Batata Mangá – Coin Laundry Lady. Curso Intensivo De Surrealismo E Bizarrice.

Capa do Mangá

Mais um mangá de volume único nas bancas. “Coin Laundry Lady”, escrito e com arte de Hiro Kiyohara, é um tratado mangá de surrealismo e bizarrice à toda prova que, cá para nós, não foi lá grande coisa, de tão esquisito que ficou. O enredo é bastante simples: dois universitários vão a uma lavanderia para dar um trato em suas roupas e são surpreendidos por uma moça que vive na máquina de secar, que é totalmente louquinha de pedra.

Morando na máquina de secar da lavanderia…

O problema é que não temos uma história coesa do início ao fim, mas uma narrativa para lá de fragmentada, onde os protagonistas passam pelas mais loucas e inusitadas situações. Ainda, para apimentar um pouco mais a situação, o nosso mangaká também faz os famosos mangás hentai, aqueles com certo conteúdo erótico, e ele abusa de alguns fetiches por aqui como masoquismo e voyeurismo. Só que a coisa é tão bobinha que não alcança o pretenso resultado esperado de chocar (pelo menos não aos olhos de nossa cultura). O grande problema é que, por ser tão fragmentada, a narrativa até se torna confusa em alguns momentos, sem falar que é altamente bizarra e surreal.

Uma menina meio maluquinha…

Assim, a leitura não engrena e é altamente enfadonha. A gente até entende um pouco por que o mangá adquiriu tais contornos tão pouco ortodoxos quando vemos o depoimento de Kiyohara mais ao final, onde ele mesmo assume um quê um pouco infantil e solitário, além de assumir que a moça da máquina de secar é um alter ego seu (ambos têm hemorroidas, argh!).

Leves insinuações a la Hentai…

Dessa forma, “Coin Laundry Lady” infelizmente não foi uma boa experiência. Se o autor tivesse, pelo menos, feito uma história com mais coesão, talvez a coisa ficasse um pouco mais aceitável. Mas do jeito extremamente fragmentado como ficou, até com uma rápida historinha totalmente diferente do contexto mais ao final, ficou um pouco difícil de acompanhar. Até porque, quando a gente compra um mangá, geralmente espera uma história que seja contada ao longo de toda a revista, que tem cerca de duzentas páginas geralmente, e não algo todo picotado. Uma pena.

Não se pode negar, pelo menos, que o mangá tem uma bela arte…

Batata Mangá – Feridas. Unidos Em Defesa Contra As Adversidades Da Vida.

Capas do Mangá

Um mangá em volume único chama a atenção nas bancas. “Feridas”, escrito por Otsuichi e com arte de Hiro Kiyohara, fala de dois meninos de uma classe especial. Mas, um pouco diferente do que entendemos de “classe especial” no Brasil, no Japão e em outros países, esse tipo de classe também é para as crianças que têm dificuldades de relacionamento.

Keigo e Asato, dois amigos muito unidos…

Vemos aqui a história de Keigo, um desses meninos. Ele é criado com muita indiferença pelos tios, depois de seu pai ser internado no hospital e sua mãe sair de casa para desaparecer e nunca mais voltar. Ele guarda mágoas de sua mãe por ter fugido e o deixado sozinho e tem profundo rancor do pai, que o tratava com violência, assim como à sua mãe. Keigo vai parar na classe especial justamente depois de surrar com muita raiva um garoto que o humilhava por causa de sua condição familiar. Na classe especial ele conhecerá Asato, outro menino criado com indiferença pelos parentes, e que vive totalmente recluso com relação às demais pessoas. Lentamente, Keigo se aproxima de Asato e eles se tornam amigos. Mas, num belo dia, Keigo descobre que Asato tem um poder especial: ele consegue passar para seu corpo as feridas de outras pessoas, curando-as. Ao mesmo tempo, Asato também pode passar essas feridas para outras pessoas. Keigo, então, tem a ideia de ajudar as pessoas feridas com o poder de Asato, que transferia as feridas das pessoas para o pai de Keigo no CTI, numa espécie de vingança do filho revoltado com o pai. Haverá, ainda, na vida dos dois, uma misteriosa funcionária de uma sorveteria que anda constantemente com uma máscara cirúrgica, sendo que ela será a única a tratar os dois com carinho e amor.

