Batata Literária – A Irmandade.

A tarde caía

Os monges andavam pelo deserto ainda quente

Logo, viria a noite

Trazendo o prenúncio da morte

O pequeno e árido planeta logo seria pulverizado

Pelo braço flamejante

Era uma remanescente de supernova

Que se aproximava rapidamente do sistema planetário

 

Tal sistema era praticamente desabitado

Só um punhado de monges exilados

Vivendo no mais rude e medíocre dos planetas

Postos ali por seu próprio povo natal

Que abraçou a ciência e aboliu a fé

Expulsando os últimos remanescentes religiosos

Os monges mantiveram sua fé a duras penas

Mas agora seriam definitivamente dizimados

 

A quinta estrela do sistema aglomerado de  Jaliel explodiu

Varrendo tudo o que vê pela frente

Os velhos monges apelaram para o Deus Kosh

Pediam a salvação de suas almas

Mas, acima de tudo, a preservação de suas vidas

Pois eram os últimos fiéis do grande Kosh e de suas palavras

Por que a irmandade remanescente

Seria ironicamente dizimada por outra remanescente?

 

Todas as noites, os monges saíam em peregrinação pelo deserto

Para encarar de frente o inimigo que vinha do céu

Perante o símbolo de grande morte

Os monges oravam a Kosh, pedindo por suas vidas

Mas a gigantesca chama se tornava cada vez maior

Banhando o céu noturno com um luminoso vermelho sangue

Trevas rubras mortais ameaçavam engolir os fiéis

Que, impassíveis, assistiam ao trágico espetáculo agarrados às suas crenças

 

Até que, um dia, a noite estava muito quente

Não estava mais escuro

Todo o céu tomado pelo rubro letal

Um calor insuportável e cheiro de morte

Nenhum sinal de Kosh e sua redenção

Os monges perdiam as esperanças…

A onda de choque já era visível,

Um véu branco, translúcido, que crescia

 

Vinha de longe, bem pequeno,

E se tornava cada vez maior,

Maior, maior, até que…

Todo o céu ficou coberto daquele véu branco,

Com o grande avermelhado por trás…

Começava a ventar…

Tempestades de areia derrubavam os monges…

Quem não havia ainda perdido os sentidos podia ver…

 

A onda de choque desabava rapidamente sobre o deserto…

Até que… uma explosão!

E tudo se silenciou…

Era o fim?

Só um véu negro e… o nada…

Parecia que muito tempo havia se passado…

Uma eternidade, talvez…

Mas eis que, de repente, surge uma luz…

 

Os monges ainda estão todos lá

E caminham em direção à luz

Chegando a ela, encontram uma silhueta

Era Kosh!

“Venham meus filhos”, disse o Deus, “Agora vocês levarão minha palavra a toda Jaliel”

“Vocês viajarão mais rápido que o pensamento

E estarão em todos os corações e mentes

Conciliando a fé com a razão”.

Batata Movies – Lámen Shop. Unindo Culturas E Famílias Pela Gastronomia.

Cartaz do Filme

Um interessante co-produção Singapura/Japão/França. “Lámen Shop”, de Eric Khoo, é um filme sobre culinária oriental e encontros. Uma doce e fofa película que fala, também, da família de forma muito terna. Mas que também pode desenterrar sérias feridas do passado. Falemos, agora, desse filme, sempre lembrando que usaremos spoilers aqui.

Um restaurante lámen…

Vemos aqui a história de Masato (interpretado por Takumi Saito), um rapaz que trabalha com seu pai num restaurante lámen no Japão. Aqui no Brasil o termo lámen foi ridicularizado como miojo, aquele macarrãozinho barato com o maldito tempero que é uma sopa de química pura e que a gente come quando está sem grana. No Japão, ele era visto como um mero “macarrão chinês”, mas pouco a pouco ele foi se introjetando na culinária local ao ponto de se tornar um prato muito conhecido e restaurantes especializados em pratos com lámen proliferarem pelo país. Mas, voltando ao nosso protagonista, Masato tem uma relação distante e fria com o seu pai, um homem amargurado desde a perda da esposa. Um dia, o pai de Masato falece e, ao mexer em suas lembranças, ele vê muitas coisas de sua mãe, inclusive um caderno todo escrito em mandarim por ela, uma língua que Masato não conhece.

