Dando sequência às nossas análises de episódios de “Jornada nas Estrelas Voyager”, falemos hoje de “Rumo Ao Esquecimento” (“Course: Oblivion”), décimo oitavo episódio da quinta temporada. Esse episódio tem como característica principal o fato de ser continuação do episódio “Demônio”, da quarta temporada, e que já foi analisado aqui (inclusive, essa análise deu início à nossa Seção Batata Séries).
Mas, no que consiste a história de “Rumo Ao Esquecimento”? Vemos aqui o enlace matrimonial entre Tom Paris e B’Elanna Torres. Durante a cerimônia, percebemos que o arroz jogado no casal estranhamente passa pelo chão e cai nas partes inferiores da nave. Isso está acontecendo, pois há um processo de desintegração em nível molecular de tudo e todos que estão na nave, a partir do motor de dobra. Investigações mais detalhadas levarão à conclusão de que essa não é a Voyager original, mas sim a Voyager gerada a partir da espécie biomimética do planeta classe Demônio do episódio lá da quarta temporada. Foi descoberto que a deterioração era irreversível e a única esperança da tripulação era voltar ao planeta natal. Entretanto, a cópia da capitã Janeway insistia em levar a nave para o planeta Terra, tal como faria a Janeway original. Somente depois de muitas mortes da tripulação e uma tentativa fracassada de colonizar outro planeta classe Demônio, Janeway se convenceu de que era necessário voltar ao planeta da espécie biomimética. O problema é que já era muito tarde e a Voyager biomimética acabou se destruindo, isso quando enviava um pedido de socorro à Voyager original, que casualmente passava pelas proximidades.
Esse é um episódio angustiante, pois vimos o nascimento de uma nova espécie lá na quarta temporada e agora vemos o seu fim na quinta temporada. E, para piorar a situação, quando tudo parecia perdido, a Janeway biomimética ordenou a construção de uma cápsula do tempo, onde dados de sua espécie e seus feitos ficariam registrados para a posteridade. Entretanto, a Voyager biomimética não teve êxito em ejetar a cápsula do tempo e toda a informação dessa civilização se perdeu com a explosão da nave. Assim, tivemos uma dupla catástrofe: além da extinção total da espécie, sua história, identidade e cultura foram totalmente apagadas e riscadas do mapa. Isso fatalmente nos remete ao genocídio e etnocídio de indígenas na América, talvez o exemplo concreto que mais se aproxime da situação descrita no episódio, onde tribos inteiras e suas culturas foram simplesmente riscadas do mapa e nem tivemos a oportunidade de conhecê-las.
Uma personagem chama muito a atenção nesse episódio: a Janeway biomimética. Isso acontece, pois a capitã não abre mão de retornar à Terra, além de seguir todas as prerrogativas da Federação, mesmo quando sabe que não é a Janeway original. Ou seja, na sua ânsia de cumprir seu papel mimético, ela coloca em risco a existência de toda a sua espécie, mesmo sob os apelos insistentes de Chakotay e Paris em retornar ao planeta classe Demônio. Assim, nossa capitã “de mentirinha” não vê as coisas com objetividade, saindo uma cópia mal feita da original, principalmente (e de forma muito paradoxal) quando tenta ser o mais fiel possível à capitã original.
Outro detalhe que chama a atenção é a maquiagem usada para simular o mal que acomete os tripulantes. Como se trata de algo que já tem uns vinte anos, é claro que a qualidade da coisa não está à altura da maquiagem e CGI de hoje, mas era nojento o suficiente para provocar alguma repugnância, embora também lembre o queijo derretido que a gente vê na pizza, só que meio esverdeado (argh!). Era muita pereba junta…
O final do episódio se constitui na parte mais dolorosa. Aqui, a Voyager original, sem entender muito o que aconteceu, vê os destroços da Voyager biomimética, que falhou em sua tentativa de contactar a sua irmã original. Tal imagem dá uma baita sensação de impotência do nada que pode ser feito. E do fim de uma espécie que não deixará qualquer registro.
Assim, “Rumo Ao Esquecimento” é um episódio sem “happy end”, um episódio em que a sensação ruim da perda arrebata o trekker. E, pior de tudo, a sensação de que uma civilização e cultura foram simplesmente apagadas sem deixar qualquer vestígio, que desperta a sensação mais dolorosa de todas. Um episódio que novamente traz um convite à reflexão, a partir de seus aspectos mais dolorosos. Vale a pena assisti-lo de forma conjugada ao episódio da quarta temporada.