Descobrindo um poder…

Seguindo a linha filosófica do Tio Ben do Peter Parker, “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”, os meninos, ao quererem fazer o bem, não usaram o poder de Asato como devia e isso trouxe sérios problemas para os dois, que ficavam com suas vidas ainda mais angustiantes do que já eram. Isso sem falar na vingança que Keigo promovia contra o seu pai, que de bem não tem nada. O grande mote da história, no entanto, são os sofrimentos e traumas dos dois adolescentes. É um mangá que pesa muito para o lado do drama, sendo altamente emotivo, com o poder de Asato sendo uma espécie de ingrediente a mais que amplifica essa situação de drama. A vida pregressa dos dois protagonistas também é um combustível a mais que beira o bizarro, pois a forma como mães e pais se voltam contra os filhos é de chocar. Vale dizer aqui que o autor, Otsuichi, se inspirou na obra de Torey Hayden, uma psicóloga infantil dos Estados Unidos e professora de classes especiais. Seus livros relatam experiências com crianças dessas classes, inclusive com situações de violência entre os alunos.

Uma sorveteira com uma estranha máscara…

Apesar de todo esse drama, paroxismo e agonicidade, o autor do mangá não optou por um final triste e abraçou um happy end cheio de esperança. Ou a coisa teria ficado pesada e insuportável demais. De qualquer forma, é uma história que traz elementos para a reflexão e, por que não, uma espécie de grito de socorro em nome de crianças que não são cuidadas de forma adequada por seus pares. Cá para nós, o que não falta nesse mundo é criança largada e jogada por aí por quem as gerou, sem qualquer noção de mundo e de como as coisas são. E isso é algo muito grave, com esse mangá denunciando isso. Daí a importância dessa leitura, que consegue ser muito tocante. E, ainda por cima, é um mangá de volume único, algo altamente recomendável, pois como é difícil fazer uma coleção completa de mangás japoneses no Brasil!!! Os números chegam até nós de forma muito irregular, isso quando chegam. Assim, sempre recomendo aos leitores a chance de ler um mangá de volume único e torcer para que o mangá de vários volumes que você escolheu chegue com a maior regularidade possível e da forma mais completa. Mas não se esqueçam de dar uma olhadinha em “Feridas”.

Situações de sofrimento…

Batata Mangá – Avengers 09. A Vingança É Um Prato Mais Gostoso Servido Frio.

Capa do Volume 1

Mais um mangá perturbador nas bancas. “Avengers 09”, de Seishi Kishimoto, toca num tema que sempre foi muito caro ao comportamento humano: a vingança. Essa é uma história que usa o argumento do “olho por olho” para coibir a criminalidade. Mas a vingança não será realizada pelos parentes das vítimas e sim por uma força policial especial conhecida como Avengers. Segundo o mangá, a “Lei da Vingança” existia no Japão até o surgimento da política modernizadora do Imperador Meiji no século XIX. E, nos tempos atuais, ela passa a ser retomada, pois há a queda das taxas de natalidade e uma instabilidade econômica que aumentam as taxas de assassinato e crimes hediondos. Para frear o ritmo de crimes, as famílias das vítimas têm o direito de requerer a pena de vingança, onde um avenger irá aplicar o mesmo crime que o criminoso aplicou contra a vítima, isso depois de uma análise bem meticulosa de se a pena de vingança deve ser aplicada ou não. Mas se o criminoso ganhar o duelo com o avenger num bairro fechado, ele tem direito a uma anistia de três anos e a morte por eutanásia. São, ao todo, nove avengers que foram vítimas de crimes hediondos ou tiveram parentes vítimas de crimes hediondos, pois assim eles podem se solidarizar na dor dos parentes das vítimas que assistem a tudo num óculos que mostra imagens captadas por uma câmara que está na roupa do avenger que executa a pena, isso para que o parente se sinta como se ele mesmo praticasse a vingança.

