Batata Books – Como Star Wars Conquistou O Universo. Por Dentro E Por Fora de “Guerra nas Estrelas”.

Por Carlos Lohse

Capa do Livro
Capa do Livro

A Editora Aleph fez um senhor lançamento no final do ano passado. O livro “Como Star Wars Conquistou O Universo”, de Chris Taylor, é uma leitura obrigatória para qualquer fã de “Guerra nas Estrelas”. Para os mais novos, é uma oportunidade e tanto de conhecer todo o Universo de uma das franquias mais amadas de todos os tempos. Para o fã mais antigo, mais rodado, é uma oportunidade de dar um “upgrade” no seu conhecimento sobre “Guerra nas Estrelas”, pois Taylor desmistifica algumas informações que eram consideradas verdades absolutas. Ou seja, o autor do livro faz um exaustivo trabalho de rever todo o conhecimento sobre a saga e atualizá-lo. Daí a sua importância.

A Legião 501
A Legião 501

O livro é dividido em vinte e sete capítulos, precedidos por uma introdução à edição de 2015 e uma introdução do livro, e sucedidos por uma conclusão e um epílogo. A introdução procura mostrar o alcance de “Guerra nas Estrelas” em várias culturas, inclusive na indígena, onde foi feito todo um esforço para exibir o filme “Uma Nova Esperança” dublado para o idioma Navajo. Os primeiros capítulos falam da infância de George Lucas, alternados com um estudo minucioso sobre as possíveis influências que “Guerra nas Estrelas” teve, indo de histórias sobre Marte escritas por Edgar Rice Borroughs até as fitas em série onde Buck Rogers e, principalmente Flash Gordon, interpretado por Buster Crabbe (essa sim uma reconhecida influência sobre o jovem George Lucas) são de grande destaque. É mencionada, também, outra paixão de Lucas além das séries e do cinema: a velocidade. Mas um acidente automobilístico grave colocou Lucas nos trilhos da sétima arte, não sem tirar da mente do cineasta a paixão por velocidade, vide as corridas de pods do “Episódio I”, as perseguições de speederbikes do “Episódio VI”, ou até a louca corrida entre tie fighters e X-Wings na vala da Estrela da Morte do “Episódio IV”. O livro segue falando dos anos de Lucas na Universidade e seu filme experimental THX 1138, de sua parceria com Francis Ford Coppola, a produção de “American Graffiti”, a influência do filme de arte “2187” no conceito de Força, o processo extremamente agônico de escrever roteiros (há, no livro,  um ótimo mapeamento de todos os roteiros escritos sobre “Guerra nas Estrelas” até a versão final que seria o “Episódio IV” no futuro), os primeiros contatos de Lucas com os grandes estúdios para fazer o filme, a escolha do elenco, a produção e todos os seus problemas, detalhes dos sets de filmagem como o casinho rápido entre Carrie Fisher e Harrison Ford, ou o consumo de drogas que Carrie Fisher fazia no set, etc. Todos esses detalhes foram sendo mapeados através de todos os filmes da saga, indo da trilogia clássica à trilogia prequel, chegando até aos detalhes da venda da franquia para a Disney e a expectativa com o “Episódio VII”. Alguns pontos que eram conhecidos como “cânones” para os fãs mais experientes com o Universo dos filmes foram um tanto quanto desmistificados, como a história de que Lucas ganhou sozinho muito dinheiro com licenciamento, pois somente ele enxergou o potencial do merchandising e da venda de produtos licenciados na época. Na verdade, a Fox também tinha uma parcela dos lucros com licenciamento.

Um acidente de carro que mudou a História do Cinema
Um acidente de carro que mudou a História do Cinema

Mas o livro não se pauta somente nas influências sofridas por George Lucas para fazer os filmes e a sua trajetória no cinema e das trilogias. Taylor também escreveu instigantes capítulos dedicados aos fãs, como o dedicado à famosa Legião 501, formada por fãs que fazem cosplay de stormtroopers, ou a notável coleção de Steve Sansweet, considerada a maior do mundo. O próprio Lucas intitula Sansweet como o “fã supremo” de “Guerra nas Estrelas”. Ainda, podemos ver um capítulo onde é citado um fã clube especializado em construir droides astromecs. Ou o capítulo onde é contada a história da fila que se formou vários dias antes da estreia do “Episódio I”, no cinema Coronet, onde o “Episódio IV” havia estreado em 1977. Falando na trilogia prequel, há um capítulo que se preocupa em tentar compreender por que essa trilogia foi mal recebida pelos fãs, e bem recebida por outros, estabelecendo algumas reflexões importantes sobre a questão. Há até um capítulo que fala das ligações entre “Guerra nas Estrelas” e “Jornada nas Estrelas”. À propósito, a galeria de fotos tem algumas raridades, como a foto do único encontro entre George Lucas e Gene Roddenberry, ou a capa de jornal local da cidade de Modesto, com a foto do carro destruído de Lucas depois de seu acidente que mudou os rumos da vida do cineasta e da História do Cinema.

O único encontro entre Gene Roddenberry e George Lucas
O único encontro entre Gene Roddenberry e George Lucas

Dá para perceber, fazendo esse brevíssimo inventário do conteúdo do livro, como a obra de Chris Taylor é rica e prolífica. Só há uma crítica a ser feita na forma como o livro foi montado e estruturado. As notas de citações foram jogadas para o final da publicação, de uma forma muito decalcada do texto. Teria sido melhor que elas fossem colocadas nos pés de página ou então, numeradas ao longo do texto. Foi realmente uma pena, mas isso não diminui a grandiosidade do texto de Chris Taylor, que se revelou um pesquisador e tanto do Universo de “Guerra nas Estrelas”. Sendo assim, só ratifico o que foi dito acima: “Como Star Wars Conquistou O Universo” é uma obra fundamental para fãs e estudiosos do Universo de “Guerra nas Estrelas”, sendo uma leitura obrigatória. Não deixe de ter o seu!

