Batata Literária – Fada Safada E A Promoção Do Supermercado.

– Fadinha! Fadinha!

– O que foi, amozinho?

– Vamos dar uma saída!

– Para onde?

– Tem promoção de aniversário no supermercado!

– Ai, amozinho! De novo aquela loucura?

– Vamos lá! Vamos lá!

– Justamente agora que eu tava fazendo a unha?

– Entra aqui no bolso da minha camisa! Vamos!

 

*          *          *

 

– Nossa, amo!

– O que foi?

– O estacionamento tá muito cheio!

– Tem uma vaga lá, ó!

– Lá não pode, é de deficiente

– Ah, a gente para rapidinho!

– Amooooo…

– Tá, tá. E aquela ali?

– É de idoso…

– Caramba.

– Olha lá! Tem uma moça saindo ali…

– Vamos lá

– Ih, um moço tá indo para lá também…

– Eu vi primeiro…

– Amozinho, não vai brigar…

 

*          *          *

 

– Filha da puta! Eu vi a vaga primeiro!

– Vai tomar no cu!!!

– Vai se fuder, caralho! Vou te dar porrada!!!

– Ai, minha Nossa Senhora das Fadas Aflitas!!! Quanta testosterona boba!!!

PLOFT!

 

*          *          *

 

– Amozinho, eu falei para você não brigar…

– E não briguei, fofinha… só estava falando amorosamente com o rapaz usando palavras chulazinhas…

– Será que ele achou uma vaga na rua?

– Achou sim, meu amor! Ele estacionou lá do outro lado da rua e pagou ao flanelinhazinho…

– Ai, você está meloso demais até para mim! Eu trouxe as bombas nível 13. Deixa eu cortar esse efeito um pouco (splect!)

– Ufff, mas a bomba nível treze não é para guerra internacional severa?

– Essa mesma

– E por que você trouxe essa tão forte?

– Você acha que promoção de supermercado é o que?

– Tá bom, vamos comprar as coisas logo, Deixa eu ver a lista aqui…

 

*          *          *

 

– Detergente, desodorante, Dermacyd, Carefree…

– O Carefree é tamanho mínimo, tá?

– Você não gosta de Sempre Livre proteção tripla? É mais garantido…

– Só se eu estiver num navio afundando e eu precisar de um bote salva vidas, né? Olha o meu tamanho…

– Você está malcriada, fadinha!

– Você sabe que o proteção tripla não cabe nas minhas perninhas, mesmo quando eu o diminuo ao nível mínimo…

– Tá bom, tá bom…

– GRANDE PROMOÇÃO DE NUTELLA 500g A APENAS UM E NOVENTA E NOVE!!! VAI LÁÁÁÁÁÁÁ!!!

– Oba! Escutou isso, fadinha???

– Mas amo, Nutella não tem na lista. A gente ainda tem um pouco em casa…

– Vamu lá! Vamu lá!

– Amozinho!!!

 

*          *          *

 

– Amozinho! Tem gente demais!!!

– Eu vou entrar no bolo!

– Não, amozinho! Tem aquelas velhinhas lá batendo em todo mundo!

– Fui!!!

– Não, amozinho!!!

 

*          *          *

 

– Ai, minha deusa Faduxita! O amo tá lá dentro apanhando muito!!! Eu não tenho força para tirar ele de lá! Nem as bombas nível treze resolvem essa ânsia por Nutella barata!!! O que eu vou fazer??? Ah, já sei!!! Preciso de reforços!!!

 

*          *          *

 

– Ah, eu sabia que na parte infantil eu ia encontrar o que precisava!!! Unicórnios nas embalagens de fraldas e pastas de dente!!! Vão ser eles mesmos!!!

PLOFT!!!

 

*          *          *

 

– Soldadinhos do amor!!!! Sentido!!!!

– Rinch! Rinch!

– Vão até a baia de Nutella e lambam os rostos de todos aqueles bobos!

– Rinch! Rinch!

 

*         *          *

 

– Ai, ui, ai…

– Tá melhor, amozinho?

– Acho… que… sim…

– Eu te falei que isso aqui é uma loucura. Mas você não me escuta…

– O que aconteceu???

