Batata Movies – Rogue One (Parte 3)

O cristal kyber

Vamos, hoje, continuar a falar das virtudes de “Rogue One”. Houve referências a outros filmes da saga, embora sutis. Se em “O Despertar da Força”, houve uma homenagem a “Uma Nova Esperança”, com referências bem explícitas que depois de algum tempo chegaram a cansar, em “Rogue One”, as referências eram mais implícitas, daquelas que fazem os fãs vibrarem, porque somente os mais aficionados conseguem perceber tais referências. Como um exemplo, em um dado momento do filme, dentro da base rebelde, é chamado pelo alto falante o general Syndulla, alusão a Hera Syndulla da série “Rebels”. Ou então havia até brincadeiras com as referências. K2SO chegou a começar a famosa frase “Estou com um mal pressentimento com relação a isso”, presente em todos os filmes de “Guerra nas Estrelas”, mas é interrompido por Andor e Erso. Ou então, os stormtroopers falando dos T-15, que são aposentados, para dar lugar aos T-16, em “Uma Nova Esperança”. Outra referência, mais presente no Universo Expandido, é a citação aos cristais Kyber, que são usados para a construção dos sabres de luz e que são extraídos de Jedha, onde está o templo jedi, sendo usados como combustível para a Estrela da Morte. Assim, é interessante perceber como toda a tecnologia da arma de destruição em massa do Império se baseia numa arma ancestral da conservadora guarda de elite da Velha República, havendo uma espécie de imbricação entre a tradição e a modernidade. Cristal Kyber que também está pendurado no pescoço da protagonista, um presente afetuoso do pai que constrói a arma, mas, ao mesmo tempo, é um símbolo de poder, quando Chirrut Îmwe (interpretado por Donnie Yen) diz a Jyn que as estrelas mais fortes têm cristal Kyber em seu interior.

Jedha. Alusão à invasão americana ao Oriente Médio

O filme também faz alusões a guerras e situações reais. É muito interessante perceber a influência da cultura árabe e islâmica no filme, seja no entreposto comercial que aparece bem ao início da história, seja em Jedha. Aliás, a presença do Império em Jedha lembra muito a ocupação americana no Oriente Médio, com direito a caça ao “terrorista” Saw Gerrera. A figura da criança chorando sob fogo cruzado é emblemática e já vimos em muitas imagens reais de guerra. Já a batalha em Scarif lembra mais a guerra do Vietnã ou a campanha americana no Pacífico na Segunda Guerra Mundial, onde agora é a Aliança Rebelde que faz as vezes dos americanos. Ou seja, o filme faz alusões aos americanos como “vilões” e “mocinhos” no contexto de guerras diferentes.

Scarif. Lembranças do Vietnã e da campanha americana no Pacífico na Segunda Guerra Mundial

A morte de todos os membros do Esquadrão Rogue One também é algo digno de destaque. Apesar de possuirmos personagens muito bons nesta película, a morte deles não se fez de forma tão traumática, pois não houve tempo hábil para os fãs se apegarem aos personagens. Nesse ponto, a morte de Han Solo foi muito mais impactante. Já a morte de Rogue One foi mais heroica, numa mostra de sacrifício por uma causa.

Tarkin virtual. Claro e escuro tornaram o rosto mais realista

Um elemento que levou o público ao delírio e que se mostrou um grande trunfo para o filme foi o uso do CGI para que alguns personagens de “Uma Nova Esperança” retornassem às telonas. Ver novamente o grão-moff Tarkin num Peter Cushing, mesmo que virtual, foi uma baita de uma experiência. Sabemos que é um efeito de computação gráfica, mas o impacto da primeira visão de Tarkin e Cushing de volta é equivalente a de uma ressurreição. E, ao final, um êxtase ao se ver novamente a princesa Leia na flor da idade. Agora, sejamos francos. A aparição de Tarkin foi muito mais convincente, pois seu rosto ficou à meia-luz, com contrastes de claro e escuro pronunciados que davam um tom maior de realismo. Já a face de Leia infelizmente ficou muito iluminada, dando a ela uma carinha de boneca de vinil, o que foi uma pena. Mas, mesmo assim, essa foi uma surpresa muito bem vinda.

No nosso próximo artigo, vamos falar de alguns problemas existentes em “Rogue One”. Até lá!!!!

Princesa Leia virtual (direita). Infelizmente, o resultado não ficou muito bom, devido à forte iluminação

Batata Movies – Rogue One (Parte 2)

Cassian Andor. Um personagem dúbio

Continuemos a falar das impressões do filme Rogue One.

Como foi o avanço no amadurecimento de “Guerra nas Estrelas” em “Rogue One”? Em primeiríssimo lugar, esse é o filme que mais tem cara de histórias do Universo Expandido. Apesar de tudo que é produzido sobre “Guerra nas Estrelas” da Era Disney para cá ser considerado parte do cânone oficial, há muitas coisas de altíssima qualidade dignas da série “Legends”, sendo que os melhores livros dessa série geralmente davam mais consistência às histórias contadas nos filmes e buscavam resolver algumas contradições. Por exemplo, o livro “Darth Plagueis”, de James Luceno, dá uma nova perspectiva aos acontecimentos de “A Ameaça Fantasma”, preenchendo algumas lacunas que empobreciam o filme. “Rogue One” faz o mesmo com “Uma Nova Esperança”, por exemplo. O próprio final do filme é uma ponte direta para “Uma Nova Esperança”. Ainda, sempre ficou muito mal contada a história de que uma violenta e poderosa arma de destruição que é a Estrela da Morte fosse tão vulnerável. Mas isso fica muito mais compreensível quando sabemos que Galen Erso, ao ser obrigado pelo Império a construir a arma, introduziu propositalmente essa vulnerabilidade. Assim, “Rogue One” faz o papel dos bons livros do Universo Expandido da série “Legends” que justificam esses pequenos problemas na história.

Saw Gerrera, o extremista

Outro ponto que aproxima muito “Rogue One” do Universo Expandido, sobretudo da trilogia Zahn (e talvez um pouco da trilogia prequel), é a questão das discussões políticas. Esse filme coloca uma reflexão notável sobre as posturas da Aliança Rebelde. Se na época de Lucas, os rebeldes eram heróis cheios de virtudes, defensores da liberdade e da justiça, agora a coisa fica um pouco mais complexa. As atitudes nem sempre são louváveis ou virtuosas. Jyn Erso é persuadida a ajudar a Aliança a encontrar seu pai, sem saber que, pelas costas, há um plano da Aliança em matar Galen Erso. Dois personagens desse “lado sombrio” rebelde são emblemáticos: Cassian Andor e Saw Gerrera. Andor foi uma gratíssima surpresa para o filme. Esse protagonista, que estava sempre ao lado de Jyn, tinha uma natureza muito dúbia. Ao início da película, ele era frio e calculista, não hesitando em matar quem quer que fosse quando necessário. À medida que ele conhecia mais profundamente Jyn e até algumas atitudes de Galen (que pediu a Krennic que não matasse os cientistas sob seu comando), Andor sofreu uma reviravolta em seu caráter. Ponto para Diego Luna, que soube conduzir bem o personagem. Inicialmente, ele usou caras e bocas que deixaram Andor extremamente rude e tenso. Mas, com o tempo, ele passou a ter atitudes mais afetuosas para com Jyn. Para quem achava que Andor seria uma espécie de coadjuvante de luxo, a sua importância no filme foi muito bem vinda. Já o personagem de Saw Gerrera é muito curioso. Tendo aparecido nas “Guerras Clônicas”, Gerrera é o estereótipo do terrorista radical. O homem se desliga da Aliança Rebele e passa a agir por conta própria. Sua forma extremista de atuar provoca problemas até para a Aliança, nas palavras da própria Mon Mothma. Outro ponto de cisão na Aliança Rebelde ficou claro quando o próprio grupo Rogue One desrespeita uma decisão da Aliança de não atacar Scarif para roubar os planos da Estrela da Morte. Assim, podemos perceber como há divergências entre os membros da Aliança e que não há uma unanimidade de opiniões, abrindo margem para disputas e implicações políticas entre os rebeldes. Esse clima pesado entre os mocinhos é uma mostra de como houve um amadurecimento na saga e de como o Universo Expandido é uma influência direta, pois já trabalha essa questão há um bom tempo.