Um grande livro de um grande autor
Um grande livro de um grande autor

Batata Movies – Doutor Estranho. Medicina, Misticismo e Princípio da Incerteza.

Cartaz do Filme
Cartaz do Filme

Por Carlos Lohse

A Marvel dá mais uma de suas boas cartadas. Estreou no cinema o esperado “Doutor Estranho”, estrelado por Benedict Cumberbatch, e que tem Mads Mikkelsen fazendo o papel do vilão. Somente esses pequenos detalhes já justificam a ida ao cinema, antes de mais nada. Mas o filme tem mais, muito mais, pois ele consegue abordar temas muito interessantes. Só quero fazer uma observação aqui. Esse artigo terá “spoilers”. Espero que você já tenha visto o filme. Caso contrário, volte mais tarde.

Vemos aqui a história do Doutor Stephen Strange (interpretado por Cumberbatch), um competente neurologista com uma carreira de muito sucesso. Isso faz com que Strange tenha um comportamento extremamente arrogante, provocando a antipatia de muita gente. A única pessoa que ainda consegue aturá-lo é outra neurologista, Christine Palmer (interpretada por Rachel McAdams), colega de profissão e ex-namorada. Um belo dia, Strange, que é um cara muito bem de vida financeiramente e é cercado de bens materiais, está em seu possante carro falando ao celular sobre qual cirurgia ele fará, e acabou sofrendo um grave acidente por isso, que destrói suas hábeis mãos para cirurgias muito delicadas. Desesperado por não poder mais conseguir exercer seu ofício, ele descobre com seu fisioterapeuta um paraplégico que conseguiu voltar a andar. Ao falar com ele, este lhe indicou um endereço no Nepal. Lá, Strange conhece a anciã (interpretada por Tilda Swinton), que vai lhe revelar os segredos do misticismo e a existência do multiverso. Mas um antigo aluno da anciã, Kaecilius (interpretado por Mads Mikkelsen), quer permitir que uma entidade cósmica maligna invada a Terra sob a promessa de vida eterna. Strange, então ainda um aprendiz, vai ter que evitar que os planos de Kaecilius se concretizem para salvar o planeta.

Um neurocirurgião irado!!!
Um neurocirurgião irado!!!

Dá para perceber que o enredo é bem interessante. A coisa aparentemente cai num lugar comum da velha história do materialista fútil e arrogante que descobre a elevação espiritual no misticismo. Mas a película não fica apenas nessa boa lição. A medicina, área de atuação de Strange, e representante da ciência no filme, não fica relegada a um segundo plano e aparece recorrentemente como um recurso necessário ao longo da história, como se a sabedoria do misticismo se aliasse à sabedoria da ciência. Mas o mais incrível aqui é a ideia de que há um multiverso, ou seja, a existência de vários universos possíveis, além de portais que vão de um lugar para outro. Essas ideias são muito relacionadas à mecânica quântica e à física da relatividade geral. Os portais lembram muito a noção de buracos de minhoca, onde corpos com muita massa e muito densos (os conhecidos buracos negros) distorcem a estrutura do espaço-tempo de tal forma que poderiam provocar “atalhos” entre duas regiões do Universo. No filme, entretanto, esses buracos de minhoca seriam provocados pelo misticismo e magia dos aprendizes da anciã. Já a ideia de multiverso é associada à mecânica quântica, mais especificamente ao Princípio da Incerteza de Heisenberg. Esse princípio diz que, para conhecermos o movimento de um átomo ou outra partícula qualquer, devemos conhecer simultaneamente sua posição e velocidade. O problema é que não conseguimos essa determinação simultânea. Só podemos conhecer ou a posição ou a velocidade, nunca as duas ao mesmo tempo. E isso é uma limitação imposta pela própria natureza. Assim, para cada posição que determinamos, temos infinitas possibilidades de velocidade, e, para cada velocidade que determinamos, temos infinitas possibilidades de posição. E o que tudo isso quer dizer? Que este Universo em que vivemos é apenas um de muitos prováveis, ou seja, somos todos ondas de probabilidade. Eu poderia até entrar em questões mais complexas e polêmicas do tipo: se tudo agora é probabilidade, como fica Deus, algo altamente determinístico, num contexto desses, mas vamos parar por aqui, já que temos um filme a analisar. Então, a existência na película de um multiverso, onde há uma infinidade de universos possíveis, tem tudo a ver com o Princípio da Incerteza cunhado pelo físico atômico Werner Heisenberg. O mais legal foi ver essas associações entre a física relativística e a mecânica quântica com o misticismo. Os físicos e astrofísicos que não me ouçam, mas essas formas científicas de conhecimento sempre tiveram um quê místico aos olhos do grande público, sobretudo a mecânica quântica, um assunto muito hermético para a grande maioria das pessoas. Ver isso em “Doutor Estranho” só confirma tal hermetismo e mito que associam saberes tão diferentes (ciência e misticismo).

Kaecilius. Poder de Persuasão.
Kaecilius. Poder de Persuasão.

O que mais podemos falar do filme? Algumas coisas que já detectamos no Universo Marvel em outras ocasiões. Em primeiro lugar, a vinda de um novo herói sempre é muito bem vinda, já que um dos principais problemas dessa franquia é o excesso de filmes de herói, tornando a coisa até um certo ponto repetitiva. Tem-se, então, a necessidade de uma renovação constante, que leva ao surgimento de novos heróis nas telonas, algo que a Marvel consegue fazer bem, pois tem um celeiro praticamente inesgotável de super-heróis. Em segundo lugar, o humor novamente deu o ar de sua graça, mesmo que o personagem do Doutor Estranho tenha uma aparência um tanto soturna. Vou sempre defender esse conteúdo mais humorístico da Marvel, pois ele funciona e traz aquela coisa nova de que os filmes precisam, ressaltando sempre que fazer humor é algo extremamente difícil.

