Batata Séries – Jornada Nas Estrelas, A Série Clássica (Episódio Piloto) – The Cage.

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Capitão Pike, o varão “Pike” das Galáxias…

Dando sequência à análise de episódios de “Jornada nas Estrelas, vamos falar do primeiro episódio da série, o piloto intitulado “The Cage”.

A Enterprise, sobre o comando do capitão Christopher Pike, atravessa uma onda de rádio proveniente do Sistema Talos, com um antigo sinal de socorro. O sinal vem da SS Columbia, uma nave que desapareceu há dezoito anos. O capitão prefere manter o curso para Veja para levar seus feridos, já que não há indícios de sobreviventes. A decisão do capitão de não fazer o resgate deixa a tripulação da ponte estupefata. O capitão sai da ponte e passa, nos corredores, por um casal que parece mais estar indo à praia, em trajes civis (indício de que há militares e civis na nave). Nos seus aposentos, Pike chama o Dr. Boyce, que concorda com sua prioridade de ir a Veja levar os feridos e lhe oferece um Martini. Pike diz que está cansado das responsabilidades de capitão e pensa em aposentadoria. O Dr. Boyce diz claramente que se Pike deixar essa vida, corre risco de definhar. Spock entra em contato e diz que foram encontrados sinais de vida em Talos. Há 11 sobreviventes, num planeta com atmosfera de oxigênio e disponibilidade de água e alimentos. Pike decide mudar o curso para Talos em dobra sete. Uma ordenança quase se choca com Pike e este resmunga que não está acostumado com mulheres na ponte. A tenente (interpretada por Majel Barrett) olha para ele de forma surpresa e Pike pede desculpas, dizendo que com ela é diferente, o que leva a outro olhar surpreso da tenente. Aqui a gente tem que fazer um parênteses. Estamos falando de um produto cultural da segunda metade da década de sessenta do século passado, quando passava-se muito longe de qualquer coisa a discussão sobre empoderamento feminino. Mesmo que aos nossos olhos do século 21, a postura de Pike tenha sido extremamente machista para uma pessoa do século 23, deve-se ficar registrado aqui a forma perplexa como a personagem de Barrett olha para seu capitão, mostrando a sua indignação com o machismo do capitão. E temos a presença de duas mulheres na ponte de comando, algo que não acontecia em outras séries da época, como em “Viagem Ao Fundo do Mar”, com um submarino repleto de varões. Essa postura da tenente é ainda mais notável quando sabemos do comportamento de algumas mulheres que assistiram esse piloto da série, pois elas reclamaram de uma forma bem machista da postura da tenente, ao bom estilo “quem essa mulher pensa que é para estar aí nesse posto?”.  Assim, podemos dizer que Roddenberry já nos primeiros momentos de “Jornada nas Estrelas” diz ao que vem a série, que é discutir sobre a questão da diversidade e da barreira dos preconceitos.

Star Trek: Discovery' Lead is 'Number One' from 'The Cage'
Majel Barrett como a Número 1. Um olhar de perplexidade contundente contra o machismo…

A Enterprise chega ao planeta e Pike escolhe seu grupo de descida, não escolhendo a tenente, que é a “Número 1”, ou seja a Primeira Oficial da nave. Nossa tenente fica um pouco chateada de não ir, mas Pike dá um argumento convincente do tipo “como não sabemos direito o que há lá, precisamos de oficiais experientes na nave”. Ou seja, houve uma preocupação de se justificar o fato de que a tenente foi preterida: ela é uma oficial experiente e ficará responsável pela nave na ausência do capitão. Pela primeira vez vemos o teletransporte sendo usado e o impressionante cenário de Talos IV, que, mesmo sendo uma espécie de pintura, é de grande realismo para um episódio piloto. Spock e Pike encontram a plantinha azul que emite sons e que se silencia quando se pega em suas folhas. Aqui, o Spock dá o seu conhecido sorriso, já que o personagem ainda não estava suficientemente construído em toda a sua lógica vulcana. É encontrado um acampamento somente com homens idosos, os sobreviventes da SS Columbia. Pike se apresenta dizendo que é o capitão da “United Space Ship Enterprise”, fazendo com que a gente saiba o que é o U.S.S. da nave. Aparece Vina, que teria nascido logo depois do acidente e os pais morreram. Enquanto isso, nas profundezas do planeta, os talosianos assistem tudo. Vina diz que Pike é um excelente espécime e os idosos pedem desculpas pelo linguajar demasiadamente científico. Vina diz que é hora de mostrar o segredo deles à tripulação da Enterprise. Vina leva Pike para a entrada de uma caverna e ele é imobilizado e capturado pelos talosianos. Os idosos desaparecem e a tripulação tenta abrir a caverna com os phasers, o que não acontece. Spock comunica à Numero 1 que não há sobreviventes e que perderam o capitão, que caiu numa armadilha.

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A Número 1 e sua ordenança, uma personagem também com seu carisma, apesar de ser o lado mais fraco da corda…

Pike acorda na jaula. Ele tenta fugir mas não consegue. Há outras jaulas com outras espécies. Os talosianos chegam e Pike se apresenta, dizendo que é de um sistema solar do outro lado da galáxia e que suas intenções são pacíficas. Os talosianos se comunicam por telepatia e discorrem sobre Pike sem falar com ele. Pike escuta o que falam. E fica especialmente preocupado quando eles citam que logo começará a experiência.

