Batata Séries – Jornada Nas Estrelas Discovery (Temporada 2, Episódio 4) “Uma Moeda Para Caronte”. Uma Forte Referência.

Salvando Burnham…

O quarto episódio de “Jornada nas Estrelas Discovery”, “Uma Moeda Para Caronte” foi um episódio muito bom, talvez o melhor de todos dessa série até agora. Tudo bem, eu sei que outras análises virão e elas vão apontar problemas que o episódio tem (como acontece em tudo na vida, onde existem virtudes e defeitos). Mas eu confesso que estou preferindo aqui buscar mais pontos positivos de “Discovery” e especular como eles poderão ser trabalhados melhor no futuro. Só há uma coisa que está incomodando um pouco. É o segundo episódio seguido que se desvia do arco principal, que está nos sinais ao longo da galáxia e do anjo vermelho. Só espero que eles não façam com esse arco o mesmo que fizeram com a guerra com os klingons na primeira temporada, que se propunha ser o arco principal e que praticamente não existiu.

Saru, uma participação importantíssima nesse episódio…

Mas vamos ao plot desse episódio. A Discovery conseguiu a localização da nave de Spock e a está perseguindo. Mas ela é impedida de continuar por uma grande esfera que se mostra um organismo vivo e infecta a nave com um vírus que produz sobrecargas elétricas e sérias avarias nos sistemas. Para piorar a situação, Saru adoece e ele diz que seu mal é terminal, o que afeta demais Burnham. Stamets e Reno (isso mesmo, ela está de volta!) conseguem retirar a sobrecarga da nave e Saru e Burnham desenvolvem uma espécie de anticorpo digital que ataca lentamente o vírus. O fungão do episódio anterior se prende a Tilly e Stamets inicia uma comunicação com ele (depois de meter uma furadeira na cabeça da moça para injetar um implante de comunicação). O fungão, então diz que é de uma espécie que vive na rede micelial e que os saltos da Discovery estão provocando sérios problemas no seu mundo. Stamets se desculpa e diz que vai consertar tudo, mas o fungão não solta Tilly e, pelo contrário, a envolve completamente. Stamets consegue tirar Tilly do fungão com um maçarico. Mas o fungão libera uma substância que deixa todo mundo doidão. Quando Stamets inocula um remédio nele e em Reno que neutraliza as alucinações, ele percebe que Tilly foi novamente capturada pelo fungão. Quando Stamets o abre novamente, só vê uma cavidade e a mocinha desaparece. Burnham, ao ver a tentativa de comunicação com o fungão, tem o insight de que de repente a esfera está tentando se comunicar com a nave através do vírus. Ela passa essa informação para Saru e este crê que a esfera, que tem 100 mil anos, está morrendo e quer passar suas experiências de vida para a nave. Ela estaria morrendo pois, como Saru também está morrendo e sua espécie kelpiana é altamente empática, seu corpo estaria se apropriando da fase terminal da esfera. Depois de muito custo, Saru e Burnham convencem Pike a baixar os escudos para que o vírus entre totalmente na nave e transmita as informações da história de vida da esfera, que está prestes a explodir. Quando os dados são totalmente transmitidos, a esfera explode, mas antes ela empurra a Discovery para salvá-la e a seus dados de experiência de vida. A última coisa que a esfera registrou foi justamente a posição de Spock e a Discovery pôde continuar a seguir a nave do vulcano. Burnham vai com Saru aos aposentos do kelpiano e ele pede que a moça corte seus gânglios inflamados para que ele possa morrer antes da dor e da loucura ficarem insuportáveis. Burnham chora muito e Saru a conforta, dizendo que ela é uma espécie de irmã, pois não conseguiu se despedir de sua irmã verdadeira. E Saru ainda pede que Burnham faça as pazes com Spock. Mas, quando Burnham vai cortar os gânglios, eles caem e Saru se cura, perdendo o medo, se tornando mais forte e, principalmente, inconformado com o papel de presa que seu povo kelpiano faz há eras. Depois da conversa com Saru, Burnham, que queria evitar Spock, por respeito a posição resignada dele com relação ao contato com ela, muda de ideia e quer procurá-lo.

Reno. Bem vinda de volta!!!

