paris. Como Funciona Um Grande Teatro.

                   Cartaz do Filme

Quando passamos pela Cinelândia, temos o prazer de ver o Teatro Municipal. Sujo e encardido por muito tempo, nosso teatro sofreu uma reforma há alguns anos e agora reluz em verde e dourado. A construção, iniciada em 1906 e concluída em 1909, foi inspirada no teatro mais conhecido da França, o Ópera de Paris. E é justamente sobre esse teatro que tivemos um excelente documentário em nossas telonas. “A Ópera de Paris” fala do cotidiano do teatro mais conhecido da França. A impressão que se dá é a de que o Ópera de Paris por fora é um grande museu, tamanha a sua beleza e ornamentação. Mas, quando adentramos o teatro, vemos que há todo um mundo lá.

                                                                      Um boi numa apresentação…

E é esse mundo que o documentário mostrou com excelente maestria. Praticamente tudo do teatro estava lá, desde a direção até o pessoal da limpeza, passando pelo grande corpo de artistas que trabalha lá diariamente. Pudemos ver no filme os ensaios de balé, do coro, a nova promessa do canto lírico vinda direto da Rússia (e que ainda não sabia falar francês), a organização dos ensaios de óperas nos bastidores, a parte administrativa, etc., etc. Um momento muito interessante foi ver o cotidiano do diretor do teatro, que tinha que lidar com questões muito espinhosas tais como: corte de verbas, corte de pessoal, greve de funcionários, etc. O mais interessante era ver como  diretor tratava a questão do corte de pessoal, sempre barganhando que o mínimo de funcionários fosse cortado, assim como respeitava os sindicatos e os movimentos grevistas. Ou seja, durante os dias de greve, os espetáculos até eram realizados, mas de forma incompleta ou deficiente. E algumas pessoas insistiam em ficar para o jantar antes do espetáculo e assistir ao espetáculo meia boca mesmo, em solidariedade à casa. Coisas simplesmente inimagináveis em certo país subdesenvolvido da América do Sul, cujo nome começa com “B” e não é a Bolívia. Outra coisa surpreendente foi ver uma reunião da direção discutindo o excessivo preço das óperas para o público.

        A jovem promessa russa do canto lírico…

Mas a Ópera de Paris também faz um trabalho social e dá aulas de música para comunidades carentes, formando até grupos de músicos infanto-juvenis. Pudemos ver as aulas das crianças e sua exibição para o público na formatura final.

                              Projetos sociais…

E quando um grande astro desfalca a ópera em cima da hora e é necessário que outro medalhão o substitua? Isso também aparece no filme, de uma forma até suave, pois o substituto conseguiu ter um baita de um jogo de cintura para interagir com a equipe, tendo pouco (ou até nenhum) momento para o ensaio. Coisas do dia a dia de um teatro da magnitude da Ópera de Paris.

                        O cantor de última hora…

O jovem cantor lírico foi um momento todo especial do filme  Pudemos acompanhar a ligação onde ele ficou sabendo que havia sido escolhido pelo teatro, a sua chegada, as medidas para as roupas, sua familiarização progressiva com o idioma francês, o encontro com um grande ídolo, sua amargura ao errar um ensaio e o triunfo de um espetáculo bem sucedido. São pequenas histórias como essa que dão um sabor todo especial ao documentário.

                                                        E as bailarinas, é claro!!!!

Assim, “A Ópera de Paris” é um filmaço sobre o grande teatro francês que se torna um programa obrigatório e um filme para se ver, ter e guardar, pois mostra em detalhes o cotidiano de uma grande atração turística francesa. Programa imperdível.

Batata Movies – A Primeira Noite De Um Homem. A Sinuca De Bico De Um Jovem.

                   Cartaz do Filme

Eu nunca tinha visto “A Primeira Noite de Um Homem”, o filme que colocou Dustin Hoffman nos holofotes, com a trilha sonora imortalizada por Simon e Garfunkel. Volta e meia, a gente fica com essas lacunas vergonhosas na nossa carreira de cinéfilo e precisa tapá-las de um jeito ou de outro. Pois bem, no ano de 2017, comemorou-se os cinquenta anos do filme e foi feita uma nova restauração na película, que entrou em cartaz. Essa foi uma oportunidade de ouro para se ver o filme e eu não a perdi. Afinal, foi um filme que ganhou o Oscar de melhor diretor para Mike Nichols em 1968, e que ganhou cinco Globos de Ouro (melhor filme de comédia ou musical, melhor diretor, melhor atriz de comédia ou musical para Anne Bancroft, melhor promessa feminina para Katharine Ross e melhor promessa masculina para Dustin Hoffman).

                 um casal peculiar para sua época…

E quais são as impressões dessa película? Confesso que ela me impressionou muito, principalmente o inventivo roteiro, discutindo temas que deveriam ser grandes tabus de sua época. Como o filme tem cinquenta anos, creio que não será pecado mortal cobrir esse texto com spoilers.

