E a Disney apresenta mais uma de suas boas animações. “Moana, Um Mar de Aventuras”, e concorre ao Oscar de Melhor Animação e repete a fórmula das últimas animações de apresentar culturas de povos muitos diferentes dos WASPs, sendo esse um bom serviço feito na direção da tolerância e do respeito às diferenças, cada vez mais em falta no mundo, e que devem ser ensinados desde sempre às crianças.
A história se passa na Polinésia e é baseada na cosmogonia de tribos locais. A deusa Te Whiti, que é visualizada pelos nativos como as encostas de sua ilha, teve o seu coração roubado por Maui, uma espécie de semideus. Mas, ao lutar contra um monstro que expelia lava (alegoria dos vulcões da região), ele perdeu o coração e um anzol mágico que o fazia se transformar. Isso deixaria o povo da Polinésia à mercê das forças do mal. Essa história era contada por uma anciã às crianças de sua tribo que choravam muito quando escutavam isso, exceto uma: Moana, que era a filha do líder da tribo e herdeira de seu poder. O sonho de Moana era pegar um barco e desbravar o oceano, para o desespero do pai, que queria manter toda a sua tribo segura na ilha. Mas os pescadores percebiam que os peixes diminuíam cada vez mais, indício da maldição que pairava sobre a ilha. Incentivada pela avó e a contragosto do pai, Moana parte para o Oceano, de posse do coração de Te Whiti, que fora achado pela anciã, para procurar por Maui, que precisa entregar o coração para a deusa e restabelecer o bem.
A animação é muito legal em vários sentidos. O principal deles é o de deixar as crianças ocidentais a par da cultura local dos povos da Polinésia, algo muito importante para ensinar as crianças o respeito pelas diferenças. Aliás, devemos mencionar que esse filme foi até um pouco além nesse quesito, pois dentre os vários números musicais presentes na animação, pudemos presenciar alguns em língua nativa local e sem legendas, algo que não se vê todo dia nas animações da Disney. Ainda, devemos chamar a atenção que os povos da Polinésia têm uma cultura que relativamente se assemelha em alguns momentos à cultura indígena brasileira, principalmente quando vemos toda uma visão de mundo onde as forças da natureza têm um papel fundamental. Essa interação do ser humano com o meio ambiente, expressa de forma profunda em culturas consideradas “primitivas” pelo homem branco ocidental “civilizado”, é uma tremenda lição para as futuras gerações, já que nosso planeta se vê cada vez mais ameaçado pelos violentos golpes que o ser humano desfere contra a natureza, que também reage a altura. Devemos sempre nos lembrar que precisamos do planeta e sua natureza para viver, mas o planeta e a natureza não precisam da gente para continuarem a existir. E a animação mostra como a interação harmoniosa do ser humano com o meio ambiente pode ser algo totalmente possível, expresso metaforicamente na relação de Moana com o oceano.
Os roteiristas da animação também foram muito felizes em explorar uma característica dos povos da Polinésia que inicialmente poderia causar uma certa estranheza, que é a prática de cobrir os corpos inteiros com tatuagens. Se aqui no Brasil, mais precisamente no Rio de Janeiro, a tatuagem é até uma coisa corriqueira, nem sempre isso é verdade em outros recantos considerados “brancos e civilizados” do mundo. Optou-se por fazer as tatuagens de Maui vivas, o que levou a vários momentos engraçados na animação. O bom relacionamento entre Maui e Moana também chamou a atenção, pois não houve qualquer insinuação de caso amoroso entre os dois em qualquer momento, numa situação relativamente espinhosa para uma animação infantil (uma adolescente e um homem adulto presos num barco em pleno oceano). Percebeu-se como houve um cuidado em mostrar que a relação entre os dois chegava, no máximo, a uma ideia de afeto platônico. Ou seja, por mais que a Disney esteja trabalhando temas de outras culturas no filme, o moralismo WASP não foi de todo esquecido e se infiltrou na cultura polinésica local.
Assim, “Moana, Um Mar de Aventuras”, é mais uma boa animação que a Disney coloca nas telonas. Mais uma animação que busca mostrar uma cultura local, com o objetivo de familiarizar o branco, anglo-saxão e protestante com o outro. E uma animação que busca exibir que uma interação harmoniosa do ser humano com o meio ambiente é possível, sendo que isso é ensinado por uma cultura considerada “primitiva” aos olhos de brancos com doses intoleráveis de etnocentrismo. Programa imperdível para crianças e adultos.