– Lembra das velhinhas?

– Lembro…

– Cinco vieram para cima de você… três te ergueram no ar e duas batiam em você com uma bolsa cheia de latas de leite condensado e uma bolsa cheia de batatas…

– Elma Chips???

– Não, amozinho!!! Cruas! Cruas!

– E como você me tirou de lá?

– O ódio estava muito forte. Precisei chamar reforços…

– Mas, quem… aaarrrrrggghhhhhhh!!!!!

– Rinch!

– Fiz um exército de unicórnios para te tirar da confusão! Eles lamberam a cara de todo mundo e as pessoas ficaram calminhas…

– Como você fez isso?

– Rinch!

– Eu tirei eles das embalagens de fraldas e pastas de dentes da seção infantil

– E agora todos eles ficarão espalhados pelo supermercado???

– Rinch!

– Quando o efeito da magia passar, vai ficar um monte de pasta de dente e de fralda espalhadas por aí…

– Ai, me ajuda a levantar…

– Vamos direto para o caixa agora e sem conversa!!!

– Mas, e a lista?

– Os unicórnios já pegaram tudo! Só vamos comprar muita pilha agora que estou começando a ficar com raiva aqui e isso não é bom…

– Rinch!

 

*          *          *

 

– Aqui, fadinha!!! Pilhas à milanesa!!!

– Oba! Obrigado, amozinho! Chomp, chomp!

– Eu… quero te pedir desculpas…

– Tem que pedir mesmo…

– Eu… fui muito burro hoje…

– Foi mesmo…

– Ah, fadinha… é porque eu gosto muito de Nutella e tava baratinho…

– Eu sei, amozinho, mas tava muito perigoso lá. Aquelas velhinhas…

– Tá bom, tá bom… foi mal…

– Eu… tenho uma surpresa para você…

– O que? Nossa!!! Dez potes de Nutella! Oba!!!

– Gostou?

– Adorei! Obrigado, fadinha! CHUAC!!! CHUAC!!! Mas, como você conseguiu?

– Enquanto os unicórnios lambiam todo mundo, eu peguei e coloquei no meu decotinho mágico…

– Mas, você… furtou?

– Claro que não, amozinho!!! Eu paguei!!!

– Mas, como, se o cartão tava comigo?

– Bitcoins…

– Bit… o que?

– Deixa para lá, amozinho, depois te explico!!!

– Só uma coisa, fadinha…

– O que foi, amozinho?

– Acho que você se esqueceu da pasta de dente…

– RINCH! RINCH! RINCH! RINCH! RINCH!

– Não me esqueci não…

Batata Movies – O Amante Duplo. E Uma Doidona Tripla.

Cartaz do Filme

Mais um curioso filme francês (em co-produção com a Bélgica). “O Amante Duplo”, de François Ozon, é um daqueles filmes onde temos vários plots twists de gêneros. Se a coisa inicialmente parece um dramalhão psicológico, com o tempo a película toma contornos de um thriller pesado, voltando a algo mais psicológico num final um tanto óbvio.

Uma mulher que encontra um grande amor…

Vemos aqui a história de Chloé (interpretada por Marine Vacth), uma moça atormentada que tem problemas de saúde por se alimentar mal. A ginecologista que a atende indica um psicólogo e Chloé vai se consultar nele. Seu nome é Paul (interpretado por Jérémie Renier) e, depois de algumas sessões, os dois se apaixonam e vão morar juntos. O que parecia ser a realização de um sonho de um relacionamento estável acaba se tornando uma rotina tediosa para Chloé, que vê o seu amado na rua com outra. Depois de interpelar Paul, Chloé, tomada pelo ciúme, escuta dele que ela somente viu alguém parecido. A moça vai ao local e descobre que há outro psicólogo trabalhando lá, com o mesmo sobrenome de Paul. Ela marca uma consulta e descobre que esse psicólogo é irmão gêmeo de Paul, Louis, e se comporta de forma completamente diferente. Enquanto Paul é pacato e doce, Louis é agressivo e arrogante, tendo um maior apetite sexual e satisfazendo Chloé nesse quesito, o que provoca o envolvimento da moça com Louis. Vai começar aqui um jogo de gato e rato, onde a vida pregressa desses dois irmãos tem várias surpresas, a imensa maioria delas totalmente desagradável.