Masato, um rapaz em busca de seu passado…

O rapaz tem vagas lembranças de sua estadia com a mãe em Singapura. E aí, ele decide procurar seu tio nesse país. Lá, ele consegue achar o tio e lhe pede para ensinar o prato típico da região, o Bak kut teh. Masato troca figurinhas com os chefs locais, ensinando sopas e lámens, enquanto aprende a culinária de Singapura. Mas, o que parece uma idílica farra gastronômica asiática também tem seus dissabores. A avó de Masato não quer conhecê-lo, pois ele é de origem japonesa e Singapura foi invadida pelo Japão em 1942, quando seu marido foi assassinado pelos nipônicos. Masato, então, terá um certo trabalho para se aproximar de sua avó.

Masato faz uma viagem…

Apesar do clima de tensão entre Masato e sua avó, boa parte do filme se passa em brancas nuvens, com relações muito ternas entre os personagens e as receitas orientais sempre cimentando tais relações. Os atores trabalharam de forma muito suave e deu gosto de ver o trabalho de todo o elenco. Já a lembrança do ataque japonês, que era a potência imperialista da região, foi muito oportuna e pertinente, ainda mais porque tal beligerância era o fator que partia a família e trazia dor aos seus membros. E qual foi a melhor forma de combater isso? Isso mesmo, caro leitor! Com a comida! Assim como o lámen era uma comida que, pouco a pouco conquistou o público médio japonês, o Bak kut teh era uma comida das classes menos favorecidas em Singapura e se tornou uma espécie de ícone nacional (tal como a nossa feijoada por aqui). Esses dois pratos se tornaram uma espécie de embaixadores das duas culturas para promover o entendimento entre os povos do Japão e de Singapura, estancando as feridas do passado. São as duas culturas outrora inimigas voltando a interagir através da gastronomia.

Aprendendo novos pratos com o tio…

Assim, “Lámen Shop” é um filmaço sobre o entendimento e a tolerância entre duas culturas. Um filme de atuações muito suaves e cativantes. E um filme de dar água na boca (toda a comida que vemos lá parece ser muito gostosa!). Um programa imperdível.

Batata Movies – Buscando… Sulu Stalkeando.

Cartaz do Filme

Um curioso filme vindo lá dos lados dos Estados Unidos. “Buscando…” é uma película que propõe trabalhar o gênero de suspense com uma temática muito atual atrelada à internet e às redes sociais. Com isso, o filme vai lançar mão de uma estética pouco usual: ele se passa totalmente dentro de uma tela de computador, como se o espectador estivesse sentado à própria máquina.

Um pai cheio de problemas…

Vemos aqui a história de uma família, destroçada por uma doença. Um pai, David Kim (interpretado pelo “Sulu” John Cho), a mãe Pamela (interpretada por Sara Sohn) e a filha Margot (interpretada na adolescência por Michelle La). Pamela morrerá de câncer, deixando pai e filha sozinhos. Um belo dia, Margot diz que vai passar a noite na casa de amigos para estudar para uma prova e… desaparece, deixando David atordoado.

Stalkeando tudo o que pode para encontrar sua filha…

Ele entra em contato com a polícia e vai contar com a ajuda da investigadora Vick (interpretada por Debra Messing) para encontrar sua filha. Enquanto a policial faz as investigações de campo, David segue plugado no seu PC e no de sua filha stalkeando tudo o que vê pela frente para encontrar pistas do paradeiro de Margot. E aí, uma trama de suspense é desenhada.

Onde está a moça???

A grande atração do filme é justamente essa estética baseada no que a gente vê nas telas de computador por aí, com direito a muitas consultas no Google ou conversas no whatsapp. Mas nada disso seria de muita serventia se não houvesse um roteiro bem escrito aqui. A história prende a atenção do espectador do início ao fim, mesmo que alguns possam achar o desfecho um pouco óbvio. De qualquer forma, a investigação das pistas pode assumir caminhos tortuosos, onde problemas muito contemporâneos tais como notícias e perfis fakes levam a perseguição de pistas erradas, introduzindo um elemento relativamente novo nessa proposta de suspense, o que ajuda a tornar a história ainda mais interessante.

Até memórias de um passado distante cabem na tela de um computador…

Com relação aos atores, não há muito o que dizer. Nada de medalhões. O único ator que chama mais a atenção é John Cho, que interpreta o protagonista David Kim, e ainda sim porque ele é conhecido por ser o Sulu do “Star Trek de J. J. Abrams”. Pelo menos foi legal o ator ter a oportunidade de mostrar o seu talento num personagem que passa por várias situações espinhosas, como a perda da esposa e o sumiço da filha, embora sua atuação, se não comprometeu, também não teve nada de muito espetacular.

