Batata Séries – Jornada Nas Estrelas, A Série Clássica (S01 Ep03), O Estranho Charlie. Filhote De Q?

1x02 - Charlie X - TrekCore 'Star Trek: TOS' HD Screencap & Image ...
A Enterprise recebe um estranho passageiro…

Dando sequência às nossas análises de episódios de Jornada nas Estrelas, retornemos à série clássica para falar do terceiro episódio da primeira temporada, intitulado “O Estranho Charlie”.

Robert Walker Jr., 1940-2019
Charlie parecia um adolescente normal…

Qual é o plot desse episdódio? Um cargueiro se encontra com a Enterprise para trazer um estranho passageiro: um adolescente náufrago chamado Charlie Evans, que viveu quatorze anos sozinho, desde que tinha apenas três anos. Ele será transferido pela Enterprise para uma colônia e mal teve contato com humanos. O capitão do cargueiro está em silêncio e Charlie faz uma cara onde revira os olhos e, logo, o capitão do cargueiro enche Charlie de elogios, dizendo que ele conseguiu, com sua inteligência, sobreviver ao naufrágio de forma bem competente. Charlie fica curioso com a Enterprise e as centenas de tripulantes, interrompendo a conversa de Kirk com o capitão do cargueiro à todo momento. Kirk chama a atenção de Charlie para isso. Kirk pergunta se o capitão precisa de alguma coisa e o capitão diz que não precisa de nada (nem de conhaque sauriano). Kirk estranha isso. Kirk manda a ordenança Rand levar Charlie para seus aposentos e o garoto fica estupefato em ver uma mulher pela primeira vez.

Review “Charlie X” Remastered – TrekMovie.com
… que não sabia lidar com as mulheres…

Charlie faz exames médicos na enfermaria e está em perfeita saúde. Ele pergunta a McCoy se o doutor gosta dele e McCoy diz “Por que não?”. Charlie dizia que as pessoas da outra nave em que ele estava não gostavam dele. McCoy, achando que aquilo é uma inofensiva insegurança adolescente, o conduz para os aposentos. Charlie anda pela nave e vê dois tripulantes se cumprimentando, dando um tapa no outro. Charlie encontra Rand e consegue dar o perfume preferido dela, intrigando a tripulante. Eles marcam para conversar e, depois do combinado, Charlie dá um tapa na bunda de Rand, como viu os outros dois tripulantes fazerem. A ordenança chama a atenção de Rand, dizendo que ele não pode fazer isso com as mulheres e pede para que o capitão ou o doutor explicarem por que.

Robert Walker, Jr. from Star Trek's “Charlie X” has died — Daily ...
Bom em truques com cartas…

Na ponte, McCoy insiste a Kirk que Charlie precisa de uma figura paterna e Kirk joga a batata quente para o doutor. Já Spock insiste na hipótese de que o planeta em que Charlie estava era habitado, pois Charlie, só com três anos e um ano de comida, não poderia ter sobrevivido sozinho.

Charlie Evans from the Star Trek episode "Charlie X". #StarTrek ...
Mas tinha dificuldades para aceitar a derrota no xadrez tridimensional…

Na área de recreação, temos a famosa sequência onde Uhura canta com o acompanhamento de Spock tocando a sua lira irada. Uhura canta e a letra da música é mais uma cantada explícita em cima do vulcano (J. J. Abrams deve ter visto isso). Charlie, que estava dentro da área de recreação, também recebe uma canção de Uhura, mas ele não gosta de ficar exposto perante o público e, com o seu poder, tira a voz de Uhura. Charlie faz alguns truques de cartas para impressionar Rand e faz sucesso entre as pessoas. Mais tarde, Charlie pergunta a Kirk por que não pode bater na bunda de mulheres e o capitão fica todo sem jeito para explicar, num exemplo explícito de puritanismo WASP da década de sessenta dos Estados Unidos em pleno século 23.

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Kirk, mesmo com sua barriguinha, leva o garoto para treinar luta…

Kirk recebe um chamado de que o capitão que trouxe Chrlie quer falar com ele. O rapaz pediu para ir à ponte junto. O capitão não consegue se comunicar com a nave e o sinal desaparece. Charlie falou que a nave era “muito fraca”. Logo depois, Spock descobre pelos sensores que a nave onde estava o capitão explodiu. Ainda, Kirk havia mandado sintetizar carne de peru para o Dia de Ação de Graças. E agora a cozinha da nave estava com perus de verdade. Cherlie escondeu um sorrisinho e saiu da ponte pelo elevador. Tudo isso acabou despertando em Kirk suspeitas sobre Charlie.

Charlie X « Mission Log Podcast
Essas coisas de macho alfa deixaram o menino assustado…

Kirk e Spock jogam xadrez tridimensional (provavelmente, a primeira vez que esse jogo aparece na série). Spock diz taxativamente que Charlie deve ter algo a ver com o evento da explosão da nave. Kirk, embora com suspeitas, ainda acha que Spock está exagerando. Charlie entra na área de recreação e ele e Spock começam a jogar. Spock vence Charlie, mas ele não aceita. Spock simplesmente sai de perto e deixa Charlie com cara de tacho. Charlie se revolta e derrete as peças brancas. Charlie chega perto de Rand e praticamente se declara a ela. Rand chega a Kirk e pede para que ele fale com Charlie para se afastar dela, pois pode magoá-lo. Kirk, com um olhar maroto, diz que vai fazer isso. O capitão diz que Charlie não pode pressionar e fala que há uma diferença de idade entre Charlie e Rand (mais uma vez a mentalidade da década de sessenta) e que Charlie deve aprender a conviver com isso (há coisas no Universo que podemos ter e outras que não). Kirk lave Charlie para fazer exercícios físicos, mas o garoto não quer muito fazer isso. Kirk insiste e treina luta com Charlie. O capitão derruba o garoto e um tripulante acha graça. Charlie, enfurecido, faz o tripulante desaparecer. KIrk chama a segurança para confinar Charlie nos aposentos. Charlie imobiliza os seguranças. Kirk, no melhor estilo macho alfa, ordena que Charlie vá aos aposentos, ou vai “pegá-lo na marra”. Charlie acaba cedendo e vai com os seguranças. Kirk descobre que todos os phasers da nave desapareceram,  alem do phaser do segurança que tentou imobilizar Charlie.