Na nave, vemos a primeira reunião da tripulação na franquia. Foi dito que os talosianos têm a capacidade de criar ilusões e que têm um cérebro três vezes maior que o humano, podendo ser uma ameaça caso a nave ataque o planeta. Mas o capitão está encarcerado por eles. A Número 1 decide atacar Talos IV.

Os talosianos começam o teste, dando a Pike algo importante para ele proteger. Ele acaba em Rigel VII com Vina pedindo ajuda. Pike logo percebe que tudo aquilo é uma ilusão. Uma criatura surge e Pike luta contra ela, mesmo sabendo que tudo é de mentirinha. Pike mata o ser e retorna para a cela, agora acompanhado de Vina. A moça diz para Pike que ele pode ter o que quiser, mas Pike só quer saber de como se aproximar dos talosianos e não deixar mais que os mesmos usem sua mente contra ele.

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O sorriso de um Spock ainda sob construção…

Do lado de fora do túnel, a tripulação usa uma arma mais sofisticada para abrir a porta, entretanto nada acontece. O doutor diz que tudo o que estão vendo pode não passar de uma simples ilusão e a montanha onde está a caverna já pode até ter sido destruída.

Vina começa a responder algumas perguntas de Pike. Os talosianos foram para as profundezas, pois houve uma guerra e acabaram se desenvolvendo mentalmente, criando um mundo aparente e não mais se preocupando em desenvolver coisas para o mundo real, capturando alienígenas para estudar suas vidas e experiências reais. Pike está na dúvida de se Vina é real e ela afirma que sim. Nisso, entra uma talosiana que retira Vina da jaula e a leva para o castigo por ter falado demais.

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Os talosianos…

Um alimento é dado para Pike. A talosiana se comunica com ele dizendo isso e ele pergunta o que acontecerá se ele se negar a comer. A talosiana lhe dá um castigo e ele tem a ilusão de estar sendo queimado. A talosiana diz que ele precisa consumir o alimento. Pike então pergunta por que a talosiana não lhe dá uma ilusão de fome. Isso quer dizer que os talosianos têm limites em sua força telepática? A talosiana ameaça Pike, dizendo que há coisas mais desagradáveis na sua cabeça para ela transformar em castig. Pike consome o alimento e faz menção de avançar na talosiana que se assusta. Pike chega à conclusão de que a talosiana não pode ler sua mente o tempo todo. Pensamentos primitivos parecem não poder ser lidos. A talosiana fala que Vina é real e que ela foi a única sobrevivente da sua espécie.. Pike pergunta por que é importante que ele sinta atração por Vina. Seria para criar uma comunidade humana? E por que Vina é castigada se ele é que desobedece? Sarcasticamente, a talosiana fala dos sentimentos de Pike: proteção emocional e simpatia. E sai dizendo: “Excelente”. Pike vai para outra ilusão onde está fazendo um piquenique com Vina na sua casa, onde até seu cavalo aparece. Pike se lembra então da conversa que teve com o doutor, de que queria abandonar tudo e ter uma vida mais prosaica, afastada da realidade. E, agora que ele estava naquela encenação, entendia a resposta do doutor de que abandonar a realidade era um passo para definhar. Pike conversa com Vina para buscar uma saída para aquelas ilusões e ela confirma a tese de que os talosianos não lêem a mente com pensamentos primitivos. Mas isso é somente por um tempo e depois eles assumem o controle de tudo novamente, o que tornou Vina uma escrava. Os dois acabam se declarando um para o outro e os talosianos percebem que os humanos escondem os sonhos até de si mesmos. O ambiente é mudado e Vina agora é uma sensual escrava verde de Órion que se apresenta para Pike e outros homens. Pike fica incomodado com a visão e se afasta, mas Vina vai atrás dele para seduzi-lo.

Susan Oliver | Memory Alpha | Fandom
Vina. De lourinha indefesa a uma mulher que fazia um estratégico jogo duplo…

Na Enterprise, uma equipe de descida se prepara para se teletransportar. Mas o teletransporte somente funciona para a Número 1 e a ordenança. Aqui temos o famoso gesto de Spock, onde ele grita: “as mulheres!”. A Número 1 e a ordenança se materializam na jaula e Vina, que estava quase seduzindo o capitão, olha para as duas mulheres de forma atravessada, que não se abalam. A Número 1 disse que Vina estava na tripulação da SS Columbia, insinuando então que ela seria mais velha do que aparenta. Aparece uma talosiana, que diz a Pike para escolher a mulher que quiser. A Número 1 é muito inteligente, o que poderia dar filhos inteligentes, sem falar que a Número 1 tem fantasias com o capitão, o que a constrange. Já a ordenança é jovem e com grande libido. Essa forma seca de querer arranjar um casamento para duas cobaias de laboratório por parte dos talosianos é emblemática e é uma critica velada aos casamentos arranjados, mais frequentes na década de 60 do que hoje. Mas Pike nutre sua cabeça com pensamentos agressivos para ficar fora do alcance da telepatia dos talosianos, ameaçando-os com bastante raiva. A talosiana castiga Pike e diz para ter os pensamentos certos, para cooperar.