Saw Gerrera nas “Guerras Clônicas”

Durante as gravações do filme, houve um rumor de que a Disney estava achando a trama muito séria e que a película precisava de um pouco de humor. No resultado final, vemos esse humor um tanto negro, sobretudo nas falas rudes de K2SO e no ato de se encapuzar um cego, mas que não atrapalhou o tom de tensão e seriedade da história.

Na próxima parte desse artigo, continuaremos a falar de mais virtudes do filme “Rogue One”. Até lá!!!

Grupo Rogue One invade Scarif desrespeitando uma ordem da Aliança Rebelde.

 

Batata Movies – Rogue One (Parte 1)

Cartaz do Filme

E finalmente chegou o filme mais aguardado do ano de 2016 para todos os fãs de “Guerra nas Estrelas”. “Rogue One, Uma História Guerra nas Estrelas” estreou no último dia 15 de dezembro e a galera do Conselho Jedi Rio de Janeiro chegou em peso ao Cinemark Botafogo 6, no Botafogo Praia Shopping, para assistir ao filme. Muitos vieram com seus cosplays, outros (como esse humilde articulista que vos fala), com uma camisa que lembrasse sua adoração por “Guerra nas Estrelas”. Veio o filme e, com ele, as reações extasiadas da plateia à medida que apareciam imagens de grande impacto para os fãs. E, ao final da película, já nos créditos, o mais legal foi ver a reação da galera. Tinha gente em pé, com a mão no peito, se escorando nas cadeiras, ou pessoas pulando e batendo os braços, ou ainda, cosplayers aos abraços, vertendo rios de lágrimas! Muitas diziam que tinham visto o melhor filme de “Guerra nas Estrelas” de todos os tempos, outras diziam que “Rogue One” foi melhor que o “Episódio VII”, etc.

Jyn Erso, a protagonista

Sim, meus amigos, a estreia bombou e emocionou bastante a todos. Mas, passada toda a euforia, podemos nos perguntar, agora que estamos num viés mais racional e que já vimos o filme mais vezes. “Rogue One” foi realmente tudo isso que disseram? Houve algum problema no filme? Poderia ter sido melhor? Quais são as vantagens e desvantagens da película?

Em primeiro lugar, vamos fazer uma pequena sinopse do filme, ainda que todos já estejam carecas de saber o que se passou na película, pois vai ajudar a gente a refletir um pouco sobre tudo. Ah, e um aviso: esse artigo estará coalhado de “spoilers”. Então, veja o filme antes de dar uma lidinha aqui.

