Mais um filme que é um convite à reflexão em nossas telonas. “Uma Temporada na França” é, acima de tudo, um filme de denúncia. Um filme onde o Cinema grita com todos os seus pulmões contra as injustiças que vemos por aí. Um filme que nos envergonha como humanos.
Vemos aqui a trajetória de uma família originária da África Central, que foge de uma guerra em seu país. No meio da fuga, a mãe é assassinada. O pai e o casal de filhos consegue chegar a Paris e enfrenta todas as dificuldades de estrangeiros em solo europeu que pedem asilo político. O pai, Abbas Mahadjir (interpretado por Eriq Ebouaney), era professor em seu país natal. Agora, em Paris, ocupa o cargo de feirante. Ele vai precisar criar os dois filhos com muito jogo de cintura, pois o passado burguês da família lhe impõe certas exigências cobradas pelos filhos, como uma casa própria com um quarto para cada um. Mas tudo é muito difícil em solo estrangeiro. Abbas tem uma namorada, Carole Blaszak (interpretada por Sandrine Bonnaire) que o ajuda nas dificuldades do dia-a-dia, e também imigrante. Um terceiro amigo, o conterrâneo Etienne (interpretado por Bibi Tanga) fecha o círculo de pessoas próximas à família. Vivendo num país hostil em sua maioria das vezes, esses personagens precisarão matar um leão por dia para sobreviverem, pois a terra natal já se encontra arrasada e retornar não é uma opção.
Esse é um filme que transpira melancolia em grande parte de sua execução. A película denuncia o pouco caso das autoridades francesas com os imigrantes que querem o acolhimento do país europeu mas lhe têm as portas fechadas na maioria das vezes. O que mais dói nesse filme é um misto de indiferença e de repúdio por parte dos franceses que conseguem negar um visto de permanência a uma família que foge de uma situação de guerra e que já perdeu sua mãe. O ódio contra os imigrantes é um tempero explosivo a mais nessa química perigosa. Fica bem claro que africanos negros e muçulmanos são os que mais sofrem preconceito nessa relação entre os franceses e os imigrantes, já que a imigrante branca do leste europeu conseguiu regularizar sua situação. Tal filme tem uma importância marcante, pois se a França sofreu uma série de ataques terroristas nos últimos anos, fica a questão: até que ponto esse tratamento ríspido contra os imigrantes não produz inimigos contra a própria França? Será que uma politica mais flexível para com os imigrantes não deteria um pouco tamanha escalada de ódio? Todos nós sabemos que cada país tem seus problemas, mas não podemos nos esquecer de que todo esse contexto caótico vem da exploração imperialista sobre a África e a Ásia feita no século XIXm justamente pelas potências europeias estrangeiras. Tal cataclisma não ficaria sem consequências.
No mais, a gente precisa bater (e muito) palmas para Mahamat-Saleh Haroun, o diretor e roteirista desse filme que dá voz a um segmento excluído e marginalizado no continente europeu, que é o imigrante que foge de sua terra natal, de misérias e de guerras provocadas direta ou indiretamente pelas potências imperialistas estrangeiras e seu processo colonizatório altamente predatório.
E palmas também a um elenco que mostrou que tal situação escabrosa pode acontecer com qualquer um: eu, você, seu pai, mãe, vizinho, amigo… ou seja, qualquer pessoa que tem sua vida estável numa zona de conforto que subitamente lhe é arrancada. Um filme que choca e alerta, um filme que cumpre sua função social de denúncia. Um programa imperdível.