Star Trek the Cage Vina dress (com imagens) | Jornada nas estrelas ...
Buscando estratégias para sair da jaula…

Spock ia partir com a nave, pensando na tripulação, etc., etc. (algo muito estranho deixar o capitão, a Numero 1 e a ordenança para trás), mas os controles não respondem. Em Talos IV, a talosiana tenta pegar as armas da tripulação na jaula e Pike consegue prendê-la, estrangulando-a. Esta diz que destruirá a Enterprise se Pike não largar seu pescoço. Os talosianos invadem telepaticamente a Enterprise e começam a coletar os dados do computador da nave. Em Talos IV, Pike entrega a refém para a Número 1 e tenta atirar com o phaser, aparentemente descarregado, no vidro da cela. Achando que é uma ilusão, ele aponta o phaser para a cabeça da talosiana e o buraco no vidro aparece, com a ilusão desaparecendo. Todos vão para a superfície e a entrada da caverna também está toda destruída, agora que as ilusões acabaram. A talosiana diz que eles não tem para onde ir e que construirão uma civilização na superfície sob a orientação dos talosianos. A Número 1 toma mais uma atitude e coloca seu phaser para sobrecarregar e explodir, pois nenhum humano deve viver como escravo. Outros talosianos chegam e eles chegam à conclusão que a raça humana é muito perigosa pois, no cativeiro, mesmo com tudo que lhes agrade, ainda sim é uma raça muito violenta pois não tolera ficar presa. A Número 1 já tinha desativado o phaser quando os outros talosianos chegaram. Vina diz que a tripulação da Enterprise está livre para ir embora. Pike fica revoltado, pois foi aprisionado junto com a ordenança e a Número 1 e não recebeu sequer um pedido de desculpas. Os talosianos disseram que os humanos eram sua última esperança, pois eram mais adaptáveis. Pike sugeriu uma colaboração mútua, mas os talosianos não quiseram, pois acreditavam que quando os humanos aprendessem as técnicas de ilusão dos talosianos, eles se destruiriam.

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Presa e caça muito se estudaram…

A Enterprise tem de novo a sua energia. A ordenança e a Número 1 voltam. Pike fica na superfície e vê a verdadeira aparência de Vina. Muito ferida na queda da SS Columbia, a moça foi reconstruída pelos talosianos, mas eles não tinham ideia das verdadeiras formas humanas e Vina ficou com uma aparência terrível. Mas Vina foi presenteada pelos talosianos com sua bela aparência e com a ilusão de um Pike somente para ela. Pike volta para a Enterprise a tempo de ainda ter a piada fnal na ponte, onde a ordenança pergunta quem teria sido a Eva dele. A ordenança é repreendida pela Número 1 e o doutor faz uma piada com o capitão. Fim do episódio.

Esse episódio piloto de Jornada nas Estrelas, onde tudo começou enquanto série e franquia, suscita algumas discussões. Em primeiro lugar, é curioso perceber como um tema tão caro à ciência, como o ato da observação e experimentação, é tratado no episódio. A espécie talosiana lança mão da ciência para estudar espécies alienígenas como cobaias, privando-as de sua liberdade. O ato de experimentar e observar, ferramenta básica do método científico, parece, num primeiro momento, algo maniqueísta, já que é usado como um artifício para aprisionar outros povos. Por um outro lado, Christopher Pike, enquanto prisioneiro dos talosianos, também lança mão do expediente da experimentação e da observação para entender mais o povo que o aprisiona e buscar uma forma de se libertar da jaula. Assim, se o método científico aprisiona, ele também pode libertar. Ou seja, o método científico é nada mais, nada menos do que uma ferramenta. O que importa é o uso que se faz dele. Mais ou menos a mesma coisa que falamos hoje da internet.

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No diálogo final, a busca por um acordo…

Um segundo ponto, e esse é muito curioso, é a tensão entre utopia e distopia já no episódio piloto. Os talosianos, uma espécie muito desenvolvida (seu cérebro era três vezes maior que o dos humanos) vivia nas profundezas em função de uma guerra do passado. Por estarem numa situação de clausura, desenvolveram demais a mente e passaram a fazer experiências com outras espécies alienígenas, criando uma distração para os dias de confinamento, ao invés de retomarem a vida e reconstruírem sua civilização. Tal situação os impossibilitou de reconstruírem sua civilização por si mesmos e a dependerem de mão-de-obra alienígena para isso, onde os humanos eram a melhor opção.  Daí a necessidade de Pike e Vina se unir para promover a reprodução e formar essa mão-de-obra. Uma vez que Pike entende essa condição de fraqueza dos talosianos, ele oferece uma ajuda mútua que é rechaçada pelos talosianos, pois os humanos se destruiriam no momento em que eles aprendessem as técnicas telepáticas dos talosianos. Assim, se temos uma condição mais distópica atribuída aos talosianos no início do episódio, com a situação da guerra passada e do aprisionamento de espécies, ao final do episódio, os talosianos e humanos chegam ao entendimento, mais utópico, com os primeiros reconhecendo que a liberdade é muito importante para os segundos e com os humanos oferecendo ajuda aos talosianos, mesmo tendo sido aprisionados. Só ficou mal contado como Vina e a ilusão de Pike poderiam ser úteis para os talosianos reconstruírem sua civilização, esse sim um furo de roteiro.