Temos aqui o personagem Ben Braddock (interpretado por Hoffman), um jovem estudante que terminou sua faculdade com todos os méritos possíveis e imagináveis, sendo celebrado por pais, parentes e amigos numa festa em sua casa após sua formatura. O problema é que Ben não suportava mais tantas bajulações e se escondeu num quarto. Lá, apareceu a senhora Robinson (interpretada por Anne Bancroft), esposa do melhor amigo (e sócio) de seu pai, que lhe pediu uma carona para a sua casa. Ben atendeu ao pedido e levou a respeitável senhora para o seu lar no seu carro conversível. Lá, a senhora o convidou para entrar e tentou seduzi-lo. Ben resistiu de forma muito relutante e, por pouco não foi flagrado pelo marido da senhora Robinson. O sr. Robinson, inclusive, disse ao rapaz que ele deveria mais aproveitar a vida, não suspeitando que a esposa tinha tentado seduzir Ben. O moço acabou acatando a sugestão do sr. Robinson e tornou-se amante da senhora. Os dois ficaram meses se encontrando num quarto de hotel, até que Ben começou a querer conversar com a sra. Robinson, para conhecer mais detalhes de sua vida. Desta vez, foi a senhora Robinson que ficou relutante. A coisa esquentou quando a senhora Robinson proibiu terminantemente Ben de sair com sua filha Elaine (interpretada por Katharine Ross), que também estava de chegada para passar uns dias com os pais. O problema é que os pais de Ben viam a chegada de Elaine como uma chance de ouro de casarem os dois, o que obrigou Ben a sair com a moça, pela qual se apaixonou desesperadamente. Só que Ben teve que enfrentar a ira da sra. Robinson, que ameaçou contar todo o ocorrido à filha, que também se apaixonou por Ben. A partir daí, o filme tomou caminhos tortuosos, que trabalhavam o inusitado, o cômico e o dramático, com um desfecho muito ousado.

                                                         A senhora era de uma frieza incrível…

O que mais impressiona nesta película, em primeiro lugar, é o ousado. Vemos aqui uma relação extraconjugal entre uma mulher mais velha e um pós-adolescente virgem, numa época em que fica bem claro que os pais de uma classe média alta arranjam os casamentos dos filhos. Para piorar a situação, o rapaz ainda se apaixona pela filha de sua amante. É bem provável que esse filme tenha sido visto com reprovação por setores conservadores da época. Mas também o filme pode ter sido muito celebrado, em virtude daqueles também terem sido anos de efervescência cultural. Isso fica claro quando o homem conservador que aluga o quarto para Ben em Berkeley diz que detesta agitadores. Esse personagem, inclusive, é colocado como alívio cômico, assim como os pais de Ben, que entram numa espécie de histeria quando o moço avisa que vai casar com Elaine. Ou seja, o pensamento conservador é meio que tratado de forma ridícula e caricata no filme. Mas a grande ruptura com o pensamento conservador está mais ao final, quando Ben, depois de andar por quilômetros e quilômetros, consegue tirar Elaine do altar e fugir com ela de ônibus. Lá, pudemos ver toda a ira do conservadorismo expressos nas faces do noivo de Elaine e do casal Robinson, totalmente desmantelado pela relação extraconjugal, mas que ainda jogava as fichas da honra da família no casamento tradicional da filha com um moço de bom berço. Elaine, ao fugir do altar com Ben, destrói o último resquício de conservadorismo em nome de uma vida feliz e do amor, numa mostra de como um pensamento vanguardista pode ser piegas às vezes! De qualquer forma, ainda assim esse é o happy end que todo mundo quer ver e que funciona muito bem na película.

