Dando sequência às nossas análises de filmes que concorrem ao Oscar, vamos falar hoje de “Pieces Of A Woman”, mais uma produção da Netflix que concorre a estatueta de Melhor Atriz para Vanessa Kirby. Para podermos falar desse filme, vamos precisar dos spoilers de sempre.
Vemos aqui a história de um casal, Martha (interpretada por Kirby) e Sean (interpretado por Shia LaBeouf). Eles estão prestes a ter uma filha e querem fazer o parto em casa. A parteira que acompanhou toda a gravidez estava ocupada no dia do nascimento da bebê e eles receberam a ajuda de uma parteira “reserva” por assim dizer. O problema é que o nascimento foi todo complicado e a menina acabou morrendo. Isso foi apenas o início de uma via crucis para Martha, que teve que lidar com os procedimentos que iria realizar com o corpo da criança (enterro ou doação do corpo para pesquisas), o processo em cima da parteira e a relação com o marido que ficou em frangalhos. Para piorar toda a situação, a mãe de Martha, Elisabeth (interpretada por Ellen Burstyn) se achava no direito de se intrometer na vida da filha e nas suas decisões, o que gerava ainda mais atritos. E, no meio dessa tempestade toda, as perdas ficam ainda maiores, com somente uma coisa principal a fazer: aguentar a maré brava passar. Mas não sem tomar algumas atitudes que serão decisivas para conseguir a paz de espírito e seguir em frente.
O filme tem um ritmo lento e, obviamente, é muito pesado, onde parece haver uma depressão coletiva na maioria dos os personagens, algo bastante comum nesse contexto. O ritmo lento o torna um pouco maçante, mas ele também desperta uma angústia muito forte quando vemos a vida das pessoas desmoronando. Vanessa Kirby, a indicada à Melhor Atriz, passou por várias fases ao longo do filme. A primeira, pouco tempo depois da morte da bebê, mostrava uma Martha tão letárgica que ela parecia indiferente à tudo, até à morte da filha. Nesse ponto, o personagem de LaBeouf foi bem mais enfático e mostrou um sofrimento bem pronunciado, assumindo um comportamento mais frio com o transcorrer do filme, até o afastamento total. Martha, por sua vez, tem uma explosão de paroxismo quando discute com a mãe num encontro familiar, com esta falando também de seus sofrimentos pregressos, quando era perseguida pelos nazistas e foi obrigada a fazer o parto sozinha em que nasceu Martha (foi uma bela atuação de Ellen Burstyn aqui). E sua grande participação no filme foi seu depoimento no julgamento da parteira, que não vou comentar aqui porque já dei spoilers demais.
O filme tem uma metáfora bem interessante. Martha, depois que perde o filho, come uma maçã no trem, cercada por pais junto de seus filhos. De repente, ela tira da boca uma sementinha de maçã. Ela irá cultivar sementes de maçã, colocando-as no algodão molhado (da mesma forma que fazíamos no ensino primário com os feijões) para que elas germinassem e fossem plantadas. Essa metáfora é responsável pela cena final do filme que, depois de maltratar bastante o espectador com uma história sofrida e pesada, nos fornece um happy end.
Dessa forma, “Pieces Of A Woman” é mais um candidato ao Oscar que merece a atenção. É um filme sofrido e difícil de assistir, mas tem uma boa atuação de Kirby, que foi em várias camadas. Sem dúvida, uma concorrente de peso ao posto de Melhor Atriz.