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Fofamente se declarando para a Ordenança Rand…

Kirk, Spock e McCoy se encontram na sala de reuniões e o vulcano diz que os thasianos (povo alienígena do planeta em que viveu Charlie) têm o poder de transmutar objetos e torná-los invisíveis, e que parece que Charlie tem o mesmo poder. Eles chegam à conclusão de que Charlie é um perigo, pois tem todo esse poder com uma mentalidade adolescente e Kirk é a única pessoa que o respeita. Nisso, Charlie entra com um segurança. Kirk pergunta se Charlie destruiu a nave e ele diz que sim, pois a tripulação não gostava dele.

Kirk não quer levar mais Charlie para a colônia em virtude do perigo do garoto. Mas Charlie toma o controle da nave e coloca Spock numa situação humilhante, forçando-o a recitar poesias. Kirk lhe dá uma bronca e o garoto recua. Spock diz que uma hora harlie não mais recuará. E Kirk sabe disso. Charlie invade os aposentos de Rand e tenta forçá-la a amá-lo. Ela lhe dá um tapa no rosto e ele faz Rand desaparecer. Spock e Kirk, que ficaram sabendo que Charlie estava nos aposentos de Rand porque ela ligou o áudio e eles escutaram da ponte, estão nos aposentos da ordenança e escutam Charlie dizer que precisa de Kirk, pois a Enterprise é uma nave maior para Charlie controlá-la sozinho. Charlie começa a tripudiar da tripulação.

Star Trek - Charlie X, Stalker - YouTube
Imobilizando Kirk e Spock…

Na ponte, Uhura diz que está recebendo uma transmissão nave a nave. Kirk pergunta a Charlie sobre isso mas o garoto desconversa. KIrk percebe que, desde que Charlie assumiu o controle da nave que ninguém mais desapareceu. Kirk orquestra um plano com McCoy e Spock (Charlie havia saído da ponte momentaneamente) para distrair Charlie e sedá-lo, mesmo sendo muito arriscado, pois Kirk achava que, assim que a Enterprise chegasse à colônia, Charlie se livraria de todo mundo. Kirk desafia Charlie e o garoto imobiliza o capitão. Uma mensagem chega à nave vinda de Thasius. Rand aparece na ponte. Algo aparece na tela e Charlie começa a gritar, implorando que não deixem levá-lo. Uma face verde aparece flutuando na ponte e Charlie, totalmente vulnerável, implora mais ainda para ser levado para a colônia. O thasiano (a face verde) disse que assumiu sua forma de séculos atrás para falar com a tripulação e se desculpa por não ter conseguido salvar a primeira nave, mas colocou tudo de volta ao normal na Enterprise. Charlie implora para ficar na Enterprise. Kirk fala ao thasiano que Charlie poderia viver com os humanos e ser ensinado a não usar seus poderes. O thasiano diz que isso seria impossível e, das duas uma: ou Charlie destruiria a raça humana ou os humanos o destruiriam. Já os thasianos cuidariam de Charlie. O thasiano fala para Charlie vir com ele e desaparece. Charlie implora para ficar, pois os thasianos não podem sentir, amar, nem serem tocados. Implorando a Rand e à tripulação, Charile lentamente desaparece. Uhura diz que Charlie está à bordo da nave thasiana e que ela vai embora. Rand chora e Kirk diz que tudo está bem. Mas toda a tripulação está mortificada na ponte. Fim do episódio.

O que podemos dizer desse episódio escrito por D. C. Fontana e Gene Roddenberry? Em primeiro lugar, é impossível não se lembrar de Q em TNG quando vemos esse episódio, lembrando que o episódio piloto de TNG, onde Q aparece pela primeira vez, foi também escrito pela dupla Fontana – Roddenberry. E aí a gente se pergunta se Q não recebeu influência de Charlie, até porque, mesmo sendo interpretado por um adulto como John De Lancie, Q, em sua ironia e sarcasmo, poderia ser engraçado bem ao estilo da imaturidade de um adolescente (podemos nos lembrar quando o contínuo chega a tirar os seus poderes, assim como vemos Charlie ficar subjugado pelos thasianos). De repente, Q, que aparece justamente no início de TNG (assim como Charlie aparece bem no início de TOS), pode ter sido uma visão um pouco mais desenvolvida e trabalhada de Charlie, pois no fundo, os dois têm a mesma essência (superpoderes que a tudo subjugam). De qualquer forma, foi angustiante ver toda uma tripulação, nave e tecnologia ficarem à mercê de um adolescente tão instável emocionalmente, sendo que o único freio desse adolescente era o respeito por Kirk e a necessidade de ter o capitão por perto, já que Charlie não conseguia (e essa era a sua limitação) controlar a Enterprise como um todo, por ser uma nave muito grande. Ainda assim, era muito pouco para a tripulação ter um controle mínimo sobre o garoto.