Mas há um irmão gêmeo bem mordaz…

O grande lance desse filme é o quebra-cabeça que Chloé busca desvendar, gerado pelo relacionamento dela com esses dois irmãos. Além do fato que a moça está fortemente abalada psicologicamente, a forma agressiva e pouco cortês de Louis assusta Chloé que, entretanto, não age como uma vítima frágil e entra de cabeça em toda essa turbulência. À medida que essa história vai se tornando mais e mais complexa, fica mais claro como o filme terminará e algumas sequências dão o tom disso quando analisamos as imagens. Mas não vou entrar em maiores detalhes sobre isso, pois seria não um spoiler do filme, mas o spoiler do filme.

Uma conversa bem à vontade…

É uma película um pouco difícil de assimilar em virtude da agressividade e crueza de algumas cenas dentre elas, cenas de sexo não consentido (leia-se estupro) tapas, socos, um feto saindo da barriga de Chloé como um alien (argh!) ou a história (sinistra, por sinal) do corpo de uma pessoa assimilar o feto do que poderia ter sido o seu irmão gêmeo, além de uma moça em estado vegetativo em cima de uma cama. Todas essas cenas estão mais na fase de suspense da película, quando a narrativa fica muito pesada.

Momentos de delicadeza…

Os atores foram muito bem. Marine Vacth, a atriz que interpretou Chloé, conseguiu passar fragilidade, mas também uma boa dose de animosidade quando se relacionava com Louis. Tivemos a grata surpresa de ver, em alguns poucos momentos, Jacqueline Bisset de volta, como a mãe de Chloé. Mas o grande nome do filme foi Jérémie Renier, que teve que fazer dois irmãos de comportamentos totalmente diferentes, sendo, com certeza, o ator mais exigido no filme.

… e tudo parecia ir bem, entretanto…

Assim, “O Amante Duplo” é uma história que combina um drama psicológico leve com um pesado thriller e que tem um final óbvio. É um filme onde as atuações dos atores têm um papel fundamental e eles corresponderam, sobretudo Jérémie Renier. E um filme que, na sua fase inicial e mais leve, trabalhou bem os closes, para dar um tom mais intimista aos bem construídos personagens. Vale a pena você se encucar com essa película.

Batata Movies – Uma Noite De Doze Anos. Vamos Juntos Para A Prisão?

Cartaz do Filme

Uma co-produção Uruguai/Argentina/Espanha. “Uma Noite de Doze Anos”, de Álvaro Brechner, é mais um filme que aborda o período das ditaduras militares latino-americanas, tendo agora como foco o que aconteceu no Uruguai. A temática é muito simples. Depois de uma tentativa de ataque do movimento Tupamaro, onde figuras importantes do governo uruguaio foram mortas, o exército partiu com tudo para cima dos guerrilheiros, desbaratando o movimento com mortes violentas e prisões.

O desespero de se estar na prisão…

Alguns desses presos ficaram na condição de reféns do Estado, sendo transferidos para lá e para cá, num período de doze anos (de 1973 a 1985). O filme mostra a trajetória de três desses reféns no cárcere: José Pepe Mujica (interpretado por Antonio de la Torre), que seria no futuro o presidente do Uruguai; Mauricio Rosencof (interpretado por Chino Darín, o filho de Ricardo Darín), jornalista e escritor; e Eleuterio Fernández Huidobro (interpretado por Alfonso Tort), ex-ministro da defesa. Por durante os 122 minutos da película, esses três prisioneiros são continuamente transferidos de um quartel para outro, ficando nas mais diferentes prisões, sempre em condições subumanas e sempre muito maltratados pelos militares.

Poucos momentos juntos…

Era clara a intenção dos militares de colocar os presos na situação mais degradante possível, com o objetivo de levá-los à loucura, o que quase aconteceu justamente com Pepe Mujica, não fosse a intervenção de sua mãe em uma das visitas, que chamou a atenção para o plano dos militares e pediu ao filho que resistisse a qualquer custo. A propósito da situação de quase loucura de Mujica, deve-se abrir aqui um pequeno parênteses: quando vemos um filme que fala dos horrores da ditadura militar, a gente espera uma narrativa um pouco mais precisa, no sentido de que relate de forma objetiva todos os horrores aos quais os presos políticos foram submetidos.