Um discípulo, uma mestre e um bibliotecário sisudo
Um discípulo, uma mestre e um bibliotecário sisudo

E os atores? Bom, eu acho que nem preciso dizer muito. Dessa vez, a Marvel caprichou muito no elenco, colocando somente cobras criadas. Cumberbatch foi muito bem como o médico arrogante que se regenera, arrancando simpatia do espectador. Mikkelsen, o atorzaço de sempre, mostrou grande poder de persuasão ao tentar convencer o Doutor Estranho à sua causa. Tilda Swinton, que já tinha ido muito bem em papéis altamente díspares nos filmes “Amantes Eternos” e “O Grande Hotel Budapeste”, prova novamente seu lado camaleônico ao fazer uma anciã que é a mestre do protagonista, e, ao mesmo tempo, desperta dúvidas em seus discípulos à respeito de sua integridade moral. E temos Chiwetel Ejiofor, aquele ator de nome complicadíssimo que protagonizou “12 Anos de Escravidão”, e que aqui interpreta Mordo, o principal discípulo, o mais cheio de dúvidas em relação à sua mestre, com uma interpretação contida e sóbria, até em seus maiores momentos de decepção.

Comprem o Gibi!!!!
Comprem o Gibi!!!!

Assim, “Doutor Estranho” é mais um tiro certo da Marvel, que conseguiu mostrar o seu poder de renovação, além de repetir o que vem dando certo, que é o humor. Um filme laureado por um excelente elenco, que dá credibilidade aos personagens. Uma película que usa o misticismo como mote principal, sem esquecer a importância da ciência. E, como em todos os filmes da Marvel, com pós-créditos. Dois, para ser mais exato. Não saia da sala até a última letrinha e além. Você não vai se arrepender. Programa imperdível! E não deixe de ver o trailer abaixo.

Batata Antiqualhas – Battlestar Galactica. Visões De Um Passado Antigo E Recente (Parte 2).

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Por Carlos Lohse

Hoje vamos continuar nossa discussão sobre o universo de “Battlestar Galactica”. Essa série, produzida por Glen A. Larson (ele produzia muitas séries para tv nos fins da década de 70 e início da década de 80) foi repaginada em 2004. Antes de se realizarem os episódios, foi feito um longa-metragem. Se tomarmos esse longa como referência (confesso que ainda não tive a oportunidade de ver a série), encontramos várias diferenças com relação à série original. Agora, os cilônios foram produzidos pelos humanos e se rebelaram contra eles. Os centuriões estão novamente lá, com um design mais irado, mas não dizem uma só palavra. Existem modelos de cilônios que imitam fielmente 12 humanos diferentes. As 12 tribos novamente estão lá, e são destruídas pelos cilônios. Mais uma vez, a Galáctica encabeça uma frota de naves humanas em fuga. Mas agora, há esses 12 modelos de cilônios infiltrados, já que a raça humana não foi totalmente dizimada. É curioso perceber que os cilônios “humanos” não conseguem cumprir com eficiência as missões ordenadas pelo cilônio número 1, pois eles estavam emocionalmente envolvidos com os demais humanos, ou seja, era o amor (por mais piegas que possa parecer) que evitava que eles destruíssem os humanos, o que deixava intrigado o cilônio número 1, o mais frio de todos. O detalhe é que até um dos cilônios número 1 passou a ficar “emotivo” (lembrem-se que havia vários cilônios dos 12 tipos: vários números 1, vários números 2 e assim por diante) . O longa que deu origem à série termina com uma trégua entre os cilônios e os humanos e dois números 1 sendo executados na Galáctica: um mais emotivo e outro mais frio. Detalhe: a execução era ser lançado pelo espaço. Aí, era meio difícil de engolir isso, pois a gente via os caras flutuando no espaço, quando seus corpos deviam, na verdade, explodir, pois saíam de um ambiente com uma atmosfera de pressão do ar para pressão nenhuma. Então, a tendência do corpo seria explodir, como vimos em “O Vingador do Futuro”, do Schwarznegger. Mas como, em muitas ficções científicas, o som se propaga pelo espaço e naves explodem em bola de fogo…

Cilônios com novo design
Cilônios com novo design

Dá para perceber que a história recebeu uma turbinada. Mas algumas coisas pioraram na minha modesta opinião. Todas as referências às culturas antigas praticamente desapareceram nessa nova “Galáctica”. Ao invés disso, a gente via muitas referências ao presente da época em que a série foi feita. Militares com metralhadoras e fuzis, civis andando de terno e gravata, etc. Confesso que não gostei muito disso e acho que corrompeu uma ideia legal da série original, que era fazer uma ponte entre o que se via na história de Galáctica e as culturas antigas, para reforçar a impressão de que a raça humana veio do espaço. Outra coisa que ficou um pouco estranha foi a ligação entre os cilônios e os humanos. Os segundos se viam como uma espécie de criação do primeiro, e houve umas falas meio loucas, um tanto desconexas e místicas, na hora do ataque dos cilônios às tribos. Ficou uma parada meio bicho grilo, o que não acho muito legal numa série de ficção científica. De qualquer forma, o ódio dos cilônios pelos humanos era latente, já que eles se sentiram escravizados. Agora, uma coisa que realmente caiu muito bem nessa nova série é a presença de Edward James Olmos no papel do Comandante Adama. Esse ator foi um ícone dos anos 80. Não podemos nos esquecer de sua participação em “Blade Runner”, como o policial oriental que fazia pequenos bonequinhos com palitos de fósforo e sempre aparecia, de forma bem inconveniente, na frente de Harrison Ford. E, principalmente, como o inesquecível tenente Castillo, de Miami Vice, um homem de poucas palavras e olhar fixo, que sempre conseguia controlar a impetuosidade dos policiais “cascas grossas” Sonny e Tubbs. Ele fez um Adama mais frio e seco, bem ao seu estilo. E devo confessar que só vou procurar me inteirar mais sobre essa série nova da Galáctica mais por causa de Olmos.

Edward James Olmos. O melhor do novo longa
Edward James Olmos. O melhor do novo longa

Dessa forma, “Battlestar Galactica” mostra possuir uma boa história, que deu origem a duas leituras, datadas pela época em que foram escritas e realizadas. A série antiga teve mais referências a culturas antigas, mas menos episódios. Já a série mais nova excluiu essas referências, mas parece que fez uma história mais atraente, pois teve mais episódios. São visões diferentes, mas não menos interessantes. E não deixe de ver o trailer do filme de 2004 abaixo.