Galen Erso

Bom, a história do primeiro “spin-off” de Guerra nas Estrelas se passa entre os episódios III e IV, e se trata do roubo dos planos da Estrela da Morte pela Aliança Rebelde. A personagem-protagonista é Jyn Erso (interpretada por Felicity Jones, que já trabalhou em filmes como “A Teoria de Tudo” e “Inferno”), uma prisioneira do Império que tem como pai Galen Erso (interpretado pelo lendário Mads Mikkelsen), um cientista do Império que fugiu, mas que foi recapturado para conceber e construir a famosa Estrela da Morte. Quando Galen Erso foi trazido de volta ao Império pelo Diretor Orson Krennic (interpretado por Ben Mendelsohn), sua mulher foi assassinada e Jyn fugiu. Anos depois, um piloto do Império, Bodhi Rook (interpretado por Riz Ahmed), deserta e procura Saw Gerrera (interpretado pelo também lendário Forest Whitaker), um antigo militante rebelde que se tornou ultrarradical e passou a agir por conta própria, para lhe entregar uma mensagem de Galen Erso sobre a arma de destruição em massa. Um membro da inteligência rebelde, Cassian Andor (interpretado por Diego Luna), descobre a missão do tal piloto desertor e a Aliança Rebelde, liderada por Mon Mothma (interpretada por Genevieve O’Reilly), decide sequestrar Jyn da prisão e, juntamente com Andor e o androide K-2SO (interpretado por Alan Tudyk), procurar Saw Gerrera em Jedah, onde ficava o antigo templo Jedi, para averiguar se a informação sobre a Estrela da Morte procedia. Os rebeldes também queriam arrumar uma forma de encontrar Galen Erso e matá-lo, mas esse detalhe não fora contado a Jyn Erso. A partir daí, várias situações ocorreriam, culminando com o roubo dos planos da Estrela da Morte, numa operação inicialmente clandestina organizada pelo grupo Rogue One que, ao contrário da ideia na cabeça da maioria dos fãs de que fosse um esquadrão de X-Wings, era na verdade um grupo de assalto em ações por terra.

Diretor Krennic

Bom, dá para perceber por essa breve sinopse que havia uma boa história a ser contada. E ela realmente o foi. Eu já tive a oportunidade de comentar na minha resenha sobre “O Despertar da Força” que as histórias da franquia “Guerra nas Estrelas” passam por um processo de maturação. Quando tudo estava nas mãos de George Lucas, havia mais um tom infantil de Fantasia Espacial. Lucas teve o enorme mérito de criar todo o Universo de “Guerra nas Estrelas”, mas parecia não saber muito o que fazer com as histórias, o que provocou algumas críticas e desgastes. Os primeiros sinais de que a saga seria abordada de forma um pouco mais séria e madura vieram com os livros do Universo Expandido, sobretudo nas mãos de autores como Timothy Zahn e James Luceno, os maiores na minha modesta opinião. Anos mais tarde, o anúncio da venda da franquia à Disney deixou os fãs em polvorosa e um medo no ar de que Mickey Mouse estragasse tudo. Mas “O Despertar da Força” contrariou os pessimistas. Agora, com “Rogue One”, esse tom de seriedade e respeito a “Guerra nas Estrelas” avançou mais um degrau.

Estreia do filme. Sabres de luz em profusão!!!!

E como foi esse avanço? Isso é o que veremos no próximo artigo. Até lá!!! Por enquanto recorde do trailer vendo o vídeo abaixo.

Batata Books – Herdeiro Do Jedi. Luke Skywalker Em Primeira Pessoa.

Capa do Livro

Mais um bom lançamento da Editora Aleph referente ao Universo de “Guerra nas Estrelas”. Escrito por Kevin Hearne, “Herdeiro do Jedi” é uma aventura integrante do novo cânone, que tem Luke Skywalker como protagonista. E, dessa vez, com uma grande curiosidade. O livro é narrado em primeira pessoa pelo próprio Luke Skywalker. Isso faz com que o personagem tenha uma relação de grande cumplicidade com o leitor e, por que não, com o fã. Podemos compartilhar com ele seus desejos, medos, receios e outros sentimentos, num momento em que ele acabou de explodir a Estrela da Morte (os eventos da história desse livro se passam entre os Episódios IV e V). Assim, ele acabou de perder Obi Wan Kenobi, quer se iniciar no treinamento jedi, mas não tem ainda um mestre, e tem uma enorme curiosidade em saber um pouco mais de Darth Vader e por que o senhor sombrio matou seu pai.