Identidades fakes…

Assim, “Buscando…” é uma boa história de suspense, que consegue prender a atenção do espectador por despertar grande curiosidade. A gente tem a oportunidade de ver um gênero tão usado no cinema lançando mão de uma nova roupagem, que é o meio cibernético, trazendo elementos novos para a construção da narrativa como os perfis e notícias fakes. E um filme que mostra de forma definitiva como é o exercício de se stalkear tudo o que se vê pela frente. Vale a pena pelo roteiro e pela curiosidade.

Batata Movies – Missão Impossível, Efeito Fallout. Mais Um Bom Filme Da Franquia.

Cartaz do Filme

Sempre gostei muito de “Missão Impossível”. Nunca tive muita oportunidade de assistir a série antiga, mas gosto dos filmes do Tom Cruise, principalmente porque ele dispensa dublês para fazer as cenas de ação. Isso sem falar de que os roteiros sempre são bem escritos, não se apoiando somente nas espetaculares cenas de ação. E, desta vez, não foi diferente a meu ver. “Missão Impossível, Efeito Fallout” traz todos esses ingredientes de forma bem organizada e construída. Mais um bom “Missão Impossível”.

Eles estão de volta!!!

Nessa nova aventura de Ethan Hunt (interpretado por Cruise), ele precisa evitar que cargas de plutônio caiam nas mãos de um grupo terrorista. O problema é que, ao tentar fazer isso, ele acabou, como se diz no popular, “dando mole” e deixou justamente tal carga no colo de pessoas que podem vendê-la para terroristas. Tudo isso porque ele preferiu salvar a vida de seus dois fiéis escudeiros – Benji (interpretado por Simon Pegg) e Luther (interpretado por Ving Rhames) – ao invés de deixá-los ir para o sacrifício, como o protocolo exige em caso de falhas na missão. Assim, Hunt precisa, agora, correr atrás do prejuízo. Mas sua falha fará com que ele seja acompanhado pelo agente Walker (interpretado pelo “Superman” Henry Cavill que, além do bigode, agora está de barba também). E aí, tome cenas de ação mas também uma história muito bem elaborada, que precisa bastante da atenção do espectador e que os spoilers me impedem de entrar em maiores detalhes.

Hunt dá mole ao salvar os amigos…

Um dos grandes baratos desse filme é a presença de muitos “plot twists”, onde havia sequências com muitas reviravoltas. Isso já aconteceu em outras oportunidades e a coisa de se usar aquela máscara ajuda em muito nisso. Agora, parece que nesse filme tivemos a maior quantidade de reviravoltas em toda a franquia. A cada segundo, mocinho virava bandido e vice-versa.

Contracenando com Cavill (olha o bigode aí)…

Tudo que parecia ser uma coisa num momento era outra num momento seguinte, onde a narrativa fazia um verdadeiro jogo de gato e rato com a mente do espectador. A história também passou por situações muito extremas e impossíveis, onde o próprio Hunt não sabia se ia conseguir resolvê-las, dando como resposta um “não sei, eu dou um jeito”, cheio de dúvidas quando interpelado se ia conseguir dar cabo da situação ou não. E. claro, os plot twists também deram o ar de sua graça aqui.

O filme só tem mulherão…

Outra coisa muito boa no filme foram as locações. As sequências em Paris tiveram um charme todo especial, onde pontos turísticos como o Opera e o Arco do Triunfo tiveram seu dia de estrela de Hollywood. A sequência de perseguição em Londres teve adicionada uma componente de humor que caiu como uma luva.

Mais uma vez as motos nas cenas de ação…

Esse também é um filme de boas atuações e personagens. Além dos já citados, tivemos as gratas presenças de Alec Baldwin, Angela Bassett, Rebecca Ferguson e Sean Harris, na volta do terrorista Lane, um vilão usado de forma muito sábia ao longo da franquia.

Momentos de descontração nas filmagens…

Assim, “Missão Impossível, Efeito Fallout” é mais uma boa amostra dessa franquia que realmente deu certo, pois sempre apresenta bons filmes com boas cenas de ação, boas tramas, bons personagens e bons atores. Por hora, creio que há mais espaços para continuações, pois o modelo não parece mostrar sinais de desgaste. E um programa obrigatório para quem gosta de cinema como entretenimento, mas também como bom cinema.

Batata Movies – Sonata De Outono. Uma Experiência Arrebatadora.

