Um bom drama biográfico passa quase que despercebido por nossas telonas. “Mark Felt, O Homem Que Derrubou A Casa Branca”, escrito e dirigido por Peter Landesman, e que tem Ridley Scott como um dos produtores, reconstitui a história do vice-presidente do FBI que denunciou o caso Watergate à imprensa e ficou conhecido como “Garganta Profunda” por isso. O caso provocou a demissão de vários funcionários do primeiro escalão do governo americano no início da década de 70 e a renúncia do próprio presidente Richard Nixon. Para interpretar um personagem real tão cascudo assim, tivemos o bom ator Liam Neeson, que fez o papel com desenvoltura, numa ótima caracterização, onde a maquiagem o envelheceu bastante.
Esse é um tipo de filme em que não há cenas de ação e que exige muito do espectador, que deve ficar atento à trama o tempo todo para não perder o fio da meada. Mark Felt é uma figura e tanto na película, pois nunca foi presidente do FBI, mas ficou na retaguarda da figura do todo poderoso J. Edgard Hoover por muitos anos, conhecendo a fundo casos altamente confidenciais, o que despertava o medo de todos.
Com a morte de Hoover, ficava claro que o nome de Felt seria o imediato na sucessão da presidência do FBI, mas isso não ocorreu, muito provavelmente em virtude de todo esse temor que ele provocava. Felt fazia questão de frisar que o FBI era uma instituição austera e incorruptível, não sofrendo qualquer interferência de ninguém que fosse, nem da Casa Branca, para realizar suas investigações (o que, provavelmente, foi uma patriotada daquelas que a gente vê nos filmes americanos, pois é muito difícil uma instituição ser tão austera e incorruptível tal como o filme quer vender). Quando ele sentiu que o escândalo de Watergate iria ser abafado pela presidência, acabou botando a boca no trombone, mesmo que omitindo sua verdadeira identidade.
Além da necessidade de atenção total do espectador na trama, podemos dizer que esse filme tem o tempo todo um clima altamente tenso e soturno, onde a política é a força motora. Ninguém vai ser morto, não haverá lances violentos, mas parece que eles nos espreitam a cada fotograma. E esse clima pesado envolve a gente, que já sabe o desfecho da coisa. Ou seja, o filme em si já é uma espécie de grande spoiler, por se tratar de um evento real. Por isso mesmo, o que importa aqui não é a conclusão, mas sim o desenrolar da história. Como foi essa denúncia? Como ela foi sendo construída ao longo do tempo por um personagem considerado tão austero? Para a coisa não ficar muito mecânica, esse clima tenso e soturno foi um elemento muito interessante no filme, justamente para dar uma componente um tanto dramática ao espectador e não somente ser algo descritivo e sem emoção.
Além de Neeson, não podemos nos esquecer de Diane Lane no papel de Audrey, esposa de Felt, que sofria muito com as pressões que o marido sofria no emprego e nas constantes mudanças de cidade (e até de estado) que o cargo do marido exigia. Aliás, esse foi um lance interessante do filme, que mostrou a vida pessoal de Felt e todo o preço que ele acabou pagando por causa das responsabilidades de um emprego tão espinhoso, onde até a filha dele se distanciou e passou a fazer parte de um grupo que lutava pelos direitos civis, numa clara cisão familiar.
Assim, “Mark Felt, O Homem Que Derrubou A Casa Branca” não é exatamente uma película espetacular, mas deve ser acompanhada com atenção pelo cinéfilo mais atento, pois é um bom trabalho de reconstituição política de um momento turbulento da História Política dos Estados Unidos. Neeson foi muito bem em seu papel e o clima sombrio de um filme embebido em tramas políticas é muito atraente. Vale a pena dar uma conferida.
https://www.youtube.com/watch?v=D77uJR53Apc