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No fim, tudo era ilusão…

O terceiro ponto, que já foi mencionado acima, é o da questão de gênero, corajosamente abordada para a época que o episódio foi feito (1964), pois a posição da mulher naquela sociedade era altamente periférica. E aí, temos uma ponte onde duas mulheres trabalham, à despeito das observações machistas do capitão. O papel de Majel Barrett nesse episódio é de suma importância, pois ela era a Número 1 da nave, ou seja, era a capitã na ausência do capitão, e deu umas três olhadas perplexas para seu superior quando ele estava em arroubos de machismo. Ou seja, uma reação sutil que acaba sendo muito mais contundente do que se ela fosse mais direta. Já a nossa ordenança, que teria o papel mais vulnerável para o machismo do capitão, usava com inteligência o argumento de que precisava estar na ponte, já que o próprio capitão havia lhe dado ordens receber dela relatórios periodicamente. Foi especial a forma sarcástica dela entregar o relatório para o capitão no final do episódio. E mais delicioso ainda o atrevimento dela ao perguntar para o capitão, na ponte, perante todos os varões e superiores, quem seria escolhido por ele para ser a sua Eva. Lembremos que estamos em 1964, onde séries como a já citada “Viagem Ao Fundo do Mar”, não tinham mulheres em postos militares, e que as próprias mulheres telespectadoras achavam a Número 1 muito petulante por estar num posto geralmente destinado a um homem. Assim, Roddenberry já entregava seu cartão de visitas de abordar temas polêmicos para sua época no piloto da série. O leitor mais atento pode perguntar: e Vina? Ela também foi uma personagem ativa, jogando em duas frentes. Num momento, ela lançava mão de sua ligação com os talosianos para seduzir Pike, noutra hora, ela se aliava a Pike para buscar fugir da jaula, sendo uma personagem mais complexa que o da lourinha indefesa a ser salva pelo varão.

Sabemos que esse piloto não foi aprovado num primeiro momento, talvez por ser desafiador demais na época, talvez pela aparência demoníaca de Spock, que muito incomodou os WASPs de plantão. Mas “The Cage” ficou imortalizado como a obra seminal de “Jornada nas Estrelas” e um documento definitivo de uma franquia que faria muito sucesso nas cinco décadas seguintes.

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Um final feliz para Vina…

Batata Séries – Personagens de Jornada nas Estrelas – Jean-Luc Picard

Star Trek: Patrick Stewart retornará como Jean-Luc Picard em nova ...
Um personagem icônico…

A Batata Espacial, em sua sessão Batata Séries, começa hoje a fazer pequenos artigos sobre personagens de Jornada nas Estrelas. Vamos começar com o mitológico Jean-Luc Picard.

James T. Kirk | Memory Alpha | Fandom
A comparação com Kirk é inevitável…

Jean-Luc Picard  é sempre lembrado como o capitão da Enterprise D. Quando ele apareceu em “Encontro em Far Point”, o episódio piloto de TNG, as comparações com o Capitão Kirk logo se tornaram inevitáveis. Podemos dizer que os dois capitães tiveram trajetórias distintas. Kirk, por exemplo, era o aluno certinho da Academia da Frota Estelar, tornando-se o homem impetuoso e aventureiro enquanto capitão da Enterprise. Já Picard foi exatamente o oposto. Era um aluno impetuoso e indisciplinado na Academia da Frota Estelar a ponto de ter um coração mecânico, pois se envolveu numa briga com nausicanos, sendo esfaqueado por isso. Mas quando assumiu o comando de naves estelares, Picard mostrou-se como profundamente moral, lógico e muito inteligente, sendo um mestre da diplomacia e do debate, que resolve problemas aparentemente insolúveis entre múltiplas partes. Picard, por exemplo, é um profundo conhecedor da cultura klingon, com sua presença sendo indispensável em questões de ordem diplomática entre a Federação e o Império Klingon. Apesar de tais resoluções serem geralmente pacíficas, Picard também é mostrado usando suas notáveis habilidades táticas em algumas situações, quando elas são requeridas. Ele gosta de histórias de detetives, interpretando Dixon Hill nos holodecks, dramas shakespearianos, cavalgadas e chá Earl Grey. Picard fez o primeiro contato com cerca de 27 espécies, incluindo ferengis e borgs.

Captain Horatio Hornblower R.N. (1951)
Horatio Hornbower (aqui na pele de Gregory Peck). Uma inspiração para Picard…

Jean-Luc Picard nasceu em La BarreFrança, filho de Maurice Picard e Yvette Gessard,  a 13 de julho de 2305, e sempre sonhou em entrar na Frota Estelar, contra a vontade do pai. Havia atritos entre Jean Luc e seu irmão Robert, por questão de ciúmes do irmão mais velho. Ele não conseguiu passar em sua primeira prova para entrar na Academia da Frota Estelar, porém subsequentemente foi admitido e se tornou o primeiro calouro a vencer a maratona da Academia. Ele era um cadete imaturo e atribuiu ao zelador Boothby chegar a um comportamento mais maduro. Seu treinamento acadêmico em arqueologia é mencionado várias vezes no decorrer da série e ele continua a buscar a tecnologia como um passatempo; ele também afirma que uma vez foi reprovado em química orgânica. Pouco depois de se formar, Picard foi esfaqueado no coração por um nausicano, deixando o orgão irreparável e requerindo substituição por um implante partenogênico. Picard inicialmente foi para a U.S.S. Reliant como alferes. Mais tarde, serviu como primeiro oficial a bordo da USS Stargazer, tornando-se posteriormente seu capitão, após a morte do capitão titular. Durante esse período, ele inventou uma tática de escape/ataque com a nave que ficou conhecida como a Manobra Picard.

