Batata Movies – Um Retrato De Mulher. Uma História Dentro De Outra.

Um Retrato de Mulher - 1944 | Filmow
Cartaz do Filme

Mais um filme da fase americana de Fritz Lang. “Um Retrato de Mulher”, realizado em 1944, traz vários integrantes do elenco de “Almas Perversas”, que seria realizado um ano depois. Outro elemento em comum nesses dois filmes foi o relacionamento entre um casal com diferença de idade, os elementos de sempre do “Noir” e do subjetivo. Mas as diferenças param por aí. O suspense volta com força total nessa película. Vamos novamente lançar mão de spoilers de setenta e seis anos.

Um Retrato de Mulher (Fritz Lang, 1945) | Cine Cafe
Uma mulher e seu retrato…

Vemos aqui a história do Professor Richard Wanley (interpretado por Edward G. Robinson), especializado em direito criminal. A sua esposa e filhos viajam e ele está sozinho numa espécie de clube com seus amigos. A conversa é amistosa e gira em torno de um quadro de uma moça jovem numa galeria próxima. Eles falam divertidamente de como seria um suposto amor entre um homem mais velho e uma moça mais nova (devemos nos lembrar que esse é um filme rodado em 1944, quando assuntos dessa magnitude eram considerados muito mais um tabu do que hoje em dia). Os amigos de Wanley vão embora e este começa a ler um livro, pedindo para o funcionário do clube avisá-lo quando for dez e meia da noite, enquanto lê um livro. Wanley adormece e é acordado pelo funcionário na hora pedida. Ao sair do clube, ele se depara com o quadro da jovem e uma mulher igual a do quadro começa a falar com ele na rua. Seu nome é Alice Reed (interpretada por Joan Bennett). Os dois começam uma amizade, vão para um bar e depois para a casa de Alice. Um homem entra na casa, aparentemente um amante de Alice e começa a estrangular Wanley. Este, para se defender, pega uma tesoura e dá nas costas do estranho, matando-o. Diante do problema, Wanley precisa se desfazer do corpo do estranho, levando-o para longe da cidade e jogando-o no matagal de um parque. Parecia a ocultação de cadáver perfeita. Mas um dos amigos de Wanley se interessa pelo caso, pois o tal estranho morto é um rico empresário. E acompanha as investigações da polícia, que se atém aos mínimos detalhes e vai encontrando as pistas para montar o quebra-cabeça que chega ao assassino. Tudo isso sob o olhar atônito de Wanley que jamais imaginou que uma investigação policial fosse tão minuciosa. Para piorar a situação, o tal empresário tinha um guarda-costas, Heidt (interpretado por Dan Duryea), um homem de má índole que vigiava todos os passos de seu patrão e percebeu que ele desapareceu na casa de Alice. Heidt vai começar a chantageá-la e a moça comunica o fato a Wanley, que bola um plano para matar o guarda-costas, colocando uma dose excessiva de tranqüilizantes numa bebida que será servida para o chantagista. Mas ele descobre o plano e cobra ainda mais dinheiro de Alice. Desesperada, ela liga novamente para Wanley, que não sabe o que fazer e ele mesmo toma a dose excessiva de tranqüilizantes para se matar. Só que Heidt é morto pela polícia e é tido como o assassino do empresário, já que ele pegou uma jóia com as iniciais de seu chefe na casa de Alice. A moça tenta, desesperadamente, avisar Wanley, mas este já se encontra morto. Ou melhor, dormindo, com o funcionário do clube avisando-lhe que são dez e meia da noite. Ou seja, toda a trama que vimos na película não passa de um sonho de Wanley, onde o empresário morto é o funcionário que guarda os chapéus e casacos do clube e o chantagista é o porteiro do clube. Na rua, Wanley se depara novamente com o quadro e uma moça fala novamente com ele. Se lembrando do sonho, Wanley, comicamente, sai correndo pela rua.

Um Retrato de Mulher - 24/02/2012 - Ilustríssima - Fotografia ...
Precisando encobrir um assassinato…

Confesso que quando vi esse filme, me lembrei de “O Gabinete do Dr. Caligari”, que tem essa mesma estrutura de uma história dentro da outra. Mas em Caligari, a história de dentro desafiava as autoridades alemãs e a história de fora tira esse peso, dizendo que todos os personagens que desafiavam a autoridade na história de dentro eram loucos de um hospício. Aqui, a história de fora restaura o happy end subtraído da história de dentro, que tem um desfecho trágico. Mas o mais interessante é que a história de dentro é totalmente onírica, um sonho mesmo. Ou seja, toda a trama principal do filme não passa de uma invenção da cabeça do protagonista, um sonho, uma alucinação, com um quê totalmente subjetivo. A história de dentro também é um suspense policial de mão cheia, onde a ironia fina está no fato de que um professor de direito penal vai ter obrigado a cometer um homicídio e a ocultar um cadáver. Ou seja, nosso protagonista vai ter que encarar, na prática, questões que ele encarava apenas teoricamente. E aí, o claro/escuro do “Noir” vem com toda a sua força, sobretudo nas cenas onde Wanley toma todos os procedimentos para ocultar o cadáver, seja apagando as luzes do apartamento de Alice, seja na ocultação do corpo em si, numa floresta à noite. A busca por pistas e as teorias sobre o assassinato elaboradas pelos investigadores nos mostram também um roteiro (diga-se de passagem adaptado) bem escrito.

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Ameaçada por um chantagista…

A máscara externa de happy end estraga um pouquinho as coisas mas, pelo menos, o desfecho foi cômico, o que destoou completamente do filme todo e foi uma pequena surpresa agradável ao seu final.

CINEMATIKO: 2733 - UM RETRATO DE MULHER
Sem coragem para encarar uma mulher mais nova depois de um pesadelo…

Assim, “Um Retrato de Mulher”, é mais um bom filme da fase americana de Frritz Lang.  Um filme que repete elenco, as fórmulas do “Noir” e do subjetivo, dá mais uma boa história de suspense que não abriu mão do happy end, mas que teve um desfecho trágico na história de dentro. O desfecho trágico viria no filme seguinte, “Almas Perversas”.  E não deixe de ver o filme completo abaixo.