                                 Mas, se pressionada a falar sobre sua vida, ela desmoronava…

Em termos de atuação, esse filme se resume a dois nomes: Hoffman e Bancroft. O primeiro chega de forma avassaladora ao estrelato, dizendo firmemente ao que veio. Um ator que conseguiu ser dramático no momento certo, tímido no momento certo, explosivo no momento certo, tratando com maestria todas as matizes de sua atuação, que não foram poucas. Bancroft teve uma atuação um pouco mais plana, sem as violentas matizes que eram exigidas de Hoffman, mas seu estilo gélido em algumas horas, usando o jovem como um mero brinquedo sexual, e seu estilo agressivo, principalmente quando proibia Ben de se encontrar com Elaine, chegavam a assustar. Seu momento mais forte foi quando Elaine descobre do relacionamento de Ben com sua mãe. Lá, Bancroft deu toda uma fragilidade à sua personagem, onde, destroçada, ela dá um adeus a Ben.

                                               Um jovem casal rompendo com as convenções sociais…

Assim, “A Primeira Noite de Um Homem” é uma grande película do passado, que fez cinquenta anos em 2017 e que merece ser lembrada e celebrada como uma das joias da História do Cinema. Uma película que revela a efervescência cultural de seu tempo, desafiando parâmetros altamente conservadores, e trabalhando com o altamente inusitado. Tudo isso com uma trilha sonora magistral. Uma obra-prima.

Batata Movies – Minha Amiga Do Parque. Bebês E Solidão.

                  Cartaz do Filme

Uma co-produção argentino-uruguaia na área. “Minha Amiga do Parque”, de Ana Katz, é uma película, acima de tudo, sobre a fragilidade que a solidão impõe às pessoas. Tudo isso acompanhado de bebês, carrinhos, mamadeiras e passeios no parque.

                                               Liz, solitária e fragilizada, com seu filho…

Vemos aqui a história de Liz (interpretada por Julieta Zylberberg), uma mãe de primeira viagem que precisa cuidar de seu filho com alguns meses de vida, sozinha. Isso porque seu marido está em viagem de trabalho. O cotidiano de Liz é ficar totalmente dedicada à criação de seu filho, tendo poucas formas de companhia. Esse detalhe, mais o arrependimento que ela teve de não produzir leite para seu filho deixaram-na extremamente fragilizada. Um belo dia, Liz encontra Rosa (interpretada por Ana Katz), que também tem uma criança. Logo, as duas começam uma amizade. Mas a forma como Rosa se comporta, seja incitando Liz a sair de uma lanchonete sem pagar a conta, seja sem ter qualquer pudor de ser pidona com as coisas de Liz, seja falando um monte de mentiras, incomoda desde o primeiro instante. O filme, a partir daí, vai desenvolvendo essa ideia e a gente fica na expectativa de como Liz, fragilizada pela solidão, vai ser ou não um alvo fácil para Rosa, que parece ser, no mínimo, uma irresponsável. Ou mau-caráter mesmo…

                                                      … conhece Rosa, a amiga do Parque…

O filme, que parece ser uma historinha água com açúcar, vai paulatinamente ganhando tons dramáticos, à medida que Liz aprofunda suas relações na rua. O caminho que essas amizades tomam parece não ser o melhor, e a história vai dando sinais disso. A gente espera que Liz quebre a cara fragorosamente ao final do filme. Isso vai mesmo acontecer? Chega de tantos spoilers.

                                                             No início, tudo parece bem…

As atrizes estiveram muito bem. Julieta Zylberberg teve uma atuação cativante, sobretudo nos seus momentos de fragilidade. Ela conseguia envolver bem o espectador no clima de solidão e tristeza na qual estava metida. Já Ana Katz funcionou bem como a amiga falsa, interesseira, sonsa e irresponsável de Liz. O mais interessante é que não temos uma personagem simples e plana no caso de Rosa, sendo mais complexa até do que a própria protagonista.

   …mas, com o tempo, as coisas ficam tensas…

Mesmo que façamos algum juízo de valor sobre as personagens, o filme deixa bem claro que quer destacar as suas características humanas, mostrando não somente os defeitos, mas também as virtudes e fraquezas, sobretudo das personagens Liz e Rosa.