Batata Antiqualhas – Battlestar Galactica. Visões De Um Passado Antigo E Recente (Parte 1).

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Por Carlos Lohse

Quando o filme “Guerra nas Estrelas” estreou lá nos fins da década de 70, surgiram algumas séries para televisão nos Estados Unidos que se inspiraram em ficção científica espacial. A gente via na Globo, nos domingos à tarde, especificamente dois “enlatados” (era assim que se denominavam as séries de tv americanas na época): “Buck Rogers” e “Galáctica, Astronave de Combate”. A série “Buck Rogers” era mais fajuta. Todo mundo já conhece a história do americano que, em 1987 (a série passou por aqui em 1982), foi ao espaço numa nave, ficou congelado por cerca de 400 anos e voltou para a Terra em 2492, ou seja, em pleno século 25. Já a série “Galáctica” era bem mais interessante. Ela foi inspirada naquela ideia que algumas pessoas meio doidas defendem por aí de que a raça humana tem origem no espaço.  Assim, os humanos teriam formado 12 tribos pelo Universo. Mas o Império Cylon (ou cilônio, para os mais antigos), formado daqueles robôs em formato de centurião romano (eram chamados assim mesmo, de centuriões) e com aquele olho vermelho que ficava andando para lá e para cá (do mesmo jeito que a Supermáquina, do Michael Knight), travou uma guerra de mil anos contra os humanos. Vendo que não conseguiam a vitória, os cilônios simularam uma trégua para fazer um ataque surpresa, o que praticamente dizimou a raça humana, destruindo as 12 tribos. Todas as naves de combate haviam sido destruídas, exceto a Galáctica. Assim, ela passou a liderar pelo espaço uma frota de 1220 naves com os remanescentes da raça humana, enquanto os cilônios as perseguiam. Havia uma lenda de que, quando os humanos deixaram seu mundo de origem, Kobol, um grupo teria formado uma 13ª tribo, que seria justamente o planeta Terra. E assim, a Galáctica viajava pelo espaço em busca do nosso planeta.

Apolo, Adama e Starbuck
Apolo, Adama e Starbuck

Essa série de Glen A. Larson era muito interessante, pois vários elementos da História Antiga da Terra estão presentes. As 12 tribos são uma referência aos judeus. Os cilônios são descaradamente uma referência ao Império Romano. Os capacetes dos pilotos de caça da Galáctica tinham um design que lembrava a cultura egípcia antiga. A religião desses humanos, apesar da influência judaica, era politeísta como várias culturas antigas (eles adoravam “os senhores de Kobol”). Um dos robôs que estavam no alto comando dos cilônios se chamava Lúcifer, e por aí vai. O elenco contava com nomes como Lorne Greene (que ficou famoso na série “Bonanza”), interpretando o Comandante Adama, que liderava a Galáctica, e Dirk Benedict (conhecido por ser o Cara de Pau do Esquadrão Classe A, que passava no SBT), o tenente Starbuck, amigo do capitão Apolo (interpretado por Richard Hatch), filho de Adama. Eles pilotavam os caças que faziam batalhas espaciais contra os caças dos cilônios. Não podemos nos esquecer de John Colicos, que foi o primeiro klingon na série clássica de “Jornada nas Estrelas”, fazia o traiçoeiro Baltar, que se descambou para o lado dos cilônios e perseguia a Galáctica.

Os cilônios!!!
Os cilônios!!!

A série ainda contou com Lloyd Bridges como ator convidado, no episódio duplo onde a Galáctica encontra a astronave de combate Pegasus, comandada justamente pelo Comandante Caim (olha outra referência às culturas antigas), interpretado por Bridges. A Manchete reprisou “Galáctica” na década de 90, juntamente com “Buck Rogers” e a série clássica de “Jornada nas Estrelas”. E aí, pudemos ver alguns episódios novos que não haviam passado na Globo. Nesses episódios, a Galáctica já havia chegado à Terra, mas não podia entrar em contato com os humanos de nosso planeta, pois se os cilônios os descobrissem, teriam tecnologia suficiente para destruir tudo. No lado dos cilônios, já havia robôs com aparências humanas. Do elenco original só havia restado praticamente Lorne Greene, agora ostentando uma elegante barba branca, e o ator Herbert Jefferson Jr, que interpretava o tenente Boomer, um piloto de caça, que meio que foi “promovido” e assumiu um posto de comando na ponte da Galáctica nesses novos episódios. Os efeitos especiais sumiram e víamos dois pilotos de caça andando com suas motos pelas estradas da Terra fazendo missões secretas para defender o planeta dos cilônios. Ah, sim, me esqueci de dizer, as motos voavam (!).

Na conclusão desse artigo, vamos falar um pouco sobre a nova versão de “Battlestar Galactica”, produzida em 2004. Até lá! Mas antes, não deixe de ver o vídeo abaixo!!!

Capitão América – Guerra Civil. Filme, Quadrinhos, Livro. De Que Lado Você Está? (Parte 3)