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Charlie se torna uma ameaça a todos, especialmente Rand…

Os ecos de uma produção datada novamente apareceram nesse episódio. Um puritanismo WASP novamente assombrou a utópica tripulação do século 23, sendo na falta de jeito de Kirk de explicar a Charlie como um homem se deve tratar uma mulher, seja na recusa de um romance entre Charlie e Rand por esta última ser mais velha. Como já foi mencionado em análises anteriores, por melhores que sejam as intenções utópicas da obra e de quem as escreve, é muito difícil se escapar dos vícios e hábitos da época em que a obra é escrita. Pelo menos, houve um bom desenvolvimento da personagem da ordenança Rand, que deixou de ser o mero símbolo sexual de “O Sal da Terra” para ser uma personagem com mais profundidade neste episódio, já que o relacionamento entre Rand, como uma mulher mais velha que precisa lidar com a delicada situação de não magoar uma paixão adolescente, e o inexperiente Charlie, levou a ótimos momentos no episódio. Ajudou também na construção de Kirk, que agiu em boa parte do episódio como uma espécie de apoio paternal. Creio que tudo isso tenha acontecido por mérito de Dorothy Fontana, que foi uma excelente roteirista de Jornada nas Estrelas, mesmo que alguns digam que Rooddenberry teve uma participação no que ela escreveu. Quando vemos uma história escrita por Fontana, sempre nos vêm à cabeça a sensação de que há um algo a mais ali.

Morre Robert Walker Jr., do episódio "Charlie X" | Trek Brasilis ...
O ator Robert Walker Jr., recentemente falecido…

Mas o mais surpreendente é o desfecho do episódio, que dá mais profundidade ainda à Charlie. Se no início do episódio a gente simpatizava com o garoto por sua inexperiência adolescente (com a qual todos nós poderíamos perfeitamente nos identificar), com o desenrolar da história, sua onipotência e instabilidade o transformam num vilão maligno. Mas o fim do episódio deixa nosso Charlie numa situação de vulnerabilidade total frente aos thasianos. E aí, passamos a sentir pena do garoto, pois, contra a sua vontade ele vai ficar preso à uma civilização que não tem qualquer sentimento ao toque humano e ao amor, coisas que ele tinha experimentado na Enterprise e queria explorar mais. Voltamos a ver Charlie como um adolescente inexperiente e que não sabe lidar com suas emoções. Entretanto, aquele mal ao qual Charlie será obrigado a passar é absolutamente necessário, já que seu convívio com os humanos é extremamente perigoso. Resta à tripulação assistir, mortificada, ao destino imposto à Charlie e, principalmente, a vermos Rand, chorosa e entristecida, lamentar o que aconteceu com o adolescente, justamente Rand, que mais havia sofrido nas mãos de Charlie. Ou seja, um desfecho que complexifica um personagem que poderia ser visto apenas como um plano vilão odioso que merece ser castigado. Devemos sempre nos lembrar que Jornada nas Estrelas era um programa televisivo de entretenimento e tal profundidade de personagem em Jornada nas Estrelas era, já nos primeiros episódios, um cartão de visitas de que não víamos um produto cultural qualquer.

Dessa forma, se “O Estranho Charlie” nem sempre é bem visto por algumas pessoas do fandom, ainda assim é um episódio cheio de virtudes da gênese de Jornada nas Estrelas e merece ser revisitado.  

Star Trek – Charlie X (Review) | the m0vie blog
Um desfecho de dar pena…

Batata Movies – Sepulcro Indiano. Culturas “Exóticas”.

O Sepulcro Indiano (1959) | Cineplayers
Cartaz do Filme

Mais um filme de Fritz Lang, agora em sua volta à Alemanha, depois de anos nos Estados Unidos. “Sepulcro Indiano” (“Das Indische Grbamal”, 1959) é a continuação de “O Tigre de Bengala” (“Der Tiger Von Eschnapur”), a partir de uma ideia conceciba conjuntamente por Fritz Lang e sua esposa Thea Von Harbou, cuja parceria rendeu, na década de 20, filmes como “Os Nibelungos” e o próprio “Metrópolis”, indo bem na vibe da paixão de Lang pelas chamadas culturas “primitivas” do Oriente. Para podermos falar sobre essa película, vamos liberar spoilers de sessenta e um anos.

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Fugindo da perseguição do marajá, com uma teia de aranha de deuixar o Peter Parker com inveja…

Bem, “Sepulcro Indiano” começa dando um pequeno resumo de “O Tigre de Bengala” para contextualizar o espectador. O plot fala de um arquiteto, Harold Berger (interpretado por Paul Hubschmid) que chega à Índia para fazer obras para um marajá local, Chandra (interpretado por Walter Reyer). À caminho do castelo, Berger salva a dançarina Seetha (interpretada por Debra Paget) do ataque de um tigre. Os dois se apaixonam, mas Seetha já está prometida ao marajá. Os dois fogem, sendo perseguidos pelos homens do marajá, Paralelamente, o irmão do marajá pretende tomar seu trono e inicia uma conspiração.