 

Cartaz do Filme

No ano do centenário do lendário cineasta sueco Ingmar Bergman, o Espaço Itaú de Cinema realizou, ao mês de setembro último, uma pequena mostra para homenagear esse importante nome do Cinema Mundial. E aí, pintou uma oportunidade para assistir a “Sonata de Outono”, um filme que sempre tive curiosidade de assistir. Confesso que vi poucos filmes do cineasta (ele tem cerca de setenta filmes, fora os trabalhos para teatro e para a TV sueca) e preciso preencher essa lacuna. Mas, por que o meu interesse especial por “Sonata de Outono”? Eu li, há alguns anos, o famoso livro de Liv Ullmann, “Mutações”. Ullmann foi um dos muitos casos de Bergman que, apesar de seu talento mundialmente reconhecido, não era lá uma figura muito fácil em termos de relacionamento humano, como o próprio cineasta reconhecia. E, quando vemos Ullmann se expressar, parece que ela é demasiadamente sensível perto do gélido temperamento nórdico, passando sempre para a gente uma sensação de fragilidade e de sentimentalismo muito grande. Pois bem, ao ler “Mutações”, a gente vê que Ullmann se lembra de forma muito especial de sua relação com Ingrid Bergman em “Sonata de Outono”, onde atores e personagens meio que se fundiram ali.

Eva, uma filha insegura…

Ou seja, as duas atrizes ficaram realmente marcadas por todo o sofrimento de suas personagens e ainda tinha o agravante de que Ingrid Bergman já padecia de um câncer no seio na ocasião. Ullmann falava de um sentimento maternal que nutria por Ingrid Bergman e de como vestiu a camisa da opressão maternal que sua personagem Eva sentia. Outro detalhe muito marcante de “Sonata de Outono” é que temos a oportunidade de ver Ingmar Bergman dirigir Ingrid Bergman, a mítica atriz de “Casablanca”. Confesso que lá nos idos de minha adolescência cheguei a confundir os dois artistas em um só.

Charlotte, a mãe determinada…

Mas, como é a história de “Sonata de Outono”? A trama é bem simples. Uma filha, Eva (interpretada por Ullmann), recebe em sua casa a mãe, uma renomada pianista, Charlotte (interpretada por Ingrid Bergman). Mas a artista não sabe que Eva também abriga a sua irmã, Helena (interpretada por Lena Nyman), que sofre de problemas motores, algo que angustia Charlotte. Pouco a pouco, Eva e Charlotte vão revolvendo o passado e o que parecia, num primeiro momento, uma relação cordial entre mãe e filha vai revelando camadas de muito ressentimento e até de ódio.

Helena, a filha adoecida…

É um filme pesado e assisti-lo torna-se uma experiência arrebatadora. Temos uma oposição inicial filha frágil e insegura X mãe autossuficiente e determinada onde, pouco a pouco, os papéis se invertem. Eva passa a ser implacável e cruel, não perdoando as constantes viagens da mãe nos tempos de infância e a aparente indiferença de seus sentimentos para com a filha. Ao mesmo tempo, Charlotte deixa de ser a mulher forte e determinada para revelar toda uma fragilidade que vinha também de um relacionamento mal resolvido com sua mãe, onde ela também padecia da indiferença. Ou seja, a gente tem repetições de uma mesma situação de loops de indiferenças maternas que assolavam psicologicamente as filhas. Só que no caso de Charlotte e Eva, temos o agravante de Helena, onde fica citado no filme que a doença da moça também é provocada, de uma certa forma, pelo comportamento da mãe. Aliás, é de Helena o mais terrível grito de angústia do filme, próximo ao seu desfecho que, ao contrário do que pode parecer em toda a película, traz um vento de esperança que substitui a letargia de uma melancolia que a gente vê ao longo da exibição, melancolia essa sacudida nos momentos mais tensos entre Eva e Charlotte.

Lágrimas, muitas lágrimas…

Do ponto de vista técnico, uma coisa chama muito a atenção: o uso dos closes como instrumento dramático. Ver Ullmann e Bergman e suas faces ocupando toda a tela com olhos que se marejavam nas frontes petrificadas (acho muito forte a interpretação onde o ator faz lágrimas brotarem de seus olhos sem qualquer desfiguração da face) era algo de grande impacto.

Um trio da pesada…

E, cá para nós, o close de Ullmann olhando a mãe tocando piano talvez seja um dos mais icônicos e definitivos da História do Cinema, onde a jovem atriz dá a sua personagem toda uma insegurança e fragilidade perante a figura monumentalizada da mãe, que toca a peça com uma indiferença de frieza muito intensa.

Um dos maiores closes da História do Cinema…

Assim, “Sonata de Outono” é um grande momento da História do Cinema, pois traz um excelente roteiro interpretado de forma magistral por uma jovem atriz e uma diva do Cinema Mundial, tudo isso sob a batuta de um dos maiores diretores de cinema de todos os tempos. É um clássico para ver, ter e guardar.