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Vamos terminar nossa análise falando hoje do filme em si. Bom, depois de ler os quadrinhos e o livro, parti para o Odeon na época bem desanimado, pois se as duas mídias que são mais fieis à história já tinham mostrado aquele desfecho, o que poderia acontecer no cinema, que geralmente faz decalques malfeitos das histórias originais? Entretanto, ao ver o filme, fui fortemente surpreendido. A coisa de o cinema fazer um decalque malfeito da história original paradoxalmente salvou a trama. Podemos dizer popularmente que a emenda saiu melhor que o soneto. Se nos quadrinhos o desenvolvimento da história foi primoroso e o desfecho um fiasco, podemos dizer que no filme, a coisa se deu quase que ao contrário. Na película, tivemos um bom desenvolvimento da história, mas não tão marcante quanto o dos quadrinhos. A ausência de Sue Richards foi muito notada. O enfoque na importância do Homem Aranha foi radicalmente reduzido. E, se o traje dado ao Aranha por Stark era iradíssimo nos quadrinhos, com direito a uns tentáculos extras, no filme o traje que Stark deu ao aracnídeo era apenas o traje que conhecemos, já que Stark conheceu Parker quando ele ainda começava a dar seus primeiros passinhos como super-herói e usava um traje improvisado, que mais parecia um pijama com óculos escuros. Essas foram perdas muito importantes. Também não tivemos aquela grande variedade de heróis que havia na revista, mas sim os heróis que apareceram nos filmes, com a exceção da grata surpresa do Pantera Negra (interpretado por Chadwick Boseman, o mesmo ator que ficou conhecido pelo filme “James Brown”). A querela da regulamentação deixou de ser uma questão americana e tomou contornos mundiais. Vejamos: a tragédia de Stamford se transformou numa morte de cidadãos de Wakanda (o país do Pantera Negra) quando os Vingadores perseguiam terroristas em Lagos, capital da Nigéria. Isso fez com que o rei de Wakanda, o pai de Pantera Negra, encabeçasse a campanha pela regulamentação dos super-heróis e conseguisse uma lei aprovada pela ONU, assinada por 117 países. Ou seja, parece que a intenção do filme foi passar o bastão da responsabilidade da regulamentação dos Estados Unidos para todo o mundo, para dar um pouco mais de legitimidade à questão. Na história em quadrinhos, houve muito debate na coisa da regulamentação, mas ela sempre me pareceu algo ligado à severa visão intervencionista americana, onde a Shield fazia de forma bem efetiva o papel de cão de guarda na figura da Comandante Hill. No filme, esse suposto cão de guarda apareceu na figura do Secretário de Estado Thaddeus Ross (interpretado magistralmente por William Hurt). Ou seja, a visão intervencionista americana também aparece na película, mas apenas como em forma de breves pinceladas, um verniz externo. Nos quadrinhos isso se deu de forma muito mais profunda.

Um duelo casca grossa
Um duelo casca grossa

Agora, concordo com alguns comentários que surgiram por aí que o filme deu uma esvaziada na questão política e se tornou uma questão um pouco mais, digamos, pessoal. Uma coisa muito boa que aconteceu na película foi envolver o Soldado Invernal na querela. Ele foi responsabilizado pelo atentado que matou o Rei de Wakanda e acabou envolvendo um elemento a mais na cisão entre o Capitão América e o Homem de Ferro, pois Steve Rogers queria salvar a qualquer custo seu amigo, antigo companheiro da Segunda Guerra Mundial. Aí entra o tal “espírito antiquado” do herói, que parece não se encaixar muito nos dias atuais. Mas não tivemos o viés pessoal apenas se manifestando no Capitão América. O tivermos também em Tony Stark, pois foi o Soldado Invernal que matou seus pais sob efeito de um poder sugestivo implantado na mente do ex-combatente pelos soviéticos e isso deixou Stark revoltadíssimo, pois a perda dos pais fora um grande trauma para ele. Isso rendeu a batalha mais espetacular do filme, entre o Homem de Ferro e o Capitão América, que defendia de todas as formas seu amigo Soldado Invernal. Eu digo que essa batalha final foi ainda mais marcante que a longa sequência de luta entre todos os super-heróis do filme no aeroporto, pois envolvia um conflito pessoal que deixou traumas psicológicos profundos nos super-heróis, sendo essa batalha a mais doída de todas.  Não era somente uma pancadaria que a gente curtia em nosso gosto pouco desenvolvido por violência, mas era uma pancadaria que afetava nosso íntimo e que não queríamos que ocorresse. Sentíamos a dor de cada personagem ali: a perda dos pais de Stark, o arrependimento do Soldado Invernal, as tentativas desesperadas de Rogers de acabar com a luta tentando convencer Stark a parar com toda aquela violência. E aí, chegamos ao desfecho da luta, em que Rogers vence Stark (como nos quadrinhos) e, ao invés de lhe dar o golpe de misericórdia, apenas o atinge no coração, sem matá-lo, abrindo caminho para a reconciliação.

Tem se falado por aí que esse é um filme com igual peso para o Capitão América e o Homem de Ferro, que não seria um terceiro filme do Capitão América. Mas, apesar de toda a importância dada ao Stark, vou me arriscar a dizer aqui que esse ainda é um terceiro filme do Capitão América, mais do que tudo. Digo isso porque existe uma participação marcante do Soldado Invernal na película e, em segundo lugar, porque há uma implicação política na história, mais do que em algumas películas e quadrinhos da Marvel. Por esses motivos, essa história tem mais a cara dos filmes do Capitão América, que, na minha modestíssima opinião, são os melhores filmes da Marvel, pois eles envolvem um conteúdo de História e política muito bem elaborado, tendo como exemplo a Hidra, que vem do nazismo, se infiltrando na Shield, sendo uma espécie de responsável indireta pela visão intervencionista americana que nosso Steve Rogers discorda tanto por manter os puros ideais democráticos americanos na cabeça.

