Martin Scorsese volta à cena com o filme “O Irlandês”. Essa é uma película que está disponível no Netflix a partir do próximo dia 27 de novembro, mas como se trata de um filme também estrelado por Robert De Niro e Al Pacino com um baita cheiro de Oscar, fica muito difícil não querer ver na telona as limitadas sessões disponíveis. Como este escriba acabou perdendo as sessões de “Roma” e viu o Oscar de Melhor Fotografia deste ano no celular, assim que “O Irlandês” se tornou disponível no cinema, fui correndo ao Estação Botafogo para assistir. Houve dois problemas: a venda era feita em separado para uma sessão que lotou o cinema. Assim, tivemos problemas como, por exemplo, a impressora instalada no notebook não funcionar direito e o ingresso demorar para sair, ou só ser aceito pagamento no cartão e não em dinheiro. Esse é o tipo de coisa que precisa ser melhor vista quando a Netflix fizer essas sessões de cinema. O outro problema é que a película tem uma duração de, praticamente três horas e meia. Ou seja, tem que ter disposição. Para que a gente entenda melhor o filme, vamos lançar mão de spoilers aqui.
A história começa em meados da década de 50 e gira em torno do irlandês Frank Sheeran (interpretado por De Niro), um ex-combatente da Segunda Guerra Mundial que esteve na Itália, se tornou motorista de caminhão transportando carnes e ganhava um por fora desviando a mercadoria. Seu advogado, ligado à máfia ítalo-americana, conseguiu tirá-lo da situação e isso foi meio que a porta de entrada para que Frank entrasse para o mundo do crime. Ele irá trabalhar para Russell Bufalino (interpretado por Joe Pesci), com quem irá desenvolver uma relação de fidelidade total. Através desse submundo, ele irá também conhecer Jimmy Hoffa (interpretado por Pacino), o famoso líder sindical dos caminhoneiros que desapareceu e não foi encontrado até hoje. Vamos vendo, ao longo do filme, como Frank se envolve cada vez mais com o mundo do crime, não somente de forma profissional, mas também de forma afetiva com Bufalino e Hoffa, onde chegará um momento em que Frank terá que fazer escolhas muito duras. O mais curioso aqui é que o filme é contado em flash-back, de forma que vemos Frank bem idoso num asilo, mostrando que ele foi um dos poucos que conseguiram sobreviver à violência do submundo da máfia ítalo-americana.
A primeira coisa que vem às nossas cabeças quando vemos esse filme é a película “Os Bons Companheiros”, onde temos também De Niro e Pesci fazendo um filme sobre a máfia ítalo-americana. Entretanto, há algumas diferenças. Enquanto que o filme “Os Bons Companheiros” parecia ser algo mais estritamente ligado à máfia ítalo-americana, com uma crueza bem maior (lembro-me da psicopatia do personagem de Joe Pesci nesse filme), em “O Irlandês” temos um filme menos violento (mas, ainda assim com a violência típica dos filmes de máfia ítalo-americana) e vemos a máfia conectada com outros núcleos, tais como o movimento sindical e o desaparecimento de Hoffa, a família Kennedy no poder e a questão da Revolução Cubana. Ou seja, é um filme com um desdobramento muito maior que o torna bem mais rico e interessante pelo forte background histórico. Fica bem clara a interação de todos esses núcleos, dando a entender que Kennedy foi assassinado a mando da máfia, assim como a mesma teve participação no episódio da Baía dos Porcos e no desaparecimento de Hoffa. É um filme que exige muito da atenção do espectador pelo rosário de personagens e situações onde os mesmos interagem. E tudo isso em mais de três horas de exibição. Pelo menos, se o espectador não conseguiu pescar toda a história e seus meandros, ele vai ter nova chance de fazer isso através do Netflix, o que é acalentador. De qualquer forma, vale muito a experiência de se ver a película no cinema, pois temos um roteiro para lá de primoroso e muito bem trabalhado em toda a sua complexidade.
Agora, definitivamente o mais espetacular foi ver as duplas De Niro-Pacino e De Niro-Pesci atuando. Um baita de um cast que vale demais o ingresso! Não é todo o dia que a gente tem a oportunidade de ver tanta gente muito boa trabalhando junta! E, mesmo com as mais de três horas de exibição, ficou um gosto de quero mais. Confesso que não me contento em ter esse filme somente no streaming e gostaria muito de conseguir uma cópia em DVD para ver quando quisesse (sempre há a possibilidade da Netflix retirar o filme quando os acessos baixarem no futuro). É nessas horas que a gente percebe como vale a pena passar por todas as dificuldades para ver uma produção como essa numa boa sala de cinema.
Dessa forma, “O Irlandês” é um programa imperdível que vale o ingresso e a experiência de vê-lo em uma boa sala de cinema. Um filme de Scorsese à antiga, o Scorsese que fala do mundo do crime ítalo-americano, com um elenco magnífico que interage de forma bem azeitada e redondinha. Um deleite para os olhos obrigatório para qualquer indivíduo que se diz ser cinéfilo.