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Uma dança sensual perante os sacerdotes no templo de Shiva

É um filme muito imerso na cultura indiana e que tem tons de uma produção bem cara. Há todo um ritual para a deusa Shiva, onde a sequência em que Seetha dança perante uma serpente, um tanto risível, impressiona, entretanto, por todo o contexto. Uma gigantesca estátua da deusa ornamenta o cenário. E o ritual, assistido pelos sacerdotes, que procura atestar a fidelidade da moça perante o marajá, mas também a toda a cultura local, mostra um verdadeiro conflito de poder entre o marajá e os sacerdotes, onde o primeiro está cego de ódio pela traição, colocando seus interesses particulares sobre os da coletividade. Ao final, quando o marajá se vê diante de um golpe arquitetado pelo seu irmão, mas recupera o poder depois, ele pode testemunhar as atitudes louváveis de Berger e abre mão de seu poder, tornando-se o assistente do ancião e sábio local, que já o havia alertado que a única atitude que o marajá poderia tomar perante o caso de Seetha era a humildade e resignação. No mais, temos um bom filme de ação, onde cenas de luta e perseguição tornam o filme até bem contemporâneo aos olhos das gerações de porrada, bomba e tiro. Lembrando sempre que temos aqui cenários e figurinos simplesmente esplêndidos, que nos dão a boa impressão de uma produção feita com muito cuidado e tato. Fica aqui a curiosidade de ver uma história desse naipe sob a óptica do cinema expressionista alemão, já que foi uma ideia concebida originalmente por Lang e Harbou.

Foto de O Sepulcro Indiano - O Sepulcro Indiano : Foto - AdoroCinema
Uma produção muito bem cuidada, de figurino impecável…

Dessa forma, se a gente não consegue ter uma ideia inicial do que é a obra completa “O Tigre de Bengala/Sepulcro Indiano” (lembremos que estamos inicialmente, nessa mostra de Fritz Lang na Batata Espacial, garimpando todos os filmes de Lang legendados ou dublados em português no Youtube, e não achamos “Tigre de Bengala”), pelo menos a análise de “Sepulcro Indiano” nos dá uma boa impressão dessa produção alemã que segue muito a linha dos filmes de ação, mas com uma roupagem das culturas consideradas “exóticas” pelos europeus, de que Lang tanto gosta e que ele muitas vezes menciona em seus filmes. É de se notar o respeito do diretor por essas culturas ao ver o desfecho do marajá que aceita as palavras serenas e coerentes do ancião local. Vale a pena uma olhada na película na íntegra abaixo, mostrando a versatilidade desse diretor cuja obra permeia boa parte da História do Cinema.

https://www.youtube.com/watch?v=WV4Hp73UpmA

Batata Movies – Guerrilheiros Das Filipinas. A Guerra No Pacífico.

Guerrilheiros das Filipinas - 1950 | Filmow
Cartaz do Filme

Mais um filme de Fritz Lang. “Guerrilheiros das Filipinas” (“American Guerrilla In The Philippines”, 1950)é mais um filme do vastíssimo repertório de películas de Segunda Guerra Mundial, abordando, desta vez, a guerra do ponto de vista do front do Oceano Pacífico, onde os Estados Unidos tiveram grande participação. Lembrando que este é um filme que foi rodado em 1950, ou seja, quando a guerra já havia terminado. Lembrando que os spoilers de setenta anos estão liberados.

Guerrilleros en Filipinas [American Guerrilla in the Philippines ...
Palmer. Perdido num país controlado pelos japoneses…

O plot é o seguinte. O Japão invade as Filipinas, forçando a retirada das tropas americanas. Mas alguns militares americanos ficaram para trás, obrigando-os a sobreviver em condições adversas e a se esconder dos japoneses. Dentre eles, temos Chuck Palmer (interpretado por Tyrone Power), que tem planos de arrumar um barco e seguir para a Austrália, para se juntar aos militares americanos e voltar à guerra. Nesse ínterim, ele conhece Jeanne Martinez (interpretada por Michelle Presle), que, apesar de sua origem francesa, abraçou a nacionalidade filipina e diz que Palmer que não pretende fugir. Palmer, por sua vez, consegue o tal barco, que logo será destruído pelas monções, sendo obrigado a retornar às Filipinas. Ele andará escondido pelas florestas com mais um punhado de soldados americanos, planejando arrumar outro barco para ir par a Austrália até que encontra Juan Martinez (interpretado por Juan Torena), o marido de Jeanne Martinez. Juan diz que pode arrumar um barco falando com um militar filipino que resiste contra os japoneses e que está em contato com outros americanos que fazem um movimento de guerrilha. Palmer acaba se envolvendo com a guerrilha de forma que ele não pode sair mais e entra na resistência contra os japoneses até a chegada de Macarthur no arquipélago, três anos depois.

Filme: Guerrilheiros Das Filipinas (American Guerrilla in the ...
Um barco rumo à Austrália…

O filme, em seu início tem letreiros que explicam que a película foi rodada nas Filipinas, com o apoio de seu governo e das forças armadas, cujos líderes foram ativos no movimento de guerrilha contra os japoneses, além de agradecimentos ao Departamento de Defesa dos Estados Unidos. Ou seja, esses letreiros já dão um grau de legitimidade ao que vemos no filme, pois vemos o registro de um feito relativamente recente. A película deixa bem claro que, não fosse a investida de Macarthur no último momento, a guerrilha não teria a menor chance contra o exército japonês. De qualquer forma, o filme tem lances muito curiosos como, por exemplo, toda a montagem de uma estrutura para que o movimento de resistência pudesse existir, onde baterias velhas eram vistas como ouro, pois elas poderiam ser reaproveitadas para se estabelecer um sistema de rádio, o que possibilitou o contato até com os Estados Unidos, ou o uso de arames farpados para se estabelecer um sistema de telégrafo. Um miniestado foi estabelecido numa cidade filipina, com direito a impressão de jornais e até de uma moeda local.