O Soldado Invernal tornou o filme mais interessante
O Soldado Invernal tornou o filme mais interessante

Agora, o filme tem um enorme trunfo! E esse trunfo se chama Zemo, que foi interpretado pelo magnífico ator Daniel Brühl (para quem não se lembra dele, ele interpretou o piloto de Fórmula 1 Nikki Lauda no filme “Rush”, onde Chris Hemsworth, o Thor, interpretou o também piloto James Hunt e grande rival de Lauda). Pode-se dizer que esse personagem salvou “Guerra Civil” daquele desfecho lamentável dos quadrinhos e do livro. Vejamos. O homem vivia na Sokóvia, aquele país do leste europeu que foi praticamente demolido no segundo filme dos Vingadores. Apesar de viver no campo, muito longe da cidade, os parentes de Zemo foram mortos na batalha, o que gerou um sentimento de vingança profundo por parte de Zemo contra os Vingadores. Assim, ele elaborou um plano que jogasse os super-heróis uns contra os outros, e seria totalmente bem-sucedido nisso, não fosse pela percepção do Capitão América de que havia algo de estranho no ar. Rogers até chegou a convencer Tony Stark de todo o problema, mas Zemo ainda tinha uma última carta na manga, que foi o assassinato dos pais de Stark pelo Soldado Invernal. Um momento marcante foi ver Zemo ter a sua tentativa de suicídio impedida pelo Pantera Negra, que buscava a vingança contra o Soldado Invernal pela morte do pai. Ao escutar a história de Zemo, Pantera Negra viu ali um caso de uma pessoa totalmente consumida pelo sentimento de ódio e vingança, evitando sua morte, até para que Zemo também pudesse pagar por seus crimes. E ver toda aquela história trágica também dissuadiu Pantera de seus sentimentos contra o Soldado Invernal. Pois é, eu havia dito acima que as questões pessoais tiveram mais peso que as questões políticas nesse filme. Mas com essas duas questões pessoais (a morte dos pais de Stark e o sentimento de vingança de Zemo), a coisa valeu muito a pena, não sendo piegas como poderia parecer. Ainda atento para outro detalhe. Se nas histórias em quadrinhos, as pessoas que sofriam com as destruições provocadas pelas brigas entre os super-heróis apareciam como meras vítimas, aqui o personagem Zemo, que foi uma vítima da destruição empreendida pelos Vingadores, se revelou também uma ameaça contra os super-heróis no seu forte sentimento de vingança. Esse detalhe subverteu a história completamente e simplesmente a tornou genial. Ainda, a última fala de Zemo deu a entender que ele pode aparecer nos próximos filmes por aí, o que seria algo muito bom, pois esse é um baita vilão interpretado por um baita ator.

Outro detalhe muito importante é que houve um desfecho apaziguador. Stark percebe as intenções do governo americano em tratar os heróis contra a regulamentação como criminosos quando ele vai ao presídio flutuante. E, no duelo final, ele não é morto pelo Capitão América e ainda recebe depois uma carta de desculpas do Capitão por não ter lhe dito que o assassinato dos pais foi por intermédio de um agente soviético (Rogers não sabia que havia sido o Soldado Invernal o responsável). Por essas e por outras, Stark não move uma palha quando o Capitão América liberta seus colegas da prisão. E ficou aquele final em aberto de que eles podem se reunir novamente no futuro.

Muito bem. Analisados quadrinhos, livro e filme, podemos chegar a algumas conclusões. Em primeiro lugar, tanto os quadrinhos quanto o filme mostraram uma história muito bem escrita, mas com o final melancólico. O livro teve a virtude de acrescentar mais alguns elementos à história, mas não teve a eficiência de descrever as cenas de luta com a materialidade visual dos quadrinhos, que podem ser considerados verdadeiras obras de arte. Já o filme desenvolveu a história de forma menos aprofundada que os quadrinhos, com menos super-heróis envolvidos, deu menos peso às implicações políticas em benefício de ótimas implicações pessoais, teve bons alívios cômicos (o Homem Formiga e o Homem Aranha foram providenciais nisso!), mas teve uma subversão sensacional na história em virtude do surgimento de um personagem, o vilão Zemo, interpretado por um ator sensacional que é Daniel Brühl, sendo essa uma ótima aquisição para o Universo da Marvel no cinema. E o final cinematográfico foi em tom reconciliador, ao invés da coisa altamente lamentável que se revelou no final dos quadrinhos. De uma forma ou de outra, “Guerra Civil” se mostrou uma história e tanto nas três mídias e mais uma vez a Marvel atropelou a DC no cinema. Esperemos o próximo round.

Zemo, uma excelente aquisição!!!!
Zemo, uma excelente aquisição!!!!

Capitão América – Guerra Civil. Filme, Quadrinhos, Livro. De Que Lado Você Está? (Parte 2)

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Por Carlos Lohse

Vamos hoje continuar a discussão de como “Capitão América – Guerra Civil” foi colocado nos quadrinhos, no livro e no filme lançado recentemente.

Se a história e seu desenvolvimento nos quadrinhos foram primorosos, com várias cenas de ação, duas violentíssimas batalhas, a morte de um herói, e os conflitos psicológicos em vários personagens como Tony Stark, Sue Richards e Peter Parker, o mesmo não se pode dizer do desfecho que, no mínimo, foi extremamente lamentável. Justamente na batalha decisiva, Steve Rogers se rende de uma hora para outra, deixando todos os seus comandados na mão. O motivo? Na batalha realizada dentro de um presídio que continha um portal para a tal dimensão paralela, os agentes da Shield trancariam o portal aprisionando todos os partidários do Capitão América de uma só vez. Assim, Manto, um herói do lado de Rogers, com poderes de teletransporte, levou todos para fora do presídio, caindo nos arredores do Edifício Baxter, o quartel-general do Quarteto Fantástico, bem no centro de Nova York. Obviamente, a super pancadaria provocou mais explosões e destruições entre os pobres inocentes. No embate final entre Capitão América e Homem de Ferro, o veterano de guerra se deu melhor e, quando ia dar o golpe de misericórdia (inclusive a pedido do próprio Stark), alguns populares o agarraram para parar com a carnificina. E aí, novamente com o centro de Nova York destruído (essa cidade só não é mais destruída que Tóquio!), Steve Rogers se toca da desgraça toda que está provocando e se rende, não como Capitão América, mas com seu nome civil de Steve Rogers. O detalhe aqui é que o grupo do Capitão América estava em superioridade numérica e ia ganhar a batalha final mas, segundo o Capitão, não ia ganhar a discussão. Ou seja, o projeto do governo de regulamentar os super-heróis foi bem sucedido e Tony Stark tomou toda a liderança do projeto. Um pequeno grupo de ex-seguidores do Capitão América permaneceu na dissidência e nosso Steve Rogers, um herói da Segunda Guerra Mundial, guardião dos ideais democráticos dos Estados Unidos da América (e acusado de antiquado por não querer se regulamentar), terminou vencido e humilhado na prisão.