Cada avenger tem uma característica específica. O protagonista, Yuuji Yamagishi, por exemplo, tem pernas e braços insensíveis em virtudes de acidentes anteriores que ele sofreu onde perdeu membros e o implante deles tornaram-nos insensíveis. Ele usa isso para fazer tocaias para os criminosos. Já a mais nova avenger, Ryouko Koizumi, que sofreu um estupro, tem a característica de poder contorcer todo o seu corpo, deslocando articulações para atacar de surpresa os criminosos.

Um qualificado grupo de vingadores…

Conseguimos ver em todo o primeiro número um ambiente doentio onde todos os condenados têm comportamentos psicóticos, sendo dignos da punição que recebem, exceto por um caso que aparece mais ao final do volume. Ainda, embora a “Lei da Vingança” seja amplamente usada, ela também não deixa de ser questionada, principalmente na figura da jornalista Haruka Yanase, amiga de Yamagishi e que sustenta o argumento de que um julgamento não é justo, no sentido de se tratar com equidade a análise dos crimes, se os familiares das vítimas interferem. Ou seja, numa história onde o espírito de vingança dá o tom, já no primeiro número aparecem os primeiros questionamentos, até porque, se há parentes das vítimas que não gostam de ver os criminosos sendo punidos violentamente, outros nutrem um violento prazer em se tornarem os carrascos por intermédio dos avengers, prazer esse que beira a psicose. Num dos crimes, eles não se contentaram em apenas ver o criminoso ser executado, mas ainda profanaram seu túmulo e o decapitaram. É realmente uma leitura bem pesada, com muita violência explícita e imprópria para menores de 18 anos, como está escrito na capa da revista.

Assim, “Avengers 09” é uma leitura forte para quem tem muito estômago e, principalmente, uma mente centrada, pois fica meio difícil embarcar na canoa furada da vingança, ainda mais em dias de violência e ódio desmedidos em nosso país. Tal leitura deve ser consumida com sabedoria e não para despertar ódios tão insanos como os que nós temos visto ultimamente. Mas vale a pena procurar esse mangá nas bancas.

Capa do Volume 2

Batata Mangá – Innocent. Execuções, Torturas E Androginias.

Capa do Mangá

Mais um mangá nas bancas. “Innocent”, de Schin’Ichi Sakamoto, tem um toque todo peculiar, pois é baseado numa história real ocorrida durante a… Revolução Francesa (!). Uma história sobre um jovem de coração puro, profundamente atormentado pelo ofício que lhe é imposto por uma tradição de família.

Um rapaz atormentado

E que tipo de ofício é esse? Os membros da família de Charles Henri-Sanson, o jovem em questão, desempenham a função de carrasco nas execuções ordenadas pelo rei. Isso faz com que os familiares de Sanson sejam vistos como algo maligno e amaldiçoado, como uma coisa que exala morte, sendo rechaçados por todos. O rapaz, marcado por essa espécie de maldição, não consegue conviver com as demais pessoas, tendo aulas particulares com um padre de aparência, no mínimo, muito estranha. Mas vai chegar um dia em que Sanson vai ter que, não somente frequentar uma escola e interagir com as pessoas, como vai ter também que honrar a tradição da família e começar a praticar o ofício da execução através de decapitações com uma espada. No meio disso tudo, surge um rapaz em sua vida que se compadece de seu sofrimento. Um rapaz que pode ser um alento em sua vida… ou um tormento ainda maior para um garoto já muito angustiado.

Ele precisa cumprir o ofício da família…

O leitor vá me desculpar pelos spoilers deste texto, mas como se trata ainda do primeiro volume do mangá, vou tomar a liberdade de lançar mão deles. O que podemos falar do primeiro número deste mangá? São 204 páginas de pura arte. Uma arte igualmente complexa e delicada, onde as paisagens e o humano são trabalhados com igual competência, num estilo rebuscadíssimo. Desse ponto de vista, o mangá é uma imbatível obra de arte. O problema é que temos uma predominância de muitos quadrinhos sem um diálogo sequer, o que acaba tornando a leitura (?) um pouco enfadonha. Temos muitos e muitos closes de Sanson com lágrimas singelas escorrendo em seu rosto, ou de gritos profundamente paroxistas expressando dores físicas e da alma. Nesse ponto, o mangá foi extremamente contundente. Mas temos outros momentos em que a leitura nos afeta com grande intensidade. Além da crueldade da execução em si, a família Sanson, com o peso da sua tradição em praticar execuções, acaba se tornando altamente neurótica, com o pai praticando torturas em seus filhos, ao bom e velho estilo do Antigo Regime, onde as práticas de tortura são meticulosamente estudadas e analisadas, seja para provocar ainda mais dor, seja para aliviar momentaneamente a dor para preparar o torturado para uma nova sessão. Tal imolação dos filhos partia de um expediente onde o pai buscava convencer os herdeiros de seguirem as tradições da família. Nesse ponto, a leitura é pesada e tocante.