MICHELINE PRESLE, TYRONE POWER, AMERICAN GUERRILLA IN THE Stock ...
Jeanne será seu par romântico…

É claro que aqui os japoneses foram representados como a vilania a ser superada e varrida da face da Terra. Se em “Os Carrascos Também Morrem”, os nazistas tinham cara e procedimentos ultrajantes em toda a sua venalidade, aqui os japoneses são vistos de forma mais caricata reduzidos a uma truculência militarista incompreensível, onde só um oficial se comunica com os personagens da história, mas sempre de forma ameaçadora. O leitor mais atento pode perguntar: e o amor pelo exotismo asiático que Lang sempre nutriu? Podemos ver nas Filipinas como um todo, onde vemos as populações das aldeias locais e seus hábitos, com danças típicas na sequência da festa, assim como a beleza das florestas e paisagens.

Filme - Guerrilheiros das Filipinas (American Guerrilla in the ...
Luta aberta…

Dessa forma, “Guerrilheiros das Filipinas” é outro filme de Fritz Lang, mais um a abordar a temática da Segunda Guerra Mundial, agora na frente do Pacífico, com direito a filmagem nas próprias Filipinas. Um filme que fala de uma resistência conjunta entre americanos e filipinos contra o fascismo e o imperialismo japoneses. Vale a pena assistir a película na íntegra abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=L7JVKHBI7qI

Batata Movies – Os Carrascos Também Morrem. Um Povo Contra O Nazismo.

Resenha #45 – Os Carrascos Também Morrem (Hangmen Also Die, 1943 ...
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana de Fritz Lang. “Os Carrascos Também Morrem” (“Hangmen Also Die”, 1943), pode ser considerado um filme todo especial do diretor, pois ele é baseado numa história que Fritz Lang escreveu com ninguém mais, ninguém menos que Bertolt Brecht. Uma história de resistência do povo tcheco contra a invasão nazista.  Lembrando que os spoilers de setenta e sete anos estão liberados.

Cinema Rosa: Os carrascos também morrem – Fundação Rosa Luxemburgo
Svoboda, fugindo da perseguição dos nazistas…

O plot é bem simples e foi baseado numa história real. O administrador nazista da Tchecoslováquia é conhecido por ser um carrasco cruel do povo tcheco. Ele acaba sendo assassinado pela resistência tcheca, o que faz com que a Gestapo, a polícia secreta nazista, comece uma caçada. Os nazistas prendem várias pessoas para pressionar a população, promovendo fuzilamentos até que o autor do atentado apareça. Ele é o Doutor Franticek Svoboda (interpretado por Brian Donlevy), que se esconde na casa do historiador Stephen Novotny (interpretado por Walter Breenan). Isso vai envolver a família do historiador, que é seguidamente presa e interrogada pelos nazistas. O filme, portanto, será todo um rosário de situações onde o povo tcheco terá que lidar com a pressão e a truculência dos nazistas até que estes encontrem o assassino.

Filme: Os Carrascos Também Morrem (1943) | Filmes, Títulos de ...
Masha tomará consciência da luta, ameaçando até seu noivado…

Se tem uma coisa que a dupla Lang/Brecht conseguiu fazer aqui é colocar no espectador um ódio muito grande contra os nazistas. Poucas vezes vimos uma truculência tão crua num filme de Segunda Guerra Mundial que, como já dissemos aqui várias vezes, tem um repertório muito vasto. Por um outro lado, a união do povo tcheco contra o nazismo se torna um personagem à parte. E isso tem uma explicação. Esse é um típico filme de propaganda, pois à época em que ele foi realizado (1943), a guerra ainda não havia terminado e era uma prática no cinema americano se fazer filmes onde eram exaltados povos que lutavam efetivamente contra o nazismo naquele momento. Ou seja, podemos dizer que tais filmes eram uma espécie de propaganda exaltando a luta contra o nazismo. Quando a União Soviética passou para o lado dos aliados, por exemplo, foi feito um filme exaltando a resistência do povo ucraniano na luta contra o nazismo (“Estrela do Norte”, 1943). Ou seja, os comunistas eram bem vistos no cinema americano quando eram aliados na época da Segunda Guerra Mundial.

As obras de Brecht no cinema - Tribuna do Norte
A herança expressionista de sombras como personagens ameaçadores…

Embora a população tcheca tenha sido exaltada como bastião de resistência, o filme é claro em mostrar como as táticas desumanas dos nazistas de repressão tinham êxito em dividir a população. Vemos, por exemplo, Svoboda numa baita de uma crise de consciência ao ver muitos inocentes sendo executados por causa do homicídio que ele cometeu, a ponto de Svoboda querer se entregar aos nazistas, algo que somente não aconteceu pois ele foi dissuadido por seus companheiros, pois o ato de Svoboda se entregar significava que os nazistas ganhariam em sua pressão. A filha de Novotny, Masha (interpretada por Anne Lee), também passou pela transição de uma personagem que queria entregar o assassino para salvar o pai para uma cidadã tcheca que era consciente de sua resistência, sofrendo a dura pena de ver seu pai ser executado, mas com a consciência tranquila de que resistia ao nazismo.