10 Best Jean-Luc Picard Episodes of Star Trek: The Next Generation ...
Com Q, um debate eterno sobre as virtudes e defeitos dos humanos…

Star Trek: The Next Generation mostra Picard no comando da USS Enterprise (NCC-1701-D). O episódio piloto da série mostra a missão da nave de investigar um problema na Estação de Far Point, desviando-se quando a entidade Q faz de Picard um “representante” em um julgamento acusando a humanidade de ser uma “raça infantil perigosamente selvagem”.Picard persuade Q a testar a humanidade, com a entidade escolhendo julgar a performance da tripulação em Far Point. O julgamento “termina” sete anos depois (quando Q lembra Picard que ele nunca foi encerrado), no episódio final da série, quando a humanidade é absolvida pela demonstração de Picard de que a espécie tem a capacidade de explorar as “possibilidades da existência”.

Resistance is futile: Jean-Luc Picard and the terrifying history ...
Locutus, um grande trauma…

O último episódio da terceira temporada, “The Best of Both Worlds“, mostra Picard sendo assimilado pelos Borg, tornando-se Locutus, para servir como um ponte entre a humanidade e os Borg; sua assimilação e recuperação são pontos críticos do desenvolvimento do personagem, dando o pano de fundo para o filme Star Trek: First Contact e o desenvolvimento de Benjamin Sisko, o protagonista de Star Trek: Deep Space Nine.  Stewart pedia à Gene Roddenberry para manter Picard como um Borg por alguns episódios a mais além do final da terceira temporada, já que ele achou que seria mais interessante do que restaurar Picard na Parte II. É mais tarde revelado em First Contact que apesar de todos os maquinários Borg terem sido removidos de seu corpo, ele ainda possui lembranças traumáticas e sofre pesadelos de sua assimilação. Aliás, vale mencionar aqui que o Picard visto na série é diferente do Picard visto nos longas. Na série, ele mantém suas características originais, de ser uma pessoa moral, diplomática e capaz de resolver conflitos na base da conversa. Já o Picard dos longas está mais levado pelo espetáculo da ação, lembrando o Capitão Kirk e sua impetuosidade.

Robert Picard | Memory Beta, non-canon Star Trek Wiki | Fandom
Atritos com o irmão Robert…

O episódio “Family”, da quarta temporada, revela que Picard tem um irmão, Robert, que assumiu as vinícolas da família em La Barre depois que Jean-Luc se juntou a Frota Estelar. Robert e sua esposa Marie tem um filho, René, sobrinho de Jean-Luc. Durante Star Trek Generations, Ele descobre que Robert e René morreram em um incêndio. Picard ficou muito abalado com essas perdas, pois além da perda dos entes queridos, muito lhe atormentou o fato de que a linhagem da família seria interrompida, já que ele não tinha filhos.

Tapestry (episode) | Memory Alpha | Fandom
Esfaqueado em seus anos de imaturidade…

Picard junta forças com o lendário James T. Kirk em Generations para derrotar o Dr. Tolian Soran. Comandando a nova USS Enterprise-E, Picard novamente confronta os Borg em First Contact. Seus traumas originários da assimilação em Best of Both Worlds vão interferir em suas decisões e ele se recusa a destruir a Enterprise E que está tomada pelos borgs. Picard chegará ao disparate de chamar Worf de covarde. Mas ele será redirecionado a um comportamento mais ponderado depois que toma uma baita bronca de Lily, sua amiga do século 21.  Mais tarde ele luta contra a relocação forçada dos Ba’ku em Star Trek: Insurrection, onde descobrimos que ele é um bom dançarino de Salsa, e encontra Shinzon, um clone romulano feito com seu próprio DNA, em Star Trek Nemesis.  Tal situação de ter um antagonista que é a versão mais jovem de si próprio novamente colocará nosso capitão em conflito, onde ele tenta usar a diplomacia para salvar seu eu mais impetuoso, pois passou uma infância da humilhações nas minas remianas.

Jean-Luc Picard | Memory Alpha | Fandom
Nemesis: Picard luta contra sua versão mais jovial…

Depois do sucesso dos filmes de Star Trek com a tripulação da série clássica, uma nova série de televisão com um novo elenco foi anunciada em 10 de outubro de 1986. O criador de Star Trek ,Gene Roddenberry, nomeou Picard em homenagem a um ou ambos os irmãos Auguste Piccard e Jean Felix Piccard, cientistas suíços do século XX Auguste Pìccard foi um físico que inventou o batiscafo, uma espécie de submarino projetado para navegar a grandes profundidades. Auguste, juntamente com seu irmão Jean também eram balonistas. O filho de Auguste, Jacques Piccard, desceu no oceano para explorar a Fossa das Marianas. A descendência francesa de Jean Luc Picard é também uma homenagem direta ao explorador Jacques Cousteau.

Jean-Luc Picard | Memory Alpha | Fandom
Picard com peruca. Roddenberry não gostou…

Patrick Stewart, que havia atuado no teatro pela Royal Shakespeare Company, foi originalmente considerado para o papel de Data. Stewart disse que ele não ficaria interessado em assumir um papel de coadjuvante “para ficar sentado”. Roddenberry não queria Stewart como Picard, todavia; ele tinha imaginado um ator que era “masculino, viril e com muito cabelo”. A primeira escolha de Roddenberry era Stephen Macht, levando “semanas de discussão” com Robert Justman, Rick Berman e o diretor de elenco para convencê-lo de que “Stewart era a pessoa que eles estavam procurando para sentar na cadeira do capitão”; Roddenberry concordou depois de fazer testes com todos os outros candidatos para o papel. O próprio Stewart estava incerto dos motivos que influenciaram os produtores a escolher “um ator britânico, shakesperiano, careca e de meia idade” como capitão da Enterprise. Ele teve sua peruca vinda de Londres para se encontrar com os executivos da Paramount Pictures, porém Roddenberry mandou Stewart retirar a peruca “horrível”. Sua voz estentórica impressionou os executivos, que imediatamente aprovaram sua contratação. Roddenberry enviou à Stewart alguns livros de Horatio Hornblower, de  C. S. Forrester, dizendo que Picard era baseado em Hornblower, porém o ator já estava familiarizado com o personagem, tendo lido os livros quando criança. Podemos ver esse personagem no filme O Falcão dos Mares, protagonizado por Gregory Peck. Hornblower é um capitão da marinha britânica que se comporta como uma espécie de cavaleiro introspectivo.

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Jacques Cousteau, outra influência…

Enquanto a série progredia, Stewart exerceu mais controle sobre o desenvolvimento do personagem. Quando a produção do primeiro filme da The Next Generation começou, “era impossível de se dizer onde Jean-Luc começou e Patrick Stewart terminou”. As filmagens da primeira temporada de TNG foram um caos, mas Stewart foi fiel a seu trabalho e desenvolveu cada vez mais o personagem.

Auguste Piccard – Wikipédia, a enciclopédia livre
Auguste Piccard, inventor do batiscafo…

Stewart afirmou que, “Um dos prazeres de ter feito a série e interpretado este papel é que as pessoas são tão atraídas pela ideia de Star Trek… vários anos depois do fim da série… eu gosto de ouvir quanto as pessoas gostaram de meu trabalho… é sempre gratificante para mim que esse inglês, careca e de meia idade parece se conectar com eles”.O ator também comentou que seu papel ajudou abrir Shakespeare para os fãs de ficção científica. Ele já notou uma “presença regular de trekkers na platéia” sempre que ele se apresenta no teatro, e adicionou que “Eu encontro essas pessoas depois, recebo cartas deles e os vejo nos bastidores… E eles dizem ‘Nunca vi Shakespeare antes, achei que não iria entender, porém foi maravilhoso e mal possa esperar para voltar'”.

A volta de Picard na série produzida para a CBS All Acess no ano de 2020 trouxe reações díspares no fandom. Enquanto algumas pessoas gostaram do agora aposentado almirante, enfraquecido por uma doença degenerativa, mas obcecado em salvar a vida da andróide Soji, pois ela seria um resquício de seu amigo Data, que se sacrificou para salvar a vida de Picard em “Nemesis”, por outro lado há fãs que criticam a nova série, por ser distópica em demasia, abordar em demasia temas como o suicídio e a melancolia, além de novos personagens tratarem muito mal o protagonista da série. Ainda, causou muita estranheza a consciência do almirante ser trasladada para o corpo de um andróide. 

Poderia se falar muito mais de Picard aqui, mas podemos ver uma descrição mais completa do personagem no site Memory Alpha. Para isso, segue o link

https://memory-alpha.fandom.com/wiki/Jean-Luc_Picard

Por hoje ficamos por aqui. Num futuro próximo, falaremos de outros personagens de Jornada nas Estrelas. Até lá!!!

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Um personagem numa volta um tanto equivocada…

Batata Séries – Enterprise (S01 – Ep 01) Broken Bow.

Legenda Star Trek: Enterprise S01E01 | Legendário
Onde tudo começa…

Vamos começar hoje a fazer artigos sobre as séries de Jornada nas Estrelas, agora que Picard terminou. A ideia é falar dos episódios em sequência de todas as séries. Assim, começamos hoje com o episódio piloto de “Enterprise”, intitulado Broken Bow. O episódio inicia com um jovem Jonathan Archer e seu pai conversando sobre quando a nave projetada pelo pai irá ficar pronta. Trinta anos depois, em Broken Bow, Oklahoma, uma pequena nave klingon está semi-destruída numa plantação. Um klingon é perseguido por dois alienígenas, mas se desvencilha deles provocando uma explosão. O dono da fazenda atira no klingon, ferindo-o.

Star Trek: Enterprise | Netflix
Uma nova tripulação para uma época mais antiga…

Existe um clima tenso entre Archer e os vulcanos. Eles querem devolver o klingon morto, para não cair em desgraça da desonra de ter sobrevivido a uma batalha perdida, respeitando sua. Archer se opõe a matá-lo e força uma situação para a recém pronta Enterprise fazer sua primeira viagem devolvendo o klingon vivo a Kronos, apesar da oposição dos vulcanos, que tutelam os terráqueos e não os acham prontos para a missão por sua inexperiência e natureza emotiva.

Vemos o interior da Enterprise, onde o teletransporte é usado somente para carga. Interior da nave é muito apertado, parecendo um submarino.

Star Trek: Enterprise S01 E01 E02 "Broken Bow" / Recap - TV Tropes
Cerimônia de lançamento da Enterprise, com direito a discurso gravado de Zephran Cochrane…

Archer monta a sua tripulação. Depois de convocar o Dr. Phlox, o capitão vai atrás de Hoshi por sua experiência com idiomas e frequências. A oficial de ciências será vulcana (T’Pol), pois lhe fornecerá cartas estelares para ir até Kronos. T´Pol se apresenta e fica claro que a situação é desagradável para ela, ainda mais com Porthos, o cachorrinho do capitão.

Henry Archer, pai de Jonathan Archer, desenvolveu motor de dobra juntamente com Zephran Cochrane. Uma gravação de Cochrane falando do motor de dobra é transmitida enquanto Archer zarpa com a Enterprise e sua tripulação.

Watch Star Trek: Enterprise Season 1 Episode 1: Broken Bow, Part 1 ...
Tentando salvar um klingon…

Numa espécie de estação, um integrante da espécie que perseguia o klingon fala com uma figura com a identidade oculta sobre o klingon (Klaang) e que este estava sendo enviado para Kronos pela Enterprise. A figura oculta disse para que o erro fosse desfeito.

T'Pol, Trip, and Archer | Star trek theme, Star trek episodes ...
Um trio que parecia que ia se dar bem…

Archer, Trip e T’Pol jantam juntos. A vulcana percebe que os terráqueos ainda comem carne. Trip rebate que fome e guerras foram praticamente erradicadas em duas gerações. Archer lembra que não é fácil se livrar dos instintos mais básicos. T’Pol responde que, com disciplina, tudo é possível.

O klingon acorda, mas Hoshi não consegue se comunicar com ele. A nave sai de dobra e a energia cai. Os alienígenas que perseguiam o klingon invadem a nave e o levam. O klingon murmura “suliban”.

Commander Charles Trip Tucker III and Subcommander T'Pol | Flickr
Trip e T’Pol. Conflitos e apelo sexual…

O desaparecimento do klingon colocou T’Pol numa rota de colisão com Archer, com a primeira dizendo que a missão acabou e não acreditando no potencial humano de reverter a situação. O Dr. Phlox descobre que o suliban morto no ataque tem a sua estrutura genética alterada. A tradução que Hoshi fez do que o klingon falava citava o décimo planeta do sistema Rigel, onde o klingon esteve antes de ir para a Terra. Essa informação era de conhecimento de T’Pol, que relutou em passá-la para Archer, o que aumentou ainda mais o clima de conflito entre a vulcana e os humanos. Archer ordena traçar um curso para o décimo planeta de Rigel.

O klingon é interrogado pelos sulibans. Eles querem saber onde está uma coisa, mas o klingon não sabe. Ele só diz que esteve no décimo planeta de Rigel para falar com uma suliban chamada Sarin que não deu nada para ele.

No décimo planeta de Rigel, uma equipe desce para procurar informações sobre os klingons e os humanos estranham as culturas locais, querendo interferir no que veem, sendo advertidos por T’Pol para não intervir (ainda não há a diretriz de não interferência). Um suliban está à espreita. Archer e Hoshi são aprisionados pelos sulibans. Trip e T’Pol também. Archer é levado pelos Sulibans para conversar. Sarin conversa com Archer e diz que deu a Klaang uma mensagem de que os sulibans estão inflitrados no império para semear discórdia entre as casas. Isso é feito por uma cabala (no caso, uma organização superior) dos sulibans, que recebe ordens do futuro na guerra fria temporal. Os sulibans atacam e Sarin é morta. No tiroteio, Archer é ferido e T’Pol assume o comando da Enterprise.

Na descontaminação, Trip e T’Pol passam um gel no corpo do outro, numa cena de forte apelo sexual. T’Pol insiste que a missão acabou e Trip reage com indignação perante à arrogância vulcana para com os humanos. T’Pol escuta as queixas de Trip e se mantém na missão de Archer.

Porthos | Star trek, Star trek universe, Star trek enterprise
Porthos, o personagem mais fofo…

O capitão faz seu diário de bordo com data de 16 de abril de 2151 (ainda não há data estelar). A nave persegue o rastro de dobra da nave suliban e eles chegam a um planeta gigante gasoso, perdendo o rastro. Com a ajuda de T’Pol, eles recuperam o rastro.

Na estação suliban, a figura oculta diz que a mensagem de Sarin não pode chegar aos klingons. A Enterprise entra na atmosfera do planeta, descobre a estação e sofre o ataque de uma nave, se escondendo numa camada atmosférica superior de fósforo líquido. A tripulação decide capturar uma das pequenas naves que os atacam para entrar na estação e tirar o klingon de lá. Trip e Archer vão na pequena nave mas o capitão fica preso na estação espacial. T’Pol acha mais lógico que o capitão fique para trás para não colocar o klingon em risco, mas Trip impetuosamente bate o pé. Archer se encontra com o suliban que conversa com a figura oculta e os dois entram em luta corporal. A Enterprise faz um voo sobre a estação e aciona o teletransporte, sendo Archer o primeiro a ser teletransportado para a nave. Klaang é enviado para Kronos e entrega a mensagem, escondida em seu DNA, sob os olhares de Archer, Hoshi e T’Pol.

Archer recebe ordens para a Enterprise começar sua missão de entrar em contato com outras culturas. Ele conversa reservadamente com T’Pol e procura aparar as arestas de seus preconceitos e conflitos contra os vulcanos. A Enterprise começa sua missão, com a lembrança de infância de Archer com seu pai colocando uma nave de brinquedo para voar. 