…mas é extremamente sensível…

A história apresenta também um alto grau de androginia, manifesto na figura do jovem Sanson. O rapaz tem um lado feminino profundamente sensível e refinado, o que aumenta ainda mais o seu sofrimento ao tentar cumprir as tradições da família. Em oposição a isso, está a figura de sua avó, uma guardiã da tradição, impiedosa em suas falas e com um certo prazer sádico no cumprimento das execuções. No meio desses dois pólos totalmente dicotômicos, está o pai, que obedece às diretivas da tradição, ao ponto de impô-las aos filhos através de torturas, mas com a consciência altamente pesada de fazer isso, chegando a abraçar o jovem Sanson depois que ele aceita, sob tortura, o ofício de executar, e dizer ao filho: “Agora não serei mais desprezado por você!” Mais neurótico do que isso, impossível. Freud explicaria?

Tortura. Pedagogia de Antigo Regime…

Assim, “Innocent” é um interessante lançamento da Editora Panini, sob o selo Planet Mangá. Uma história escrita por um japonês como Shin’Ichi Sakamoto sobre fatos reais da França Revolucionária. Um mangá que é uma obra de arte altamente refinada e rebuscada, contrastando com o forte tom de angústia e desespero que permeia toda a obra, com pitadas doentias de tortura e poder de vida e morte sobre os filhos, ao bom estilo da ideologia punitiva do Antigo Regime. Aliado a tudo isso, uma androginia delicada que torna nosso protagonista muito suscetível ao peso do fardo da tradição da família. Um verdadeiro teste para os mais sensíveis e um desafio para psicólogos e estudiosos dos tormentos da alma. Por tudo isso, a classificação do mangá a torna impróprio a menores de 18 anos, ou seja, um mangá para adultos, acima de tudo. Vale a pena dar uma conferida.

Androginia extrema…

 

Batata Mangá – Inspector. A Vida Controlada Pelo Sistema (Operacional).

Capa do Mangá

A Editora Panini (Selo Planet Mangá) nos traz outro lançamento de mangás japoneses. “Inspector – Akane Tsunemori” lança mão de uma importante questão: até onde nossas vidas, num futuro não tão distante, serão reguladas e controladas pela máquina? Quais são os prós e contras de tal situação? Isso seria uma utopia ou uma distopia? As páginas desse mangá adulto (ele é inadequado para menores de 18 anos) irão buscar uma reflexão sobre esse assunto. Sem nos esquecermos de que esse mangá cumpre um “caminho inverso” e é baseado no anime “Psycho Pass”. Geralmente, vemos animes baseados em mangás, justamente o oposto. Ah, sim, a autoria (arte) do mangá é de Hikaru Miyoshi.