Quadrinhos. Final tacanho
Quadrinhos. Final tacanho

Desculpem o comentário exaltado, mas que raio de final é esse? Tudo bem que o Capitão América se rendeu em nome de seus ideais, que ele não queria machucar as pessoas, etc., etc. Mas, e o compromisso com seus comandados? Um soldado que prima tanto a honra e o companheirismo também não poderia fazer isso. Se o meu estimado leitor me permitir reescrever o final desses quadrinhos, eu daria a seguinte sugestão: que o teletransporte fosse para alguma ilha deserta e afastada do Pacífico Sul, os caras resolvessem tudo na porrada, até que Rogers derrotasse Stark, mas não o matasse. Aí, Rogers daria ordem para seus comandados encerrarem a batalha, vencida pelos revoltosos. Ou seja, os vencedores poupariam os derrotados. Mas os aeroporta aviões da Shield estariam a caminho e Manto teletransportaria os revoltosos para um lugar desconhecido onde eles estabeleceriam uma base e trabalhariam fora do controle da lei americana, ou seja, o grupo do Capitão América seria uma espécie de força internacional de super-heróis fora da jurisdição de qualquer país, vivendo numa espécie de exílio com relação aos Estados Unidos. E, assim, novas histórias envolvendo os super-heróis regulamentados e os não-regulamentados existiriam no futuro, com as mesmas querelas psicológicas entre os personagens e até trabalhos em conjunto fora de solo americano. E, quem sabe, trabalhos clandestinos entre regulamentados e não-regulamentados nos Estados Unidos? Ainda, já imaginaram como seria para os super-heróis não regulamentados terem sua entrada nos Estados Unidos proibida? Como Parker teria que fazer para entrar no país e visitar Tia May e Mary Jane, que seriam vigiadas e monitoradas pela Shield? Já imaginou Parker entrando pelo México com a ajuda de coyotes? Dá para perceber como o tema da Guerra Civil pode dar pano para manga. E, de repente, esse fiasco de final! A impressão que se dá é a de que foi feito um grande esforço, um grande roteiro, desenhos incríveis (verdadeiras obras de arte!), ou seja, um trabalho muito bem feito e, de repente, me chega esse desfecho tacanho? Não, muitos podem discordar de mim, mas eu não consigo me conformar com isso.

Passemos, agora, ao livro. Escrito por Stuart Moore, inspirado diretamente nos quadrinhos acima, o livro conta praticamente a mesma história. Mas, quando comparamos duas mídias dessas naturezas, uma de característica verbal e outra não-verbal, onde palavras são confrontadas com imagens, vem aquela pergunta inevitável: uma imagem realmente vale mais que mil palavras? Geralmente eu acho que não, mas este livro de Stuart Moore consegue nos expor os dois lados dessa moeda. A descrição das cenas de batalha, por exemplo, ficaram um tanto que enfadonhas, e não transmitiram a vibração e choque que a arte dos quadrinhos pode proporcionar. As cenas com o Capitão América severamente ferido e ensanguentado, assim como as partes em que o clone de Thor aparecia, eram de um violento impacto visual nos quadrinhos, o que o livro acabou não proporcionando. Aqui, as imagens valem mais que as palavras. Em contrapartida, o livro desenvolve um pouco mais o roteiro, o que deixa a história mais recheada e interessante. Podemos dar aqui dois exemplos: entre a explosão de Stamford e o resgate às vítimas feito pelos super-heróis, o livro nos fornece um capítulo extra, em que o Homem de Ferro faz um voo intercontinental, praticamente de volta ao mundo, enquanto lia o jornal, falava com o Homem Aranha, marcava uma carona com seu empregado Happy. Ou em pequenos capítulos onde podemos ver Peter Parker tendo uma conversa privada com sua Tia May, que revelou ao sobrinho que já sabia há anos que ele era o Homem-Aranha ou com Mary Jane, onde os dois conversam sobre a cerimônia de casamento frustrada em virtude da revelação pública de Parker ser o aracnídeo, com a necessidade de Mary Jane e Tia May se esconderem por questões de segurança. Ainda, no momento em que Sue Richards abandona Reed, ela se depara com o Coisa, que não evita que ela saia e, ainda por cima ele diz que também está fora, partindo para a França. Todos esses elementos extras acrescentaram lances mais interessantes à história, que não eram vistos nos quadrinhos, embora o Coisa, que tenha retornado depois à guerra, disse nos quadrinhos que não iria ficar parado comendo croissants. Mas não houve qualquer menção nos quadrinhos de seu autoexílio na França, o que foi destacado no livro por sua vez. Assim, o livro acaba sendo uma mídia com uma desvantagem (a descrição das cenas de ação sem o impacto visual dos quadrinhos) e uma vantagem (acréscimo de elementos à história, tanto no núcleo do Quarteto Fantástico quanto no do Homem Aranha, que se revelou um personagem-chave para essa história, principalmente por ter trocado de lado depois de ser um admirador fiel de Tony Stark).

No próximo artigo, finalmente chegaremos ao filme e a comparação entre as três mídias. Até lá!