Filme - Os Carrascos Também Morrem (Hangmen Also Die!) - 1943
Masha e Svoboda vão lutar para encobrir o verdadeiro assassino…

Apesar das pressões nazistas, a união da população tem sua grande exaltação quando ela trabalha conjuntamente para incriminar um cervejeiro que era um agente nazista e vigiava os passos da resistência. Ao final, ficou claro que os nazistas sabiam que o cervejeiro não era o culpado, mas ele foi o bode expiatório conveniente para ficar a impressão de que os nazistas tiveram êxito na investigação. Só devemos nos lembrar que os reais assassinos do administrador alemão se suicidaram quando perceberam que o cerco nazista se fechava cada vez mais.

Fritz Lang faz 125 anos | Veja todo o conteúdo audiovisual ...
Svoboda será convencido a não se entregar….

Dessa forma, “Os Carrascos Também Morrem” é um filmaço de Fritz Lang, que pode falar com conhecimento de causa sobre o nazismo e trouxe sua visão sobre o conflito europeu para o cinema americano com grande competência e a ajuda do grande Bertolt Brecht. Vale a pena assistir o filme na íntegra abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=lT899HzlE-8

Batata Movies – Conquistadores. Mais Um Western De Fritz Lang.

Os Conquistadores - 21 de Abril de 1941 | Filmow
Cartaz do Filme

Mais um filme de Fritz Lang. “Conquistadores” (“Western Union”, 1941) fala da saga da instalação da linha de telégrafo de Omaha a Salt Lake City e todas as dificuldades a serem superadas nessa empreitada. Mais um film com spoilers (de setenta e nove anos) liberados.

15. Os Conquistadores (Western Union, 1941) | by Ivanildo Pereira ...
Um ladrão que salva sua vítima…

A película começa com um criminoso sendo perseguido. Ele é Vance Shaw (interpretado por Randolph Scott). Seu cavalo não consegue mais levar a cabo a fuga e ele precisa roubar o cavalo de um homem ferido. Ele, com peso na consciência, não consegue deixar o homem para trás e o salva, deixando-o num lugar onde pode receber assistência, e fugindo novamente. O tempo passa e o homem ferido, chamado Edward Creighton (interpretado por Dean Jagger) mostra ser o responsável por instalar a linha de telégrafo da Western Union. Coincidentemente, ele se reencontra com Vance Shaw, contratando-o para trabalhar. Edward tem uma irmã, a bela Sue Creighton (interpretada por Virginia Gilmore), que será disputada por Shaw e pelo recém-chegado Richard Blake (interpretado por Robert Young), que também vão se tornar amigos.

15. Os Conquistadores (Western Union, 1941) | by Ivanildo Pereira ...
Todas as dificuldades para instalar uma linha de telégrafo…

Mas a empreitada da instalação dos fios do telégrafo pelo velho oeste não será algo fácil. Uma tribo indígena não vai aceitar a instalação da linha por suas terras, o que vai obrigar Edward a fazer uma missão diplomática para conversar com o chefe, tendo Shaw como intérprete. Mas o pior problema será um grupo de mercenários do Missouri, cujo líder é irmão de Shaw, e que trabalham para os exércitos confederados do sul, onde eles vão fazer de tudo para que a linha de telégrafo yankee da Western Union não consiga ser instalada. Shaw vai ficar numa tremenda saia justa ante os ataques da gang de seu irmão e vai perder a confiança de Edward. Shaw, então, vai ter que tomar uma atitude drástica.

Conquistadores (1941) | A Grande Ilusão
Um triângulo amoroso soft…

Se em “O Retorno de Frank James” vimos um Western com outros elementos como a presença marcante da guerra de secessão e um julgamento altamente cômico, “Conquistadores” é um Western mais de raiz, com direito a duelos entre o mocinho e o bandido pela cidade e ataques de índios a brancos. De qualquer forma, o filme mostra alguns elementos interessantes, como o empreendimento de se instalar a linha telegráfica pelos rincões do velho oeste. E o diálogo entre Edward e o chefe índio, tendo Shaw como intérprete. A conversa foi feita em tons bem diplomáticos e dentro dos parâmetros culturais dos indígenas, mesmo que depois os brancos saiam caçoando dos índios. Impossível não se lembrar das alusões às “culturas primitivas” nos filmes de Lang, embora não tenhamos certeza de que isso tenha sido uma influência de Lang (eu acredito que não, pois o cineasta somente dirigiu o filme, não escrevendo o roteiro ou produzindo o filme). Por sua vez, é interessante ver novamente a guerra de secessão influenciando a história do filme, embora um pouco menos que em “O Retorno de Frank James”. Em “Conquistadores”, a guerra serve como um pretexto para colocar Shaw e seu irmão em pólos opostos, onde a linha de telégrafo acaba sendo ameaçada. O filme ainda teve um bom alívio cômico com Slim Summerville interpretando Herman, o cozinheiro que não queria estar na expedição e passava pelas situações mais engraçadas.  

antologia do esquecimento: WESTERN UNION (1941)
Lang na direção…

Dessa forma, “Conquistadores” é um filme Western mais raiz de Fritz Lang, embora traga a curiosidade da instalação da linha de telégrafo, o alívio cômico do cozinheiro, a guerra de secessão como um elemento a dividir dois irmãos e a interessante conversa diplomática entre brancos e índios. Vale a pena dar ma conferida no filme na integra abaixo.

Batata Movies – O Retorno De Frank James. Um Western De Estado Dividido.

O Retorno de Frank James - Filme 1940 - AdoroCinema
Cartaz do Filme

Voltemos a falar da fase americana de Fritz Lang, analisando as incursões do diretor no Western. “O Retorno de Frank James” (1940) nos dá a oportunidade de ver Lang trabalhando com Henry Fonda num filme que extrapolava o próprio gênero do Western, abordando, de forma divertida, temas da História dos Estados Unidos como a guerra de secessão. Para podermos falar dessa película, vamos lançar mão de spoilers de oitenta anos.