Akane no anime…

No que consiste a história? A Akane Tsunemori em questão é uma mocinha que é um prodígio de inteligência numa sociedade de um futuro relativamente próximo a nós. Esse mundo é todo controlado por um sistema operacional de nome Sybil, que deu um diagnóstico para Akane de aptidão para cumprir várias funções públicas altamente qualificadas. Geralmente, o Sybil seleciona pouquíssimos ou somente um ofício para cada pessoa, praticamente determinando a carreira e a vida profissional do indivíduo. Mas Akane podia escolher várias carreiras, o que lhe perturba muito. Curiosamente, a moça escolheu o ofício de inspetora da Agência de Segurança Pública, pois apenas ela poderia cumprir aquele emprego e, dentro de uma visão altamente altruísta, ela deixou suas outras aptidões possíveis para outras pessoas. E aí, seguindo um trecho da Constituição do Japão (“Faz o que deve ser feito aquele que é capaz de fazê-lo”), Akane começa seu ofício de Inspetora. E o que ela tem que fazer? Comandar e controlar os chamados executores, pessoas que têm um alto coeficiente criminal no seu chamado “psycho pass”; tal coeficiente, medido por números e cores que podem ser fortes e turvas, indica a propensão psicológica que as pessoas têm para cometer crimes futuros (nesse ponto, lembramos muito da parceria entre Tom Cruise e Steven Spielberg em “Minority Report”). E quem mede tal coeficiente? Isso mesmo, caro leitor, o Sybil! E o que os executores fazem, liderados pelo inspetor? Caçar e neutralizar os “criminosos latentes”, ou seja, pessoas de alto coeficiente criminal com uma pistola chamada “dominator”, totalmente controlada por computador, dando poderes para o inspetor sobre os executores. O problema é que se o tal coeficiente é muito alto, o criminoso latente é considerado irrecuperável e a dominator deixa de ficar ajustada para atordoar e é reajustada para matar. Para piorar, quem está relativamente próximo do criminoso latente, também tem o seu coeficiente criminal aumentado. Nesse trabalho, volta e meia há situações não previstas pelo sistema, formando bugs que colocam todos em situações de extremo perigo.

… e nos quadrinhos…

Essa, por incrível que pareça, é uma história altamente atual, pois o sistema operacional Sybil conseguiu reduzir altamente a criminalidade e os homicídios mas, em contrapartida, faz isso limitando a liberdade do indivíduo enormemente (tal como acontece nos dias de hoje, onde a liberdade é preterida em nome da segurança em várias situações), a começar por “selecionar” estatisticamente a vida profissional dos indivíduos e chegando ao ponto de usar a estatística para privar as pessoas de sua liberdade (a questão do tal criminoso latente), perturbando as pessoas ao invés de recuperá-las. Hoje em dia, temos outros mecanismos de seleção, como por exemplo, a seletividade social, que fornece um sistema educacional de baixa qualidade àqueles que possuem menor renda, sem falar dos rótulos que associam pobres a bandidos. Ainda, a questão da contaminação de outras pessoas pelo coeficiente criminal dos criminosos latentes parece muito uma alegoria de como o comportamento violento de nossas sociedades atuais gera ainda mais violência, como se a violência fosse um mal que se espalha e contamina tudo que vê pela frente tal como uma praga. Há, também, uma insinuação de que o Sybil, ao controlar as vidas das pessoas, tira também a vontade própria e a força de iniciativa do indivíduo, transformando-o numa mera engrenagem funcional de todo o sistema. Akane será a personagem que irá questionar as decisões do Sybil e se colocará em pé de igualdade com seus subordinados, para o espanto geral de todos, humanizando as relações. Ainda, ela terá um estranho relacionamento com um de seus executores, Kougami, que tem um passado nebuloso.

Kougami

A história também traz uma boa trama policial, relacionando os casos de crime que vão aparecendo ao longo da história. Isso exige uma atenção maior do leitor, sobretudo a partir do segundo volume do mangá. Uma coisa é certa: um grande vilão surgirá por aí.

Assim, “Inspector – Akane Tsunemori” vem com a promessa de uma instigante história, onde questões muito atuais como a limitação ou ampliação de nossas vidas pela informática e o combate à violência em troca da privação da liberdade são discutidas. Nossa protagonista questiona o sistema e busca humanizá-lo da melhor forma possível. Mas isso é somente o começo de uma história que merece ser muito bem acompanhada.

Os personagens do mangá…

Batata Mangá – Pluto. Matando Robôs.

Capa do mangá com Gesicht

A Editora Panini (Planet Mangá) fez um interessante lançamento para quem gosta de mangás de Sci Fi. “Pluto”, escrito por Naoki Urasawa, é livremente inspirado em “O Maior Robô da Terra” da série “Astroboy” de Osamu Tezuka, e é uma história sobre robôs. Já conhecemos bom a literatura de robôs de Isaac Asimov aqui no Ocidente. E agora, um mangá volta a abordar esse Universo, com uma pegada, digamos, mais policial.

