Confesso a vocês que tenho uma certa dificuldade de relação com os filmes coreanos. Sempre os achei muito morosos e de difícil digestão. Ao assistir “Em Chamas”, tive um pouco essa impressão. Mas como sempre é bom a gente lutar contra nossos preconceitos e buscar uma segunda chance contra aquilo com o que implicamos no mundo, a gente tem que ir além nas nossas análises mais reducionistas. E aqui essa análise mais profunda trouxe uma perplexidade.
Antes de mais nada, vamos ao plot, com spoilers. Temos aqui a história de Lee Jong Su (interpretado por Ah-In Yoo), um rapaz que tem um pai que acaba sendo preso por agressão, deixando uma pequena fazenda próxima à fronteira da Coreia do Norte à deriva. Assim, o moço precisa alternar seu tempo entre a cidade e o campo. Mas Su irá conhecer a jovem Shin Hae-Mi (interpretada por Jong-seo Jun), pela qual se apaixona. A moça se diz uma antiga amiga de infância de Su e relembra passagens que o rapaz não consegue se lembrar de jeito nenhum. Mi vai viajar para o exterior e pede que Su passe uns dias em seu apartamento, cuidando de seu gato que nunca aparece, mas que come a comida, bebe a água e deixa cocô na caixa de areia. Quando Mi retorna, ela traz a tiracolo Ben (interpretado por Steven Yeuh), um rapaz de outro estrato social, muito bem sucedido se comparado a Su e Mi, mas que consegue ser bem afável, com um ar um tanto blasé. Su fica com certo ciúme de Mi com relação a Ben, mas não quer transparecer. Ele percebe que há pulseiras e brincos no quarto da casa de Ben quando vai para lá. Mas Mi desaparecerá misteriosamente, deixando Su muito preocupado, enquanto que Ben continua com seu ar indiferente a tudo que acontece à sua volta. Su, por sua vez, encontra evidências de que Mi foi assassinada por Ben. E aí, Su irá tomar uma atitude radical. Uma atitude que seria óbvia para alguns, mas também que causa perplexidade para outros.
Por que a perplexidade? Porque Su acredita que Ben assassinou Mi por algo muito circunstancial, o que poderia levar a uma conclusão precipitada das coisas. Mas, acima de tudo, Su dá um desfecho tão inusitado a todo o contexto muito em função do fato de que ele queria engatilhar a carreira de escritor e, ao resolver o problema do desaparecimento de sua amiga, ele também acabou achando a inspiração de sua história, escrevendo-a antes de tomar as atitudes que achava que devia tomar.
O grande problema desse filme, assim como em vários filmes coreanos, que é o que mais me incomoda, é o ritmo extremamente moroso ao longo de toda a película, para termos nos minutos finais um acontecimento muito frenético com o desfecho logo em seguida. Ou seja, poderíamos ter um desenrolar mais complexo e duradouro da trama a partir do momento em que Su conclui que Ben assassinou Mi (se é que assassinou), tirando um pouco da morosidade do filme. Poderíamos ter uma visão de Mi do assassinato em si, a forma como Su tramou a sua reação com relação a Ben, a reação em si, etc. Ou seja, tirar um pouco a morosidade narrativa do filme e dar alguns minutos a mais de um ritmo um pouco mais dinâmico.
Assim, “Em Chamas” ainda não consegue tirar de todo a minha impressão de morosidade nos filmes coreanos, mas pelo menos trouxe um pouco mais de perplexidade no que se refere ao desfecho. Vale a pena dar uma conferida, mas prepare-se para um ritmo mais lento.