Luke Skywalker. Aprendizado jedi sem mestre

Mas, no que consiste a história? Depois da batalha de Yavin, a Aliança Rebelde continua a fazer várias missões contra o Império com o objetivo de enfraquecê-lo. E uma delas é justamente trazer para seu lado uma “slicer” (o equivalente a um “hacker”) do Império que quer desertar e garantir uma vida segura para a sua família. Drusil Bephorin precisa ser resgatada pelos rebeldes e ser transferida para um planeta num sistema distante e pouco conhecido para lá viver em paz com sua família. O escolhido para essa missão será Skywalker, visto pela Aliança Rebelde como um verdadeiro herói por seu êxito em Yavin. Num primeiro momento, essa fama subiu à sua cabeça mas, com o tempo, o antigo agricultor de umidade de Tatooine amadureceu e viu que a luta contra o Império é mais crítica que parece. Para tornar a coisa mais interessante, o autor Kevin Hearne deu ao nosso amado protagonista uma baita de uma companhia: a franco atiradora Nakari Kelen, uma estonteante morena de negros cabelos encaracolados extremamente espirituosa, o que mexe com a natureza introspectiva do jovem aprendiz de jedi. Obviamente, algo além de um simples relacionamento de amizade acontecerá entre os dois. Mas esse “affair” será interrompido várias vezes pelos perigos envolvidos na missão. O ato de transportar Drusil Bephorin pelo espaço da galáxia sob a perseguição das forças do Império e de perigosos caçadores de recompensas tornará a missão mais difícil do que ela parece. E aí o trio formado por Skywalker, Kelen e Bephorin vai ter que passar por muitas situações espinhosas para atingir seus objetivos. Ah, sim, não podemos nos esquecer da presença de R2 D2 na missão, que em alguns momentos se tornou mais um peso do que o robozinho que salvava o dia, embora o autor não tenha deixado de dar a ele os seus costumeiros momentos de salvador da pátria.

Nakari Kelen. Uma franco atiradora

É uma história instigante, que prende a atenção e dá ao leitor a oportunidade de uma rápida leitura. Hearne consegue criar uma trama com bons momentos de ação, intercalados por bons diálogos, sobretudo entre Skywalker e Kelen. A personagem de Drusil Bephorin também é muito atraente, pois sua característica de “slicer” e criptógrafa é consequência de que sua espécie alienígena tem muito tino para a matemática, onde até as regras de etiqueta são permeadas por complexas fórmulas. Assim, a personagem calcula as probabilidades de ocorrência de eventos relacionados ao que pode ou não acontecer na missão o tempo todo, algo um tanto “vulcano” no Universo de “Guerra nas Estrelas” (desculpem, mas eu como “trekker” não resisto). E esse “quê” vulcano fica ainda mais pronunciado quando Bephorin não consegue entender os flertes entre Skywalker e Kelen, o que leva a situações constrangedoras para o aprendiz de jedi. Falando nisso, é muito legal ver as primeiras tentativas de telecinese (o ato de mover objetos com a força da mente) de Skywalker com… macarrões no prato (!), responsáveis por momentos divertidos da história.

Assim, “Herdeiro do Jedi” é mais um tiro certo da Aleph que tem trazido boas histórias de “Guerra nas Estrelas” para o público, enquanto este espera ansiosamente pelos filmes da franquia que batem às portas dos cinemas em dezembro. Um livro que tem como grande trunfo deixar o fã mais próximo de Luke Skywalker. Um livro que traz uma boa aventura e personagens muito bem construídos. Uma história digna do Universo de “Guerra nas Estrelas”. Você não vai se arrepender se ler.

Drusil Bephorin, a “slicer”

Batata Movies – Invasão Zumbi. Na Coreia, O Papo É Outro.

Cartaz do Filme

Uma interessante produção da Coreia do Sul em nossas telonas. “Invasão Zumbi” (“Train to Busan”), escrito e dirigido por Sang-ho Yeon, é um filme de terror que, a princípio pode imitar o já batidíssimo gênero de terror com o subtema dos zumbis. Mas o filme vai além e ele revela na verdade alguns aspectos da condição humana.

Woo. Viagem insólita

O filme tem como protagonista Seok Woo (interpretado por Yoo Gong), um homem ligado ao mercado financeiro, de pensamento individualista e sem escrúpulos. Ele tem uma filhinha, Soo-an (interpretada por Soo-an Kim), que quer a atenção do pai e, ao mesmo tempo, quer fazer uma viagem de trem para rever a mãe. Depois de muito insistir, Soo-an consegue fazer o pai levá-la para a tal viagem. Mas essa viagem terminaria numa jornada de horror onde zumbis querem atacar as pessoas e infectá-las com sua doença.

Zumbis irados!!!

Até aí, nada de muito diferente. Então, o que diferencia esse filme dos demais filmes de zumbi? Em primeiro lugar, é um filme que aborda sérias questões sociais. Nosso protagonista é frio, calculista e pensa em si próprio. Mas a situação de ser perseguido por um monte de mortos-vivos vai fazer com que Woo comece a ver as coisas de outra maneira. Outros passageiros do trem vão manter essa visão individualista e irão até agir com preconceito contra outras pessoas que, acredita-se, estejam contaminadas. Ou seja, o filme levanta essa questão: numa situação de terror e pressão extremos, até onde vai a solidariedade humana? Essa é a grande questão da película. Outro tema trabalhado é o do tempo perdido. Woo nunca deu muita bola para a filha. E agora, parece que tudo vai cair por terra e ele não terá mais nenhum momento com ela. Fugir dos zumbis também será uma forma de recuperar um pouco do tempo perdido.

Interpretação convincente!!!!

É interessante perceber como parece que o filme bebeu de outras fontes. Apesar do gênero terror, a película também lembra filmes catástrofe americanos da década de 70, sobretudo a série “Aeroporto”, onde passageiros e tripulantes de aviões precisavam superar acidentes aéreos. Os filmes dessa época sempre tinham irmãs de caridade ou soldados entre os passageiros. Agora, a gente via um time de beisebol de uma escola de ensino médio. E, ao invés do avião, o filme se passava num trem que, a cada estação, uma surpresa estava por vir, fora os zumbis que já povoavam os vagões. Um terror recheado de suspense ao melhor estilão do cinema americano.

Porrada nos zumbis!!!

Um destaque especial deve ser dado aos nossos zumbis. A forma esquálida, rápida e poligonal de seus movimentos chamou muito a atenção e em alguns momentos, despertou muitos risos (como um bom filme de terror deve fazer, diga-se de passagem). Tal coreografia aliada ao uso de lentes de contato de cor leitosa produziram um efeito muito interessante e os mortos-vivos ficaram bem convincentes. Se eles foram cômicos, não foram menos assustadores.

Assim, “Invasão Zumbi” é um filme que vale a pena ser assistido. Mesmo que o leitor não goste do gênero de terror (como eu não gosto), esse filme tem um algo a mais que se distancia dos filmes de terror americanos convencionais. As discussões de caráter social são um fator que chama muito a atenção. A forma como os coreanos conceberam os zumbis também é muito interessante. E o filme ainda se aproxima um pouco do gênero de cinema catástrofe, ao contextualizar tudo numa viagem de trem. Vale muito como curiosidade. E não deixem de ver o trailer abaixo

Batata Movies – BR 716. Uma Comédia De Tempos Que Se Repetem.

Cartaz do Filme

Domingos de Oliveira está de volta com sua nova película “BR 716”. O filme traz velhos elementos já vistos em outros filmes do diretor. Mas também traz algo de novo. O que mais importa é que foi um bom filme dessa vez, pois Oliveira consegue emplacar boas histórias contadas alternadas com algumas nem tão cativantes.