Lembram do Astroboy???

É uma época no futuro onde robôs e humanos coexistem. Haverá toda uma série de assassinatos cujas vítimas serão robôs ou humanos simpatizantes de direitos de robôs. A primeira vítima é Mont Blanc, uma espécie de herói local da Suíça. A segunda vítima é Bernard Lanke, membro da Sociedade Protetora dos Direitos dos Robôs. Em seus corpos, chifres são improvisados em suas cabeças pelo assassino. Quem conduzirá as investigações dos homicídios será Gesicht, um inspetor da Europol, que também é um robô, sendo um dos mais desenvolvidos do planeta. Logo, mais robôs com grande potencial são assassinados e Gesicht percebe que ele também está entre as potenciais vítimas. Ao fim do primeiro número, ele encontra Atom, um jovem garoto robô que era o personagem principal da saga de Tezuka.

Vítimas com chifres…

Com o primeiro volume dessa história lançado, a impressão que se dá é a de que teremos um grande mangá pela frente. O único problema, inerente a todos os mangás aqui no Brasil, e extremamente grave, é a continuidade da disponibilização dessa série nas bancas e livrarias, já que a entrega dos volumes é altamente instável. A gente pode esperar meses por aqui por um novo número. E quando ele chega às nossas mãos, já nos esquecemos da história do volume anterior há muito tempo, o que faz com que a leitura de um mangá se torne por aqui um grande exercício de paciência. Mas, após esse pequeno desabafo, voltemos a “Pluto”. Existe uma coisa que chama a atenção logo de cara: a história não se passa no Japão e sim na Europa, onde Gesicht se encontra em solo alemão. Ainda, vemos algumas insinuações de Asimov na história, como em leis onde robôs não devem ferir seres humanos (tal como nas Três Leis da Robótica de Asimov) e situações onde robôs são amados como heróis, como no caso de Mont Blanc, aqui já contrastando com a visão de preconceito total que os humanos tinham com os robôs nas histórias de Asimov. Ainda assim, os assassinatos em série de robôs voltam a aproximar a história do Universo Asimoviano, sobretudo quando nos lembramos de seu romance policial “Caça aos Robôs”. É curioso também perceber nesse primeiro número, a presença de um robô que foi enclausurado por ter matado uma pessoa, robô esse que recebe a visita de Gesicht para tentar algum avanço nas investigações. Outro detalhe intrigante é uma tal de 39ª Guerra na Ásia Central, onde ela apenas é citada, mas não foi bem explicada ainda. Espera-se que vejamos isso nos próximos números. No mais, há também outro elemento: o de como alguns robôs procuram ter uma vida, digamos, mais humana. Gesicht, por exemplo, tenta planejar uma viagem com sua esposa, também robô, para se curar de uma suposta fadiga provocada pelo excesso de trabalho, assim como temos um casal de robôs que adota crianças, dada a sua impossibilidade de terem filhos.

Comunicando à esposa robô a morte de seu marido robô…

Assim, “Pluto” é um instigante mangá que vale a pena a atenção do leitor, pois ele combina romance policial com ficção científica, tudo isso com um tempero de Tezuka, pois Atom, o conhecido Astroboy, foi incluído na trama bem ao final do mangá. Lamento pelos spoilers, mas acho que eles foram um bom cartão de visitas para chamar a atenção para os volumes vindouros. Que eles não demorem muito para chegar às nossas mãos.

Um robô veterano de guerra que quer ser pianista…

Batata Mangá – Who Fighter E O Coração Das Trevas. A Segunda Guerra Mundial Em Mangá.