John Billingsley como Dr. Phlox em Star Trek Enterprise - Trekkers ...
Phlox, o médico mais simpático…

Depois da sinopse do episódio, podemos identificar algumas coisas. A primeira é o já famoso estado de conflito entre os humanos e os vulcanos, onde, no século 22, os segundos tutelam os primeiros e retardaram o lançamento dos humanos ao espaço profundo e ao contato com outras culturas. Fica bem claro aqui uma arrogância vulcana que entende que os humanos, por sua natureza emocional e um tanto primitiva, ainda não estão preparados para usar a tecnologia de dobra e entrar em contato com outras civilizações. Por mais que os humanos reclamem dessa postura vulcana, o episódio mostra claramente que os humanos ainda têm barreiras a superar, como, por exemplo, a vontade de interferir em culturas que eles estranham. Quer dizer, se a série mostra as virtudes humanas de explorar e de levar a boa índole da humanidade com seu altruísmo em salvar o klingon e levá-lo para seu planeta de origem, há a ressalva de que eles têm ainda muito a aprender ao interagir com outras culturas, dando uma certa razão à visão que os vulcanos têm dos humanos. A melhor coisa aqui foi colocar T’Pol interagindo com Archer e Trip, onde os choques iniciais de visões de mundo vão sendo gradativamente substituídos pelas quedas de preconceitos e com o ato de um aprender com o outro. O impetuoso Trip aprende um ponto de vista mais multicultural com T’Pol, enquanto que esta aprende com Trip o ato de não se deixar os companheiros para trás, à despeito da lógica dizer o contrário.

Hoshi Sato | Memory Alpha | Fandom
Hoshi, um tanto indisciplinada…

O episódio tem alguns problemas. Hoshi, a especialista em frequências e idiomas, teve alguns pitis com o capitão à medida que a nave dava umas chacoalhadas. Ficou um pouco feio para uma série que preza tanto pela hierarquia militar. Ainda, foi aqui, já no piloto da série, que temos a primeira alusão à “guerra fria temporal”, que ficou mal desenvolvida na série e nunca entendemos bem o que significava. Mas o mais problemático foi a sequência de descontaminação, onde Trip e T’Pol, em trajes mínimos, precisam passar uma espécie de gel um no corpo do outro. Foi um apelo sexual muito forte e desnecessário para Jornada nas Estrelas, claramente visando buscar um público novo. Já tínhamos visto algo com os trajes de Sete de Nove em “Voyager”, mas em “Enterprise” a coisa foi mais exagerada.

De qualquer forma, esse episódio piloto de “Enterprise” parecia então promissor no que tange às visões de mundo posteriores à nossa contemporaneidade e anteriores a utopia da série clássica do século 23. Vale a pena muito revisitá-lo.

Batata Movies – A Rosa Azul De Novalis. Radiografando Uma Identidade.

A Rosa Azul de Novalis - Filme 2018 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Um documentário brasileiro no mínimo provocante. “A Rosa Azul de Novalis”, de Gustavo Vinagre e Rodrigo Carneiro, busca mapear a figura de Marcelo Diorio, um rapaz que é homossexual e HIV positivo, cuja trajetória de vida é bastante curiosa. Para podermos entender melhor o filme, vamos precisar de spoilers.

A Rosa Azul de Novalis (The Blue Flower of Novalis) - YouTube
Marcelo Diorio, um personagem curioso e inusitado…

Dando voz total ao protagonista, o documentário não faz qualquer leitura e deixa Marcelo bem à vontade para falar de si próprio. E ele o faz sem qualquer medo e com muita sinceridade. Com uma certa mágoa, Marcelo fala da difícil relação com sua família, segundo ele altamente conservadora, que não aceitava a sua sexualidade e uma revelação extremamente bombástica no enterro do irmão que deve ter azedado o clima entre nosso protagonista e a família de vez (não darei o spoiler aqui). Marcelo ainda fala de sua relação com o HIV e com os amantes com os quais ele tem relações, contando experiências inusitadas, como um conector USB com um cronômetro enfiado em seu cu por um desses amantes desvairados, gerando uma história inusitada e hilária. Mas a característica mais curiosa dessa película é o fato que Marcelo diz ter lembranças de outras vidas, tais como a de um corpulento general asiático na Idade Média e o poeta romântico alemão Novalis no século XIX, que buscava uma rosa azul. Mais inusitado, impossível.

A rosa azul de novalis | Filme B - o maior portal sobre o mercado ...
O enterro do irmão marcou sua vida…

O documentário também vai ser muito agressivo para os conservadores mais sensíveis, pois há encenações das experiências sexuais de Marcelo, com direito a vigorosas cenas de sexo oral.  E podemos também dizer, com o perdão do trocadilho, que esse é um cu de filme, não no sentido de ser uma película ruim, mas pelo fato da película começar e terminar com um close do cu do protagonista. E por que isso? Ao início, Marcelo toma sol em virtude de sua deficiência de vitamina D e, por mais estranho que isso possa parecer, ele precisa tomar sol no cu (não me perguntem por que, indicações médicas). E, ao final, numa postura e posição altamente desafiadoras, nosso protagonista fica nu, de quatro para a câmara, que faz uma viagem por suas entranhas depois dele fazer um monólogo onde exalta sua sexualidade (e seu cu), além de dizer que a película, até aquele momento, estava muito careta. Fico imaginando os mais conservadores vendo tudo isso. Eles, literalmente, iriam enfiar do dedo em seus cus e rasgar.

Teddy Award - The official queer award at the Berlin International ...
Indicações médicas…

Brincadeiras à parte, esse é um documentário muito corajoso, sincero e importante, pois mostra, de forma bem natural, sem deixar de ser iconoclasta, o pensamento de Marcelo Diorio sobre si mesmo e sua sexualidade, pouco ligando se vai ser agressivo aos mais conservadores. Pela sua ousadia, é um filme muito importante para os momentos sombrios em que vivemos. Um filme sem papas na língua. Vale a pena dar uma conferida.