Poucos sopros de liberdade…

O filme até começa dessa forma, mas quando se chegou ao momento com Mujica, seus devaneios e delírios tornaram a narrativa surreal, o que tirou um pouco da objetividade de se contar a história. Pelo menos, tais delírios nos deram a oportunidade de resgatar algumas passagens anteriores em flash-back. Se bem que o flash-back também foi utilizado quando o personagem Eleuterio estava em foco na história. Já Rosencof teve uma característica interessante: por ser escritor, ele consegue ficar amigo de um sargento que quer escrever uma carta para a mulher pela qual ele está apaixonado e passa a ter (poucas) regalias.

Eleuterio Huidobro

De qualquer forma, o isolamento dos personagens é notório e eles ficam anos sem se ver, se comunicando volta e meia dando pequenos socos nas paredes da prisão quando estavam encarcerados perto uns dos outros. Creio que os socos reproduziam código morse.

Mauricio Rosencof

Ao se mostrar a rotina dos presos, o espectador experimenta a rotina de também estar enclausurado e incomunicável, alheio às mudanças que ocorreram ao longo dos doze anos de prisão, salvo em situações muito peculiares, onde nossos três personagens tiveram pouquíssimo acesso ao mundo exterior e a o que acontecia. O próprio Mujica reclamava não ver uma mulher ou ler um livro há anos.

José Pepe Mujica, o presidente mais fofo do mundo!!!

Outro detalhe deve ser mencionado aqui: a participação especial de César Troncoso, astro do cinema uruguaio, como o militar que mantém os protagonistas na prisão. Infelizmente, sua participação foi muito pouca, atuando mais como um coadjuvante de luxo, sempre nos lembrando de seu talento nas poucas vezes em que aparecia.

O diretor Álvaro Brechner orienta seu elenco…

Assim, “Uma Noite Em Doze Anos” é mais um filme importantíssimo para os tempos nebulosos em que vivemos, devendo ser muito divulgado e, principalmente, visto. Ao se analisar a rotina de três presos políticos, o espectador se vê na situação claustrofóbica de ficar isolado do mundo e ser sujeito seguidamente a humilhações e violações de seus direitos humanos. Ou seja, o filme realmente te coloca na situação para você experimentá-la. Daí a sua força e seu poder de denúncia, fazendo o cinema cumprir sua função social. Um programa imperdível que traz um convite à reflexão.

Batata Movies – O Orgulho. Uma Estranha Forma De Se Relacionar.

Cartaz do Filme

A figura do advogado e da instituição do direito sempre foi vista com uma certa desconfiança. Volta e meia rola uma piadinha de advogado aqui, uma história complicada sobre a forma como um juiz deu uma sentença ali, recentemente, o judiciário de nosso país tem sido muito criticado por certas decisões tomadas e por aí vai. Lanço mão desse pequeno preâmbulo para justamente contextualizar o filme que será analisado aqui hoje, “O Orgulho”, uma produção franco-belga que traz o consagrado e sempre eficiente Daniel Auteuil e a grata surpresa Camélia Jordana. Esse filme fala sobre a retórica dos advogados, apresentada aqui de uma forma, no mínimo estranha para nosso inocente senso comum.Vamos, mais uma vez, ter que lançar mão dos spoilers aqui.

Uma dupla improvável…

Neïla Salah (interpretada por Jordana) é uma moça de origem argelina que tem origem humilde e decide empreender a carreira de advogada. Mas no primeiro dia de aula ela chega atrasada e, perante um grande anfiteatro lotado, é humilhada pelo professor Pierre Mazard (interpretado por Auteuil), inclusive com frases de conotação racista. Os alunos denunciam o professor, que já tem um histórico de muitas confusões por sua rispidez e, dessa vez, não tem jeito, será submetido a um conselho disciplinar. O diretor da Universidade sugere então a Mazard que, para limpar um pouco a sua barra, ele treine Neïla para um concurso de retórica que a Universidade já não ganha há muito tempo. A contragosto, Mazard irá levar a cabo a tarefa, para o estranhamento de Neïla. Será daí que surgirá uma forma dos dois chegarem à amizade.

