Um polêmico filme francês passou em nossas telonas. “120 Batimentos Por Minuto”, de Robin Campillo, que ganhou o Grande Prêmio do Júri em Cannes, nos leva aos anos 80 na França para testemunharmos as ações do grupo Act Up, que defendia que os infectados pelo vírus HIV tivessem acesso mais rápido e fácil a novos medicamentos desenvolvidos por laboratórios que, aparentemente, visavam apenas ao lucro. Vale lembrar que, naquela época, havia pouquíssimas drogas que davam um tratamento apenas parcialmente eficaz e que traziam efeitos colaterais desagradáveis, como o AZT.
O Act Up fazia ações volta e meia radicais, como invadir os escritórios de laboratórios e sujar tudo com um sangue artificial, invadir escolas e fazer campanhas de prevenção na marra, etc., tudo isso sob a alegação de que o tempo dos infectados era muito pouco e que eram necessárias ações mais rápidas para combater o problema que tinha dimensões de saúde pública (segundo o que foi falado no filme, a França daquela época era o país da Europa com o maior número de casos de AIDS, o que não podia em hipótese alguma ser negligenciado pelo governo).
Outro ponto interessante do filme foram as reuniões que o grupo fazia, mostrando uma diversidade de opiniões que nem sempre se relacionavam de forma harmoniosa. Apesar de muitos momentos de conflito, ainda assim a gente podia ver como era o debate de um grupo de pessoas muito esclarecidas, algo que não acontece com muita frequência por aqui, infelizmente. Foi curioso, também, perceber a quantidade de homossexuais no grupo. Sabemos que o filme é datado e que hoje a AIDS está muito mais difundida em vários segmentos sociais.
Mas o filme deu um pouco a impressão de que a AIDS era uma doença restrita muito mais ao mundo gay do que a outros, embora a película tenha dito reiteradas vezes que qualquer um possa se infectar. Talvez tivesse sido melhor mostrar não somente como a AIDS atingia os homossexuais, mas também os heterossexuais.
Uma coisa que provocou muito impacto foi mostrar o desenvolvimento da doença e como ela definhava as pessoas violentamente naqueles dias (não que isso não aconteça hoje, isso tem que ficar bem claro). Isso se deu de forma fictícia, onde foi mostrado todo o processo de morte lenta de um dos personagens do filme, Sean (interpretado por Nahuel Pérez Biscayart), como de forma real, quando vimos a foto de um casal gay americano infectado, onde um dos membros do casal estava extremamente debilitado e desfigurado pela doença. Talvez essa seja a parte mais importante do filme, pois depois do terror mundial que a doença provocou, os dias de coquetel, mesclados às novas gerações que não presenciaram aqueles dias dos anos 80 e 90, trouxeram uma nova vida de descuidos e o aumento do número de infectados. Relembrar todo o mal da AIDS no filme é um choque necessário que as pessoas precisam sofrer, fazendo a película cumprir sua função social.
Assim, “120 Batimentos por Minuto” é um filme muito importante que nos faz relembrar de todas as mazelas da AIDS e notar que a doença ainda está por aí e é muito perigosa. É uma prova de que o cinema pode ser uma arte útil, do ponto de vista de denúncia de uma situação que parece que muitos não enxergam mais.