Assim, se “Minha Amiga do Parque” é uma película relativamente curta (cerca de 86 minutos), podemos destacar a fragilidade que a solidão impõe como tema principal, seguida pela construção das personagens, que se são marcadas inicialmente por juízos de valores, ainda assim elas são exibidas como figuras humanas com defeitos, virtudes e fragilidades. Temos uma protagonista estressada e no fio da navalha em virtude de sua solidão. E uma antagonista que, apesar de interesseira, também deixa escapar seu lado emotivo. Nada de tão pirotécnico (o desfecho da película se faz num tremendo anticlímax), num choque de realidade que elenca o humano como fator principal.

Batata Movies – Pequena Grande Vida. A Arte Da Reviravolta.

                Cartaz do Filme

Sabe quando você vê o trailer de um filme e acha que ele será apenas uma diversão média, um passatempo? E quando você vê a película, ela havia escondido o jogo e foi muito mais do que você pensou? Pois é. Essa é a impressão de “Pequena Grande Vida”, um filme que a gente pode classificar como comédia, mas também como drama, mas também como tendo uma pitada de ficção científica e de filme reflexivo. Ou seja, ele não se enquadra propriamente em nenhum gênero e, ao mesmo tempo, se enquadra em vários. Dá para perceber como tal filme é bem curioso e um tanto peculiar, perto do que se tem visto por aí.

                                                               Um casal que quer encolher…

Temos aqui a história de Paul Safranek (interpretado por Matt Damon), que testemunha, junto com a esposa Audrey (interpretada por Kristen Wiig) um revolucionário programa de encolhimento humano. Tal programa era benéfico para o encolhido que, ao ficar com apenas 12,7 cm, ele consumia muito menos que um humano comum e sua vida ficava extremamente barata. Assim, o encolhido tornava-se um milionário com uma vida totalmente idílica, sem precisar trabalhar para o resto da vida (você só trabalha se quiser). Ainda, com um consumo menor de recursos, a pessoa diminuta passa a contribuir para o meio ambiente, pois a explosão populacional esgota os recursos de nosso planeta. O casal faz um pacto e encara o processo. Mas Audrey rói as coradas e deixa Paul sozinho lá, pequenininho. Nosso protagonista vive em depressão até que seu vizinho, o extravagante sérvio Dusan (interpretado pelo sempre eficiente Christoph Waltz), dá mais uma de suas barulhentas festas e Paul, ao invés de reclamar, decide experimentar. Depois de uma noitada daquelas, ele conhece a faxineira vietnamita Ngoc Lan Tran (interpretada por Hong Chau), uma moça que vai transformar completamente sua vida. Paremos por aqui com os spoilers.

                                        Conversando com o coleguinha…

Esse filme consegue brincar muito bem com os chamados plot twists. Nosso próprio protagonista Paul, lá para o final da película, fala de como sua vida sofreu uma série de reviravoltas que ele nem acreditava que passaria se isso lhe fosse dito cerca de um ano antes (o filme tem uma série de saltos no tempo, alguns curtos, de alguns meses,  outros um tanto longos, de vários anos). Com tantas mudanças, fica até difícil para a gente classificar o filme. Como foi dito acima, ele tem caras de vários gêneros diferentes, e, por incrível que pareça, isso funciona bem, apesar de parecer inicialmente algo um tanto fragmentado, mas o fio condutor da narrativa convence e consegue amarrar bem a variedade de temas e sub-tramas que o filme oferece ao público.

                                                             Um elenco que chama o público…

É claro que o filme tem alguns chamarizes, principalmente no elenco. As presenças de Damon e Waltz já nos trailers atraem o espectador. Há até a aparição de dois atores mais conhecidos que nem foram ventiladas no trailer e são participações para lá de rápidas e especiais. Mas não vou dizer aqui quem são. Uma é muito conhecida de nós, brasileiros, ou seja, tem uma certa proximidade com a gente. Outra é de uma atriz bem conhecida que apareceu recentemente num filme que fala de uns tais jedis.

                                                 Uma vietnamita que transforma a vida de Paul…

Agora, não tenha dúvida, caro leitor. Apesar dos trunfos do elenco, o que dá realmente valor ao filme é a qualidade da história contada e as suas variações. Com tanta coisa diferente acontecendo à medida da exibição, o espectador fica com a atenção presa à tela o tempo todo. Assim, “Pequena Grande Vida” consegue ser um filme surpreendente, pois tem cara de uma diversão mais morna, mas se revela algo mais interessante do que aparenta. Vale a pena dar uma conferida.