                                 Capa do Mangá

Vamos falar hoje de um lançamento em mangá já bem antigo (mais especificamente de julho de 2010). A HQM Editora trouxe, naquela longínqua data, um volume único com três histórias que se remetiam à Segunda Guerra Mundial. A primeira, Who Fighter, era mais centrada em aviação e OVNIs. Tanto a aviação americana quanto a japonesa detectam um objeto não identificado nos céus do Japão. O tenente Kitayama, que fez contato visual com a estranha luz, é chamado para depor. A partir daí, nosso personagem protagonista se envolverá numa trama regada à espionagem, mistério, suspense e estranhos alienígenas. A história não fica somente nesses gêneros, abraçando também um pouco do terror. Podemos ver soldados morrendo com seus cérebros espatifados, ou poças de sangue aqui e ali. Há, também, menções a sinais deixados pelos alienígenas em descampados e que também apareciam misteriosamente impressos em corpos de pessoas que haviam tido contatos imediatos de terceiro grau (ou seja, quando se deparavam frente à frente com os alienígenas). Uma coisa que incomodou na história foi o seu fim um tanto abrupto e o fato de que o OVNI e a espécie alienígena permaneceram um mistério, com o último quadrinho tomado pela enigmática frase: “Os céus são maiores do que você pensa”. Ou seja, o leitor fica o tempo todo esperando para ver quem são os alienígenas e suas intenções, mas no final, nada fica explicado. Parece aqui que o alienígena foi somente um argumento, um pretexto para que se fizesse o exercício do mistério, do suspense e do terror ao longo da história.

                                                                             Who Fighter

A segunda história do mangá, “O Coração das Trevas”, tem uma notável curiosidade. Ela é baseada na obra de Joseph Conrad, que inspirou também o filme “Apocalipse Now”. De Francis Ford Coppola. Assim, a coisa nos soa muito familiar. Essa trama também é ambientada na Segunda Guerra Mundial, tendo como personagens oficiais do exército japonês. Nosso protagonista é o primeiro-tenente Maruo, uma especialista em combate estratégico que foi convocado para uma missão muito inusitada: localizar, nas selvas da Birmânia (atual Mianmar), o coronel Kurutsu, um herói da guerra sino-japonesa que, aparentemente, enlouqueceu e desertou, levando consigo todo um regimento preparado para um combate na linha de frente. O coronel deixou uma carta onde disse que desistia do combate da guerra na Birmânia e havia decidido fundar uma sociedade utópica nas florestas. Aí, vemos uma livre adaptação em relação a que vimos em “Apocalise Now” (infelizmente não li Conrad) com algumas diferenças introduzidas, onde as intenções de nosso coronel não eram tão idealistas assim (Marlon Brando era muito mais idealista e muito mais psicótico também) e o desfecho teve uma cara totalmente diferente do filme de Coppola. Assim, foi muito instigante testemunharmos uma história que faz parte de um clássico do cinema ser recontada de forma criativa num outro veículo que é o mangá.

                                                                        Encontrando um OVNI…

A terceira história é muito curta, intitulada “Tanques”, onde presenciamos batalhas de tanques nas Duas Guerras Mundiais, que nada mais eram do que o sonho de um militar que operava um tanque numa guerra do futuro.

O autor dessas três histórias, Seiho Takizawa, ainda nos brinda com um posfácio, onde ele nos revela detalhes de seu processo criativo, assim como algumas dificuldades criativas que ele enfrentou, além de confessar que gosta muito de trabalhar histórias onde se tem o medo (daí a pegada de terror da primeira história). O autor também falou de como desenvolve seu processo criativo em histórias originais e histórias adaptadas, exatamente os casos desse mangá específico.

          O coração Das Trevas

Assim, “Who Fighter” e “O Coração Das Trevas” são histórias de um mangá bem interessante e curioso, sobre a presença japonesa na Segunda Guerra Mundial. Seja carregando nas tintas do mistério, suspense e terror na primeira história, seja relendo um clássico do cinema na segunda história, dando-lhe novas perspectivas. Só é pena que esse mangá já seja demasiadamente antigo (eu o consegui num stand de livros a dez reais na Feira da Providência de 2017), mas pode ser que seja possível obtê-lo em lojas e bancas especializadas de quadrinhos. Vale a pena procurar por aí.

    O livro de Joseph Conrad…

Batata Mangá – Saintia Shô. Cavaleiros Do Zodíaco Para Meninas.