O Retorno de Frank James – 1940 – (Trial Áudio/Dublado) – Bluray ...
Frank James vai vingar o irmão, Jesse James, de uma morte covarde…

O plot gira em torno do tal Frank James (interpretado por Fonda), irmão do lendário Jesse James, que foi assassinado pelos irmãos Ford, antigos companheiros de confiança nos crimes e que mataram Jesse James pelas costas. Escondido num rancho, Frank James não quer saber muito de confusão e não vai se meter a caçar os assassinos, confiando na justiça, para desespero de Clem (interpretado por um jovem Jackie Cooper, que seria o Perry White do filme do Super Homem de Christopher Reeve), filho de um dos membros da quadrilha de Jesse, que havia ficado sob a proteção de Frank. Quando os irmãos Ford são condenados à forca mas perdoados por McCoy, o político local, Frank sai à caça dos irmãos Ford, mandando que Clem fique no rancho. Mas o rapaz sai às escondidas e se encontra com Frank justamente quando ele assalta um posto da estrada de ferro. O funcionário acaba morrendo de um tiro que vem de fora do posto, dado pelos policiais do xerife. Frank vai para Denver, no Colorado, onde espalha a notícia de sua morte, com a ajuda de Clem, despertando o interesse da aspirante a jornalista Eleanor Stone (interpretada por Gene Tierney). A caçada aos irmãos Ford continua e Frank consegue perseguir um e trocar tiros com ele. Mas a munição de Ford vai acabar e ele, que está no alto de um penhasco, perde o equilíbrio e cai, morrendo, sem Frank alvejá-lo. De volta a Denver, Frank fica sabendo por Eleanor que seu criado negro, Pinky (interpretado por Ernst Whitman) foi condenado à forca pelo assalto ao posto da estrada de ferro, quando nem estava lá. Num primeiro momento, Frank sai à caça do segundo irmão Ford, mas muda de ideia e volta para a cidade natal, onde Pinky será enforcado. Frank será preso em flagrante e julgado. Ele acaba absolvido pelo júri, apesar de haver um complô para condená-lo, e o outro dos irmãos Ford, acreditando na condenação de Frank, vai ao tribunal assistir ao julgamento. Quando Frank é inocentado, o irmão Ford sai correndo e troca tiros na rua com Clem, que é mortalmente ferido. Ford se esconde num celeiro e Frank vai atrás dele, mas Ford também está ferido e tomba morto. Frank consegue sua vingança sem acertar um tiro sequer nos algozes de seu irmão. O filme termina com Frank se candidatando a um cargo público na cidade onde mora e fazendo uma promessa velada a Eleanor de que vai voltar a Denver para vê-la.

COOPER,FONDA, THE RETURN OF FRANK JAMES, 1940 Stock Photo - Alamy
Frank James com Clen (Jackie Cooper, o Perry White do “Superman”, de Christopher Reeve)

Quando vemos Fritz Lang fazendo um Western, é claro que não se trata de um filme “Noir”. Mas não devemos deixar de mencionar algumas cenas noturnas no filme que lembram o subgênero policial, assim como a questão do crime, do julgamento e do personagem ambíguo que é Frank James, o homem que quer abandonar a vida de crimes, confiando na justiça, mas quando a vê que esta é manipulada no perdão aos irmãos Ford, retorna aos velhos tempos de malfeitos na sua busca por vingança, voltando a roubar e a perseguir assassinos para fazer a justiça com as próprias mãos. Foi a força das circunstâncias que fez nosso protagonista ver a sua vingança sendo realizada sem sujar as mãos.

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Eleanor, uma aspirante a jornalista. Empoderamento feminino…

O filme teve um momento estupendo e muito inteligente, que foi o julgamento de Frank James. Aqui, as querelas da guerra de secessão, que já haviam acontecido, ajudaram a determinar os rumos do julgamento. Frank James era um ex-soldado confederado, assim como seu advogado, o divertido Major Rufus Cobb (interpretado por Henry Rull). O promotor, um yankee típico, acabou sendo o pretexto para que o julgamento de Frank se tornasse uma guerra norte-sul, com o juiz, também, sulista, tendo que mediar os conflitos. A batalha retórica entre a promotoria e a defesa foi escrita de forma muito inteligente, lançando mão do humor, algo que não esperamos, à princípio, num Western. O pouco caso de Frank para com o andamento do julgamento expressava claramente a pouca credibilidade de um tribunal de um Estado ainda com sequelas de divisão, que jamais poderia ser justo, ainda mais porque Frank sabia que ele e seu irmão eram perseguidos na cidade. De qualquer forma, a questão da guerra pesou para o júri, que vinha a intervenção da estrada de ferro, provavelmente yankee, na sua região, como mais um fator a decidir a favor de Frank.

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Julgamento, a melhor sequência do filme…

Dessa forma, “O Retorno de Frank James” é mais um bom filme de Lang a ser apreciado, pois ele ultrapassa os limites do Western, lançando mão de falas bem escritas e engraçadas na cena do julgamento, que usam a guerra de secessão como um elemento de relevância a se decidir o veredicto. Além disso, sempre é bom rever Henry Fonda. Não deixem de assistir à película dublada abaixo.  

https://www.youtube.com/watch?v=eT7n0rvL-Tk&t=65s

Batata Movies – Desejo Humano. Uma Estranha Demonização.