Humilhação e racismo

Meio clichê, não?  O problema foi como se estabeleceu o relacionamento entre os dois. Mazard continua sendo ríspido com a moça e ainda assim ela o aceita, já que ele a convence que essa rispidez faz parte da própria retórica do direito e se indignar com a mesma seria algo, digamos, patético e infantil. Ao naturalizar tal tratamento pesado como uma espécie de regra geral do direito, a coisa fica um tanto quanto estranha. É claro que o treinamento não ficou só nisso. Ela aprendeu várias técnicas de persuasão inspiradas em Schopenhauer, que se revelaram muito úteis. O problema é que havia coisas consideradas um tanto belicosas como, por exemplo, a parte em que Mazard ensina uma técnica de persuasão que consiste em ofender ostensivamente o seu antagonista. Foi uma série de xingamentos mútuos que eram engraçados mas ainda assim estranhos, embora a gente até entenda que o advogado tem que ter muito jogo de cintura para persuadir, sendo racional e com muito tato no momento certo, mas também muito firme quando se precisa. Creio que o problema de todo o estranhamento provocado por tais práticas é que a componente polêmica do racismo e da imigração entram no discurso, e tais coisas têm provocado muitos problemas na Europa, inclusive atentados terroristas, parecendo pouco adequado abordá-las da forma que vimos, constituindo-se numa química que pode até ser meio perigosa. Não que eu censure o filme, mas a autocrítica às vezes precisa ser usada um pouco, já que vivemos tempos um tanto difíceis.

Um clima pesado…

Entretanto, se houve essa química perigosa, também rolou uma boa química entre os atores que fizeram os papéis protagonistas. Auteuil dispensa apresentações e foi odioso em todo o seu esplendor, mas também desperta muita comoção ao se relacionar com a sua estudante, sobretudo nas cenas do metrô, as mais deliciosas do filme. Agora, que grata surpresa foi Camélia Jordana! Ela é profundamente apaixonante e esteve à altura de Auteuil de forma notável, não deixando a peteca cair em nenhum momento. Parecia que ela já tinha anos e anos de carreira e sua presença é muito marcante. A gente entra no cinema sem saber quem é a moça e sai fã incondicional e ansioso por vê-la no seu próximo filme, dada a forma impactante como atua.

Curso de retórica. Retratação…

Assim, “O Orgulho” a princípio pode parecer um filme clichê sobre o professor que transforma a vida da aluninha, mas o problema é que essa transformação se faz de uma maneira um tanto inusitada, envolvendo elementos como os problemas da imigração e do racismo na Europa, trazendo aí uma componente um tanto explosiva, mas ainda assim original. Pudemos também matar a saudade de Auteuil. Mas o grande mérito foi apresentar Camélia Jordana em nossas telonas num papel de impacto. Surge uma nova estrela que, espero, brilhe muito ainda. Vale a pena dar uma conferida.

Batata Movies – O Banquete. Decadence Sans Elegance.

Cartaz do Filme

Um filme brasileiro muito tenso e doloroso. “O Banquete”, de Daniela Thomas, é um filme sobre a condição humana e todo um maquiavelismo (no mau sentido da palavra) envolvido. É uma película que mostra até onde as pessoas podem chegar quando elas atacam outras. É um filme que mostra quanto o humano pode ter um comportamento degradante e revoltante.

Uma mesa muito sinistra…

A história do filme é relativamente simples. Um jantar, promovido por Nora (interpretada por Drica Morais) e seu marido (interpretado por Caco Ciocler) tem como objetivo comemorar os dez anos de casamento de dois amigos, Mauro (interpretado por Rodrigo Bolzan) e Bia (interpretada por Mariana Lima). O jantar terá outros convidados. Mas antes mesmo de todos os convidados chegarem, já percebemos que as coisas não vão muito bem. O casal anfitrião já briga, com o marido bêbado e a esposa dizendo que ele fez uma imensa besteira que destruiu suas vidas.