Quadrinhos. Um violento impacto visual, algo que se perde nos livros
Quadrinhos. Um violento impacto visual, algo que se perde nos livros

Capitão América – Guerra Civil. Filme, Quadrinhos, Livro. De Que Lado Você Está? (Parte 1)

A edição em quadrinhos da Panini
A edição em quadrinhos da Panini

Por Carlos Lohse

Este ano tivemos no cinema um dos grandes e esperados lançamentos da Marvel, “Capitão América – Guerra Civil”. Esse filme foi cercado de grande expectativa, pois era uma aposta para recuperar o interesse na fase dois da Marvel, que parecia perder um pouquinho de força com tantos filmes de vários super-heróis juntos. Era necessário dar um upgrade na franquia. Isso até foi feito em “Homem Formiga” e “Deadpool”, com uma investida bem sucedida no humor e em novos personagens. Mas, cá para nós, a sequência de “Vingadores” não tinha sido lá essas coisas. Era urgente uma boa história para o Capitão América, o Homem de Ferro, Viúva Negra e companhia. E, para isso, foi recuperada do Universo dos quadrinhos “Guerra Civil”. Essa história parte da seguinte premissa: os super-heróis têm um grande poder e ações totalmente ilimitadas, algo potencialmente perigoso. Assim, é necessário que os super-heróis passem a sofrer alguma regulamentação do governo, o que divide nossos protagonistas. Um grupo, liderado pelo Homem de Ferro, aceita tal atitude e assina um documento se comprometendo a isso. Já outro grupo, liderado pelo Capitão América, fica contra essa determinação, alegando que sua liberdade de escolha será reprimida, e que limitar suas ações pode até ser mais perigoso. Assim, os dois grupos muito argumentarão e também duelarão, o que vai trazer muitas cenas de ação e, principalmente, pancadaria.

Dois heróis em posições antagônicas
Dois heróis em posições antagônicas

Bom, uma das primeiras vezes em que as ações violentas de heróis foram questionadas, pelo que eu me lembre, foi num episódio das Meninas Superpoderosas, onde foi feita uma sátira aos “Tokusatsus” japoneses e as heroínas mirins comandavam um enorme robô que lutava contra um gigantesco monstro e destruíam toda a cidade, matando seus habitantes. À medida que os prédios e estádios eram destruídos, a gente podia escutar o grito das pessoas. Mas isso era feito num espírito de muita gozação, bem ao estilo daquelas animações que usavam uma violência altamente escrachada, em tom muito cômico. Quem diria que um dia esse tema passaria a ser abordado de forma muito séria nos filmes de super-heróis americanos e, ainda por cima, isso aparecesse em dois filmes este ano, que praticamente estrearam um atrás do outro, primeiro o da DC (“Batman vs. Superman”) e, depois, da Marvel (“Capitão América – Guerra Civil”). Se na história da DC, a questão foi mais uma rixa pessoal entre heróis, onde um desaprovava o método do outro, na Marvel, houve uma maior implicação política na questão, onde até a opinião pública tinha peso. Entretanto, a forma como a história da Marvel foi abordada nos quadrinhos, no livro e no filme, tiveram semelhanças e diferenças. A ideia aqui é fazer uma breve explanação de como “Guerra Civil” foi contada nestas três mídias e elaborar uma pequena comparação entre elas. Primeiro vamos falar um pouco dos quadrinhos, passando imediatamente para o livro e, depois, para o filme. Acho que o leitor já percebeu que teremos que lançar mão de muitos “spoilers” para fazer essa comparação.

Comecemos com os quadrinhos. Aqui foi usada a edição da Panini, de autoria de Mark Millar (roteiro) e Steve McNiven (desenhos). A ideia da tal regulamentação de super-heróis vem depois que acontece uma grande tragédia que vitimou cerca de novecentas pessoas, tragédia essa causada por um motivo muito banal: um “reality show” de um jovem grupo de super-heróis, os Novos Guerreiros. Ao encurralar um grupo de vilões, Nitro, o mais poderoso deles, provocou uma explosão de dimensões devastadoras num bairro residencial de Stamford. No funeral de uma das crianças vitimadas pela explosão, Tony Stark é hostilizado pela mãe. Ao mesmo tempo, Johnny Storm, o Tocha Humana, é praticamente linchado na saída de uma boate, sendo isso um sinal de que a opinião pública se voltava contra os super-heróis. Já há um debate da necessidade dos super-heróis terem um registro. Enquanto isso, num aero porta aviões da Shield, a comandante Hill, que substituiu Nick Fury no comando da força de segurança, prepara uma tocaia para o Capitão América, que consegue fugir. Logo, logo, dois grupos ficam bem delineados: os que vão respeitar a lei e se registrar, liderados por Stark e os que vão se rebelar contra isso, liderados por Steve Rogers.

Uma roupa irada para o Aranha!!!!
Uma roupa irada para o Aranha!!!!

A história do Universo dos quadrinhos é muito rica na diversidade dos super-heróis. Vemos, por exemplo, os X-Men, que decidiram tomar uma postura neutra. O Quarteto Fantástico, por sua vez, sofreu um verdadeiro racha interno, não só no grupo, mas até no casamento entre Reed e Sue Richards. O marido, com sua mentalidade totalmente racional, ficou do lado de Stark e do governo, mas Sue não gostava muito dessa regulamentação e o rumo autoritário que as coisas tomavam, passando para o lado liderado por Capitão América. Outro detalhe muito bem trabalhado foi a participação do Homem Aranha na história. Ele recebe de Stark um traje cheio de upgrades e fica do lado do Homem de Ferro na questão. Peter Parker até revela sua identidade publicamente para dar o exemplo. Mas isso acabou colocando Tia May e Mary Jane em risco e as duas tiveram que ficar num lugar seguro, distante de Parker, que muito sofreu com isso. Ainda, a primeira grande batalha entre os super-heróis levou Golias à morte, através das mãos de um Thor clonado por Stark. Tudo isso levou o aracnídeo a contestar o que o Homem de Ferro fazia e Parker trocou de lado. Há também a presença do Justiceiro, do lado do Capitão América, e do Príncipe Namor, que entrou na batalha à pedido de Sue, mas também porque sua prima, Namorita, morreu na explosão de Stamford. Logo, temos uma quantidade de heróis bem rica na revista. Até alguns super-vilões ficaram em ambos os lados da luta. Outro detalhe interessante foi a prisão em que ficavam os super-heróis capturados e que eram contra o registro. Ela ficava numa espécie de dimensão paralela, altamente à prova de fugas, já que seria impossível manter um super-herói numa prisão normal.

No próximo artigo, vamos continuar a comentar como “Capitão América – Guerra Civil” foi abordada nos quadrinhos e começaremos a falar da versão da história no livro. Até lá!

Peter Parker revela sua identidade!!!
Peter Parker revela sua identidade!!!