Quais são as virtudes do episódio? Em primeiro lugar, mais uma referência, desta vez bem forte, ao Universo de Jornada nas Estrelas. Falo isso com relação à esfera que é uma forma de vida e que quer se comunicar. Impossível não se lembrar de V’Ger ou da Orta, mesmo que a comunicação das duas com os integrantes da Federação tenha sido feita sob outras circunstâncias. Mas a intenção da esfera viva querer preservar a sua memória e deixar seus registros se perpetuarem, é também um tema muito caro às séries antigas de “Jornada nas Estrelas”, algo que acabou fisgando o meu coração de historiador. Assim, vemos que “Discovery” vai, paulatinamente e cada vez mais, se aproximando do que víamos antigamente em “Jornada nas Estrelas”. A outra grande virtude é uma espécie de sequência do que vimos no episódio anterior, no que se refere às personagens Burnham e Tilly. Eu disse na resenha anterior que essas duas personagens funcionam bem melhor num estado fragilizado e sob pressão. E o presente episódio se aprofundou nisso. Totalmente subjugada pelo fungão, Tilly estava visivelmente aterrorizada, mas sob controle de si, deixando de ser totalmente um alívio cômico nesse episódio. Talvez tenha sido a melhor atuação de Mary Wiseman em toda a série até agora. Outro elemento que funcionou muito bem nesse núcleo da Tilly foi a relação entre Stamets e Reno, uma bela aquisição de personagem para a série e cuja ausência desde o primeiro episódio já muito me incomodava. Se, inicialmente, os dois não se bicaram muito, a força das circunstâncias da invasão da esfera à nave fez com que os dois trabalhassem em equipe bem rapidamente. E houve uma química muito boa entre eles, sem considerar o quê alucinógeno e psicodélico desse núcleo, com direito a Prince e “Space Oddity”, do David Bowie.

Agora, uma grande virtude, dentro da missão principal de Discovery de “resgatar Burnham” esteve na relação desta com Saru. Tudo bem que depois da presença de Doug Jones no Brasil e de toda a tietagem explícita que os fãs fizeram com ele, assim como sua resposta muito calorosa, fazem a gente ver Saru com outros olhos. Mas, mesmo assim, esse foi um episódio muito importante para Burnham e Saru teve um papel determinante nisso. Se com Amanda no episódio anterior, Burnham já ficou fragilizada emocionalmente, aqui a coisa foi muito mais forte, pois seu amigo bem próximo estava morrendo e ela ainda foi elencada por ele a “desligar os aparelhos”. O choro que ela dá à frente de Saru na suposta hora derradeira do kelpiano convenceu bastante e serviu para fortalecer o elo entre os dois. Na minha modestíssima opinião, esse é o caminho certo para tornar a personagem querida do público. Ao invés de ser uma mulher perfeita que dita procedimentos aos seus colegas e se veste de uma certa arrogância, ela deve se envolver mais com os seus e dividir os louros como fez com Saru no episódio. Vejam bem que, desta vez ela não salvou o dia sozinha e contou com uma baita de uma ajuda do Saru, que estava ali no sacrifício. E, depois, ainda tivemos uma terna conversa entre os dois. Isso sim é usar a Burnham de forma inteligente. Eu, como fã confesso de Yamato (a antiga Patrulha Estelar da Manchete, lembram-se?) gostava muito daquele desenho animado (anime é coisa para os mais novinhos) muito em função do espirito de equipe da tripulação e de como eles se viam como uma enorme família ao invés de militares. Esse espírito também está nas séries antigas de “Jornada nas Estrelas” e precisa estar aqui em “Discovery”. O vínculo entre Saru e Burnham foi tão bem elaborado aqui que ele fez referências ao Short Trek “The Brightest Star” e Saru ainda convenceu a moça a fazer as pazes com seu irmão Spock, usando a relação com sua irmã kelpiana como argumento. Essas coisas realmente estavam fazendo falta na série.

Stamets busca salvar uma Tilly que, finalmente, saiu do ridículo…

Bom, até agora só falei de virtudes no episódio. E os defeitos? Bom, infelizmente tenho um nome para isso: Pike. O nosso capitão ficou mais uma vez caladão enquanto a tripulação trabalhava para solucionar a crise da esfera e se opôs fortemente a baixar os escudos, quando deveria ter sido mais ativo no debate com Burnham e Saru e ter decidido logo a questão. Um Kirk ou Picard e até o Pike do Hunter teriam sido bem mais rápidos aqui. E me desagradou um pouco novamente o quê religioso de Pike quando ele diz que o conhecimento de 100 mil anos sobre a galáxia que a esfera tinha se equivalia aos “Manuscritos do Mar Morto da Galáxia”. Sem querer fazer pouco caso dos Manuscritos do Mar Morto (que era de um grupo judeu que queria lutar contra a presença romana e se refugiou para esperar um líder guerreiro chamado Messias – aí poderiam estar as primeiras bases do Cristianismo), mas o conhecimento de cem mil anos de uma galáxia inteira parece ser algo bem maior e não cabe na comparação que a mente excessivamente religiosa desse Pike faz. Gostaria de ver uma mentalidade clássica de capitão aqui, se é que vocês entenderam meu trocadilho infame.

Bom, esse foi “Uma Moeda Para Caronte”. O episódio foi tão bom que até o título lembra aqueles títulos altamente literários da série clássica. Vamos ver se a coisa va continuar melhorando no próximo episódio. E veja o trailer clicando no link abaixo

https://www.youtube.com/watch?v=V3HiQnXdFuI