MOVIE POSTERS: HUMAN DESIRE (1954)
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana de Fritz Lang. “Desejo Humano” (“Human Desire”, 1954), além de apresentar a rara situação de ter a tradução literal em português do título original, é mais uma história adaptada, dessa vez de um romance de Émile Zola (“La Bête Humaine”). O claro/escuro aparece mais uma vez, assim como uma referência rápida à cultura japonesa. Mas, dessa vez, vemos um forte drama psicológico usando um assassinato como pano de fundo. Mais uma vez, os spoilers, agora de sessenta e seis anos estão liberados.

Human Desire (1954) -- (Movie Clip) That's Railroadin'
Jeff (esquerda). Um maquinista de volta da guerra

Qual é o plot da história? Vemos aqui o personagem Jeff Warren (interpretado por Glenn Ford), um ex-combatente da Guerra da Coreia que consegue retornar à sua vida antiga de maquinista de trem. Jeff está muito feliz com seu retorno e ao convívio com os seus. Ele tem um amigo chamado Carl Buckley (interpretado por Broderick Crawford) que acabou de ser demitido e pediu para a sua esposa, Vicki (interpretada por Gloria Grahame, conversar com John Owens (interpretado por Grandon Rhodes), um rico empresário que pode influenciar o patrão de Carl a devolver seu emprego. Entretanto, Vicki não queria fazer isso, pois ela já foi criada na casa de Owens e tinha que se entregar a ele para que o patrão a mantivesse junto com sua mãe. Ao pedir um favor para Carl, a coisa não foi diferente. O problema é que Carl desconfiou que tivesse acontecido algo entre Vicki e Owens. Dessa forma, Carl agrediu Vicki violentamente e planejou o assassinato de Owens com o auxílio forçado de Vicki, dentro do vagão de um trem em viagem, sendo que Carl obriga Vicki a forjar uma carta convidando Owen para um encontro que seria a armadilha para a morte de Owen. A carta também seria usada por Carl para chantagear Vicki, pois a carta incrimina a moça e mantê-la com ele. Ao saírem do local onde Owen foi assassinado por Carl, o casal viu Jeff e Carl obrigou Vicki a despistá-lo, atraindo-o para o bar, o que fez com que Jeff se apaixonasse por Vicki. No fim da viagem, Carl e Vicki se encontram com Jeff e este último finge que nada ocorreu. O corpo de Owen é encontrado e, na investigação, Jeff não cita que viu Vicki no depoimento para incriminá-la. Jeff e Vicki começam um romance às escondidas e, aos poucos, Jeff descobre tudo o que ocorreu. Os dois, então, planejam a morte de Carl, mas Jeff não consegue matá-lo. Vicki acreditava que Jeff podia fazê-lo, mas, segundo o próprio Jeff, matar um soldado inimigo desconhecido é bem diferente de matar um bêbado que tem nome e rosto. Jeff percebe que Vicki o estava usando para se livrar de Carl e desfaz o namoro, entregando à Vicki a carta que a incriminava, pois Jeff a tomou de Carl, que novamente perde o emprego, fazendo Vicki ir embora, se afastando definitivamente de Carl. Na viagem em que Vicki vai embora, e onde Jeff conduz o trem, Carl está no trem e implora para Vicki ficar com ele. Esta se nega e humilha Carl, que a mata estrangulada.

Human Desire (1954) – The Movies I have seen!
Jeff vai se apaixonar por Vicki…

É um filme muito perturbador, pois se a personagem Vicki é vitimizada num primeiro momento, ela é demonizada num momento posterior. A moça não queria rever Owen, pois sabia que o adultério aconteceria, mas, para ajudar o marido a recuperar o emprego, ela acaba sendo obrigada a ir para depois ser agredida violentamente pelo próprio marido morto de ciúmes, que ainda a envolve num homicídio e a chantageia com uma prova forjada contra ela. Para se livrar de tudo isso, Vicki usa Jeff, talvez a única opção que ela tivesse, sendo, por isso demonizada. Mesmo que a postura de Vicki não tenha sido das mais virtuosas, ficou parecendo a uma certa altura do filme que as atitudes de Vicki foram muito mais torpes do que a do próprio Carl, onde o adultério teve um peso muito forte, sendo condenado até por Jeff, e onde a história insinua que as atitudes de Carl poderiam até ser justificadas em virtude do adultério, pois seriam executadas por um homem verdadeiramente apaixonado. Tais visões de mundo são muito estranhas aos olhos de hoje, ainda mais porque vemos Vicki sendo severamente castigada por suas atitudes, sendo estrangulada ao final do filme. Todas essas características do filme revelam um tratamento muito desproporcional no que se refere à forma como Vicki e Carl são vistos na película. E, se o filme foi rodado há mais de sessenta anos, não podemos nos esquecer que a história é baseada num romance de Zola, mais antigo ainda.

Human Desire (Fritz Lang 1954) | another film blog
Sinais de agressão. Mas isso não impede a demonização de Vicki na história…

Dessa forma, “Desejo Humano” é mais um filme de Lang que vai dessa vez abordar um drama mais psicológico com um juízo de valor baseado numa visão de mundo considerada por nós antiga, provocando estranhamentos. Temos aqui uma vítima que é demonizada, muito em função de se tratar de uma mulher que comete adultério. Um filme bem perturbador para nossos padrões atuais. Mas vale a pena vê-lo na íntegra abaixo.  

https://www.youtube.com/watch?v=_mquP9Lw9JE