Capa do número 1

E a Editora JBC nos traz uma obra, por assim dizer, magnifica para quem gosta de Cavaleiros do Zodíaco. “Saintia Shô” é uma espécie de Cavaleiros do Zodíaco para meninas, embora seja uma leitura para todos. Todos mesmo, não importa o sexo ou a idade. A história é escrita por uma fã, Chimaki Kuori. Isso me faz lembrar muito do Universo Expandido de “Guerra nas Estrelas”, embora a gente não possa dizer se a obra de Kuori pode ou não ser considerada canônica. A história também pode não ser muito original (pelo menos nos dois primeiros números que já saíram nas bancas), mas tem a mesma pegada emocionante do anime que víamos na tv.

Capa do número 2. As duas já estão nas bancas aqui do Brasil

Mas, do que consiste a trama? Vemos aqui a história de Shoko, uma menina que é recorrentemente atormentada por um pesadelo onde é perseguida por uma cobra alada que lhe chama de hospedeira e é salva por Miro, o Cavaleiro de Ouro de Escorpião. Shoko tem uma irmã, Kyoko, que não vê há cinco anos, pois ela foi selecionada para estudar na Fundação Graad, liderada por ninguém mais, ninguém menos que a senhorita Saori Kido, a lendária Atena, deusa grega que defende a Terra contra as forças do mal. Ao descobrir que Saori, uma adolescente ainda em formação, iria estudar em sua escola, Shoko tenta vê-la de qualquer jeito, mas é impedida por Mii, uma espécie de secretária particular de Saori.

Shoko terá a difícil tarefa de proteger Saori e salvar sua irmã

Ao conversar com uma amiga no jardim da escola, Shoko percebe que todos desmaiam à sua volta, e uma estranha aluna a chama de mãe, de forma ameaçadora. Nesse momento, Kyoko, sua irmã, aparece com a armadura de Equuleus (“Cavalo Menor”) e afugenta a estranha mulher. É então revelado a Shoko que Kyoko e Mii são saintias, ou seja, uma espécie de damas de companhia de Atena, que defendem a deusa e podem usar as armaduras, mas não precisam abrir mão de seu lado feminino, como é imposto a outras mulheres que defendem Atena. Ou seja, criou-se um subterfúgio para que surgissem Amazonas de Atena. A Terra está sob a ameaça de Éris, a deusa da discórdia, que alimenta a animosidade e a beligerância entre os humanos. Mas Éris ainda não despertou e suas filhas aguardam o despertar dessa deusa maligna que vai ocupar um corpo. E esse corpo é justamente o de Shoko, que será protegida por Atena, Mii e Kyoko, que já perceberam o forte cosmo de Shoko. Entretanto, as coisas ficariam mais difíceis, pois numa nova batalha contra as forças do mal, Kyoko acaba sendo atingida para proteger sua irmã, tornando-se a nova hospedeira de Éris. Caberá a Shoko fazer um treinamento intenso em pouco tempo para se tornar uma saintia, defender Atena e ainda salvar sua irmã.

Miro, de Escorpião, um dos poucos personagens masculinos nesse Universo predominantemente feminino

Bom, como foi dito acima, não é uma história original, pois Hades já havia incorporado Shum, irmão de Fênix, e em “The Lost Canvas” aconteceu mais um caso de incorporação. Mas o simples fato de que a grande maioria dos personagens é feminina e ainda termos uma participação especial de Miro de Escorpião nos poucos personagens masculinos, dão um charme todo especial à história. Isso sem falar que a arte do mangá está uma baita de uma arte mesmo. E relembremos o que foi dito acima: a história dessa revista, pelo menos nos dois números iniciais, tem uma pegada tão eletrizante quanto a que víamos nos animes lá na extinta TV Manchete. Todos esses elementos fazem esse mangá ser muito apaixonante e uma leitura obrigatória para qualquer fã que minimamente se diga adorador de Saint Seya. É o tal negócio: quando a coisa é feita por fã, que respeita e ama, na maioria das vezes o resultado é muito bom. E não foi diferente para nossa Chimaki Kuori, que está de parabéns pelo seu trabalho. Só espero que os próximos números continuem com a mesma pegada. E estou ansioso para conferir isso.

Éris, a Deusa da Discórdia
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