A anfitriã…

À medida que os convidados chegam, o clima somente piora, com todos em volta da mesa ricamente adornada, lançando indiretas e fazendo uma série de comentários cada vez mais ácidos e cínicos com o passar da noite, regada a muita bebida. Paulatinamente, o cinismo passa para observações mais agressivas e, quando chegamos ao auge desse lamentável espetáculo, as agressões verbais e até físicas é que dão o mote da coisa. Esse grupo de pessoas está entrelaçado emocional e profissionalmente. E todo e qualquer motivo, seja ele emocional ou profissional, é legítimo para atacar o outro.

Um garçom que também se envolve…

O histórico de entrelaçamento dessas pessoas nunca fica totalmente desvelado para o espectador, que deve se contentar com fragmentos aqui e ali. Mas isso não prejudica a gradativa torrente de agressividade entre os membros do banquete. Outra coisa que chama a atenção é o seu pano de fundo: estamos em plena época da presidência de Fernando Collor de Mello e um artigo de Mauro contra o presidente o levará para a prisão, já que ainda vigora a lei de imprensa da época da ditadura militar.

Um jornalista que irá preso…

Mas esse é somente um elemento que vai acrescentar mais tensão a algo extremamente já tenso, que é o relacionamento venenoso entre os “amigos” de longa data. O filme também parece adquirir tons de crítica às elites hegemônicas do país, que se acham no direito de  conduzir o processo político, mas já estão tão apodrecidas que nem se entendem entre seus membros. Aqui as palavras de ordem são magoar e machucar seus desafetos o máximo que podem, seja com sarcasmo, seja com linchamento moral, seja com agressividade pura e simples.

O sarcasmo em todas as idades…

E, para expressar tanta agressividade, é óbvio que todos os atores foram bem, embora fique aqui a impressão de que todos eram cínicos, como se o cinismo fosse um personagem independente que se incorporasse nos demais personagens em maior ou menor grau. Essa característica cínica atribuída a todos os personagens prejudica um pouco as coisas, pois parece que todos são planos nessa característica em específico, embora pudemos ter visto matizes nas características dos personagens.

A diretora Daniela Thomas

Assim, “O Banquete” é um filme um tanto poderoso e muito desgastante para a cuca do espectador, que fica por uma hora e quarenta e quatro minutos sendo bombardeado por cinismo, sarcasmo, agressividade e situações constrangedoras. Mas ainda assim é um filme extremamente necessário, pois ele ensina de forma categórica tudo o que NÃO devemos fazer quando nos relacionamos com outras pessoas, mesmo que elas nos tenham ferido em nosso íntimo. Vale a pena dar uma conferida.

Batata Literária – Fantasia de Arco-Íris.

Dizem que minhas cores são em número de sete!

Mas isso é uma grande mentira!

Na verdade, seis é o real número inconteste!

Sete é o número cabalístico que a alma revira!

Da natureza, represento todas as maravilhas

A candura, a beleza, até a paz das famílias

Sou, também, o símbolo das minorias

Que lutam para impor suas singelas sabedorias

 

Mas, como eu de fato apareço?

Sou, no fim das contas, um grande efeito visual!

Provoco em todos um grande apreço

Pois minha exuberância foge do banal

Eu sou luz branca decomposta

Por pequenas gotículas de água no ar

Torno-me luzes de cores, de vivacidade imposta

Uma grande explosão de alegria a celebrar!

 

E o céu, o meu grande coadjuvante?

Ele nunca quer ser insignificante

Perante ao meu grande espetáculo!

Volta e meia, faz do azul seu grande tentáculo

E tenta competir comigo

Sempre é mal sucedido, meu frustrado amigo

E torna-se negro e cinza, de um só arremate

E melhor para mim fica todo esse contraste

 

É, meus caros, não adianta

Minha beleza é inigualável

Minha delicadeza ninguém suplanta

Sou formado da curva mais admirável!

Sou o grande arco-íris das chuvas de fim de tarde

Que traz ao mundo o gigantesco alarde

De que a natureza é sábia na sua obra

E produz todas as grandezas sem demora!