Felipe, o alter ego do diretor

Vemos aqui a história de Felipe (interpretado por Caio Blat), uma espécie de “bon vivant” que tem um gigantesco apartamento na rua Barata Ribeiro, 716 (daí o título do filme), que foi herdado do seu pai (interpretado por Daniel Dantas), um homem falido, mas com seu nome limpo na praça. O problema é que Felipe dá festas homéricas em seu suntuoso apartamento, regadas a muito álcool e porralouquices. Felipe, inclusive, tem o sonho de ser roteirista, mas sua natureza, que é emocionalmente instável (um verdadeiro alter ego de Oliveira), faz com que ele tenha sempre obstáculos para concluir seu projeto. Ao perder a namorada para o melhor amigo, o homem cai em depressão e só consegue se esquecer um pouco dela com as tradicionais noitadas em seu apartamento, que aumentam cada vez mais a conta pendurada no bar da rua do seu prédio. Mas a trama não gira somente em torno do protagonista. Os muitos frequentadores das festas do apartamento também são personagens inusitados, divertidos e tragicômicos. Temos o caso da psicóloga e sua paciente que têm um relacionamento homossexual altamente violento (por parte da paciente), uma ninfeta (maravilhosamente interpretada por Sophie Charlotte), que quer ser cantora ou atriz, e sabe lançar mão de sua beleza para conseguir o que quer, ou o escritor e jornalista que joga cantadas altamente inconvenientes para as mulheres da festa (muito bem interpretado por Pedro Cardoso, embora sua presença tenha sido pequena na tela). Personagens um tanto loucos em festanças insanas. Mas toda a farra terminaria de forma um tanto melancólica, onde a chegada da ditadura militar seria o anticlímax para o clima de euforia.

Sophie Charlotte, imponente

Qual seria o elemento antigo do filme, muito presente em outras películas de Oliveira? A tremenda cara de comédia de costumes dos filmes do diretor, retratando a vida de uma elite de Zona Sul, que pode se dar ao luxo de ter crises existenciais e produtivas. Devo confessar que incomoda um pouco o fato do bairro de Santa Cruz ser tratado como outra galáxia no filme. Tudo bem que ele seja muito longe da Zona Sul e a mobilidade entre essas duas partes da cidade na década de 60 fosse muito pior que hoje, mas o filme abordou essa questão com uma relativa segregação social, principalmente em algumas piadas sob a ótica de quem vive na Zona Sul. Por outro lado, o filme trouxe algo novo que foi a força de vários personagens carismáticos. Embora as outras películas de Oliveira tenham vários personagens interessantes, dessa vez a coisa foi diferente, pois o clima altamente festivo e explosivo fez com que cada personagem tivesse uma diversidade toda própria, sempre trazendo um elemento novo, regado com muito carisma. Não foi um filme de um protagonista com coadjuvantes. Todos eram protagonistas, pois eram personagens muito intensos, tal como a grande festa que era o BR 716 fosse o real personagem coletivo, formado pelas individualidades dos demais personagens. Claro que o personagem de Blat era o mais importante, mas o filme não girava totalmente em torno dele e isso tornou a película muito atraente.

Felipe, numa de suas muitas crises

Outro fator que chama a atenção é a situação de instabilidade política que tomou conta do filme com a proximidade do golpe militar de 1964, que é um tanto semelhante com a situação de instabilidade política de hoje, aliada a uma gama altamente autoritária que está no ar. As festas no BR 716 eram uma espécie de ilha de bom senso, paradoxalmente formada por festeiros bêbados, em meio ao clima de autoritarismo existente. O apartamento, inclusive, passou a ser visto como uma bolha protetora contra os dias do golpe militar e ninguém arredou o pé de lá por dias, com medo dos tempos sombrios que viriam. Tal situação de insegurança e medo com relação ao futuro está bem viva também nos dias de hoje.

Oliveira e Charlotte

Dessa forma, “BR 716” foi um bom filme de Domingos de Oliveira que, se de um lado ele se repetiu em sua comédia de costumes, por outro lado ele mostrou uma gama de personagens todos interessantes, onde não havia propriamente a figura do coadjuvante. Para que isso funcione, o diretor contou com um bom elenco de atores que cumpriram muito bem os seus papéis. Vale a pena dar uma conferida neste filme.