Batata Movies (Especial Oscar 2018) – Mudbound. Lágrimas Sobre o Mississippi. Lutando Dentro E Fora De Casa.

                               Cartaz do Filme

Dando sequência às análises dos filmes indicados ao Oscar, vamos falar hoje de “Mudbound. Lágrimas Sobre o Mississippi”, que concorre a quatro estatuetas (Melhor Atriz Coadjuvante para Mary J. Blige, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia e Melhor Música Para filme, competindo com a música “Mighty River”). Essa é mais uma boa história que aborda a questão do racismo nos Estados Unidos durante uma época que podemos considerar um tanto especial: a da Segunda Guerra Mundial.

      Dois amigos unidos pelo trauma da guerra

O enredo da história é um tanto simples. Uma família branca, outra negra. Ambos moram numa fazenda de propriedade da família branca. Estamos em meados da década de quarenta no Mississippi. A família negra aluga a terra em que vive, mas paga o aluguel com sua produção agrícola. Apesar de serem inquilinos, a família negra é tratada de uma forma, digamos, escravocrata pela família branca. Esse equilíbrio delicado vai sendo levado no dia-a-dia, até que chegamos à situação em que um membro de cada família vai para a guerra lutar contra o nazismo. Os dois membros de cada família sobrevivem e voltam para casa, encontrando um Mississippi provinciano, opressor e extremamente racista, bem ao sabor dos seus inimigos nazistas que combatiam na Europa. Com o mesmo inimigo no seio de seu lar, esses dois homens se conhecem, se identificam por seus traumas de guerra e irão se unir para conviver com toda a paranoia contra a qual lutavam no Velho Continente.

                                                            Um patriarca extremamente racista

Essa coisa de lutar contra uma raposa com outra mais felpuda ainda dentro de seu galinheiro é uma coisa a se pensar. Se considerarmos “Mudbound” como um filme de guerra, ele sai daquela dicotomia e maniqueísmo mocinho/bandido da grande maioria dos filmes de guerra. É difícil ver uma película desse gênero que não demonize o inimigo, embora, por ser muito vasta a filmografia sobre esse tema, a gente encontre alguns exemplos (como “O Pianista”, de Polanski), sempre muito bons. Mas em “Mudbound”, a coisa é muito mais gritante, pois o inimigo nazista não tem rosto, enquanto que a face do racismo do Mississippi é pintado em cores bem vívidas, sobretudo no patriarca da família (interpretado por Jonathan Banks), que não esconde de ninguém o ódio pelos negros. Por isso mesmo, há passagens de “Mudbound” que são extremamente repulsivas, algumas delas pelo constrangimento que a família negra é obrigada a passar, onde a individualidade e a liberdade de seus membros sempre é posta em xeque, mas há outros momentos repugnantes de violência extrema que arrebatam o filme, até então muito tenso, mas ainda não visceral. É, sem dúvida nenhuma, mais um filme de ódio do que de guerra.

                                                   A mãe que vê o filho indo para o covil dos lobos…

E os atores? Além da boa interpretação de Banks, que faz a gente odiar seu personagem com todas as nossas forças e do fundo da alma, tivemos Carey Mulligan, que se destacou como protagonista em “As Sufragistas”, fazendo a esposa da família branca, trazendo um pouco (somente um pouco) de tolerância para com a família negra. Já a mãe da família negra, Mary J. Blige, recebeu a indicação para atriz coadjuvante e foi muito bem, embora o pouco tempo de tela, se analisarmos todo o contexto do filme possa prejudicar a avaliação de seu talento. Esse é um filme de muitos atores, rostos e personagens, onde parece que cada um deles pega um pedacinho da película para si e logo abandona em favor de outro ator. Isso incomodou um pouco e meio que fragmentou um pouco a narrativa, apesar do fio condutor dos dois combatentes, que foram bem mas são um tanto desconhecidos (Garrett Hedlind e Jason Mitchell).

                                           A mãe que é solidária somente quando possível…

Assim, “Mudbound. Lágrimas Sobre o Mississippi” é mais um bom candidato ao Oscar, embora essa película pareça correr por fora em relação a filmes como “A Forma da Água” ou “Três Anúncios Para Um Crime”. De qualquer forma, mesmo que ela não faça bonito no Oscar, já o fez por tocar numa ferida da sociedade estadunidense que jamais deve ser esquecida: o racismo crônico, declarado e latente de um povo que se diz o maior defensor da democracia e da liberdade. E comparar esse defeito imperdoável com o nazismo é uma jogada de mestre. A repugnância da película em alguns momentos choca o espectador, como se ele tomasse mesmo um tapa na cara. Você sai incomodado da sala, pois passa por emoções muito fortes num intervalo de tempo muito pequeno mais ao fim da exibição. Por isso mesmo, essa película merece muito respeito como obra artística que é, independentemente de qualquer prêmio.

 

%d blogueiros gostam disto: